Os contornos da Ufologia Brasileira estão mudando mais rapidamente do que poderiam imaginar os ufólogos e simpatizantes da investigação do Fenômeno UFO no Brasil. O exemplo mais eloquente disso está nesta citação: “Membros da Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU) e representantes das Forças Armadas reuniram-se em Brasília na tarde desta quinta-feira, em evento intermediado pelo Ministério da Defesa, para tratar do acesso a documentos militares que tratam de relatos envolvendo objetos voadores não identificados”. Não, esse texto não partiu de um veículo ufológico — foi com estas palavras que teve início uma nota oficial publicada no site do próprio Ministério da Defesa, que descreveu a histórica reunião de 18 de abril de 2013, entre ufólogos brasileiros e integrantes do Exército, Marinha e Aeronáutica.
Aquela é uma data a ser lembrada nos anos que estão por vir, pois marca o princípio da futura cooperação oficial entre militares e pesquisadores civis para dar respostas à sociedade sobre a fascinante questão ufológica. O encontro foi convocado pelo próprio Ministério da Defesa em resposta direta do órgão à Carta de Foz do Iguaçu, o documento expedido conjuntamente pela Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU) e a Revista UFO durante o IV Fórum Mundial de Ufologia, ocorrido em Foz do Iguaçu em dezembro passado. Assinada por mais de 30 conferencistas presentes, de uma dúzia de países, e por um público acima de 500 pessoas, a Carta foi o elemento que agora motivou a reunião [Veja edição UFO 197, agora disponível na íntegra em ufo.com.br].
Situação contraditória
Entre os integrantes da CBU presentes à histórica reunião estavam os coeditores da Revista UFO Fernando A. Ramalho, Marco A. Petit, Francisco Pires de Campos e Thiago L. Ticchetti, o conselheiro especial Gener Silva e o editor A. J. Gevaerd — que conduziu os trabalhos pelo lado dos ufólogos. O professor Wilson Picler e o engenheiro Ricardo Varela, também conselheiros especiais, programados para também irem a Brasília, acabaram não podendo comparecer. Nada poderia ser mais oportuno para a Comunidade Ufológica Brasileira do que o Ministério da Defesa tomar finalmente parte desta discussão. O Brasil é reconhecidamente um dos países líderes no número de casos envolvendo avistamentos ufológicos e contatos com extraterrestres, e por isso chega a ser até mesmo contraditório que nações vizinhas já tenham comissões mistas de análises e estudos do tema há anos, enquanto a Ufologia Brasileira é obrigada a conviver com promessas neste sentido que parecem nunca se cumprir. Este cenário pode agora mudar — pelo menos esta é a promessa das autoridades do Ministério que intermediaram o encontro, que teve a duração de uma hora e 15 minutos.
Na reunião, no entanto, foi surpreendente para os membros da CBU constatar que alguns dos militares convocados pelo Ministério tinham quase total desconhecimento de ocorrências importantes e clássicas da Ufologia Brasileira, tais como a Operação Prato ou o próprio Caso Varginha, que foram então descritas aos oficiais pelos ufólogos. Durante o encontro, os pesquisadores deixaram claro ao secretário de Coordenação e Organização Institucional do Ministério da Defesa e mediador do evento, doutor Ari Matos Cardoso, assim como a todos os integrantes do Exército, Marinha e Aeronáutica presentes, que o que se deseja é um ambiente de cooperação entre as partes, para que seja concedido acesso total aos arquivos ufológicos governamentais. “Queremos estabelecer um vínculo e também oferecer nossa contribuição na análise da manifestação ufológica no país”, declarou na ocasião o coeditor da Revista UFO Marco A. Petit.
Como é de conhecimento da Comunidade Ufológica Brasileira, a CBU sempre defendeu em sua campanha UFOs: Liberdade de Informação Já que um estudo sério e sistemático do Fenômeno UFO pode resultar em conhecimentos científicos inestimáveis para a sociedade, especialmente se contar com apoio das Forças Armadas. Por isso, ao longo da reunião no Ministério, os integrantes da entidade descreveram as dificuldades que têm enfrentado para obter documentos militares classificados como secretos e ultrassecretos. “Existem muitas questões sem resposta em casos famosos, como Varginha, a Operação Prato, o incidente da Corveta Mearim, a Noite Oficial dos UFOs no Brasil e da Ilha de Trindade. A liberação de documentos sobre eles nos levaria a ter uma ideia completa destes fatos”, declarou o editor de UFO A. J. Gevaerd.
Acesso irrestrito aos ufólogos
A resposta à declaração do editor foi imediata e partiu do secretário Matos Cardoso, que afirmou que os documentos ainda não liberados são exceções: “A regra geral no Ministério da Defesa é disponibilizar aos ufólogos todos os documentos que ainda estiverem resguardados por sigilo nas Forças Armadas. Alguns casos ainda têm que obedecer ao prazo legal, mas isso é uma questão que em breve será solucionada”. O secretário também garantiu aos presentes que o Ministério tem grande respeito pelo assunto. “Quero assegurar aos senhores que estamos levando esta pauta muito a sério, que respeitamos profundamente o trabalho que realizam e que iremos fazer de tudo ao nosso alcance para concretizar um canal de comunicação para que alcancem seus objetivos”, disse, no que foi acompanhado pelo diretor do Departamento de Organização e Legislação do Ministério, doutor Adriano Portella.
