
Considero-me uma pessoa privilegiada, relativamente à profissão escolhida. Com mais de vinte mil horas de vôo em linhas comerciais, tanto no Brasil como no exterior, foi-me possível ver o que muitos não viram, ao mesmo tempo em que aprendia a dar mais crédito a relatos que, ouvidos aqui e ali, atingiam por vezes o terreno do insólito, do quase inacreditável.
Foi nos ares que conheci Thomas Green Morton, um mineiro que começa a tornar-se conhecido no mundo inteiro graças à sua paranormalidade, a qual tem nos efeitos físicos seu aspecto mais importante. Passageiro em aviões da VASP, Thomas Green Morton surpreendia todos a bordo com demonstrações fantásticas, como passar a mão sob diversas moedas, sem sequer tocá-las, e, num verdadeiro passe de mágica, transformá-las em reluzente esfera metálica, tão perfeita que poderia deslizar cm um plano nivelado sem desviar-se da trajetória retilínea. Os fenômenos que envolvem a pessoa de Thomas Green Morton já estão mais do que bem comprovados, o que não significa que alguém já tenha conseguido explicá-los.
Foi a bordo de aeronaves que tive a oportunidade de observar que os fenômenos insólitos e não explicáveis — pelo menos à luz do conhecimento racional — ocorriam mais freqüentemente do lado de fora do aparelho. Os pilotos comerciais representam um potencial de informações ufológicas de elevado nível, porém muitos são os fatores que inibem completamente uma possível abertura nesse campo. Inicialmente, nem todos estão cm condições de assumir, publicamente, como eu o fiz, o envolvimento com um fato de natureza ufológica. Cada pessoa teve a sua própria formação, seja em âmbito familiar, religioso, social ou intelectual, que forma um verdadeiro bloqueio interior, em muitos casos inarredáveis. Por outro lado, o receio de ser taxado como portador de problemas psicológicos é uma realidade na aviação, podendo isso, se concretizado, tornar-se uma estigma real que pode acompanhar a ficha profissional de um piloto, tal como a folha de antecedentes expedida por um Tribunal segue os passos do delinqüente e o tolhe completamente. Por isso, antes de mais nada, envolver-se publicamente em um caso semelhante ao do Vôo 169 representa um ato de coragem pela consciência do efeito na esfera profissional. Poucos podem fazê-lo, dentre estes, aqueles que já estão às portas da aposentadoria. No meu caso específico, diferente seria se ainda estivesse no início de minha carreira de piloto. Talvez a coragem, há vinte anos, não fosse tão forte que me levasse a relatar, em público, um episódio como o do Vôo 169. Tudo fica mais difícil, compreensível sob diversos prismas, mas não justificável.
Nos vôos que realizava, não me fixava somente nos painéis de instrumentos e comandos. Fazia urna espécie de varredura ótica pelo espaço aéreo, não só como rotina de piloto, mas também tentando observar qualquer coisa interessante que pudesse ocorrer naquele mundo misterioso e imenso. O encantamento que a natureza fazia desfilar continuamente em todos os ângulos e momentos era o meu prêmio, fruto do privilégio de poder voar. Quantas nascentes e poentes pude presenciar através das janelas de aviões cruzando os ares a mais de dez mil moiros de altitude! Nuvens que formavam imagens várias, esculpidas pelos ventos. Florestas, rios, praias moldadas pelo não menos misterioso mar, tempestades, raios, chuvas, arco-íris e tantas outras maravilhas a que, como pilotos, temos o direito de ver e, às vezes, o dever de enfrentar. Os momentos de constrição maior ficavam por conta dos vôos noturnos. Livre dos comandos e instrumentos, graças ao piloto automático, era possível voltar-me, ainda que por poucos instantes, ao firmamento pontilhado de estrelas, planetas e outros sinais luminosos. O céu tornava-se o meu oratório, meu “Sanction Celestial”. Inúmeras vezes dirigi meus pensamentos, na forma de preces, a algum lugar naquela imensidão, na esperança de que algo ou alguém os ouvisse. Muita beleza, muitos sonhos e muitas expectativas. Era uma outra dimensão, quase que inconcebível para aquele que jamais tenha retirado os seus pés do chão. Dos céus fiz o meu mundo, uma forma de prolongamento de minha pessoa. E os céus, como tive possibilidade de verificar, corresponderam às minhas expectativas, indo até muito mais além do que eu poderia imaginar e transformando totalmente a minha vida no chão.
