O objeto interestelar 3I/ATLAS continua surpreendendo a comunidade científica. Após sua passagem mais próxima do Sol, em novembro de 2025, novas imagens revelaram uma intensa atividade: jatos de material se estendendo por milhões de quilômetros. No entanto, uma nova análise conduzida pelo renomado astrofísico Avi Loeb, da Universidade de Harvard, coloca em xeque a hipótese de que se trate de um cometa natural.
Segundo o estudo, se os jatos forem realmente resultado da sublimação de gases, como ocorre nos cometas, o 3I/ATLAS estaria perdendo cerca de 5 bilhões de toneladas de massa por mês. Esse valor, no entanto, é incompatível com a energia solar que o objeto recebe e com o tamanho estimado de sua superfície.

A conta não fecha: área e massa não batem com um cometa comum
Loeb explica que, para gerar tamanha perda de massa, o objeto precisaria ter uma área superficial maior que 1.600 km², equivalente a um diâmetro de 23 quilômetros. Mas observações diretas do Telescópio Espacial Hubble, feitas em julho de 2025, mostram que o 3I/ATLAS possui no máximo 5,6 quilômetros de diâmetro.
Em outras palavras, ele teria que ser dezesseis vezes maior do que realmente é para que os jatos observados fizessem sentido dentro de um modelo cometário. Esse descompasso entre os dados observacionais e os cálculos físicos sugere que a explicação convencional pode estar errada.

A hipótese da explosão cometária
Uma possibilidade é que o 3I/ATLAS tenha se desintegrado parcialmente ao se aproximar do Sol. O aumento repentino de atividade — dez mil vezes mais intenso que o observado em agosto de 2025 — indica uma possível explosão interna ou colapso estrutural do núcleo.
Caso isso tenha ocorrido, fragmentos do corpo original poderiam estar liberando enormes quantidades de gás e poeira, criando a aparência de jatos colossais. Esse cenário lembraria o que aconteceu com o famoso cometa Shoemaker–Levy 9, que se partiu antes de colidir com Júpiter em 1994.
O grande teste: 19 de dezembro de 2025
O momento decisivo chegará em 19 de dezembro de 2025, quando o 3I/ATLAS fará seu máximo de aproximação à Terra. Nessa data, telescópios terrestres e espaciais, incluindo o Hubble e o James Webb, poderão determinar se o objeto sobreviveu intacto à passagem pelo Sol.
“Se o 3I/ATLAS permanecer intacto e continuar como um único corpo, isso significará que não é um cometa natural”, afirmou Avi Loeb. “Teremos de considerar que estamos diante de algo diferente, talvez até de origem artificial.”
O cientista sugere que propulsão tecnológica, química, iônica ou de outro tipo, poderia produzir jatos semelhantes com uma perda de massa muito menor. Nesse caso, estaríamos diante de uma tecnologia interestelar, talvez uma sonda ou artefato enviado por outra civilização.

