Outro cenário possível envolve descobrirmos que o contato com extraterrestres cria um leve incômodo ou requer mais esforço do que nós gostaríamos de despender. O filme Distrito 9 [2009] destaca o cenário de contato no qual descobrimos uma equipe de extraterrestres aflita e que requer assistência humana para sobreviver. Colocados em um campo de refugiados temporário, os alienígenas de Distrito 9 apresentam uma vasta gama de temperamentos, mas sua presença como um todo irrita os humanos porque o campo de refugiados aparenta ser algo permanente.
Similarmente, nós poderíamos descobrir, por meio de mensagens remotas, que há civilizações que necessitam de nossa ajuda, mas que darão pouco em troca, de forma que o contato eventualmente começará a sugar recursos humanos. Sob circunstâncias diferentes, talvez extraterrestres façam contato com a Terra para nos dar as boas-vindas a um provável Clube Galáctico, mas somente após completarmos uma série de tarefas burocráticas. Esses povos certamente serão tecnologicamente mais avançados do que somos hoje, e então é plausível que os requerimentos para entrar em um Clube Galáctico estejam além de nossas habilidades. Nesses cenários, o contato beneficiaria a humanidade ao confirmar a presença de vida em outros lugares — mas as consequências seriam suficientemente destrutivas, irritantes ou complicadas para a civilização humana. O cenário final envolve desentendimentos internos entre nós, humanos, sobre o contato ter ou não ter ocorrido. As condições mais simples para isso poderiam ocorrer se recebêssemos uma mensagem que não possa ser decodificada inequivocamente.
Nenhum sinal do Projeto SETI [O programa de busca por vida extraterrestre inteligente] foi identificado como sendo de origem externa à Terra, e se nós nos depararmos com uma verdadeira transmissão alienígena poderia haver um longo e tedioso processo para demonstrar sua autenticidade. Modos menos prováveis desta forma de contato foram explorados em filmes como Contato [1997] e Kpax: O Caminho da Luz [2001], em que o contato só é percebido por alguns humanos e dispensado pelo resto. Se nossa detecção de contato carecer de um sinal óbvio e inequívoco, então humanos diferentes, incluindo pesquisadores, poderiam chegar a diferentes conclusões sobre a questão da detecção. Quaisquer benefícios da mera detecção poderiam ser desequilibrados pelo turbilhão dos desentendimentos.
Prejuízo intencional a nós
Os últimos cenários que consideramos são aqueles em que o contato é prejudicial à humanidade. Esse é um grupo particularmente importante de cenários por causa dos grandes cuidados que eles impõem a nossos esforços no SETI. Esses panoramas também receberam consideração extensa nos reinos da ficção e da não ficção. A possibilidade de extraterrestres causarem prejuízos não intencionais é discutida a seguir. Nos cenários de dano intencional, eles decidem que querem nos causar danos e prosseguem com seu intento. Nos casos dê danos não intencionais, eles não querem nos prejudicar, mas inadvertidamente nos causam problemas mesmo assim. Vemos dois tipos de cenários em que outras inteligências cósmicas podem nos prejudicar intencionalmente. O primeiro envolve seres hostis e egoístas que nos ataquem para maximizar seu próprio sucesso. Esse panorama sugere uma guerra de mundos. O segundo cenário envolve seres que não são de forma alguma egoístas, mas que seguem algum tipo de ética universalista. Extraterrestres podem nos atacar não por egoísmo, mas por um desejo universalista de fazer da galáxia um lugar melhor.
Mas existiriam extraterrestres egoístas? É possível e uma civilização egoísta é aquela que coloca valor intrínseco apenas em propriedades dela mesma: sua vida, seu bem-estar etc. A ideia de uma civilização egoísta é bem proeminente em discussões sobre o assunto. Por exemplo, o geógrafo Jared Diamond, com base em seu conhecimento em encontros entre diferentes populações inteligentes na Terra, acredita que os astrônomos são sempre otimistas demais sobre encontros com extraterrestres. Diz Diamond: “Os astrônomos e outros esperam que os extraterrestres, maravilhados em descobrir outros seres inteligentes, sentar-se-ão para um bate-papo amigável. Talvez eles estejam certos, esse é o melhor cenário”.