No ano de 1963, em meio a esse quadro, ocorreu o meu primeiro incidente ufológico, Como segundo-piloto de um velho Curtiss Comander C-46, um aparelho bimotor que fez história na aviação comercial brasileira, fazia a conferência das folhas de navegação, examinando a nossa posição ao longo da rota Teresina (PI) — Fortaleza (CE). Minha tarefa não exigia uma observação visual externa, razão pela qual meu companheiro, comandante Clodoaldo, era quem conduzia o aparelho. Tendo reparado que este estava fitando constantemente um ponto fora da aeronave, perguntei-lhe o que acontecia. Depois de demorar-se por alguns momentos, respondeu:
“Olha só, Britto, aquele ponto luminoso na linha do horizonte!”
Era noite clara, a lua não estava cheia e naquela região, como 6 normal em todo o Nordeste, o céu é limpo e sem quaisquer traços de poluição. O horizonte, resultado do encontro do céu e mar, era perfeitamente visível. Realmente, um ponto luminoso descrevia trajetórias retilíneas e paralelas ao horizonte, com perfeita definição. Um perfeito zigue-zague, extremamente veloz e com paradas instantâneas seguidas de acelerações bruscas. Ia para a direita e para a esquerda, alternadamente, sem alterar o nível de sobrevôo. Parecia estar vasculhando algo de importante naquela região marítima. Sabíamos que naquele setor só havia água. Entreolhamo-nos calados e, após, retornamos à observação do fenômeno. Alguns momentos mais tarde, o comandante Clodoaldo retirou-se da cabine, deixando-me sozinho e intrigado a observar o estranho zigue-zague do objeto luminoso, cujo comportamento feria por completo todos os conceitos de aerodinâmica que eu conhecia. O objeto, para meu espanto, sumiu repentinamente, logo depois.
Não houve qualquer notificação oficial do fato e nem soubemos se outras pessoas também tiveram a oportunidade de ver o insólito trabalho de vasculhamento por parte do objeto luminoso. Tudo ficou entre nós, com apenas alguns breves comentários feitos em nosso círculo profissional mais próximo. Anos mais tarde, depois da divulgação dos fatos relativos ao Vôo 169, ao reencontrar o meu antigo companheiro de aviação, relembramos aquela noite e só então batizamos aquele objeto luminoso como um UFO.
No ano de 1975, quando já havia alcançado o posto de comandante, ocorreu o segundo incidente ufológico. Viajava no sentido de Campo Grande (MS) — São Paulo (SP), pilotando um quadrimotor Viscount 827, turbo-hélice. Quando já havíamos cruzado a divi
sa entre os dois Estados, o primeiro oficial, cujo nome não mais foi possível recordar — razão por que peço-lhe desculpas, caso venha a ler este trabalho — informou a presença de unia esfera prateada a uma altura de 4.000 pés (1.200 metros) acima de nosso nível de vôo, que era de 2.750 metros. Imediatamente procurei verificar com meus próprios olhos o estranho objeto, claramente visível no dia claro e límpido, excetuando-se algumas nuvens alto-cúmulos. Realmente, unia grande esfera prateada, que não possuía qualquer semelhança com aeronaves ou balões meteorológicos, estava acima de nós!