Um enigma que desafia estatísticas cósmicas
Além de seu comportamento anômalo, o 3I/ATLAS já apresentava características estatisticamente improváveis: ele é cerca de um milhão de vezes mais massivo que ‘Oumuamua, o primeiro objeto interestelar detectado em 2017. Sua órbita e magnitude tornam sua existência natural altamente improvável, com probabilidade estimada em 1 em 100 milhões.
Um mistério em aberto
Enquanto o mistério não se resolve, os astrônomos acompanham atentamente o 3I/ATLAS, cujo destino poderá redefinir nossa compreensão sobre o que cruza os confins do Sistema Solar.
Se o corpo se despedaçar nas próximas semanas, teremos mais um capítulo comum da história dos cometas. Mas se resistir intacto, a humanidade poderá estar diante de um novo enigma cósmico; e, quem sabe, de um artefato interestelar inteligente.
A opinião de um astrônomo brasileiro
Segundo o astrônomo do Observatório Nacional (ON), Dr. Jorge Márcio Carvano, é importante esclarecer o que realmente se sabe sobre esse raro visitante vindo de fora do Sistema Solar e compreender por que ele tem despertado tanto interesse. Sua declaração sobre o 3I/ATLAS foi publicado no site do Observatório nacional.
Ao longo das observações, os astrônomos determinaram que a órbita do cometa não é fechada em torno do Sol, diferentemente dos objetos do Sistema Solar, o que o caracteriza como um corpo interestelar.
“Esse é um objeto que veio de fora do Sistema Solar, vai passar a alguma distância do Sol e depois se afastará para nunca mais voltar”, explica Carvano.
Conforme explica Carvano, os cometas são formados por misturas de gelos, poeira e outros compostos, e percorrem órbitas muito alongadas, isto é, com grande variação na distância ao Sol ao longo da órbita. Quando se aproximam da estrela, o aumento da radiação eleva sua temperatura, fazendo com que os gelos sublimem – passem do estado sólido diretamente ao gasoso – e liberem a poeira aprisionada.
A sublimação pode ocorrer na superfície ou em camadas internas, onde o gás acumulado escapa sob pressão por fendas, formando jatos de gás e poeira. Esse material se acumula ao redor do cometa em uma nuvem chamada “coma” e, ao ser empurrado pela radiação solar, dá origem às “caudas”. Esses jatos podem ainda alterar levemente a órbita do cometa.
“Essas comas e caudas podem se estender por dezenas de milhares de quilômetros, e como a poeira reflete a luz solar, o brilho dos cometas aumenta bastante conforme se aproximam do Sol”, explica o pesquisador.
A trajetória de um objeto interestelar depende de sua origem, não de um destino intencional. O fato de o primeiro objeto interestelar detectado – 1I/Omuamua – ter uma inclinação orbital em relação à eclíptica de quase 60 graus não impediu que o mesmo grupo de autores sugerisse na época que ele também era uma nave espacial. Ejetados de seus sistemas planetários, esses corpos podem vir de qualquer direção.
“Portanto, não há motivo para supor que o fato de o 3I/ATLAS ter uma inclinação pequena e cruzar a órbita da Terra signifique algo além de coincidência”, afirma Carvano.
Protocolo de defesa planetária
Com relação ao protocolo de proteção planetária ativado pela NASA, amplamente divulgado na Internet, Carvano explica que existe a International Asteroid Warning Network (IAWN), uma colaboração internacional que visa aumentar a cooperação entre pesquisadores para descobrir e refinar a órbita de pequenos objetos do Sistema Solar, identificando rapidamente aqueles que possam representar risco de colisão com a Terra.
A IAWN é formada por profissionais de várias agências espaciais e da União Astronômica Internacional (IAU), mantendo vínculos com a ONU, mas a maioria dos membros são pesquisadores independentes. A organização promove campanhas de observação para treinar participantes e testar protocolos.
Em 21 de outubro, uma dessas campanhas foi convocada para melhorar as medições de posição do 3I/ATLAS, visando caracterizar variações na trajetória causadas pelos jatos de gás e poeira, que tendem a se tornar mais intensos após a passagem do cometa pelo periélio em 29 de outubro. Esses dados ajudam a entender os processos de sublimação e a estimar melhor sua massa, mas não há nenhuma possibilidade desses pequenos desvios que podem ser observados venham a produzir qualquer risco de colisão com a Terra.
Segundo o Prof. Dr.Eng. Carlos Fernando Jung, Diretor do Observatório Espacial Heller & Jung – observatório especializado em registros e análise de meteoros – “o avanço tecnológico, com instrumentos como o JWST, ALMA e o Hubble Space Telescope, tem permitido análises espectroscópicas detalhadas das composições químicas e isotópicas de cometas. Em especial, a descoberta de vapor d’água sem CO₂ em 238P/Read e a alta concentração de CO₂ em 3I/ATLAS apontam para diferentes histórias térmicas e químicas, sugerindo origens distintas e processos evolutivos complexos. Estes achados têm implicações diretas nas teorias sobre a origem da água terrestre e da matéria orgânica no Sistema Solar e em outros sistemas planetários.”

Para o Prof. Jung, assim, foi possível até o momento determinar as seguintes características do cometa 3I/ATLAS: alta fração de CO₂ vs H₂O. “Observações espectroscópicas infravermelhas com o James Webb Space Telescope (JWST) mostram que a coma do 3I/ATLAS é dominada por dióxido de carbono (CO₂). A razão CO₂/H₂O foi estimada em aproximadamente 8,0 ± 1,0. Esse valor está entre os mais elevados já observados em cometas — e está significativamente acima da tendência normal para cometas de longo período ou de família de Júpiter. Em contraste, a maioria dos cometas fotometrados apresenta H₂O dominando ou próximas proporções entre H₂O e outros voláteis (CO, CO₂)“.
A baixa atividade de água relativa e possível isolamento térmico
A observação sugere que, apesar de haver H₂O e gelo de água, há inibição da sublimação de H₂O comparada à de CO₂/CO — possivelmente por um manto isolante ou estrutura de superfície que impede o calor de penetrar profundamente. Isso diferencia 3I/ATLAS de muitos cometas do Sistema Solar onde a água (H₂O) é a principal volátil ativa perto do Sol.

“Dados indicam que 3I/ATLAS viajou por muito tempo no meio interestelar, possivelmente vários bilhões de anos, e foi exposto a raios cósmicos galácticos que podem ter alterado sua camada superficial. 3I/ATLAS é classificado como objeto interestelar (designação “3I”), e não pertence à Nuvem de Oort ou Cinturão de Kuiper do nosso sistema. Isso por si já o torna distinto de cometas do sistema solar“.
Composição pouco convencional
A detecção sugere que a sua “nuclear” ou camada ativa tem ices que podem não ter sido tão processados como os cometas do Sistema Solar ou foram processados de modo diferente — ou formados em ambiente distinto (próximo à “linha de gelo” do CO₂ num disco protoplanetário).
“Minha síntese com base apenas em dados científicos é a seguinte: A diversidade química e física observada entre os cometas, especialmente após a detecção de objetos interestelares, evidencia que os processos de formação planetária são universais, mas variam conforme as condições locais. A presença de compostos orgânicos complexos – como glicina, fósforo e hidrocarbonetos – em 67P/Churyumov–Gerasimenko, bem como as proporções extremas de CO e CO₂ em 2I/Borisov e 3I/ATLAS, reforçam a hipótese de que os cometas possam ter sido vetores de moléculas prebióticas”.




