A profundidade dos casos registrados na Amazônia
A Rede Globo fez história em 25 de agosto passado. Não somente história para a Ufologia, a mais interessada, mas principalmente para toda a sociedade brasileira, tão carente de informações sobre o Fenômeno UFO. A Globo teve a “ousadia” de ocupar praticamente todo o tempo de seu tradicional programa Linha Direta, de todas as quintas-feiras, com a reconstituição da história da vida do militar que foi a alma da Operação Prato, o então corajoso capitão Uyrangê Hollanda, e da doutora Wellaide Cecim Carvalho, a jovem médica que, em seu primeiro emprego, se deparou com ataques cada vez mais profundos e numerosos a moradores em ilhas paraenses, que viriam a ser seus pacientes. O documentário foi um show sem precedentes.
Ao mostrar de maneira abrangente e realista a gravíssima manifestação do fenômeno chupa-chupa no litoral do Pará, sem poupar testemunhas e vítimas – ora apresentadas com suas próprias identidades, ora simuladas por atores da emissora –, o Linha Direta deu ao Brasil uma noção clara, sem exageros nem omissões, de como a população enfrentou o mais contundente sinal de hostilidade extraterrestre a seres humanos que já se viu neste planeta. E ainda mostrou como as autoridades militares lidaram como assunto na época, investigando os casos in loco e tendo, elas próprias, contatos diretos com as manifestações. Essa realidade, infelizmente, apesar dos esforços dos integrantes da Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU) – que realizam a campanha UFOs: Liberdade de Informação Já –, está até hoje mantida num rigoroso sigilo.
Quem assistiu ao programa teve a oportunidade, inédita e única na TV brasileira, de sentir na pele o que se passou com centenas, talvez milhares, de pessoas residentes em algumas ilhas do litoral fluvial do Pará, especialmente Colares, epicentro do chupa-chupa nos anos 70 e 80. A reconstituição dos episódios pelo programa foi feita com uma qualidade indiscutível, tendo a Globo primado pela legitimidade da ação dos personagens contratados para simular no documentário os militares da Operação Prato, as vítimas do fenômeno e até a doutora Wellaide, mostrada atendendo às inúmeras vítimas que chegavam a todo instante na Unidade Sanitária da ilha, queimados e desfalecidos, buscando ajuda.
Efeitos especiais — As manifestações de objetos voadores não identificados sobre Colares, tanto de dia como à noite, mostradas no programa através de efeitos especiais de última geração, também podem ser consideradas entre as mais bem produzidas de que se tem notícia em documentários do gênero, em todo o mundo. Apenas algumas produções hollywoodianas trataram avistamentos de UFOs e seus ataques com tanta qualidade quanto a Globo o fez no programa. Enfim, uma análise do documentário de pouco mais de 40 minutos indica uma contribuição extremamente positiva para a Ufologia, que vem há anos insistindo na seriedade e gravidade dos fatos registrados pela Aeronáutica e por ufólogos civis daquele rincão do Brasil onde UFOs foram sinônimo de pavor e pânico.
O Centro Brasileiro de Pesquisas de Discos Voadores (CBPDV) foi a instituição consultada pela produção de Linha Direta desde o princípio de seu planejamento, quando o projeto era fazer reconstituições de casos de abduções clássicos e recentes. A entidade foi convidada a apresentar ocorrências do gênero para comporem várias edições do programa, mas preferiu sugerir à Globo que a primeira da série fosse feita sobre a vida de Hollanda, mostrando aos jornalistas da emissora a riqueza de informações que havia sobre o personagem para aproveitamento no documentário. Deu certo!
A rede decidiu usar o tema sugerido pelo CBPDV, que passou então a fornecer todos os possíveis detalhes para a produção do documentário. O resultado foi um grande sucesso. Uma detalhada e competente pesquisa dos fatos, conduzida pelo repórter Wilson Aquino, também foi essencial para que o programa tivesse o êxito que atingiu. Aquino e sua equipe estiveram duas vezes em Campo Grande (MS), reunindo-se e gravando entrevistas com os integrantes da Revista UFO. E passaram mais de duas semanas em Belém e Colares aprofundando a investigação e conversando com ufólogos, jornalistas, médicos e as testemunhas que forneceriam um quadro completo da casuística que se abateu sobre o Estado, entre 1977 e 1978, principalmente. Aquino pôde testemunhar que o fenômeno, embora arrefecido em gravidade e constância – hoje com menos ataques, mas igual exuberância –, continua a rondar o litoral do Pará assustando e maravilhando espectadores.
