Poucas pessoas possuem um pensamento tão vanguardista e afinado sobre a complexa questão da presença alienígena na Terra quanto o astrônomo e cientista da computação francês Jacques Vallée. Radicando nos Estados Unidos há décadas, foi consultor da NASA em inúmeros projetos e é autor de vários livros que fazem análises avançadas e corajosas sobre a problemática ufológica, atribuindo-lhe padrões bem diversos do que são aceitos pelos ufólogos convencionais. Sua trajetória é repleta de participações nos melhores e mais importantes momentos da Ufologia Mundial. Seu primeiro livro foi Anatomy of a Phenomenon [Anatomia de um Fenômeno, Contemporary Publishing, 1965], seguido por vários outros cada vez mais contundentes, até chegar ao fim dos anos 70, quando lançou o polêmico Messengers of Deception [Mensageiros do Engano, Ronin Publication, 1979], no qual sugeria que os seres extraterrestres estariam deliberadamente enganando os seres humanos em suas ações, em especial em casos de contatos e alegadas canalizações.
Suas obras mais recentes mostram um aperfeiçoamento gradual em sua maneira refinada de enxergar o Fenômeno UFO. Entre eles, Confrontations: A Scientist’s Search for Alien Contact [Confrontos: A Busca de Um Cientista por Contato Alienígena, Ballantine, 1990] e Revelations: Alien Contact and Human Deception [Revelações: Contato Alienígena e Engano Humano, Ballantine, 1991] oferecem um panorama do Fenômeno UFO significativamente distante daquele que os ufólogos ortodoxos visualizam. Vallée crê na materialidade das manifestações de discos voadores e seres extraterrestres em nosso meio, mas acha que elas são minoria e que os contatos mais profundos entre a realidade humana e a extraterrestre ocorrem em múltiplos níveis de interação, alguns incompreensíveis para nós, e num enredo em que nossa participação é secundária.
Os UFOs interagem com o tempo, podendo vir de qualquer lugar, inclusive de nosso próprio planeta. Temos que abandonar o conceito de espaçonaves, como as dos filmes de ficção dos anos 50
“Colégio Invisível” — O pensamento de Vallée o levou a se aproximar do pioneiro da Ufologia norte-americano, J. A. Hynek, para quem “os ETs jogam dados conosco, mas não apenas isso: eles também nos ensinam a jogar”. Ainda nos anos 60, em companhia do também ufólogo francês Aimé Michel – que desenvolveu a teoria das ortotenias – definiu o que se convencionou chamar de “Colégio Invisível” o ambiente reservado onde o conhecimento ufológico progride.
Residindo em San Francisco, na Califórnia, Jacques Vallée decidiu, há quase 20 anos, se afastar do movimento ufológico. Não participa de eventos e raramente concede entrevistas. Mas, abrindo uma brecha em sua reclusão voluntária, atendeu com extrema cordialidade o pedido de entrevista da Equipe UFO, e não se esquivou à sabatina a que foi submetido. Suas respostas às nossas indagações merecem ser, mais do que lidas, refletidas. Vallée não é um ufólogo comum, mas alguém que tem uma intimidade sem igual com o Fenômeno UFO. Para os que iniciaram nesta jornada há mais tempo, deve rapidamente vir à memória o personagem Lacombe, de Contatos Imediatos do Terceiro Grau [1977], vivido pelo artista François Truffaut. Lacombe, o matemático franco-americano que tinha excepcional conhecimento da questão ufológica, era como o diretor Steven Spielberg via Vallée. Em meio à trama militaresca do filme, foi delegada a Lacombe a função de lidar e interpretar o lado transcendental da manifestação ufológica na película.