Ficou bem evidenciado que o estranho objeto seguia o Viscount da VASP, já que ele permanecia sempre na mesma posição relativa. Portanto, a sua velocidade era de 650 quilômetros por hora, a mesma que desenvolvíamos. Até mesmo os desvios necessários que fazíamos ao longo da rota, para evitar os alto-cúmulos, eram acompanhados pela esfera prateada. Resolvi chamar o radar de Brasília, narrando à ocorrência. Como resposta, fui informado que era impossível, daquela distância, acompanhar a ocorrência, pois o radar não possuía alcance para tanto. Por momentos, lembrei-me de 1963 e do meu companheiro Clodoaldo. De novo, outra ocorrência estranha e sem possibilidade de trazer à luz qualquer coisa que a explicasse! Embora sabendo da inutilidade de registrar o fato, solicitei ao radar de Brasília que consignasse o prefixo da aeronave, tripulantes, número do vôo e rota, horário e descrição da esfera. Tenho certeza de que, em algum arquivo da Força Aérea Brasileira, este acontecimento deverá estar devidamente registrado, muito embora não possa precisar se alguma providência foi tomada, como a de enviar um caça a jato no encalço da esfera. Depois de feitas as comunicações ao radar de Brasília, o objeto desapareceu. Não me recordo de qualquer alteração em nossos instrumentos, interferências na telecomunicação ou mesmo nos motores. Assim, já eram duas as ocorrências com características ufológicas que eu havia presenciado ao longo de minha carreira.
Três anos mais tarde, em 1978, quando já fora promovido a comandante de jato puro, podendo operar as aeronaves Boeing 737, ocorreu o terceiro incidente ufológico. Esse último fato aconteceu no final do mês de abril, quando efetuava um curto vôo entre Belo Horizonte (MG)-Rio de Janeiro (RJ). Decolamos de Belo Horizonte por volta das 20h15 horas, com subida cm rota autorizada pelo controle local. Noite tranqüila, céu estrelado e sem nuvens, eu e o primeiro oficial desempenhávamos nossas tarefas de navegação sem quaisquer problemas. Antes que cruzássemos a serra, surgiu, bem à nossa frente, um forte ponto luminoso, o qual, surpreendentemente, descrevia trajetórias circulares e parabólicas ao longo do que seria a nossa rota de vôo. Era um foco compacto, azulado e amarelado, de mesma intensidade que uni farol de avião, porém dotado de incrível rapidez em suas evoluções. Rodava em altos e baixos níveis de vôo, mais parecendo uma louca acrobacia aérea do que um padrão normal de vôo. Assumi os controles do aparelho e liguei o piloto automático para poder examinar melhor o objeto. Era mesmo algo impressionante o seu desempenho: sucessivas voltas em torno de um eixo imaginário, parecendo que iria chocar-se com o solo.
Tentei contato com o controle de Belo Horizonte, indagando se havia algum caça a jato evoluindo naquela região. Normalmente nós seríamos informados, antes mesmo da decolagem, caso isso viesse a acontecer. Mas, por outro lado, também não seria possível autorização para manobras dessa natureza em uma aerovia (7) tão movimentada como a que liga o Rio de Janeiro a Belo Horizonte. A consulta ao controle de Belo Horizonte tinha somente a finalidade de cumprir uma espécie de obrigação, uma descarga de consciência. Intimamente, já sabia o que era aquilo. As duas ocorrências anteriores, em 1963 e 1975, haviam fornecido elementos mais do que suficientes para classificar aquilo que evoluía loucamente à nossa frente como sendo outro UFO!
Parece que com a minha comunicação ao controle de Belo Horizonte, consegui romper um bloqueio por parte de outras tripulações que cruzavam a mesma área. Talvez o silêncio geral fosse causado pelos receios comentados anteriormente, como ser chamado louco ou alucinado, de ser acusado de não ter o mínimo de bom senso exigível de um comandante ou, até mesmo, de estar alcoolizado. Logo depois de minha comunicação com o controle de Belo Horizonte, ouvi diversas mensagens desordenadas: “Nós também estamos observando”, dizia algum piloto. “Está sobre Governador Valadares”, disse alguém. “Nós também confirmamos”, falou outro comandante, etc…
Não é possível recordar quantas foram as mensagens e o exato teor das mesmas. Delas, apenas ficaram registrados, em minha memória, o apuro e estado emocional de todos os que entraram na fonia, Além de nossa aeronave, que fazia o vôo 021, estavam nas proximidades, talvez até em pontos mais privilegiados para a observação que o nosso, um Lear-jet da Líder Táxi Aéreo, um avião da Cruzeiro do Sul, um da Transbrasil e outro da VARIG, este último procedente de Brasília. Também acompanhava o séquito de espantados observadores, uma aeronave da Pan American, não sabendo se tal aparelho era de carga ou de passageiros.
