A Ufologia Brasileira nasceu brilhantemente buscando a ciência. Desde os nossos ufólogos pioneiros, os pesquisadores vêm elaborando protocolos de investigação que são a aplicação da razão a uma classe de manifestações desconhecidas. E hoje não é demais afirmar que o Fenômeno UFO foi um tema de investigação do que era não identificado. Porque, graças ao acúmulo de saber conseguido em décadas de trabalho, reunimos hoje certo número de características que já identificam o objeto de nossas atenções.
A primeira destas identificações é a de ser algo que se manifesta de maneira inteligente e multifacetada, que o investigador não tem a prerrogativa nem de provocar, nem de repetir em laboratório de maneira controlada. Aí começam os problemas da Ufologia com as ciências exatas, que, surpreendentemente, não aceitam as características fundamentais do objeto a conhecer — como se os métodos de qualquer ciência não fossem forjados a partir das características daquilo que se investiga. As ciências humanas também têm conflitos com as características fundamentais da Ufologia, pois os fenômenos que ela estuda igualmente não podem ser provocados ou repetidos em laboratório.
Seria a Ufologia uma “ciência em construção”, que precisaria convocar, como fazem as demais, outras áreas do conhecimento para a compreensão da manifestação da presença alienígena na Terra, esta que, por sua vez, se apresenta de múltiplas maneiras e em várias dimensões do entendimento humano? E seria uma “ciência em construção” porque exigiria, ainda, a aplicação de inúmeros métodos de abordagem das diferentes facetas e dimensões do seu objeto de estudos?
Ciência e espiritualidade
Existe um aspecto do Fenômeno UFO complicador e que invalidaria toda a dita Ufologia Científica, e ele é a chamada Ufologia Espiritualista ou Mística, como antes era designada. Isso porque aí o fenômeno é apreendido por meio de experiências pessoais, nas quais o sujeito é obrigado a elaborar um sistema de compreensão que só pode ser compartilhado com outras pessoas se essas acreditarem na informação formulada. Trata-se, então, de um conhecimento subjetivo, que não vale para aqueles que nele não creem.
Convocar a crença leva, evidentemente, a uma série de derivações inaceitáveis, como a emergência de contatados que exploram de diversas maneiras a boa-fé das pessoas, causando, talvez, o maior desserviço ao progresso do conhecimento ufológico — cujo objetivo é desvendar uma realidade que diz respeito a toda a humanidade. Assim, nada é mais salutar para o avanço da “ciência ufológica em construção” do que o alentado debate aberto recentemente pelo editor da Revista UFO A. J. Gevaerd sobre dois grandes problemas de sua fase contemporânea: sua indefinição científica e o lugar do entendimento do lado espiritual do Fenômeno UFO.
Esse debate inspirou a entrevista que se segue, com o professor e pesquisador Fernando M. Araújo-Moreira, para acrescentar e balizar a reflexão sobre a “ciência ufológica em construção”. A ideia é ainda mais robusta e consiste em veicular, em uma próxima edição da UFO, uma entrevista com um respeitável ufólogo espiritualista, ainda a ser definido, com o objetivo de confrontar ideias e avançar no debate.
Ciência e tecnologia
O entrevistado desta edição é um ardoroso defensor desses preceitos e acredita que, por ser ainda nova, a Ufologia tem muito chão pela frente até se tornar uma ciência. Com graduação em engenharia de materiais e doutorado e pós-doutorado em física, realizado entre 1995 e 1998 na Universidade de Maryland, no Estados Unidos, o doutor Araújo-Moreira é, entre suas outras atividades, professor titular do Departamento de Física da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Nascido no Uruguai, abraçou o Brasil como sua pátria há décadas.
