“Ufologia se faz coletivamente. Ninguém, sozinho, compreenderá o que querem nossos visitantes. Tem que haver a troca, o reparte e a discussão do resultado de nosso trabalho.” (Irene Granchi)
Domingo, 12 de dezembro de 2010. Um dia que ficará para sempre em nossas memórias, numa mistura de sentimentos, como tristeza, vazio, fragilidade, nostalgia, solidão e recordações fraternas, além de muitos outros, aos quais tornam-se simplesmente silenciosos neste momento.
Não bastasse o choque do falecimento, na última sexta-feira, do pioneiro José Victor Soares, nesta manhã de domingo recebemos a notícia de que a grande matriarca da Ufologia Brasileira partiu. Dona Irene Granchi, pesquisadora e ufóloga ímpar no mundo, presidente de honra do Conselho Editorial da Revista e Equipe UFO, também nos deixou.
Informamos que o velório foi nesta segunda (13) no Cemitério dos Ingleses, Gamboa (RJ) e o enterro às 14h00 no mesmo local. A missa de sétimo dia será na próxima segunda feira (20), às 19h30 na Igreja da Divina Providência, na Lopes Quinta, Jardim Botânico (Rio de Janeiro) – em frente à TV Globo.
Não há palavras, textos ou depoimentos que se comparem a um mínimo sobre a vida e obra desta mulher, revolucionária e à frente de seu tempo em todos os sentidos, mas tentaremos repassar uma breve e modesta noção do que representou esta senhora para a pesquisa do Fenômeno UFO.
Dona Irene nasceu na Alemanha, em 26 de novembro de 1913, mas teve formação inglesa. Também estudou e morou em Milão e, logo depois de se casar com o italiano Marco Granchi, veio para o Brasil.
Naturalizada brasileira “desde os tempos de Getúlio Vargas”, como dizia, teve sua vida de pacata dona-de-casa completamente mudada numa tarde de julho de 1947, quando viu, pela primeira vez, um disco voador metálico em formato de tampa de panela pairando sobre o sítio em que morava no município de Vassouras, interior do Rio de Janeiro. Desde então, se deu conta de que não teria paz enquanto não soubesse tudo a respeito do que acabara de presenciar.
Era o início da carreira desta que era a primeira ufóloga brasileira, respeitadíssima na área em todo o mundo e o retrato da garra, da força de vontade e do esforço, sem se importar com os riscos que recebeu e o cansaço que a acometia em suas investigações ufológicas.
Carregando um gravador de 15 kg numa mão e dezenas de outros apetrechos na outra, subia e descia morros do Rio de Janeiro atrás de UFOs e suas testemunhas. O resultado de tanta atividade garantiu a Irene o incontestável mérito de ser a grande pioneira da Ufologia Brasileira.
Poliglota, a nossa representante feminina foi aos poucos conquistando prestígio internacional. Desde os primórdios da Era Moderna dos Discos Voadores, conviveu com ufólogos como Joseph Allen Hynek, Jim e Coral Lorenzen, Gordon Creighton, Olavo Fontes e tantos outros com os quais manteve íntimo relacionamento e troca de informações, o que proporcionou boa soma de conhecimentos passados à Comunidade Ufológica Brasileira.
Na noite de 17 de agosto de 1968, ela retornava para sua casa, depois de ter visitado um amigo no bairro do Leblon, no Rio de Janeiro, quando avistou um UFO pela segunda vez. Era por volta das 21h15 e, enquanto esperava o ônibus, o objeto fez um show para ela. Toda sua família, incluindo o marido, foram testemunhas de avistamentos ufológicos ao longo de suas vidas.
Em 1978, numa parceria com a Hunos Editorial, lançou a revista OVNI Documento, o primeiro veículo brasileiro inteiramente dedicado à Ufologia, antecessora direta da UFO. A publicação, no entanto, durou apenas dois anos e teve somente oito edições. Foi devido a isso que surgiu a Revista UFO, tendo em Irene uma fonte de inspiração direta e constante.