Esta entrevista foi realizada com a participação de inúmeros integrantes da Comunidade Ufológica Brasileira – em especial os integrantes da Equipe UFO –, que mandaram dezenas de perguntas ao entrevistado, através do coordenador desse trabalho, o ex-ombudsman Carlos A. Reis, autor de Os Portais do Santuário [Biblioteca Esotera, 2000]. Reis foi escolhido para organizar a tarefa por ser um dos estudiosos brasileiros mais identificados com a linha de pensamento de Vallée. Ele não somente formulou suas próprias perguntas ao entrevistado, como selecionou criteriosamente aquelas recebidas dos convidados, principalmente as que fossem de interesse coletivo. Em sua tarefa, foi competentemente ajudado pelo nosso tradutor e consultor Marcos Malvezzi Leal, veterano intérprete e ufólogo, e pela advogada e escritora Laura Elias, igualmente consultora.
Reflexões nas entrelinhas — Sobre Jacques Vallée há muito o que falar, e ele próprio já foi por diversas vezes apresentado aos leitores da Revista UFO, em matérias anteriores. Um dos artigos mais detalhados que publicamos sobre seu trabalho foi justamente o do ex-ombudsman Reis, na UFO 90 [Agosto de 2003], Novos Rumos Para uma Velha Ufologia. Mas vamos deixar que a própria entrevista revele mais sobre este importante personagem da Ufologia Mundial, que, infelizmente, tem apenas alguns de seus excepcionais livros traduzidos para o português. É importante salientar que este diálogo com o entrevistado, embora limitado pelo espaço que a revista dispõe, se mostra bem mais completo do que se supõe justamente nas entrelinhas, onde há muito material para reflexão. Esta entrevista foi originalmente publicada na UFO 100 [Junho de 2004], e está sendo reapresentada aos leitores num momento oportuno, em que a Ufologia Brasileira se questiona sobre seus rumos e conquistas até o momento.
Há quase duas décadas, o senhor se afastou do meio ufológico para dedicar-se a reflexões sobre os aspectos sociais e mitológicos do fenômeno, defendendo a idéia de que desde o princípio foi feita uma leitura superficial dele e que todos nós caímos nessa armadilha. Que frutos esse isolamento proporcionou e qual seria a releitura atual da “anatomia do fenômeno”? O afastamento foi apenas das discussões públicas sobre Ufologia, e eu continuo afastado. Mas nunca desisti da pesquisa em si. Porém, o campo tornou-se tão confuso, com ramos e ideologias conflitantes, que qualquer coisa que eu dissesse como cientista se perderia na confusão. Nos últimos anos, tenho sido membro do corpo consultivo do Instituto Nacional de Descoberta Científica [National Institute for the Discovery of Science, NIDS] e consultor executivo do Centro de Registros de Fenômenos Anômalos da Aviação Nacional [National Aviation Reporting Center on Anomalous Phenomena, NARCAP], que se especializou no estudo de avistamentos de fenômenos aéreos não identificados por pilotos. Muitos pesquisadores, hoje, estão seguindo uma estratégia parecida de trabalhar em silêncio, longe das controvérsias da mídia. Nós estamos voltando aos dias do “Colégio Invisível”, de que tratamos no passado. O quadro que continua a emergir é o de um fenômeno muito forte, que combina parâmetros físicos com efeitos psicológicos e psíquicos muito interessantes. Meu método é bastante simples e muitos dos meus leitores compartilham comigo suas experiências pessoais com o Fenômeno UFO. Estes são casos que eu não divulguei para a imprensa ou para grupos ufológicos, então tenho condições de estudá-los por inteiro sem grandes esforços. Isso permite formar minha própria opinião sobre os fatos e testar os dados com variadas hipóteses. Ou seja, continuo tão fascinado quanto antes com a fenomenologia ufológica.
Jung, no seu magistral Um Mito Moderno Sobre Coisas Vistas no Céu [Vozes, 1991], aventou a hipótese de os UFOs virem a ser uma forma deinteligência que adota diferentes maneiras de se manifestar, de acordo com diferentes contextos históricos. Ou seja, algo muito parecido com o que o senhor sempre fez questão de frisar e expor. Seu pensamento ainda é o mesmo? É difícil não ficar impressionado com o fato de que o fenômeno tem tomado várias formas através da história, desde os navios voadores de Magonia, na França do século IX, às naves voadoras de 1897 e os foguetes fantasmas de 1947, na Escandinávia. As características físicas básicas dos UFOs são as mesmas, porém o fenômeno foi captado de maneira diferente por cada cultura. Uma parte disso se deve simplesmente ao contexto social ao qual foi inserido, mas parece também existir algum tipo de interação entre a fenomenologia e as testemunhas. É por esta razão que eu propus a idéia de que isso representava um sistema de controle.