Mas é ele mesmo que nos adverte das consequências: “Já uma projeção menos agradável nos diz que os extraterrestres podem se comportar do mesmo jeito que nós, seres inteligentes, nos comportamos quando encontramos outros seres inteligentes previamente desconhecidos na Terra, como humanos de aparência não familiar ou chipanzés e gorilas. Assim como fizemos àqueles seres, ETs podem começar a nos matar, infectar, conquistar, dissecar, remover ou escravizar, guardar-nos como espécimes para seus museus ou colocar nossos crânios em conserva e nos usar para pesquisas médicas. Minha visão é a de que aqueles astrônomos, agora se preparando de novo para lançar sinais de rádio para extraterrestres, são ignorantes, até perigosos”.
Potenciais perigos do encontro
Ainda que Diamond esteja correto em apontar que muitos astrônomos negligenciam os potenciais perigos de um encontro com extraterrestres, seria um erro partir do pressuposto de que eles são todos ignorantes sobre esse aspecto. Por exemplo, o astrônomo vencedor do Prêmio Nobel, Sir Martin Ryle, se opõe a esforços ativos para se comunicar com alienígenas justamente pela preocupação de um ataque deles contra nós — até Carl Sagan, sempre bem otimista sobre encontros com extraterrestres, expressou preocupações sobre os riscos do contato.
A preocupação central é de que os extraterrestres descobririam nossa presença e rapidamente viajariam para a Terra para nos comer ou escravizar. Predação é comum nas formas de vida da Terra, porque pode ser mais eficiente predar outros do que usar autotrofia para conseguir energia e a fixação de carbono e de outros nutrientes. Isso poderia ser uma preocupação menor se a qualidade de orgânicos na Terra for pobremente adequada como fonte de comida universal. Além disso, uma sociedade avançada, capaz de realizar viagens interestelares, pode ser menos propensa a transformar humanos em fonte de comida ou trabalho, porque ela já terá resolvido esses problemas por meio de uma combinação de trabalho mecânico, s&iacut
e;ntese artificial e conservação. De qualquer forma, outros motivos egoístas podem levar uma civilização alienígena a nos prejudicar, como espalhar suas crenças e ideologias por meio do evangelismo, como feito pela humanidade na difusão do Cristianismo e do Islã, ou seu desejo de usar humanos para fins de entretenimento, da mesma forma que fazemos com alguns animais.
Os cientistas I. S. Shklovskii e o citado Sagan apontaram, em uma discussão, que “os extraterrestres podem desejar ser a única força galáctica e eliminarão outras formas de vida quando elas começarem a ficar em seu caminho. Similarmente, eles podem simplesmente estar interessados em nos usar como meio para o crescimento de sua economia. Em um nível individual, eles podem não estar interessados em nos matar, mas em nos incorporar à sua civilização para que possam vender-nos seus produtos, manter-nos como seus animais de estimação ou fazer com que mineremos materiais crus para eles”.
Solução da sustentabilidade
Aqui, novamente, é útil considerar possíveis resoluções para o Paradoxo de Fermi, citado em detalhes na primeira parte deste artigo [Edição UFO 227], particularmente a Solução da Sustentabilidade. É improvável que a humanidade encontre uma civilização exponencialmente expansiva, uma vez que possivelmente já a teríamos detectado caso uma expansão exponencial pudesse ser mantida em escala galáctica — portanto, civilizações assim provavelmente não existam ou então não têm a capacidade de se expandir através da galáxia.
Uma exceção a isso seria uma civilização que cresceu exponencialmente e ruiu no passado, mas não sucumbiu ao completo colapso ecológico. Uma sociedade assim poderia se recuperar e escolher uma vez mais adotar um padrão de desenvolvimento de expansão exponencial. Se essa espécie existe hoje, então ela poderia ser extremamente prejudicial, mesmo que seja apenas mais avançada do que nós, porque se continuasse com sua trajetória de desenvolvimento e rapidamente colonizasse a galáxia, provavelmente consumiria nossos recursos antes que seu colapso ocorresse.