A OVNI Documento tinha um corpo de colaboradores de peso, que incluía nomes como o citado Hynek, Silvio Lago, Flávio Pereira, Fernando Cleto Nunes Pereira, Mário Martins Ribeiro, Bob Pratt, Bill Chalker, Décio Estrela Maia, Húlvio Brant Aleixo e o general Alfredo Moacyr Uchôa. Entretanto, a união de esforços em prol da excelência não foi suficiente para driblar a falta de patrocínio, de recursos e as sucessivas crises econômicas, obrigando Irene a encerrar precocemente suas atividades. Hoje, as edições da OVNI Documento são avidamente disputadas em sebos e zelosamente preservadas por colecionadores.
Em 1988, a ufóloga dirigiu o documentário sonoro Contatos Imediatos ao Vivo, roteirizado por Luiz Carlos Maciel, narrado por Alfredo Canthé e editado pela empresa produtora Serapis Bey, do Rio de Janeiro. No lado A da fita cassete havia um pequeno histórico sobre os discos voadores, com depoimentos de ufólogos e testemunhas, incluindo um trecho citando o então secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) Kurt Waldheim.
Batalhadora incansável, Irene realizou investigações inumeráveis [Entre elas, a abdução do caminhoneiro Elias Seixas] e participou como conferencista em dezenas de eventos, simpósios e congressos. O Centro de Investigações Sobre a Natureza dos Extraterrestres (CISNE), fundado por ela em 1982, realizou mais de 12 concorridos encontros, entre eles aquele que foi, sem dúvida, o maior acontecimento de sua carreira e, talvez, um dos mais profissionais conclaves de pesquisadores já ocorridos no Brasil, o IV Congresso Internacional de Ufologia (CIUFO), realizado no Rio de Janeiro, de 03 a 06 de setembro de 1986. Entre seus convidados estavam os maiores nomes da Ufologia da época. O evento foi um marco e uma das grandes contribuições da ufóloga à “causa dos UFOs”, como costumava dizer.
Com mais de 80 anos, Irene ainda mantinha o mesmo ritmo de trabalho de quando começou a pesquisar os UFOs a fundo, em 1954. Seu apartamento na Rua das Palmeiras, no bairro Botafogo, repleto de livros sobre Ufologia em vários idiomas e de pastas bem arrumadas contendo recortes de jornais e revistas, ela estava longe de parar.
Em complemento ao material escrito, guardava ainda dezenas de depoimentos colhidos por ela de pessoas que mantiveram contatos com os seres extraterrestres ou que testemunharam de alguma forma a presença de discos voadores. “Esse material para mim vale ouro e foi graças a ele que escrevi um livro mais dirigido a estrangeiros”. Ela se referia à obra UFOs: Brazilian Cases Histories [Horus House Press, 1995], que relata casos ocorridos no país no período de 1950 a 1975. O livro é tradução de UFOs e Abduções no Brasil [Novo Milênio, 1992].
Nos últimos tempos e dentro da casa dos 90 anos de idade (havia completado 97 em novembro passado), Irene Granchi estava completamente inativa na Ufologia, acometida de grave
diabetes, com seqüelas visíveis. Sua memória estava imensamente prejudicada, assim como a visão e audição. A edição UFO 146 trouxe uma entrevista exclusiva concedida pela ufóloga há alguns anos a Cláudio Tsuyoshi Suenaga e Pablo Villarrubia Mauso, em que falou de maneira franca sobre o início de sua carreira, suas primeiras dificuldades, conquistas, os pesquisadores que conheceu, casos que estudou e a situação da Ufologia no Brasil e em todo o mundo. Para acessar, basta clicar aqui.
Tributo e homenagem à vida e obra de uma das maiores e mais importantes pioneiras da pesquisa ufológica mundial
A. J. Gevaerd [Edição UFO 32]
Estávamos dentro de um táxi preso num pequeno engarrafamento no Rio de Janeiro. O calor era forte naquele sábado de manhã, com ar poluído e clima abafado. Já estávamos atrasados pelo menos duas horas para um importante compromisso, por motivos de tráfego e outros afazeres.