A síntese de seu pensamento sobre o fenômeno é a de que ele opera através de uma espécie de consciência não humana, fazendo parte de um domínio ainda não explorado da natureza. Seria, portanto, uma expressão carregada de simbolismo de outra inteligência. Isso significa que estamos num beco sem saída? Meu amigo Aimé Michel [Ufólogo francês falecido em 1992, um dos criadores da teoria das ortotenias] pensava que, na verdade, nós já estávamos num beco sem saída há muitos anos. Eu discordo, porque ainda é muito cedo para se chegar a esta conclusão, uma vez que a ciência ainda não se aplicou ao estudo do Fenômeno UFO. Teoricamente, é possível que a forma de consciência envolvida nas manifestações ufológicas – sejam elas extraterrestres ou não – é tão avançada ou estranha a nós que a questão de interação é realmente insolúvel. Afinal, nós sabemos que algumas questões matemáticas não têm respostas, de forma que esta não é uma situação nova. Recentemente, o doutor Eric Davis e eu apresentamos uma tese sobre este assunto numa conferência sobre ciência, consciência e religião na cidade do Porto, em Portugal. O título do trabalho é Incomensurabilidade, Ortodoxia e a Física de Alta Estranheza, e está disponível para pesquisa no site do NIDS [www.nidsci.org].
Uma das preocupações que deveríamos ter é que a primeira geração de ufólogos que tivemos está morta ou envelhecendo. Mesmo que seus arquivos sejam preservados, o que raramente acontece, suas idéias dentro da história e desenvolvimento da área estarão perdidas. Também existem muitos dados que coletamos, acumulamos e nunca foram publicados
O senhor acredita que atualmente estejamos errados em sermos mais quantitativos que qualitativos? Que deveríamos retomar o rumo das pesquisas que o senhor representa tão bem, que é o de buscar as hipóteses que possam explicar o fenômeno e suas manifestações mais intrigantes? É importante ser tão quantitativo quanto possível. A ciência está baseada em medidas. O desafio é determinar qual medida é significativa. Ao mesmo tempo, é saudável explorar novas hipóteses. Após 50 anos de pesquisas, é óbvio que falharam todas as explicações simples para o fenômeno.
Fazendo uma síntese de suas obras, o senhor afirma que sua maior decepção seria constatar que os UFOs realmente são de origem extraterrestre. Poderia explicar melhor este pensamento e se atualmente ele ainda persiste? Não foi exatamente isso que eu disse. Falei que ficaria desapontado se os UFOs se mostrassem ser nada mais do que naves espaciais. Eu passei muito tempo ouvindo testemunhas de observações ufológicas e de supostos contatos com ETs, e o que elas descrevem não é uma espaçonave, e sim um fenômeno físico que pode surgir do nada, mudar de forma dinamicamente e esvaecer, tornando-se transparente a qualquer instante. Um objeto que faz tudo isso é muito mais interessante do que “simplesmente” uma espaçonave. Ele próprio afeta o tempo, podendo vir de qualquer lugar, em qualquer tempo, inclusive de nosso próprio planeta. Nós temos que amadurecer e abandonar o conceito de espaçonave, como era vista pelos filmes de ficção científica dos anos 50.