A seriedade com que o Ministério da Defesa tratou o assunto tem explicação. Segundo o coronel da Aeronáutica Alexandre Spengler, responsável pelo Serviço de Informações ao Cidadão do órgão e também presente à reunião, o tema que tem a maior quantidade de pedidos de dados recebidos pelo Ministério por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) tem a ver com a manifestação de UFOs no país — e isso incentivou os militares e agentes públicos a organizarem o encontro. De acordo com Spengler, “todos os pedidos que a sociedade nos fez e que tiveram que ser negados o foram devido à informação solicitada não existir nos arquivos ou envolver assunto relacionado à segurança nacional. Não sendo isso, foram atendidos&rd
quo;. Para ele, restam poucas informações ainda por serem liberadas sobre discos voadores no país.
O Brasil já teve posição de liderança no mundo quanto à pesquisa ufológica, no final dos anos 60, quando estava operante em São Paulo o Sistema de Investigação de Objetos Aéreos Não Identificados (Sioani), que investigou dezenas de casos oficialmente
A predominância de pedidos de informação sobre casos ufológicos entre os requerimentos feitos ao Ministério da Defesa com o acionamento da LAI também foi enfatizada pelo secretário Matos Cardoso. Segundo a Agência Brasil de Notícias apurou, os pedidos sobre o assunto ao órgão foram recorde e muito superiores em número a qualquer outro tópico. Os dados são reveladores: em primeiro lugar, entre todos os assuntos, estão requerimentos de informações sobre Ufologia, com 107 ocorrências. E, em segundo lugar, com somente 27 ocorrências, estão questões militares. “Isso é espantoso e mostra que a sociedade tem muito interesse em saber o que ocorre em nossos céus”, disse no encontro o coeditor de UFO Francisco Pires de Campos.
Ufologia levada a sério
Os integrantes da CBU discutiram com os funcionários do Ministério e militares certas particularidades do Fenômeno UFO no país, indo além da necessidade de abertura de informações ainda mantidas sigilosas quanto ao tema pelas Forças Armadas. Um tópico especial da reunião foi a discussão sobre a forma como o pedido dos ufólogos será atendido pelo Governo Brasileiro — na Carta de Foz do Iguaçu, entre outros documentos da campanha UFOs: Liberdade de Informação Já, é pleiteado o estabelecimento de uma entidade oficial composta por civis e militares para pesquisa ufológica. O documento pede formalmente ao órgão “criar uma comissão multidisciplinar e mista, com a participação de militares das três Forças Armadas e integrantes da Comunidade Ufológica Nacional, para que, com a logística militar e a colaboração de ufólogos e cientistas civis, proceda de forma conjunta ao estudo de registros da manifestação do Fenômeno UFO, com posterior informação à sociedade, por meio de instrumentos informativos regulares e apropriados à importância do tema”.
Dez militares das três Armas estiveram presentes à reunião, mas apenas o representante do Comando da Aeronáutica deu contribuição significativa, surpreendendo os ufólogos pela franqueza e afirmando que de fato ainda existem documentos secretos aguardando liberação, “o que deve ser providenciado em breve para atendimento do pedido dos ufólogos”. Inusitadamente, o representante da Marinha apenas se limitou a afirmar que não existe documento algum em poder da arma, o que depois foi contradito por Petit, que demonstrou a existência de inúmeros fatos que foram objetos de investigações da Marinha — entre eles, especialmente, o Caso Ilha da Trindade. “Já quanto ao representante do Exército, também convocado para a reunião pelo Ministério, sua participação foi decepcionante”, disse Gevaerd. O tenente-coronel Júlio Okamoto afirmou, para espanto de todos, ter sido chamado de última hora para o encontro e que não estava a par do assunto que seria tratado, ignorando que o Exército fora convocado com bastante antecedência.
Como se sabe, a principal solicitação da Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU) ao Ministério da Defesa é a liberação de documentos referentes ao principal episódio de nossa Ufologia, o Caso Varginha. Esperava-se que Okamoto tivesse alguma coisa para dizer a respeito, mas ele não se pronunciou. Quem o fez, surpreendentemente, foi o coronel Spengler, que disse que “o Exército afirmou não ter documentos sobre o evento conhecido como ‘ET de Varginha’, de 1996, ocorrido em Minas Gerais, porque se extraviaram ou foram destruídos, como é previsto em lei”. Isso deixou a todos perplexos, pois é simplesmente imaginável que materiais sobre um episódio tão importante, como o ocorrido na cidade mineira, pudessem ser destruídos.