FONTE: GETTY IMAGES
Para o entrevistado, a Ufologia tem que ser praticada na seara da ciência, e não deve ser misturada à fé e a dogmatismos
Homem da ciência e criador do curso de Engenharia Física, que hoje prospera em inúmeras universidades brasileiras, nosso entrevistado é também mestre reiki, mestre maçom e mestre templário, portanto, também um profundo espiritualista. Seus conhecimentos e estudos abrangem uma vasta gama de assuntos e interesses, entre os quais se encontra a Ufologia — assunto que, segundo ele próprio, “lhe faz brilhar os olhos”. Seu currículo invejável e suas experiências de vida o gabaritam para falar com propriedade sobre o tema e seus rumos atuais, coisa que faz com entusiasmo.
Ponderado e com os pés bem plantados no chão, o professor Araújo-Moreira vê esses 70 anos de estudos do Fenômeno UFO de modo muito prático e objetivo, e não tem qualquer dúvida ao afirmar que, para começar a trilhar seu caminho rumo à elevação à categoria de ciência, a Ufologia precisa “ser absolutamente objetiva, isso é, sem nenhuma subjetividade, e rejeitar veementemente a influência de qualquer tipo de crença”. E que, da forma como o mundo está hoje, “o que não for cientificamente comprovado, a princípio não possui crédito e não é confiável”.
Searas ainda desconhecidas
A visão de nosso entrevistado é extremamente rica e detalhada sobre quais são os rumos e os caminhos que a Ufologia precisa seguir para conseguir se firmar em bases concretas como estudo legítimo, fazendo com que sua imensa importância seja reconhecida e suas pesquisas possam florescer. Ela é, e sempre será, um ramo multifacetado do conhecimento, abrangendo searas ainda desconhecidas e, muitas vezes, beirando o chamado “conhecimento limite”.
O que veremos a seguir é mais do que uma entrevista, é uma aula sobre o desenvolvimento da ciência e a forma como todos podemos contribuir para uma pesquisa ufológica séria e bem-feita, tabulando dados e deixando que outros participem e testem aquilo que concluirmos em nossos estudos. Quem pesquisa Ufologia lida com o imponderado e com o mistério, e a única forma de esclarecê-lo é com método científico e muita seriedade.
Observação do editor: Por seu valioso conteúdo, esta entrevista será excepcionalmente mais longa do que o normal.
Qual é a sua visão da ciência?
Antes de tudo, é necessário esclarecer que as ciências que neste momento vou discutir são as exatas, e não outras, como as sociais, políticas, ocultas etc. Concordo que a Ufologia Brasileira se encontra hoje em uma encruzilhada, mas não necessariamente associada apenas à própria complexidade do Fenômeno UFO. Acredito que essa situação se deva mais ao fato de que nas últimas décadas o mundo mudou muito, principalmente em relação aos novos recursos que a ciência e a tecnologia colocam hoje à nossa disposição, e que não são utilizados em toda a sua extensão, nem com todo o seu potencial, por aqueles que trabalham com Ufologia. Nesse contexto, para mim é muito clara a necessidade de separar a Ufologia Científica — baseada exclusivamente no método científico — de outras, principalmente daquelas relacionadas a conceitos religiosos, devendo ser absolutamente objetiva, isto é, sem nenhuma subjetividade, e rejeitando veementemente a influência nela de qualquer tipo de crença.
Como fundamenta sua posição?
Veja, no mundo atual, caracterizado por intensa globalização e forte industrialização, cabe à ciência dar o aval para praticamente tudo o que representa uma tecnologia ou um bem de consumo em prol do progresso humano. Assim, o que não for cientificamente comprovado, a princípio não possui crédito e não é confiável. Mas, sabemos que isso mudou somente a partir do século XVIII. Até então, o principal discurso legitimador cabia quase que exclusivamente à
Igreja, com sua doutrina de fé em um Deus único como sendo superior à razão. A partir desse momento, o desenvolvimento da ciência e do método científico, que culminara com a Revolução Industrial, deu início à chamada Secularização, definida como o momento em que a ciência tira a religião de seu pedestal de maneira definitiva, e ela deixa de ser a guia absoluta da conduta humana. Por meio desse processo, a fé em Deus foi substituída pela fé na razão, dando lugar ao chamado Iluminismo ou “século das luzes”, que se difundiu pela Europa por meio de pensadores como John Locke, Voltaire e Jean-Jacques Rousseau. A Ufologia atual precisa passar pelo mesmo processo de secularização e separar ciência e crença.