Como discutido acima, nós temos razões para acreditar que uma civilização sustentável tenha menos chance de ser prejudicial. Contudo, continua totalmente possível que ela seja sustentável e também prejudicial. Uma espécie desse tipo poderia se expandir rapidamente por meio de uma frente de colonização. Diferentemente da civilização sustentável anteriormente descrita, uma espécie expansiva seria sustentável, mas ainda teria desejos de consumir todos os recursos que pudesse. Esse tipo de civilização consumiria todos os recursos da Terra e destruiria a humanidade, caso ficássemos em seu caminho.
Extraterrestres universalistas
Pode parecer improvável que uma civilização universalista nos prejudicasse intencionalmente — porque espécies assim colocam valor inerente em quaisquer traços que sejam importantes para ela, independentemente da civilização a qual se relacione o valor. Em outras palavras, uma civilização universalista não estaria enviesada contra nós. Na humanidade, universalismo é comumente associado à paz e à cooperação, não ao prejuízo e destruição. Mas isso é porque as populações humanas, no geral, são todas iguais. Se, por exemplo, nós procurarmos maximizar a felicidade total, então nós teremos êxito em evitar conflitos na humanidade, pois conflitos geralmente reduzem a felicidade para quase todos os humanos.
Pode não ser esse o caso para os extraterrestres. Apenas porque uma civilização tem ética universalista não significa que ela jamais procurará nos prejudicar. Os extraterrestres podem ser bem diferentes de nós e podem concluir que nos prejudicar ajudaria a maximizar o que quer que eles valorizem intrinsecamente. Outro exemplo, se uma civilização alienígena coloca valor intrínseco em vidas, então talvez ela possa nos destruir e usar nossos recursos mais eficientemente para ajudar outras vidas.
Outras formas de valor intrínseco também podem levar uma espécie universalista a nos prejudicar ou destruir, se ela achar que produzirá mais valor sem nossa presença do que conosco. O novelista Douglas Adams captura esse cenário vividamente no livro O Guia do Mochileiro das Galáxias [Sextante, 2009], em que uma civilização coloca valor intrínseco em infraestrutura e destrói a Terra para garantir o caminho para uma passagem hiperespacial. No coração desses cenários está a possibilidade de que o valor intrínseco seja mais eficientemente produzido com nossa ausência.
Os astrônomos e outros estudiosos esperam que os extraterrestres, maravilhados em descobrir outros seres inteligentes, ao chegarem aqui, sentar-se-ão para um bate papo amigável conosco. Talvez eles estejam certos, esse seria o melhor cenário
Um caso interessante e importante de ética universalista nesse contexto ocorre quando o valor intrínseco é a própria civilização. Povos que apoiam esse padrão ético buscariam maximizar o número total de civilizações, a diversidade de civilizações ou alguma outra propriedade das civilizações. Se todas as outras questões se mantiverem iguais, essa espécie desejaria especificamente que nossa civilização permanecesse intacta.
Mas todas as outras questões podem não se manter iguais. É plausível que a espécie possa tentar nos prejudicar ou até nos destruir para maximizar o número e a diversidade de civilizações. Isso poderia ocorrer se nossos recursos pudessem ser usados para gerar ou reter outras civilizações mais eficientemente, embora essa possibilidade pareça muito remota considerando-se o quão eficientemente ligada ao ambiente está a humanidade. Alternativamente, uma espécie poderia buscar nosso prejuízo se ela acreditasse que somos uma ameaça para outras civilizações.