Origem exógena — O Linha Direta não foi puro entretenimento. Longe disso, o programa apresentou prós e contras a tese que atesta que o chupa-chupa tenha origem exógena, de fora da Terra. Para tanto, consultou importantes integrantes do meio acadêmico e militar brasileiro, entre eles o astrônomo Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, do Observatório Nacional do Rio de Janeiro, e Marcelo Gleiser, notório físico e astrônomo carioca. Ambos são donos de extensos e impressionantes currículos, mas em suas falas no programa mostraram apenas que seu ceticismo quanto ao Fenômeno UFO não tem sustentação e que os ufólogos estão imensamente mais bem preparados para defender sua posição. De quebra, suas manifestações em Linha Direta mostraram que os cientistas – não somente Mourão e Gleiser – desperdiçam uma excelente oportunidade para investigar os fatos em Colares.
Alucinação coletiva — O psiquiatra Osvaldo Saíde, especialista em neuroimagem da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), por exemplo, comparou o pânico generalizado que tomava conta de milhares de pessoas em Colares com situações restritas de emergência em caso de incêndios em cinemas e supermercados. Sua tese não se sustentou nem 30 segundos do programa, tendo a doutora Wellaide, imediatamente após sua fala, apresentado o quadro com mais realidade. “Se fosse um caso de histeria coletiva, a Aeronáutica jamais iria destacar uma equipe tão grande para fazer aquele tipo de observação e pesquisa”, disse. Ademais, como descreveu, ela atendeu dezenas de pacientes de diferentes regiões do litoral fluvial do Pará, que não se conheciam e nunca se falaram, mas que, ainda assim, apresentavam a mesma situação.
O programa também deixou evidente a fragilidade dos argumentos ao Fênomeno UFO, que não explicam tamanha quantidade de material investigativo existente na Amazônia
O jornalista Carlos Mendes, que atua no O Liberal e é integrante da imprensa que melhor e mais de perto acompanhou os fatos de Colares, foi entrevistado e mostrou com clareza a gravidade dos acontecimentos. Ele também afastou a hipótese de alucinação coletiva ou delírio, o que também foi feito pelo consultor de UFO doutor Ricardo Varela. “Há mais de 20 anos eu converso com pessoas que alegam ter experiências com seres extraterrestres e a maioria delas tem uma reputação que você não pode ir contra”, declarou. Já o piloto comercial Ubiratan Pinon Frias que tomou parte de algumas atividades na selva, durante a Operação Prato, foi ainda mais incisivo. Ele crê que existam inclusive criaturas alienígenas vivendo entre a população. “Acredito muito que alguns ‘deles’ estejam entre nós, procurando uma maneira de nos conhecer melhor”.
Pinon também deu uma descrição pungente do que testemunhou junto ao coronel Uyrangê Hollanda na Praia do Machadinho, em Colares: “Era incrível. As luzes entravam e saíam do mato e davam vôos rasantes. Elas pareciam que brincavam conosco”. Sua fala, no entanto, foi levada ao pé da letra por outro cético consultado, o professor de astronomia da Universidade de São Paulo Gustavo Medina Tanco. Sem entender a expressão, habitual em Ufologia, de que os UFOs parecem se divertir com suas testemunhas ao exporem-se apenas parcialmente, evitando um contato mais declarado, Tanco acha improvável que os ETs sejam assim tão brincalhões. Para ele, se os extraterrestres existissem mesmo, “ao virem à Terra, o menos que eu esperaria é que ficassem brincando conosco”.
Outra contradição entre os céticos partiu, curiosamente, de quem um dia deixou bem claro que já não era mais, o brigadeiro Octávio Moreira Lima, ex-ministro da Aeronáutica. Apesar de alegar a existência de muitos planetas supostamente habitados no universo, ele declarou que “um contato (com eles) seria muito difícil, dadas as distâncias gigantescas entre as estrelas”. Estranhamente, Moreira Lima esqueceu-se de entrevistas anteriores que concedeu, inclusive à Revista UFO, nas quais afirmou que os fatos ocorridos em São Paulo, durante a chamada Noite Oficial dos UFOs no Brasil, em 19 de maio de 1986, nada tinham a ver com artefatos conhecidos ou terrestres. Foi ele quem apresentou à sociedade brasileira a informação de que nossos aeroportos ficaram congestionados naquela noite por “mais de 20 objetos de origem desconhecida”. Ao fim de sua fala, apesar de negar os UFOs, disse: “Mas isso não quer dizer que a vida extraterrestre não seja possível. Ela é possível”. Ah, bom…
Testemunhas respeitáveis — A Globo caprichou principalmente em três grandes momentos que marcaram a onda chupa-chupa no Pará e a respectiva Operação Prato: o encontro que Hollanda e seus homens tiveram com uma imensa nave na Praia do Machadinho, a reconstituição do primeiro contato ufológico da doutora Wellaide Cecim Carvalho, na rua central de Colares, e ao descrever e simular a quase colisão que um helicóptero da Força Aérea Brasileira (FAB) sofreu ao tentar perseguir um UFO. Mas apesar dessas importantes informações partirem de testemunhas respeitáveis e de alta credibilidade, além dos fatos estarem documentados – apenas no site de UFO há mais de 400 páginas de relatórios à disposição –, os céticos não se renderam às evidências. Não pesquisam o fenômeno e nada sabem sobre o assunto, mas ainda assim emitem suas opiniões.