A Ufologia precisa ser absolutamente objetiva, isso é, sem nenhuma subjetividade, e rejeitar veementemente a influência de qualquer tipo de crença. Da forma como o mundo está hoje, o que não for cientificamente comprovado, não possui crédito e não é confiável.
De fato, temos visto um avanço considerável da ciência.
Sim. Ao longo dos séculos, o progresso humano em todos os aspectos — inclusive moral e ético — é inegável, embora certamente esse avanço venha sendo muito mais intenso nas áreas científicas e tecnológicas do que nas humanas. Em qualquer campo do conhecimento, o processo de estudar, entender, aprender e progredir é um sacrifício quase indescritível, mas estamos no caminho certo. Provavelmente, caminhando mais lentamente do que muitos desejaríamos, mas é o caminho certo.
Poderia nos dar um exemplo?
Apenas há 88 anos o médico e bacteriologista escocês Alexander Fleming descobriu a penicilina, que está disponível como fármaco há apenas 76 anos, desde 1941. Nós, humanos, demoramos ao redor de 1.500 anos para duplicar a população mundial, passando de aproximadamente 350 milhões de pessoas há 2.000 anos, para 700 milhões na Idade Média. Na década de 60, quando eu nasci, éramos ao redor de 3 bilhões de seres humanos, e hoje, decorridas apenas seis décadas, ultrapassamos a assustadora marca dos 8 bilhões, passando de uma expectativa de vida de pouco mais de 40 anos, há 2.000 anos, para mais de 80 anos nos dias de hoje.
Nem tudo saiu como esperado, não é?
Bem, vejo que certamente, e seguindo a inseparabilidade entre o bem e o mal, algumas coisas derivadas do conhecimento científico têm sido aplicadas de maneira errada. Mas, em linhas gerais, o progresso que alcançamos é indiscutível. E quem são os grandes responsáveis por esse progresso? A ciência e os cientistas que descobrem e os engenheiros que fazem dessa descoberta um bem de consumo e de bem-estar. Por isso acho injusto, descabido e de uma ignorância ímpar alguém dizer que não confia nos cientistas. Esses indivíduos deveriam ser coerentes, parar de usufruir tudo o que significa progresso e qualidade de vida e voltar a viver nas cavernas sobrevivendo da caça e da pesca! Essa ciência progressista permitiu a nós, humanos, chegarmos até aqui e conhecermos desde objetos localizados a 10 bilhões de anos luz até as profundezas do átomo a apenas um fentômetro [10-15m], abrangendo mais de inacreditáveis 40 ordens de grandeza.
Esta é a ciência que a Ufologia necessita?
Sem dúvidas. É essa ciência — que tem nos permitido alcançar conquistas inimagináveis — que temos que usar como fundamento para a Ufologia Científica, dando a ela um choque de qualidade e, principalmente, de credibilidade nos meios mais refratários a ela, tais como o acadêmico. A Ufologia só tem a ganhar.
Mas em que consiste a ciência que o senhor menciona?
Para iniciar essa explicação, vou considerar a diferença entre ela, o conceito de fé e o conceito de pseudociência. Fé é um termo que significa confiança, crença, credibilidade — é um sentimento de total crença em algo ou alguém, ainda que não haja nenhum tipo de evidência científica que comprove a veracidade da proposição em causa. Ter fé implica em uma atitude contrária à dúvida e está intimamente ligada à confiança. De acordo com a sua etimologia, a palavra fé tem origem no termo grego pistia, que indica a noção de acreditar, e no termo em latim fides, que nos remete para uma atitude de fidelidade. E, é claro, no contexto religioso, a fé é a virtude daqueles que aceitam como verdade absoluta os princípios difundidos por sua religião, qualquer que seja ela.
FONTE: ARQUIVO UFO
Para o entrevistado, a complexa fenomenologia ufológica deve invariavelmente ser tratada com o rigor do método científico
E a pseudociência?