O pensamento de que a humanidade seja uma ameaça a outras civilizações pode parecer implausível dada à possibilidade de nossa inferioridade tecnológica. Contudo, essa inferioridade pode ser um fenômeno temporário. Talvez outras espécies observem nossa rápida e destrutiva expansão na Terra e fiquem preocupadas com nossa trajetória civilizacional. Considerando a Solução da Sustentabilidade para o Paradoxo de Fermi, talvez os extraterrestres acreditem que uma expansão rápida é ameaçadora em escala galáctica.
Ataque preventivo
Civilizações rapidamente expansivas podem ter uma tendência a destruir outras no processo, da mesma forma que a humanidade já destruiu muitas espécies na Terra. Povos que coloquem valor intrínseco nas civili
zações podem idealmente desejar que a nossa mude seu comportamento, de modo que possamos sobreviver com todas as demais. Mas, se eles duvidarem que nosso curso possa ser mudado, então eles podem nos destruir para proteger outras espécies. Um ataque preventivo seria particularmente provável nos estágios iniciais de nossa expansão, porque uma civilização pode se tornar crescentemente difícil de destruir conforme continue a se expandir.
A humanidade pode estar, neste exato momento, entrando em um período em que sua expansão civilizacional rápida possa ser detectada por extraterrestres, nosso novo alcance está mudando a composição da atmosfera da Terra, o que por sua vez muda a assinatura espectral do planeta — ainda que seja difícil estimar a possibilidade desse cenário, isso deveria, no mínimo, nos fazer reavaliar as nossas tendências expansivas. Vale apontar que há alguns precedentes para o universalismo prejudicial na própria humanidade. Esse precedente é mais aparente na ética universalista, que coloca valor intrínseco em ecossistemas. A civilização humana afeta ecossistemas de maneira tão forte que alguns ecologistas frequentemente se referem ao atual período da história da Terra como Antropoceno [Era do homem].
Se o objetivo de alguém é maximizar o florescimento do ecossistema, então talvez fosse melhor se a humanidade não existisse ou se existisse de uma forma significativamente reduzida. A possibilidade de um contato prejudicial com outras inteligências cósmicas nos sugere que devemos ter certo cuidado com as mensagens que enviamos para o espaço. Dado que nós já conseguimos alterar nosso ambiente em modos que podem ser vistos como antiéticos por espécies universalistas, pode ser prudente evitar enviar qualquer mensagem que mostre evidências de nosso impacto ambiental negativo. A atual composição química da atmosfera da Terra pode ser uma escolha ruim para uma mensagem, porque mostraria a rápida acumulação de dióxido de carbono proveniente de atividade humana.
Perigo físico
Da mesma forma, qualquer mensagem que indique uma perda geral de biodiversidade ou ritmos rápidos de expansão pode ser perigosa se recebida por povos universalistas. Por outro lado, espécies avançadas podem já saber sobre nosso rápido impacto ambiental ouvindo aos sinais eletromagnéticos vazados ou observando mudanças em nossa assinatura espectral.
O contato físico direto com artefatos ou seres extraterrestres pode trazer prejuízos não intencionais à humanidade. Por exemplo, por meio da transmissão de doenças. Esse cenário é inspirado nas várias vezes em que humanos e animais sofreram gravemente por doenças vindas de outras regiões do planeta — essas doenças se espalharam por meio de aviões e navios e quanto mais fácil é o transporte através do planeta, maior é o perigo de que doenças regionais se tornem globais. Enfermidades introduzidas têm sido extremamente potentes, porque a população que as recebe não teve exposição anterior a elas e, portanto, não tem imunidade desenvolvida. Se extraterrestres introduzissem, ainda que involuntariamente, alguma doença entre nós, o resultado seria devastador.
É importante apontar que uma doença trazida por alienígenas poderia nos prejudicar sem nos infectar. Isso ocorreria se a doença infectasse outros organismos de nosso interesse, como plantações ou animais de cativeiro. Uma infecção não humana teria menos chance de destruir a humanidade, mas nos prejudicaria devastando algumas porções potencialmente significativas da nossa alimentação. Em um caso extremo, poderia causar extinções em massa de múltiplas espécies na Terra, mesmo que os humanos continuassem não infectados.