“Até agora não existe absolutamente nenhuma prova concreta de que nós já fomos visitados por outra civilização inteligente”, tentou Gleiser. “Sobre a presença de um ser extraterrestre, precisaríamos trazer algum aqui no programa para entrevistá-lo. Daí sim a gente vai acreditar realmente neles”, satirizou Mourão. Ambos tiveram suas negativas amparadas por Moreira Lima. Quando perguntado se há mesmo documentos secretos sobre objetos voadores não identificados em poder da FAB, o brigadeiro deu uma resposta no mínimo espantosa: “Isso é objeto de ficção. Na realidade, eles (os documentos) não existem”. Oras, se não existem, então o que são as dezenas, talvez centenas, de pastas secretas que os militares do Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro (Comdabra) garantiram aos ufólogos estarem sendo mantidas naquele órgão?
Varela imediatamente corrigiu o brigadeiro, afirmando que a FAB tem até um documento que explica como os militares devem proceder quando detectarem UFOs através de radares ou os registrarem visualmente. “O documento explica até mesmo como deve ser o contato (dos militares) com a imprensa. E a primeira coisa que os ensina a fazer é: neguem tudo”. Varela se refere ao famoso e polêmico documento NPA-09, do Ministério da Aeronáutica, emitido pelo Serviço Regional de Proteção ao Vôo do Rio de Janeiro, em 20 de agosto de 1990. Ele trata de procedimentos a serem adotados em caso de avistamento de objetos voadores não identificados por pessoal de companhias aéreas e militares e inclui um modelo de questionário a ser aplicado nessas ocorrências. Seria um exercício de imaginação interessante tentar entender por que a Aeronáutica apresentaria um documento que instrui seu pessoal a agir quando tiver em contato com algo que não existe…
Ao contrário de admitir a situação e permitir à população informar-se sobre os fatos, a Força Aérea Brasileira (FAB) colocou-se mais uma vez em cima do muro. Procurada pela produção de Linha Direta, o órgão recusou-se a responder a qualquer uma das 30 perguntas que lhe foram encaminhadas, limitando-se a emitir um comunicado. Nele, alegou que não possui qualquer comando especializado para empreender pesquisas ufológicas, o que é verdade. Mas disse que recebeu os ufólogos em 20 de maio apenas para lhes mostrar o funcionamento do I Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo (Cindacta I), o que não é preciso [Veja edição UFO 111]. Os ufólogos viram e examinaram arquivos nas instalações do órgão, embora não tenham sido autorizados a copiá-los.
Conspiração de silêncio — Outro ponto de relevância da edição de 25 de agosto de Linha Direta diz respeito ao suicídio do coronel Uyrangê Hollanda, ocorrido em 02 de outubro de 1997, justamente alguns meses após conceder sua histórica entrevista à Revista UFO. Por incrível que pareça, ainda pairam na Comunidade Ufológica Brasileira suspeitas de que o militar tenha sido alvo de uma conspiração para silenciá-lo, e por isso teria sido assassinado de forma a que parecesse um suicídio. O piloto Pinon foi um dos que defendeu a tese, mas a mesma foi rapidamente corrigida pelo co-editor de UFO Marco Petit, que acompanhou a tragédia e as diligências policiais, produzindo para a revista um texto esclarecedor sobre o assunto [Veja edições 76 e 78].
Por fim, o momento mais desencontrado da atuação dos céticos ficou a cargo do físico Gleiser, que confundiu quase tudo ao final do programa, ao misturar assuntos sem conexão. Ao fazer referência aos ataques no Pará, dos quais duvida, aludiu que a suposta violência extraterrestre seria uma lenda ou um modismo há muito difundido de que os marcianos sejam agressivos. “A idéia de que os marcianos sejam inteligentes, mas também agressivos, tomou corpo”. Pronto, pelo menos alguém nessa edição de Linha Direta achou uma identidade para os seres que atacavam em Colares. Segundo o físico Marcelo Gleiser, são de Marte…