O motorista do veículo, como quase todo taxista carioca, estava visivelmente nervoso. No meio de uma situação dessas, a ufóloga carioca e grande pioneira da Ufologia Brasileira, Irene Granchi, sentada no banco da frente, conseguiu achar tempo e disposição para perguntar ao motorista se ele já havia visto um disco voador. E com toda a seriedade.
“Como? O senhor nunca viu um UFO?”, disse ao homem completamente surpreso. “Pois o senhor fique sabendo que muitos motoristas de vários tipos de veículos já viram UFOs e alguns até já estiveram dentro deles!”, garantiu dona Irene ao motorista, cada vez mais surpreso. É desnecessário dizer que até eu fui pego de surpresa pelas indagações de dona Irene ao taxista.
Ainda presos no engarrafamento, nossa ufóloga-maior não teve dó e arrematou: “Pois saiba o senhor também que os UFOs existem de fato, não são boato e que há muitos anos nos visitam e nos raptam”. A conversa era quase surrealista, o que fez o pobre motorista, por fim, dar-se por vencido com a persistência, a segurança e a indisfarçável sobriedade de sua octogenária passageira.
E dona Irene finalizou a conversa com aquela sua instigante atitude que apenas quem a conhece sabe qual é. “Se o senhor tiver algum avistamento, por favor me ligue, pois eu pesquiso o assunto seriamente e gostaria de ouvi-lo”. Que dúvida poderia ter o homem de que aquela senhora de fato conhece e pesquisa o tal “assunto do disco voador” com toda a seriedade do mundo?
Algumas quadras a frente, quando já chegávamos ao nosso destino, dona Irene saiu do carro com alguma dificuldade e eu, que estava quieto no banco de trás, aguardei o homem fazer algum desses comentários cínicos ou jocosos para mim, sem dona Irene ouvir. Queria dar-lhe uma boa resposta! Mas sem gozação nem cinismo, o homem olhou-me e perguntou com a maior cerimonia e curiosidade: “Afinal, quem é esta senhora? É verdade mesmo tudo isso que ela falou?”.
Estufei o peito de satisfação e com uma pincelada de orgulho garanti ao homem. “Essa é a pessoa que mais entende sobre as visitas de seres de outros mundos ao nosso planeta. E tudo o que ela falou é uma grande realidade”. Dona Irene mais uma vez surpreendeu seus interlocutores, dando um fantástico recado e atraindo um novo adepto para a Ufologia. Mas muito mais que isso, deu uma grande lição.
Eu recebi ali, no banco de trás daquele táxi, gratuita e inesperadamente, mais uma aula de como “fazer Ufologia” e uma demonstração clara de que “fazer essa tal de Ufologia” é algo muito mais profundo e dinâmico do que sentar atrás de um computador e editar uma revista por 12 ou 14 horas diárias.
E foi sempre assim em todas as oportunidades que estive ao lado de dona Irene: lições e mais lições que, aos poucos, foram me permitindo compreender novos estágios da manifestação do Fenômeno UFO em nosso meio ambiente.
Incansável
Essa senhora que abordou o motorista incansavelmente é uma grande conhecida de todos nós, ufólogos brasileiros, pois “milita” em Ufologia há mais de 40 anos, ininterruptamente. Isso é mais tempo do que a média de idade da maioria dos ufólogos do país. Ela própria já viu UFOs várias vezes, embora não seja isso que dite sua determinação e obstinação como ufóloga.
Muitos dos leitores a conhecem de conferências e congressos pelo Brasil afora, embora a maioria a conheça de seu livro UFOs e Abduções no Brasil, seus inúmeros artigos em revistas (em especial a UFO) e através das centenas de entrevistas que deu à televisão. Mas confesso que, dentre tantos ufólogos que compartilham de seu agitado convívio, sinto-me um privilegiado, pois a conheço como um forte e próximo amigo há mais de 12 anos. Estive ao seu lado em incontáveis situações, em eventos no Brasil e exterior.