O senhor nega com convicção as alegações sobre UFOs acidentados, seres extraterrestres resgatados e outros fatos dessa mesma linha, que considera subcultura ufológica. Podem-se incluir nesta categoria as abduções e os implantes? Existem várias possibilidades para esta questão. Em meados da década de 60, quando defendi pela primeira vez o estudo dos contatos imediatos – especialmente dos relatos de aterrissagem envolvendo formas de vida como as que nós tínhamos nos arquivos franceses –, a maioria dos pesquisadores se colocou francamente contra a idéia. Eu me lembro de David Jacobs [Professor de história norte-americana na Universidade de Temple e autor de A Ameaça, de 2002] argumentando que este tipo de caso traria descrédito para as pesquisas que estávamos desenvolvendo. Naquela época, mesmo o Comitê Nacional de Investigações de Fenômenos Aéreos [National Investigations Committee on Aerial Phenomenon, NICAP] era cuidadoso ao publicar seus casos de pouso de supostos UFOs pela mesma razão. Então, fico contente em ver que casos de encontros imediatos de terceiro grau (CI-3) e de abdução estão agora sendo pesquisados seriamente. Tenho feito análises de resíduos materiais de casos de contatos imediatos, mas não diretos com ocupantes de UFOs. Alguns indicaram a presença de vários metais nas áreas atingidas. Recentemente, viajei à Costa Rica para colher amostras de água do Lago de Cote, onde um fotógrafo do governo viu o que parecia ser um grande disco voador. Quanto ao assunto dos acidentes com UFOs, ainda estou reservando minha opinião para o futuro. Eu vi os dados de ambos os lados sobre o assunto, porém não estou pronto para chegar a uma conclusão. Já sobre os implantes, por enquanto ainda não vi nenhuma evidência de que os objetos removidos das testemunhas sejam algo extraordinário. Os médicos que consultei sobre este assunto me disseram que dermatologistas estão acostumados a remover este tipo de objetos dos corpos das pessoas.
O que nós chamamos de nova Ufologia, aquela que busca uma “resignificação” do fenômeno, que tenta resgatar o Fio de Ariadne que se perdeu dentre tantos modelos e filosofias prontas, lança um olhar para um futuro ainda pouco definido. Quais são as perspectivas a médio e longo prazo? Existem relativamente poucos avistamentos de UFOs hoje, o que torna este momento ideal para um estudo tranqüilo da Ufologia. Vários grupos de pesquisa estão ocupados colhendo e organizando arquivos de fatos ufológicos históricos, enquanto outros estão expandindo os catálogos de casos computadorizados. Toda essa atividade nos ajudará a compreender melhor os padrões subjacentes do Fenômeno UFO. Qualquer redefinição do debate tem que começar a partir desse tipo de análise sólida.
Numa entrevista, o senhor disse que, no atual estágio de desenvolvimento humano, as perguntas se tornam mais importantes do que as respostas. Nesse contexto, o senhor diria que o Fenômeno UFO é um gerador autoconsciente de indagações? Ele trabalha como qualquer outro fenômeno da natureza. Os UFOs nos forçam a reconsiderar quem somos, qual é a história da humanidade e até a questionar o que chamamos de realidade física. Nesse sentido, o fenômeno é muito saudável.
Qual é sua opinião sobre o Caso Varginha? E qual é o acontecimento mundial que o senhor considera mais impressionante? Infelizmente, não viajei ao local do incidente de Varginha, então não tenho conclusões a oferecer. Prefiro falar apenas dos casos cujos locais de manifestação eu visitei, e cujas testemunhas encontrei e entrevistei. Em um caso como o de Varginha é crucial falar com os observadores em primeira mão e compreender o contexto social em que o fato ocorreu. Mas, veja, os casos que são muito impressionantes não são necessariamente os mais interessantes do ponto de vista científico. Eu procuro estudar casos que tenham potencial de nos ensinar algo novo sobre o Fenômeno UFO. Desta forma, me impressionei com o Caso Valensole, ocorrido na França, em julho de 1965 [Apresentado no livro Dossiê Cometa, novo lançamento da Biblioteca UFO. Veja Mensagem do Editor], e com o Caso Council Bluffs, que se passou nos Estados Unidos, em dezembro de 1977, porque em ambos os episódios as evidências são muito fortes. Mas eu teria a dizer que casos brasileiros verificados nas ilhas de Colares e Mosqueiro, no litoral fluvial do estado do Pará, foram os mais interessantes entre todos que estudei.