Esta, por outro lado, é um conjunto de crenças ou afirmações que se considera equivocadamente como tendo base ou estatuto científico, dando lugar ao que alguns chamam de pseudosofia. Também é possível definir uma pseudociência como um conjunto de teorias, métodos e afirmações com aparência científica, mas que partem de premissas falsas e/ou que não usam métodos rigorosos de pesquisa. Levando-se isso em conta, e a partir do que definirei como ciência, logo vão ficar claros alguns conceitos, como o de que na ciência se procura evidência onde quer que ela possa estar. Já na fé e/ou nas pseudociências se começa por elaborar uma conclusão e só a partir daí se busca uma confirmação.
Mas a ciência sempre parte de uma premissa cética, é verdade?
Sim, a ciência adota sempre o ceticismo, enquanto na fé e/ou nas pseudociências sempre há uma hostilidade aos céticos. Igualmente, a ciência usa terminologia precisa e com definições claras, quando na fé e/ou nas pseudociências se usam jargões vagos e evasivos com o objetivo claro de causar confusão. E tem mais: na ciência as alegações são cautelosas e temporárias, enquanto na fé e/ou nas pseudociências as alegações são grandiosas e estão muito além das evidências.
O que mais pode nos dizer sobre a diferença entre ciência e fé?
Muito. Por exemplo, a ciência considera corretamente todas as evidências e argumentos. Já na fé e/ou nas pseudociências são consideradas apenas aquelas evidências favoráveis, confiando-se basicamente em provas testemunhais e não em provas materiais. A ciência utiliza métodos rigorosos e reproduzíveis, quando na fé e/ou nas pseudociências se utilizam, em geral, métodos falhos e não reproduzíveis. E há mais. Na ciência, os cientistas trabalham em conjunto com os seus pares e com a comunidade, enquanto que na fé e/ou nas pseudociências, dissidentes trabalham solitariamente e em isolamento, sem o submetimento de suas teorias e de seus achados a uma avaliação cega pelos seus pares e, principalmente, pela comunidade científica.
Enfim, a ciência é lógica.
Exato, a ciência considera cuidadosamente a lógica, ao contrário do que ocorre na fé e/ou nas pseudociências, quando a lógica usada é inválida e inconsistente. Da mesma forma, a ciência pode mudar a cada nova evidência, o que não acontece na fé e/ou nas pseudociências, que são dogmáticas e inflexíveis. Enfim, há uma razoável diferença entre estas coisas e por isso se vê o quão importante é que a Ufologia se baseie em preceitos exclusivamente científicos, com absolutamente nada da subjetividade que se vê na fé e/ou nas pseudociências.
Perfeita colocação. Por favor, continue.
Veja, quero deixar claro que em nenhum momento tenho a intenção de desqualificar, ofender e muito menos menosprezar atividades religiosas e/ou pseudocientíficas, desde que bem-intencionadas e sinceras — todas elas, em geral, deixam algum tipo de aprendizado. Minha crítica é quando uma ou ambas querem, intencionalmente e com os mais diversos objetivos, se revestir de algum tipo de ciênc
ia, seja ela qual for. Nesse sentido, e muito sabiamente, diz Carl Sagan, no seu livro O Mundo Assombrado pelos Demônios [Companhia das Letras, 1996]: “Cada área da ciência tem o seu próprio complemento de pseudociência” [Observação do editor: Veja a citação na íntegra no box nestas páginas].
Em qualquer campo do conhecimento, o processo de estudar, entender, aprender e progredir é um sacrifício quase indescritível, mas estamos no caminho certo. Provavelmente, caminhando mais lentamente do que muitos desejaríamos, mas é o caminho certo.
Definir e entender ciência é algo simples para um leigo?