Desde que fui recebido em sua casa pela primeira vez, como um entusiasta e inexperiente ufólogo, passei a receber fantásticas lições com o convívio que entre nós se intensificava. Dormi no sofá de sua casa, fiz refeições à sua mesa, ajudei-a a subir e descer escadas, ganhei várias broncas, ouvi muitos conselhos etc, sempre recebendo (e dando) um carinho praticamente de filho.
Por isso sinto-me um privilegiado. Essa senhora, ensinou-me muito do que sei sobre os UFOs, mas não contando-me casos ou narrando-me suas pesquisas. O que aprendi com ela é muito superior a tudo isso: dona Irene ensinou-me a ter perseverança em meus objetivos dentro da Ufologia, ensinou-me a ser meticuloso, correto e honesto com meu trabalho. E ensinou-me a ver a posição dos ETs neste quebra-cabeças ufológico de forma totalmente diferente.
Foi ela quem deixou claro que os seres que nos visitam estão aqui para
algo muito maior, mais importante e imensamente mais profundo que meras visitas. Observando e admirando dona Irene nesses anos todos, confesso que sinto hoje uma responsabilidade enorme em fazer o que faço, como ufólogo e editor de UFO.
Uma responsabilidade em valorizar, honrar e dar continuidade a um trabalho tão bonito e importante que ela e alguns outros raros pioneiros desenvolveram. Não consigo sequer me imaginar decepcionando essa figura que dedicou sua vida à uma causa que eu também abraço. E essa responsabilidade não é só minha, mas de dezenas de “crias” que dona Irene têm espalhadas pelo Brasil e mundo afora.
Quando falo mundo afora, vem à minha mente mais uma fantástica situação que vivi ao seu lado, como dezenas de outras que jamais esquecerei. Tive o privilégio de viajar e participar com dona Irene de vários congressos nos EUA, e numa dessas oportunidades vivi momentos de grande orgulho quando fui convidado, durante o 3° Congresso Mundial de Las Vegas, em 1993, a apresentá-la ao público.
Como um dos diretores do evento, já havia apresentado vários ufólogos à platéia, lido seus currículos etc. Mas apresentar dona Irene foi algo especial, pois eu, uma “cria” dessa fantástica senhora, iria agora, num evento internacional de porte gigantesco, apresentá-la como minha colega de trabalho, embora isso de forma alguma me fizesse imaginar que estivesse ao seu nível.
Forte orgulho
A simples oportunidade de dirigir-me à uma platéia constituída pelos maiores estudiosos de Ufologia para apresentar alguém que tanto admiro e que todos ansiavam conhecer, foi um momento de verdadeira glória. Quero aqui testemunhar publicamente, unindo-me aos outros 11 brasileiros presentes naquela ocasião, que fizeram da delegação brasileira (chefiada por UFO) a maior comitiva estrangeira em Las Vegas, o quão calorosamente as pessoas da platéia receberam aquela senhora, incomparável lenda viva da Ufologia mundial.
Não havia quem não soubesse o que dona Irene Granchi representava para todos nós que hoje vemos a Ufologia chegar aonde chegou. Todos queriam – antes, durante e depois de sua palestra – conversar com ela, cumprimentá-la, tocá-la enfim, para sentirem, talvez por osmose, um pouco daquele entusiasmo contagiante em narrar, em seus plenos 81 anos de idade, os fantásticos e inúmeros casos que pesquisou pessoalmente.
Meu testemunho é de que conheci também no exterior pessoas que nunca viram dona Irene na vida, mas que leram seus incontáveis artigos em revistas dos quatro cantos do globo, como o boletim da antiga e hoje extinta Aerial Phenomena Research Organiza-tion (APRO), que ela representou soberbamente por mais de 20 anos.