O senhor esteve no Brasil em 1988 investigando algumas ocorrências relacionadas ao fenômeno Chupa-chupa, que gerou a famosa Operação Prato. O que o senhor pensa sobre aqueles acontecimentos e sobre a casuística brasileira, de um modo geral? Aqueles casos permanecem bem latentes em minha mente. Eles apresentam uma combinação de fenômenos físicos com efeitos psicológicos e de ferimentos reais. Eu tive o privilégio de encontrar várias testemunhas dos fatos registrados durante a onda ufológica do Pará, em 1977, e um dos médicos que tratou delas. Minha esposa [Janine Vallée] e eu também passamos várias horas com oficiais da inteligência brasileira, que viram os fenômenos que ocorriam naquela localidade, incluindo o falecido coronel Uyrangê Hollanda, comandante da Operação Prato. Não há dúvidas sobre a seriedade e o escopo dos dados que aqueles militares coletaram durante a referida missão. Por outro lado, entre os melhores estudos de casos brasileiros que conheço está o desenvolvido por Bob Pratt, que publicou um livro sobre suas experiências [Perigo Alienígena no Brasil, código LIV-014 da Coleção Biblioteca UFO. Veja na seção Shopping UFO desta edição]. Eu escrevi o prefácio do livro e espero voltar ao Brasil para adquirir mais experiência sobre essa situação. Em contraste com os Estados Unidos, o Governo Brasileiro sempre manteve a mente aberta sobre o fenômeno, e isso é muito saudável.
Fazendo um exercício de imaginação, suponhamos que num futuro indefinido seja provado que não há nenhum tipo de vida extraterrestre. O que a humanidade terá ganho ou perdido nessas últimas seis décadas de pesquisa ufológica? Nós não poderemos encontrar provas de que não há vida extraterrestre, simplesmente porque o universo é grande demais. Os longos anos que dedicamos a esta pesquisa se provarão úteis de qualquer forma, porque nos forçam a pensar sobre a natureza da vida em si. Hoje a biologia nos ensina que a vida pode se adaptar a condições extraordinárias, que nós nunca julgamos ser possíveis. A astronomia nos ensina que moléculas complexas, incluindo alguns dos blocos construtores do DNA, podem existir no espaço sideral.
Em um de seus livros, o senhor escreveu que o cético, ao dificultar um estudo sobre o Fenômeno UFO mais organizado por parte do mundo acadêmico, mantém grande parte das pessoas na ignorância sobre o assunto, facilitando o surgimento de cultos e seitas. Como o senhor vê essa situação, passadas algumas décadas de sua afirmação? Os céticos constituem uma categoria psicológica fascinante, em minha opinião. Nós podemos discordar da interpretação que fazem dos avistamentos ufológicos, mas é difícil entender como alguém que se diz um cientista possa ignorar os dados e se recusar a estudá-los. Um dia, algum jovem sociólogo investigará as atitudes acadêmicas de rejeição ao Fenômeno UFO e descobrirá algo extremamente fundamental sobre a metodologia científica e seus preconceitos. É saudável aproximar-se do assunto ceticamente, mas a pessoa tem que estar preparada para fazer uma pesquisa mais profunda.
Teoricamente, é possível que a forma de consciência envolvida nas manifestações ufológicas – sejam elas extraterrestres ou não – é tão avançada ou estranha a nós que a questão de interação é realmente insolúvel. Afinal, nós sabemos que algumas questões matemáticas não têm respostas, de forma que esta não é uma situação nova
Hoje sabemos que muitas vezes os céticos ferrenhos são os que mais contribuem para a desinformação e o acobertamento da realidade do fenômeno ufológico, mesmo sem saberem que o estão fazendo. Em sua opinião, o que podemos realmente esperar dessa questão? Existe uma situação bastante perturbadora nesta questão que você aborda. Veja, na medida em que o fenômeno ufológico é sempre apresentado como uma manifestação puramente extraterrestre, nós podemos nunca chegar à verdade, e nos trancamos num dilema. Para muitos ufólogos e para a mídia em geral, um UFO é sinônimo de inteligência extraterrestre. Mas esta é apenas uma hipótese entre muitas que existem para explicar a origem e natureza dos objetos voadores não identificados. Uma vez que não existe prova de que o fenômeno seja de fato extraterrestre, na acepção legítima do termo, muitos cientistas se afastaram dele. Eles não querem ser parte de um acobertamento, mas o resultado de sua rejeição é o mesmo, porque contribuem para uma atitude acadêmica que refuta os dados. O corolário para eles é que, sendo os UFOs sinônimo de inteligência extraterrestre, e esta não tendo sido comprovada ainda, a conclusão é de que simplesmente não existem UFOs. Ora, isso é um absurdo!