Entretanto, há algumas possibilidades de protegermos a humanidade de doenças trazidas por extraterrestres. A opção mais direta é simplesmente evitar o contato entre a biosfera alienígena e a biosfera da Terra. Muitos pedidos por tal prevenção já foram realizados, geralmente sob a justificativa da proteção planetária — se nós nunca tivermos contato com uma biosfera extraterrestre, então não poderemos ser infectados por suas doenças. Esse fato teria implicações, também, na maneira como lidamos com as comunicações extraplanetárias, por exemplo, se nossas comunicações encorajassem o contato. Também tem reflexos em nossa exploração espacial. Por exemplo, se nós mandarmos sondas em busca de vida alienígena, enviando as sondas de volta à Terra se vida for encontrada.
Nossa experiência com doenças novas — como as novas gripes que surgem o tempo todo — sugere que a doença se espalha em um tempo muito menor do que aquele que levamos para encontrar sua cura. A difusão de doenças alienígenas poderia ser ainda mais rápida e a cura ainda mais difícil de ser desenvolvida. Portanto, qualquer vantagem que possamos ter para encontrar a cura poderia ser altamente valiosa.
Infectando a humanidade
Um caminho a ser tomado seria a troca de informações, remotamente recebidas, sobre a biologia da espécie com quem estejamos conversando. Se conhecermos a biologia e a biosfera dos seres antes do contato físico, teremos como tomar medidas preventivas — e nossos interlocutores, inclusive, poderiam nos ajudar com isso. A possibilidade de que o contato físico possa vir a infectar a humanidade também sugere que nós, talvez, devamos evitar transmitir qualquer informação específica sobre nossa biologia. Espécies mal-intencionadas podem usar esse conhecimento para explorar nossos sistemas imunológicos, criando uma arma que afete apenas aos humanos antes de chegarem para nos destruir.
Doenças, entretanto, não são o único perigo físico que poderemos encarar — um risco biológico similar envolve espécies invasivas. E aqui não nos referíamos a vírus e bactérias, mas a outros tipos de espécies micro-orgânicas que, ao se instalarem em nossa biosfera podem, após algum tempo, começar a modificá-la. Já falamos sobre doenças que poderiam matar espécies animais e vegetais que nos servem de sustento, mas agora nos referimos a organismos que possam modificar enzimas e vitaminas de animais e vegetais, inviabilizando seu consumo. Algumas espécies invasivas não são doenças por si só, mas prejudiciais de outras formas.
Também existe o perigo físico n&atild
e;o biológico, ou seja, um prejuízo mecânico não intencional. Por exemplo, extraterrestres podem, acidentalmente, nos esmagar ao tentarem algum tipo de aproximação unilateral. Esse cenário é paralelo ao que acontece na Terra quando humanos inadvertidamente destroem os ecossistemas de algumas espécies, levando-as à extinção. A humanidade, em geral, preferiria não causar a destruição de espécies, mas nós sempre priorizamos outras questões, como expansão econômica, por exemplo. De fato, em muitos casos, nós talvez nem saibamos que uma espécie em risco estava presente naquele lugar até ser tarde demais. Uma civilização alienígena poderia, inadvertidamente, devastar a humanidade sob condições análogas.
Ato de incompetência
Em uma classe similar de cenários, uma civilização poderia liberar algum tipo de força prejudicial na galáxia, por meio de uma falha de equipamento ou de um ato de incompetência, muito possivelmente também se prejudicando no processo. Um exemplo pior seria uma civilização extraterrestre benevolente liberar por acidente o equivalente terrestre a uma inteligência artificial não amistosa. Estando fora do controle de seus criadores, ela provavelmente destruiria a humanidade ao tentar cumprir qualquer que fosse a função objetiva que devesse cumprir.
