A idéia de que espaçonaves podem navegar rapidamente através do universo usando buracos negros como portais de alta velocidade é um antigo clichê da ficção científica. Mas, ultimamente, o consenso entre cientistas é de que buracos negros são tão destrutíveis que espaçonaves seriam transformadas em migalhas subatômicas se seus pilotos tentassem usá-los. Então, novamente, talvez não seja a hora de se falar no assunto. Mas, de qualquer maneira, um novo estudo da Universidade de Utah, dirigido pelo físico Lior Burko, um israelense de 34 anos, levanta a possibilidade de que esses corpos celestes não destruiriam as coisas que a ele se acercariam. Assim, o potencial de viagem pelo hiperespaço permanece em aberto.
“É uma possibilidade real que os buracos negros possam ajudar-nos a viajar a locais remotos do universo, ou a outrosuniversos”, disse Burko. Para ele, isso dependeria da topologia do universo, algo que não conhecemos bem. “Não estou discutindo se é uma coisaprática ou não, mas, talvez daqui a mil anos, com certeza será mais simples”. No esquema de Burko, buracos negros podem ser portais para outros buracos, os de minhoca. Estes seriam construções teóricas equivalentes a túneis ou atalhos entre pontos distantes no universo, que se distinguiriam em diferentes tempos ou mesmo em diferentes universos paralelos.
As idéias de Burko não são novas. Buracos de minhoca foram popularizados pelo físico Kip Thorne, nos anos 80. Eram o meio de transporte interestelar da série Contato, de Carl Sagan. Mas estudos subseqüentes sobre eles sugeriram que seria impossível utilizá-los como portais. O interior dos buracos negros são infinitamente densos, de maneira que eles exerceriam destruição maciça a corpos que nele adentrem. “Seriam como marés distorcendo objetos que se aproximem, rasgando-os em suas partículas subatômicas”, disse ainda Burko.
Curiosamente, é o interior infinitamente denso destes misteriosos corpos celestes que dá a eles seu potencial para facilitar viagem no tempo e espaço. Dentro de um buraco negro, o tecido do universo entra em colapso num ponto de curvatura infinita, conhecido como singularidade tempo-espaço, onde as leis da física não se aplicam mais. É o equivalente a dizer que um buraco negro altera a estrutura do universo de forma irreversível. E há muitos por aí. Quando se interligam, formam canais que são os tais buracos de minhoca [Do inglês wormholes]. É através desses canais que, teoricamente, uma nave interplanetária suficientemente resistente à gigantesca pressão viajaria de um ponto a outro do universo. Um atalho e tanto.
Foi o mesmo Burko quem recentemente sugeriu que alguns buracos negros podem não ser tão destrutivos como outros. “Sob certas circunstâncias, podem até agir como aberturas para buracos de minhocas”. Seus trabalhos anteriores comprovaram que singularidades mais fracas estão presentes em buracos negros de uma espécie peculiar, os rotativos. Num artigo publicado na revista Physical Review Letters, o cientista alega que, sob certas circunstâncias, podem existir singularidades híbridas, compostas de um setor forte, que é destrutivo, e um setor fraco, que não é. Qualquer astronave que entrasse no setor fraco poderia, em tese, passar através dele sem ser danificada. Par isso seria necessário um grande equilíbrio e controle por parte de seus eventuais pilotos. Tudo é teórico, é claro, mas a possibilidade de uma singularidade fraca, se confirmada, aumenta o potencial para se usar buracos negros para viagem interestelares. “No momento, este tipo de viagem pelo hiperespaço não está descartada”, disse Burko.
Já o físico Richard Gott, autor de Time Travel in Einstein’s Universe [Viagem no tempo num universo de Einstein], disse que hipóteses como essas abrem possibilidades interessantes. “Uma singularidade fraca pode ser um atalho do atalho. Acertá-lo representa pular para uma nova região no tempo, algum lugar muito distante ou talvez outro universo”. Burko acrescenta que sua teoria se baseia em presunções não provadas, e que mais trabalho deve ser feito. Ele diz que pouco é sabido sobre a gravidade quântica – casamento da física quântica com a teoria clássica da gravidade – e que leis físicas ainda não conhecidas podem tornar viagens hiperespaciais impossíveis.
“E mesmo a idéia de viagens como essas sejam possíveis, fazê-lo ainda está longe de nossas capacidades”. Para exemplificar isso, Burko disse que um buraco negro no centro da Via Láctea pode ser um candidato a portal interestelar, mas está a 26 mil anos-luz de distância de nós. Mesmo viajando a velocidade próxima à da luz, o que é impensável, levaria ainda 30 mil anos para chegarmos até este portal.