Essas são pessoas que aprenderam – como nós, brasileiros – a admirá-la profundamente pelo que ela é e pelo que fez pela Ufologia. Quem está envolvido com esse espetacular campo de estudos sabe muito bem que muito do que sabemos hoje, muito do que é consagrado como uma irrevogável realidade ufológica, foi conhecido através da obra de dona Irene Granchi – obra essa que se confunde com sua própria vida.
Conheço inúmeras velhinhas nos seus 80 anos, todas comportadinhas como costumam ser essas senhoras octogenárias. Todas as que conheço passam seus dias de merecido repouso sentadas em suas cadeiras de balanço, defronte da TV, fazendo tricô ou crochê. Mas “nossa” dona Irene, igualmente octogenária, está bem longe de ser uma velhinha comum.
Nesta avançada idade, ainda não achou tempo para descansar, não conhece sábados e domingos (num desses dias, acompanhei seu almoço – já frio – feito em três etapas, enquanto atendia a inúmeros telefonemas). Do alto de sua idade, trocou a cadeira de balanço por uma escrivaninha, a televisão por uma máquina de escrever.
Em vez de tricô, essa senhora faz relatórios de suas pesquisas ufológicas – episódios em que sai empunhando um pesado gravador pelos subúrbios perigosos do Rio atrás de algum novo fato que ajude as gerações futuras e entender melhor os UFOs.
Obrigado dona Irene Granchi, em nome de todos os ufólogos e ufófilos do Brasil. Obrigado dona Irene, por dar esse fantástico exemplo para todos nós que praticamos Ufologia!
Irene Granchi: Uma merecida homenagem à nossa maior pioneira
A. J. Gevaerd [Edição UFO 144]
A Ufologia é uma disciplina que proporciona uma melhor visão de nosso futuro, através da compreensão de que nossos visitantes extraterrestres têm como alvo o avanço da espécie humana, o que poderá, um dia, resultar no aperfeiçoamento do conhecimento que temos de nossas origens e destino.
Mas ela também tem, obrigatoriamente, que ser praticada com olhos voltados para o passado, de onde retiramos os fatos que erigiram seus alicerces, que hoje usamos para sustentar conceitos há muito tempo estabelecidos. É do registro sistemático e organizado da casuística ufológica, que vem sendo feito há mais de 60 anos por nossos pioneiros, no Brasil e em todo o mundo, que aprendemos o modus operandi destes visitantes, que pouco mudou neste período.
O reconhecimento do trabalho destes valorosos personagens, que abriram as picadas na mata, por onde os ufólogos das gerações seguintes construíram as estradas pelas quais trafegam hoje, está na ordem do dia. Até porque, conhecer o que pensam estes pioneiros da presença alienígena na Terra, após tantos anos lidando com o assunto e acumulando uma experiência inquestionavelmente valiosa, é fundamental.
Em nosso país, foram vários os homens e algumas as mulheres que se lançaram na aventura de buscar, ainda nos anos 50 e 60, respostas para o Fenômeno UFO, que se mostrava incipiente na época, era quase desconhecido da população e considerado algo mítico.
Dentre estes pioneiros, destaque de primeiríssima grandeza deve ser dado, com toda justiça, à professora Irene Granchi, com quem a Ufologia Brasileira tem uma dívida impagável.
Dona Irene é aquela pessoa que sofreu todos os tipos de preconceitos, como mulher e como ufóloga, por iniciar sua dedicação ao tema há seis décadas. Na primeira categoria, porque naquela época não tinha a liberdade de exercer atividades públicas com desprendimento, e ainda assim o fazia. E, na segunda, em razão de que, mesmo ainda quase totalmente desconhecidos, os discos voadores já eram estigmatizados como algo pertencente ao reino da fantasia.
Tratar do assunto era atividade reservada às mentes alucinadas, desequilibradas ou, para os contemporâneos menos críticos, uma grande perda de tempo. Mas nada disso impediu dona Irene de fazer aquilo pelo que se apaixonou quando ainda era muito jovem, a fascinante pesquisa do tema, após ter tido ela própria um contato imediato em Vassouras, no interior do Rio de Janeiro.