Bem, reconheço que mesmo levando em conta os conceitos de fé e pseudociência antes mencionados, definir ciência não é trivial. Para Charles Darwin, por exemplo, “ciência consiste em agrupar fatos para que leis gerais ou conclusões possam ser tiradas deles”. Com todo respeito ao seu autor, um “monstro sagrado” do mundo científico, essa afirmação não me satisfaz. Provavelmente porque o mundo mudou, e mudou muito nas últimas 15 décadas, mais especificamente nos últimos 50 anos. Como consequência disso, a nossa visão do universo para cima, das galáxias, e para baixo, do dito nanomundo, mudou por meio da quebra de inúmeros paradigmas. Formalmente, o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa [Editora Positivo, 1975] define ciência como sendo “saber, instrução, conhecimentos vastos”, ou, alternativamente, como sendo “o conjunto de conhecimentos fundados sobre princípios certos”. Mas para mim, como cientista, ambas as definições são vagas e incompletas.
Por que o senhor acha assim?
No primeiro caso, ela poderia se aplicar também ao conceito de técnica, embora esse dicionário a defina de forma diferente. No segundo caso, o termo “princípios certos” é vago e subjetivo. Onde está o problema? Ambas as definições se esquecem do fundamental: o conteúdo de toda e qualquer ciência exata, deve necessariamente ser produto da aplicação do denominado método científico. E é justamente aí que a grande maioria das pessoas falha, até de maneira não intencional, ao considerar alguma coisa como sendo produto da ciência. Em geral, quase ninguém questiona se tal ou qual fato — supostamente um produto da ciência — foi realmente consequência de um estudo suficientemente aprofundado e sério, que teve como premissa básica a aplicação do método científico. Mas, em geral, acredito que não o façam com más intenções. É que as pessoas simplesmente se empolgam com a notícia e se esquecem do fundamental: a origem desse conhecimento.
O senhor acredita que a Ufologia possa ser submetida ao método científico?
Sim, pois o método científico pode ser considerado como um conjunto de regras básicas daqueles procedimentos que visam criar conhecimento. Esse processo está baseado em juntar evidências empíricas verificáveis — baseadas na observação sistemática e controlada, geralmente resultante de experiências ou de pesquisa de campo — e analisá-las com o uso da lógica. Para muitos autores, o método científico nada mais é do que a lógica aplicada à ciência. Vale destacar que ele começa pela observação, que deve ser sistemática e com todas as suas variáveis controladas, visando a obtenção dos dados científicos. O método científico é cíclico, girando em torno do que alguns denominam de Teoria Científica. E ela nada mais é do que a união indissociável do conjunto de todos os fatos científicos conhecidos e associados direta ou indiretamente ao fenômeno estudado, e de um conjunto de hipóteses testáveis e testadas, capaz de explicá-los. Os fatos científicos, embora não necessariamente reprodutíveis, como os eventos astrofísicos, que estão fora do controle humano, têm que ser, sim, necessariamente passíveis de verificação.
Os UFOs então devem ser estudados sob esta ótica?
Sim, e é possível ver, então, que a receita para termos um conhecimento confiável, produto do método científico, é muito simples. Muitas vezes essa receita não é aplicada por falta de conhecimento daqueles bem-intencionados, porém não capacitados, ou por falta de caráter de pessoas tentando “empurrar” supostos fatos científicos, visando algum tipo de ganho ou conquista, seja ela pecuniária ou não. É importante que toda ciência e todo conhecimento que dela seja fruto, seja precedida e fortemente influenciada por uma etapa filosófica, e, em particular, epistemológica. Sendo a filosofia definida como o amor pelo saber, e, especialmente, pela investigação das causas e dos efeitos, ela se torna uma etapa prévia fundamental na geração do conhecimento. Isso se torna essencial nas ciências exatas na epistemologia do fenômeno, área da filosofia que trata dos problemas que se relacionam com o conhecimento humano, refletindo sobre a sua natureza e validade.
Então a filosofia também deve se aplicar à pesquisa ufológica?
De forma natural, pois, além da filosofia e da epistemologia como bases da ciência, é essencial que todo conhecimento científico tenha como origem uma etapa metafísica. De acordo com Aristóteles, a metafísica é a subdivisão fundamental da filosofia, caracterizada pela investigação das realidades que transcendem a experiência sensível, capaz de fornecer um fundamento a todas as ciências particulares, por meio da reflexão a respeito da natureza primacial do ser. Por outro lado, e de acordo com Kant, a metafísica é o estudo das formas ou leis constitutivas da razão, fundamento de toda especulação a respeito de realidades suprassensíveis como a totalidade cósmica, Deus ou a alma humana, e fonte de princípios gerais para o conhecimento empírico.