Em outro exemplo, civilizações que exploram a galáxia usando sondas automatizadas autorreplicáveis — também conhecidas como Sondas von Neumann — poderiam, inadvertidamente, liberar uma onda de colonização que rapidamente se espalhasse pelo universo e destruísse outras civilizações. Um cenário assim surge da fabricação defeituosa de sondas automáticas ou da intenção maliciosa de sondas artificialmente inteligentes. O filósofo suíço e professor da Universidade de Oxford Nick Bostrom sugere que resultados indesejáveis poderiam ser o produto de dinâmicas evolucionárias, dentro das quais os indesejáveis são os fortes que sobreviveram a pressões evolucionárias.
Finalmente, é possível que uma civilização pudesse tornar algumas partes da galáxia inabitáveis por meio de um acidente em um experimento físico, assim como há preocupações de que certos experimentos físicos humanos com aceleradores de partículas possam ser acidentalmente destrutivos — quaisquer desses cenários envolveriam uma civilização prejudicando a humanidade e provavelmente a ela mesma.
Perigo informacional
Mesmo que não tenhamos contato físico com os extraterrestres ainda é possível que eles acabem nos prejudicando. Um transmissor alienígena malicioso poderia, por exemplo, enviar uma mensagem contendo informações prejudiciais que danificassem a tecnologia humana, algo análogo a um vírus de computador. Também poderiam nos influenciar a adotar uma linha de ação aparentemente benigna, mas fundamentalmente destrutiva, como a construção de um dispositivo perigoso. Em outro exemplo, a civilização alienígena poderia nos enviar informações sobre sua biologia, talvez na esperança de que a humanidade pudesse usar as informações para se proteger contra doenças extraterrestres ou espécies invasivas. Contudo, algo assim poderia se voltar contra a espécie humana, se nós usarmos a informação para criar uma doença, espécie invasiva ou outro perigo. O perigo poderia ser propositalmente criado por nós ou poderia ser não intencional, por não sabermos lidar adequadamente com a informação recebida. A possibilidade de um perigo informacional sugere que pelo menos algum cuidado deve ser tomado em esforços para detectar e analisar sinais eletromagnéticos enviados por ETs.
A possibilidade de um contato prejudicial com outras inteligências cósmicas nos sugere que devemos ter certo cuidado com as mensagens que enviamos para o espaço, especialmente através de programas como o Projeto SETI, que visa ouvir as estrelas
Há, ainda, um cenário de perigo informacional para se considerar. Nele, o contato com extraterrestre agiria como uma força desmoralizadora para a humanidade, com fortes consequências negativas — na história humana, contato entre sociedades modernas e culturas da Idade da Pedra sempre levam ao fim da sociedade mais primitiva. Da mesma forma, no caso de contato com alienígenas, a espécie humana pode ser levada a um colapso cultural global ao ser confrontada com a tecnologia, as crenças e o estilo de vida dos ETs. Mesmo que a civilização visitante seja amigável conosco e nos dê a escolha de aceitar ou rejeitar seu conhecimento, as vastas diferenças entre nossas respectivas sociedades podem forçar a mais primitiva a um estado desmoralizador de colapso social. Por essa razão, se os alienígenas já sabem de nossa presença e querem preservar a integridade de nossa civilização, eles podem ter escolhido revelar sua presença lenta e gradualmente, para evitar uma resposta calamitosa.
Recomendações sobre contatos
O resultado do contato com extraterrestres depende de muitos fatores que não podem ser totalmente conhecidos no momento. A análise de cenário apresentada neste estudo serve como um meio para treinar nossas mentes, no sentido de reconhecer padrões e analisar resultados antes que tal encontro ocorra. Contato de verdade pode não seguir precisamente os cenários aqui considerados, mas qualquer análise que nos ajude a nos prepararmos para o contato aumentará a chance de termos um resultado positivo.
Nossa apreciação sugere algumas recomendações práticas imediatas para a humanidade. Uma delas aponta que as mensagens enviadas para o espaço devam ser escritas cuidadosamente. Mensagens anteriores incluíram detalhes da biologia humana, os números de um a 10 — nosso sistema decimal é, provavelmente, derivado do número de dedos em nossas mãos — e a forma e estrutura da molécula de DNA. Contudo, detalhes sobre nossa biologia, embora aparentemente inofensivos, podem vir a nos causar prejuízos, como analisado ao longo deste texto.