O exemplo deve partir do Brasil
A criação de uma entidade oficial de pesquisa no país tem uma razão a mais para estar na pauta do dia. “Várias nações da América do Sul, como o Uruguai e o Chile, têm órgãos do gênero atuando de forma transparente há anos. Como pode o Brasil, a maior nação do continente, não ter um?”, questionou o também coeditor Ramalho. O Uruguai, por exemplo, tem a mais antiga entidade do mundo, a Comissión Receptadora y Investigadora de Denuncias de Objectos Voladores No Identificados (Cridovni), funcionando desde 1979 para analisar casos envolvendo UFOs que chegam ao conhecimento da Força Aérea do país. Outros exemplos são o Centro de Estudios de Fenómenos Aéreos Anómalos (CEFAA), do Chile, em funcionamento desde 1997 dentro da Diretoria Geral de Aviação Civil, e a Oficina de Investigación de Fenómenos Anómalos Aeroespaciales (OIFAA), da Força Aérea Peruana (FAP), com atividades presentemente paralisadas.
O Brasil já teve uma entidade oficial de investigação ufológica, mas apenas no curto período de 1969 a 1972, quando funcionou nas dependências do IV Comando Aéreo Regional (IV COMAR), em São Paulo, o Sistema de Investigação de Objetos Aéreos Não Identificados (Sioani). Ao longo de sua rápida e prolífica existência o órgão investigou mais de 100 casos ufológicos, produzindo milhares de páginas de documentos, fotos e croquis com os resultados de suas pesquisas. “Precisamos restabelecer o Sioani, agora modernizado e preparado para a nova demanda que a Ufologia Brasileira apresenta”, afirmou Ticchetti na reunião, também membro da diretoria da UFO.
Como se sabe, o Sioani foi criado por iniciativa pessoal do major-brigadeiro José Vaz da Silva, um militar da Aeronáutica que convenceu seus pares de que a realidade ufológica merecia atenção, isso em plena Ditadura [Veja edição UFO 158, agora disponível na íntegra em ufo.com.br]. O órgão investigou os mais diversos acontecimentos envolvendo discos voadores em Território Nacional, incluindo aqueles em que tripulantes foram avistados e tiveram contato com testemunhas. Sua extraordinária trajetória, que paradoxalmente muitos dos atuais oficiais da Aeronáutica desconhecem, pode ser uma inspiração para a criação da nova comissão
de estudos ufológicos que pretende a CBU — desta vez ela envolveria não somente as três armas, mas também segmentos da Comunidade Ufológica.
A Aeronáutica j&
aacute; tomou posição
A Força Aérea Brasileira (FAB) já deu demonstrações de que trata seriamente da questão ufológica em 2010, mas não foi muito além disso. Naquele ano seu comandante, o tenente-brigadeiro do ar Juniti Saito, assinou a Portaria 551/GC3, que determina o envio para o Arquivo Nacional de documentos a respeito dos UFOs que chegarem ao conhecimento da arma. Diz seu texto: “O Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro (Comdabra), como órgão central do Sistema de Defesa Aeroespacial Brasileiro (Sisdabra), é a organização responsável por receber e catalogar os registros referentes a UFOs, relatados em formulário próprio, por usuários dos serviços de controle de tráfego aéreo e encaminhá-los regularmente ao Centro de Documentação e Histórico da Aeronáutica (Cendoc). Esta é a organização responsável por copiar, encadernar, arquivar cópias dos registros encaminhados pelo Comdabra e enviar, periodicamente, os originais ao Arquivo Nacional”.
A criação de um órgão como era o Sioani, com a finalidade de investigar a imensa e complexa casuística ufológica do país, interessa também à sociedade, como demonstrou a considerável quantidade de pedidos de informações a respeito do tema com base na LAI, que tanto surpreendeu os militares. Embora nada tenha sido definido quanto a esta providência, no entanto, a CBU e a UFO oferecem total colaboração para a possível nova entidade, com o objetivo de auxiliar a decifrar um dos enigmas mais impressionantes já enfrentados pela humanidade, a visita de outras espécies cósmicas ao nosso planeta.
Com o tema amplamente discutido entre os presentes surgiu o oferecimento imediato, pelo Ministério da Defesa, pelo menos de um canal de comunicação entre ufólogos e as Forças Armadas — foi uma conquista parcial, mas importante, e os integrantes da CBU saíram esperançosos de futuramente ver surgir a tão necessária entidade mista de pesquisas ufológicas. A promessa de estudar sua viabilidade partiu do doutor Ari Matos Cardoso, que garantiu que agora um canal de comunicação é necessário para que os estudiosos tenham “acesso facilitado, desburocratizado e eficiente às informações que pleiteiam”. Ele encerrou a reunião com estas palavras, às quais o editor Gevaerd aproveitou e complementou: “Se é assim, por que não se fazer logo um esforço um pouco mais arrojado e realizar-se de uma vez um estudo mais amplo para estabelecermos a comissão mista de pesquisa ufológica que tanto buscamos?” Resta aos ufólogos aguardarem os próximos passos.