FONTE: THE DAILY BEAST
O entrevistado sugere que a questão dos discos voadores não pode ser tratada por seitas e nem por grupos pseudocientíficos
A etapa metafísica seria um importante passo da compreensão?
Sem dúvida. A etapa metafísica é fundamental na geração de conhecimento. Constatamos que na geração de conhecimento científico que alimente o conteúdo de uma determinada ciência existem etapas prévias que são desejáveis, porém não obrigatórias — filosófica, epistemológica e metafísica — e uma etapa obrigatória que em última instância é a que, de fato, gera o conhecimento: a aplicação do método científico.
Enfim, por que a Ufologia ainda não pode ser considerada ciência?
A palavra Ufologia significa “campo de estudo dos UFOs”, ou seja, dos objetos voadores não identificados. Essa denominação significa literalmente que existem — e observamos — artefatos que voam e que não conseguimos identificar por meio de nossa experiência e conhecimento. Desde esse ponto de vista, um dos erros primordiais da Ufologia, e que não permite que ela seja considerada como ciência, começa quando o observador ou um hipotético ufólogo admite que esses objetos desconhecidos tenham uma explicação baseada em sua crença religiosa pessoal ou quando ele passa a afirmar que, por não ter uma explicação plausível, ele automaticamente é de origem extraterrestre. O correto, na maioria dos casos, seria dizer “não temos explicação científica plausível sobre aquilo para a ciência atual”, desde que se chegue a essa conclusão por meio do uso do método científico e por quem detém esse conhecimento, sobre o qual explanei há pouco.
Isso se aplica a todas as atuais vertentes da Ufologia?
Sim. Independentemente do tipo de Ufologia que se considere — entre as chamadas Clássica, Casuística, Esotérica, Mística, Avançada, Espiritualista etc —, quais deveriam ser as suas características para ser considerada uma ciência? Vamos supor que ela seja uma ciência c
ujo conteúdo de conhecimento ainda se encontra vazio. Qual seria então a maneira de preencher esse vazio, dando corpo à ciência chamada de Ufologia? De acordo com o que descrevi há pouco, isso somente poderia ser feito exclusivamente por meio da aplicação do método científico ao estudo dos UFOs.
Poderia explicar melhor aos leitores?
Sim, mas terei que ser um pouco técnico aqui. Bem, vamos considerar alguns aspectos do método científico e depois aplicá-los à Ufologia. O primeiro deles é a observação. Neste caso, trata-se do procedimento científico de investigação, que consiste no exame atento de um fato, ou de um processo, envolvendo instrumentos ou feita de forma simples a olho nu. Todavia, deve ser controlada em todas as suas variáveis com o objetivo de que seus resultados correspondam à verdade e não a ilusões advindas das deficiências inerentes aos sentidos em obter a realidade.
Por favor, prossiga.
O segundo aspecto a considerar é a descrição do fato, ou seja, a representação oral ou escrita de um experimento, processo ou procedimento com a enumeração circunstanciada e detalhada das características de algo. O experimento necessita ser replicável, passível de ser reproduzido desde que seguidas sempre as mesmas condições experimentais, aplicando-se os procedimentos necessários para testar as hipóteses, e não os fatos em si, que não precisam ser antropogenicamente reproduzidos, mas apenas verificáveis [Observação do editor: Fatores antropogênicos são aqueles causados pela ação do ser humano, contrapondo-se às ações naturais sem interferência humana].
É a ciência que tem nos permitido alcançar conquistas inimagináveis, que temos que usar como fundamento para a Ufologia, dando a ela um choque de qualidade e, principalmente, de credibilidade nos meios a ela mais refratários, tais como o acadêmico.
O que o senhor menciona é a ampla aplicação do método científico, certo?