Qual é sua opinião sobre o uso da hipnose na investigação de casos de abduções alienígenas? Estou preocupado com o uso da hipnose nesses trabalhos, devido ao perigo óbvio de reforçar ou plantar falsas memórias nos pacientes que tenham sido abduzidos ou que pensam que foram. Eu acho isso anticientífico e antiético. E o que é pior, algo que contribui para destruir os dados sólidos que nós estamos tentando recuperar e conservar sobre o Fenômeno UFO. Eu estudei 70 casos de abdução, tendo passado dois dias com Betty e Barney Hill e com o doutor Benjamin Simon, que conduziu as hipnoses em ambos. O doutor Simon foi taxativo em assegurar que a experiência do Caso Hill era real para Betty e Barney. Porém, nenhuma conclusão sobre a realidade física do encontro poderia ser esboçada a partir disso. Sua preocupação era a terapia que aplicava ao casal, não a pesquisa ufológica. Nos últimos anos, muitos ufólogos hipnotizaram milhares de abduzidos, e nós ainda não sabemos nada sobre a natureza do fenômeno. Minha impressão é que esta metodologia é errada.
O que o senhor tem a nos dizer sobre os círculos ingleses? Pelo que tenho visto, os efeitos que causam tais desenhos nas plantações daquele país poderiam ser produzidos por algum tipo de raio de energia direcionado a partir de uma nave pairando a certa altitude, um veículo que fosse pouco observável – não um satélite orbital, mas sim uma aeronave remota não pilotada ou algum dirigível sólido e pequeno. Parece plausível assumir a hipótese de que a inteligência militar esteja testando uma nova arma energética, e a está usando para fazer os desenhos. Entretanto, não sou um expert nesses sistemas, por isso mantenho a mente aberta a possibilidades.
Em seu livro Confrontations há o interessantíssimo relato do Doutor X, um ferido de guerra que após suposto contato com um UFO teria apresentado uma espantosa cura espontânea. Em sua opinião, poderia haver outra explicação para tal fenômeno que não a origem extraterrestre? Houve de fato uma relação entre a melhora clínica do Doutor X e o avistamento ufológico próximo à sua casa? Esta é uma pergunta interessante, mas os dados que eu tenho sobre o caso precisam permanecer confidenciais por mais algum tempo. Eu continuei a estudar o caso por anos, encontrando-me várias vezes com o Doutor X e sua família. Minha esposa e eu até passamos nossas férias com eles. A testemunha tem sido muito generosa em ceder seu tempo para essa investigação e quero respeitar seu desejo de manter certos detalhes do fato em âmbito particular. O incidente foi pesquisado por outros estudiosos internacionais também, dentre os quais Aimé Michel. Em 1958, o Doutor X servia no exército da França, quando foi ferido pela explosão de uma mina. Isso lhe causou deficiência no lado direito do corpo e fortes dores. Dez anos mais tarde, ele estava cortando lenha em sua casa quando fez um movimento em falso e se cortou na perna. A hemorragia foi intensa e logo o local inflamou. Ele foi tratado imediatamente, mas as dores na área do ferimento perduraram por algum tempo.