Depois de cinco a sete minutos de expectativa, o controle de Belo Horizonte mandou que entrássemos em contato com o radar de Brasília (8). Feito isso, solicitei ao operador que informasse se era possível ver o objeto em sua tela de radar. Como resposta — a segunda em meus vôos — fui informado que não era possível detectá-lo. Houve, a seguir, um silêncio de cerca de dois minutos, após o que solicitei o registro do incidente, Para isso, forneci o número do vôo, horário, meu nome, prefixo da aeronave e coordenadas do fato, no que fui seguido por todos os demais comandantes que cruzavam a região, uma atitude, considero, insólita para a aviação comercial, já que sempre existe o risco de que a interpretação do fato seja mais estranha do que o próprio objeto observado…
A trajetória do objeto, sua velocidade, sua maneabilidade operacional, tudo compondo uma afronta aos conceitos e leis aerodinâmicas, iria transformar-me em uma pessoa diferente. Veio-me a certeza de que, dali para diante, eu jamais seria o mesmo. Decididamente, o germe da mutação interior que atinge a todos os que se questionarem acerca dos fenômenos ufológicos, havia penetrado em mim. E tal germe não possui fraquezas de espécie alguma.
Teria eu a coragem de enfrentar a opinião pública, o ambiente profissional, meus amigos, minha família, minha reputação como comandante de aviação, numa próxima ocorrência? Reuniria coragem para rebater argumentos contrários que certamente viriam calcados no mais puro conhecimento científico? Sairia ileso, em termos emocionais, de uma situação dessas?
O caminho para o que viria a ser conhecido como o “Incidente do Vôo 169” estava aberto. Estruturou-se em meu íntimo a forte convicção de que os falos presenciados ao longo de minha carreira eram mais do que suficientes para enfrentar a opinião pública e tudo o mais que viesse. Faria, com toda a certeza, o que a minha consciência há muito ditava, embora até então eu relutasse em cumprir suas ordens sutis. A Ufologia, a partir do Vôo 021, assumia um novo papel em minha vida. Talvez mais do que isso, tomava-se uma nova forma de viver, alteradora, por completo, de todos os prismas pelos quais eu percebia o mundo. Em conseqüência, novos objetivos interiores surgiram. Senti-me infinitamente insignificante perante o poder demonstrado pelos UFOs, mas, ao mesmo tempo, também cresci infinitamente. Foi por essas razões que os capítulos precedentes continham considerações de natureza quase que espiritual, aparentando, por vezes, um distanciamento dos objetivos deste trabalho. Os UFOs não possuem apenas a capacidade de bloquear nossos fornecimentos de energia elétrica, como foi (possivelmente) a causa do grande blecaute de Nova Iorque, Paralelamente aos resultados físicos, nossa estrutura mental, organizada em termos puramente humanos, é obrigada a sofrer alterações que possam permitir a absorção de novos elementos, principalmente quando estes contrariam tudo o que conhecemos e acreditamos.
Assim, embora cu esteja decepcionando aqueles que esperavam ver neste trabalho uma verdadeira coletânea de elementos de pura casuística, ou seja, inúmeros relatos de encontros nos céus, acredito ser esta a minha principal missão no campo da Ufologia. Nosso passado histórico é repleto de manifestações ufológicas que, perdidas no tempo, já não reúnem condições de serem decifradas. Por isso, não podemos correr o risco de desperdiçarmos o que acontece aqui, agora, neste momento. As oportunidades são muitas. Falta apenas a coragem de enfrentar as correntes opostas e que estão em nosso próprio meio. O fenômeno ufológico surge neste século de uma forma que dá a entender que deseja ser decifrado, que o seu enigma está pronto para ser entregue ao homem. Mas ele exige de nós a coragem e uma abertura interior, a nível espiritual, muito grande. Se ele contraria tudo o que conhecemos e acreditamos, o arcabouço intelectual e espiritual de que dispomos será por demais estreito para suportar, sem traumas, a nova visão universal que ele certamente trará consigo. Tudo, portanto, dependerá de nós mesmos.