Exato. E continuando, temos o aspecto da previsão, ou seja, o ato ou o efeito de prever. É a conjectura, a antevisão, a presciência ou também a antecipação, na base de suposições, do que ainda não aconteceu. Assim, na previsão, as hipóteses precisam ser tidas e declaradas como válidas para observações realizadas no passado, no presente e no futuro — uma ferramenta muito útil que as ciências exatas hoje utilizam na previsão de fenômenos é a chamada simulação computacional.
E como saber se o experimento está dando certo?
Para isso temos o controle, outro aspecto a ser considerado. Para maior segurança e confiabilidade nas conclusões, toda experiência deve ser controlada, ou seja, deve ser realizada com técnicas que permitam descartar as variáveis passíveis de mascarar o resultado.
O elemento humano também entra na equação?
Sim, e por meio de outro aspecto, o da falseabilidade, também chamado de refutabilidade. Trata-se da propriedade de uma asserção, ideia, hipótese ou teoria poder ser mostrada falsa. Esse é um conceito importante na epistemologia e foi proposto por Karl Popper, nos anos 30, como solução para o chamado problema da indução. Toda hipótese deve conter a testabilidade, ou seja, ser falseável ou refutável. Isso não quer dizer que a hipótese seja falsa, errada, dúbia ou duvidosa, mas sim que ela pode ser verificada, pode ser contestada — ela deve ser proposta de uma forma que possamos atribuir a ela ambos os valores lógicos, falso e verdadeiro, de forma que se ela realmente for falsa, a contradição com os fatos ou as contradições internas com a teoria apareçam naturalmente e demonstrem a sua validade.
Perfeito. O que mais?
Ainda temos a explicação das causas, também chamada de causalidade, que é a ligação entre a causa e o efeito. É a relação entre dois acontecimentos ou estados de coisas, fatos ou objetos, observada quando o surgimento do primeiro induz, origina ou condiciona a ocorrência do segundo. Em todas as áreas da ciência a causalidade é o fator-chave, e não conheço nenhuma teoria científica que viole a causalidade. Nessas condições, os seguintes requisitos são vistos como importantes no entendimento científico: identificação das causas, correlação e ordem dos eventos.
Como tudo isso se aplica à fenomenologia ufológica?
Analisando os pontos anteriores, fica claro que a Ufologia atual, que mistura de forma quase descontrolada ciência e religião, não preenche praticamente nenhum dos aspectos do método científico, e sim aqueles associados com a fé e/ou pseudociência. Uma parte significativa dela é subjetiva e está associada, e é influenciada, por diferentes crenças, o que — do meu ponto de vista — elimina toda e qualquer possibilidade de ela ser considerada como ciência.
FONTE: ARQUIVO UFO
Einstein, citado algumas vezes pelo entrevistado, teria tido um fascínio pela questão ufológica, mesmo sem se envolver com ela
Então não há solução fácil à vista?
Acredito firmemente que, até que a Ufologia atual preencha os aspectos antes mencionados, a única possibilidade de ela passar a ser considerada uma ciência e começar a ser levada mais seriamente por setores como o acadêmico, é ela se separar do conjunto atual de tendências pseudocientíficas e religiosas e se converter em uma verdadeira Ufologia Científica, que tenha como foco principal a coleta de informações baseada exclusivamente no método científico. Creio também que essa verdadeira revolução ou evolução na Ufologia valha a pena mesmo que isso signifique diminuir o seu tamanho, tanto de seguidores quanto de quantidade de informação, que a partir dessa transformação será realmente confiável. Assim, indubitavelmente, ela estará aumentando, e muito, a sua qualidade e credibilidade. Não vejo nenhum outro caminho que permita levar a Ufologia atual a ser considerada como ciência.
Quando colocamos a Ufologia na perspectiva do método científico, o primeiro problema que se apresenta é a própria definição do objeto que queremos conhecer, ou seja, luzes, naves, objetos tecnológicos, seres etc. Como o senhor enunciaria cientificamente o objeto da Ufologia?