Foi o que
lhe bastou para decidir que sua vida, a partir daquele instante, nunca mais seria dissociada da Ufologia, causa que abraçou com honestidade, dedicação e obstinação. E mais, com a noção de que a disciplina não é uma atividade única e estanque, de mera pesquisa e reconhecimento da ação de nossos visitantes, mas sim que agrega, também obrigatoriamente, a contrapartida disso, ou seja, o compartilhamento com outras pessoas dos resultados que se obtém praticando-a.
“Ufologia se faz coletivamente. Ninguém, sozinho, compreenderá o que querem nossos visitantes. Tem que haver a troca, o reparte e a discussão do resultado de nosso trabalho”, dizia-nos esta senhora nos anos 80, quando a conhecemos, entusiasmados estudiosos que mal atingiram a maioridade, ali, deslumbrados diante de sua inspiradora. Três décadas depois, a verdade destas palavras se confirma em qualquer ambiente em que a Ufologia seja praticada, e é fato inquestionável para qualquer pessoa que abrace a causa, como ela o fez tantos anos antes de nós.
Paciência e dedicação
Reconhecer os ensinamentos de dona Irene é uma deliciosa obrigação de todos os ufólogos verdadeiros, e testemunhar, com profunda gratidão, sua total entrega às gerações seguintes, repartindo com eles sua experiência através do paciente ensino do que já havia aprendido sobre nossos visitantes, é um hábito que devemos cultivar.
A Revista UFO foi concebida baseada nestes princípios, em 1984, e é até hoje inspirada no trabalho de dona Irene. Muitos outros ufólogos brasileiros também foram seus alunos, discípulos ou admiradores, vários deles pertencentes à Equipe UFO, que tiveram a sorte e o privilégio de gozar de sua confiança, de compartilhar sua companhia e de sentir sua dedicação ao tema.
Ela fez questão de nos garantir não apenas o conhecimento da Ufologia, mas os fundamentos de caráter e a conduta que devem guiar o trabalho de qualquer um que pretenda atuar na área. Dona Irene nos deu tudo isso, e é difícil saber o que mais ajudou em nossas trajetórias, se o fabuloso conhecimento que repartia constantemente conosco ou as lições de ética e moral com as quais devíamos nos pautar.
Em 09 de junho de 2008, logo após um evento ufológico ocorrido no Rio de Janeiro, este autor teve a oportunidade de reencontrar dona Irene em seu apartamento em Copacabana. Hoje ufólogos adultos e tarimbados, alguns pais e todos de cabelos brancos, após quase três décadas de trabalho pela Ufologia, sempre espelhados e enlevados por dona Irene, vivemos fortes emoções ao lado de nossa inspiradora.
A grande matriarca da Ufologia Brasileira e uma das pioneiras não só desta, mas também da Ufologia Mundial, reconhecida internacionalmente por suas enormes contribuições ao estabelecimento desta disciplina, mesmo seriamente debilitada, nos recebeu com carinho para lhe rendermos nossas homenagens.
Um busca em plenitude
É difícil descrever quão emocionante foi reencontrar dona Irene, abraçar-lhe, beijar-lhe a face e ter, durante aqueles instantes, um filme passando em nossas mentes, um revival de tudo o que já fizemos motivados por ela ou ao seu lado nas últimas três décadas. Ela nos considerava filhos, e nós a considerávamos uma grande e amorosa mãe, como ainda o fazemos.
Foi emocionante e gratificante ter passado estes instantes com ela, e eles nos renovaram de maneira marcante o agradecimento e admiração que sentimos por esta notável mulher. Além disso, prova absoluta de sua inspiração sobre nós, o reencontro ainda nos ensinou mais um fato de grande valor – que a Ufologia, uma busca constante pelas coisas mais íntimas do ser e da espécie humana, que naturalmente envolve grandes e reveladoras transformações, também é um processo obrigatoriamente permeado de muita emoção, pelo menos para aqueles que amam de verdade esta busca e a fazem em plenitude.