O caso do Doutor X parece fascinante. O que ocorreu em seguida? Na noite de 02 de novembro de 1968, ainda sofrendo seqüelas do recente acidente, Doutor X foi despertado pelo choro de seu filho e foi ao quarto para ver o que se passava. Qual não foi sua surpresa ao ver a criança de pé no berço e apontando para um clarão intenso que se movia no céu. Ele foi até a sacada e se deparou com dois grandes objetos discóides de cor prateada na parte superior, mas com o fundo lembrando as cores do pôr-do-Sol. O fenômeno se moveu para uma posição quase acima de sua cabeça e um facho de luz o atingiu em cheio. O Doutor X ouviu uma espécie de estalo e o objeto subitamente desapareceu. Em minutos, notou que não sentia dor alguma, nem do recente corte, nem do antigo ferimento de guerra.
O senhor tem sido criticado regularmente pela comunidade ufológica mundial por se abster de oferecer uma explicação cartesiana para os UFOs, como, por exemplo, sua procedência extraterrestre. Qual é a sua opinião atualmente? O método cartesiano começa com os dados e passa por um refreamento para se chegar a conclusões. Isso é exatamente o oposto do que a maioria da Comunidade Ufológica Mundial está fazendo para conhecer o Fenômeno UFO. Descartes disse: “Eu não direi que nada é verdade a menos que eu tenha evidências de que realmente é”. Quando eu me aproximei desse campo de estudos, nos anos 60, pensei que a hipótese extraterrestre era a melhor de todas as que existiam, e disse isso em meus primeiros dois livros. Mas fui forçado a mudar de opinião porque os dados que coletei contradizem esta hipótese. Se nós queremos persistir na concepção extraterrestre, devemos estar conscientes destas contradições. É assim que o método cartesiano funciona.
O cinema, de Contatos Imediatos do Terceiro Grau [1977] a ET [1983], e a televisão, de Arquivo-X [2000] a Taken [2002], exercem forte influência como veículos formadores de opinião. E em se tratando de UFOs, as seqüelas sociológicas costumam ser profundas. Na sua visão, essa é uma influência negativa ou positiva? A influência da expressão artística raramente é boa ou má, ela simplesmente reflete a imaginação da sociedade humana em um determinado momento. Steven Spielberg e outros diretores expandiram nossa visão do mundo através de sua arte, mas eu não creio que eles estão tentando influenciar as crenças sociais. Um antigo filme como Forbidden Planet [Planeta Proibido] permanece como um fantástico precursor neste campo.
Tive o privilégio de encontrar várias testemunhas da onda ufológica do Pará, em 1977, e um dos médicos que tratou delas. Minha esposa e eu também passamos várias horas com oficiais da inteligência brasileira que viram os fenômenos que ocorriam naquela localidade, incluindo o falecido coronel Uyrangê Hollanda, comandante da Operação Prato
No seu livro Messengers of Deception, o senhor aborda a figura do major Donald Keyhoe, que teria sido vigiado de perto pela CIA até sua morte. A obra de Keyhoe, The Flying Saucer Conspiracy [A Conspiração dos Discos Voadores, Henry Holt, 1955], causou um espanto inesperado nas pessoas que acreditam em UFOs, o que deve ter ajudado muito as agências nos quesitos desinformação e guerra psicológica. Dentro deste contexto, o senhor acredita que o doutor J. A. Hynek também foi um “útil descartável” para a Força Aérea Norte-Americana (USAF), mesmo sem saber? O mesmo teria acontecido com o senhor, em determinada época? Conforme nos tornamos menos ingênuos sobre o posicionamento dos vários governos neste campo, torna-se claro que as agências de inteligência têm um interesse real no monitoramento dos relatos ufológicos. Pesquisadores como o norte-americano Richard Dolan, que escreveu o livro UFO and the National Security States [UFOs e o Estado de Segurança Nacional, Keyhole Publishing, 2000], mostrou a extensão deste interesse e também seu abuso – eu escrevi o prefácio deste livro também. Está claro que vários governos, não apenas o dos Estados Unidos, têm usado o fenômeno e a crença popular nos UFOs para encobrir outras atividades. Por exemplo, as autoridades soviéticas realmente encorajavam as pessoas a acreditarem que havia UFOs numa certa região da extinta URSS, porque isso proporcionava uma explicação conveniente sobre alguns testes espaciais ilegais que lá eram realizados. O doutor Hynek e eu sempre estivemos cientes do potencial destas manipulações, e é por esta razão que também sempre nos recusamos a chegar a conclusões quando há a ausência de provas científicas. Em meu livro Revelations [Revelações, 1991], relatei o quanto Hynek e eu estivemos perto de fazer certas declarações, com a implicação de que o Pentágono então revelaria a prova da realidade ufológica. No entanto, nós nunca dissemos no que aquela prova consistiria, e nos recusamos a cooperar com o que acreditávamos ser desinformação. Muitos ufólogos criticaram esta atitude e a interpretaram como sendo muito tímida. Eu creio que os dados históricos mostrarão que nós estávamos certos em sermos cuidadosos.