Outra recomendação aponta que a humanidade deva se precaver sobre dar sinais de que é uma civilização rapidamente expansiva — isso impediria que extraterrestres ficassem propensos a tentar um ataque preventivo contra nós, de modo a evitar que viremos uma ameaça a outros na galáxia. Assim, também, uma espécie universalista que valorize ecossistemas pode observar as tendências ecologicamente destrutivas da humanidade e nos varrer do mapa para preservar o sistema da Terra como um todo.
Esses panoramas nos dão uma razão para limitar nosso crescimento e reduzir nosso impacto em ecossistemas globais. Seria particularmente importante que limitássemos nossas emissões de gases estufa, uma vez que a composição atmosférica pode ser observada a partir de outros planetas. Nós reconhecemos que a busca pela redução de emissões de CO2, assim como outros projetos ecológicos, podem ter justificativas muito mais fortes do que aquelas que derivam de um encontro com extraterrestres, mas isso não faz com que os aqui descritos cenários sejam insignificantes ou irrelevantes.
Uma recomendação final é a de que as preparações para um encontro sejam elas por meio de mensagens, do Projeto SETI, da exploração espacial humana ou qualquer outra forma, devem considerar a totalidade das possibilidades de cenários de contato direto. De fato, talvez a conclusão central da análise aqui apresentada seja que o encontro com extraterrestres pode acontecer de várias formas possíveis. É inapropriado e inadequado assumir cegamente que há um cenário específico resultante do contato — até que ele ocorra, nós simplesmente não sabemos as consequências. Dada à esta incerteza, a análise abrangente de cenários apresentada é um passo importante para nos ajudar a pensar e a nos preparar para um possível contato.
A importância deste trabalho
Apesar de seus méritos, nossa análise da situação continua sendo fundamentalmente limitada em muitos sentidos importantes. Como é comum em análises de cenários em geral, nós não oferecemos nenhum esquema de quantificação para as probabilidades de cenários específicos. Nós também não quantificamos a magnitude dos impactos — benéficos ou prejudiciais — de panoramas específicos. O resultado disso é que nós somos incapazes de produzir uma análise cumulativa dos riscos e recompensas do contato ou das tentativas de fazê-lo. Uma análise deste tipo de riscos seria de tremendo valor para fins de tomadas de decisão, contudo, o esforço requerido para tal está muito além do escopo daquilo que podemos realizar em um simples estudo e deve ser deixado para trabalhos futuros.
Um embargo adicional a este trabalho deriva dos limites de nosso conhecimento. Como não temos nenhum dado empírico sobre civilizações alienígenas, nós tivemos que extrapolar as informações disponíveis, incluindo nosso conhecimento sobre o universo observável e sobre os seres humanos. Porém, precisamos ter em mente que nossas observações são inevitavelmente confinadas à experiência humana e que nossas extrapolações, não importando o quão generalizadas, podem ainda conter parcialidades antropocêntricas implícitas.
Mesmo que o contato com extraterrestres nunca ocorra, nossa análise de cenário ainda age como uma guia para uma série de trajetórias futuras para a civilização humana. Nosso pensamento sobre a natureza dos ETs é um exercício de imaginação sobre os meios pelos quais os futuros humanos poderiam viver, sob diferentes circunstâncias ou em distintos ambientes. Esta análise, portanto, ajuda a lançar uma luz sobre as implicações de certas decisões como, por exemplo, o modo de expansão ou a linha ética de trabalho de uma civilização inteligente. Ela pode nos ajudar a distinguir entre trajetórias desejáveis e indesejáveis para a nossa espécie. Conforme continuemos a busca por extraterrestres no futuro, talvez nosso pensamento sobre os diferentes modos de contato ajude a civilização humana a evitar a ruína e a alcançar sua sobrevivência em longo prazo.