Após tantos anos de pesquisa, de acesso a dados laboratoriais, a documentação e troca de informações com cientistas e pesquisadores renomados, o senhor chegou a alguma conclusão sobre a realidade física dos UFOs? Justifica-se tanto preconceito por parte da comunidade científica tradicional? Existe um círculo vicioso aqui. Nunca se fez ciência em Ufologia. Poucos cientistas – como Hynek e eu, os doutores Pierre Guerin e Claude Poher, na França, e os doutores James McDonald, Peter Sturrock, Richard Haines e McCampbell, nos Estados Unidos – usam seus conhecimentos de homens de ciência para abordar o assunto. Mas isso não tem relação com o que realmente poderia ser considerado um esforço científico multidisciplinar e competitivo para se compreender o Fenômeno UFO. Todos esses cientistas têm dirigido grandes esforços em pesquisas dentro de ambientes acadêmicos convencionais, mas nós nunca tivemos a oportunidade de fazer o mesmo com o fenômeno. E enquanto isso não for feito, não teremos condições de chegar a qualquer conclusão séria, e assim o preconceito continuará. A menos que a evidência se torne tão grande e incontestável que a opinião pública forçará uma mudança neste sistema. Uma das preocupações que deveríamos ter é que a primeira geração de cientistas que preconizou essa pesquisa está morta ou envelhecendo. Mesmo que seus arquivos sejam preservados, o que raramente acontece, suas idéias dentro da história e desenvolvimento da Ufologia estarão perdidas. Também existem muitos dados interessantes que coletamos, acumulamos e nunca foram publicados.
Quando eu me aproximei da Ufologia, nos anos 60, pensei que a hipótese extraterrestre era a melhor que existia, e disse isso em meus primeiros dois livros. Mas fui forçado a mudar de opinião porque os dados que coletei contradizem esta hipótese. Se nós queremos persistir na concepção extraterrestre, devemos estar conscientes destas contradições
Qual é sua opinião quanto ao estudo da Ufologia também sob os aspectos do “ver” e “sentir” os UFOs e os seres extraterrestres no que seriam a quarta, quinta e, quem sabe, até outras dimensões? Nós não sabemos quantas dimensões existem. Tudo que sabemos é que a simples noção de um universo quadridimensional de espaço-tempo não é suficiente para explicar efeitos físicos que conhecemos hoje. Quando sugerimos que os UFOs não devem ser simplesmente de outro planeta, mas que usariam um universo paralelo ou outras dimensões, a maioria dos ufólogos rejeitou tal tese como se fosse uma ridícula ficção científica. Naquela época, estas idéias eram marginais dentro da física, mas hoje são parte dos objetivos acadêmicos. O que acontece com a consciência humana quando ela funciona além das dimensões físicas conhecidas é uma questão muito interessante e ainda em fase de estudos. Parapsicólogos estão tentando desenvolver modelos de investigação desse funcionamento, especialmente com experimentos de visão remota, sendo realizados neste momento nos Estados Unidos e na Rússia, e com estudos de experiências de quase-morte. Minha impressão é de que necessitaremos desenvolver novas ferramentas de pesquisa antes de irmos além dos resultados estatísticos apresentados até agora. Sou muito impaciente com estatísticas!