Primeiramente, e a modo de introdução, vou considerar a minha área principal de trabalho, a física. Uma característica essencial da pesquisa nesse campo é a busca pelas propriedades mais fundamentais e pelos fenômenos associados, visando a sua compreensão e descrição em termos de leis. Essa ciência — a mais fundamental de todas — investiga desde partículas subatômicas, átomos e moléculas, até fenômenos que envolvem grandes aglomerados de partículas, desde clusters magnéticos nanométricos até galáxias. Assim, a física tem como objeto de estudo o universo, em toda a sua extensão e complexidade. E a Ufologia atual? Tem sido pouca ou nula a sua interação, de forma acadêmica, com outras áreas científicas. Um bom exemplo do que a Ufologia deve começar a fazer para ir na direção de seu reconhecimento como ciência é seguir o método adotado recentemente no estudo multi, inter e transdisciplinar dos agroglifos, quando dados físicos, químicos e biológicos concretos foram apropriadamente colhidos e estão ainda sendo analisados seriamente e com rigoroso método científico. Isso eu garanto porque formo parte dessa extraordinária equipe organizada pela Revista UFO.
Então não há clareza na Ufologia quanto ao seu objeto de estudo?
Do meu ponto de vista, a Ufologia atual não tem claramente definido o seu objeto de estudo, pois assumir a existência de objetos voadores não identificados não é a mesma coisa que admitir a existência de vida, inteligente ou não, externa ao nosso planeta. Tenho manifestado
em diversas oportunidades que existe a possibilidade, mesmo que remotíssima, de que esses artefatos com tecnologias de voo incríveis possam, sim, ter origem terrestre — quem pode garantir que eles não são fruto de uma civilização muito antiga e ultra-avançada que tenha preferido viver paralelamente a nós, se mantendo à margem da nossa civilização? Ou, alternativamente, que as modernas observações desses objetos não possam ter origem em laboratórios norte-americanos financiados pela Agência Central de Inteligência (CIA), pela Força Aérea Norte-Americana (USAF)? Ou ainda em grupos nazistas que, sem dúvida, sobreviveram à Segunda Guerra Mundial e às perseguições posteriores, com enormes recursos científicos, tecnológicos e financeiros?
Boas perguntas. Os ufólogos precisam saber respondê-las.
Sim, alguns ufólogos reconhecem essa possibilidade, mas afirmam que esses grupos obtiveram tal conhecimento com os extraterrestres, o que, para mim, como cientista, é uma atitude temerária pela absoluta e incontestável falta de provas científicas. Relatos, registros, testemunhos e observações que não podem ser demonstrados e verificados não podem ser considerados como provas do ponto de vista científico. Isso embora, em outras áreas, como as ciências jurídicas, elas possam ser consideradas como tais. Como cientista e como ser humano considero que atribuir categoricamente quase todo o nosso progresso humano a supostos visitantes extraterrestres é tanto ofensivo quanto ignorante. É ofensivo porque denota desprezo pela enorme capacidade de invenção, criatividade e superação da nossa espécie. É ignorante porque mostra um profundo desconhecimento do sacrifício intelectual que tem significado chegarmos até aqui como civilização.
A explicação não é totalmente extraterrestre?
Não. Essa infinidade de diferentes manifestações mencionadas há pouco e supostamente associadas com seres vindos de outros mundos podem, praticamente todas elas, estar relacionadas a essas outras possibilidades que mencionei, sem nada ter a ver com origem extraterrestre. Considero que, a princípio, a única exceção nessa lista de manifestações da questão original que de fato poderia estar associada única e exclusivamente à existência de extraterrestres, é a observação e o contato com seres inteligentes claramente diferentes de nós, humanos. Ironicamente, foi esse tipo de experiência pessoal o que me trouxe para a Ufologia. Mas não tenho provas materiais disso, apenas o meu testemunho. Em relação a essa minha experiência, é impossível aplicar a ela o método científico essencial ao seu reconhecimento. Portanto, sei que ela não tem nenhum valor científico — ela só tem servido como fortíssima motivação pessoal para estudar os assuntos correlatos ao Fenômeno UFO. Então, se eu tivesse que definir o objeto da Ufologia, ele seria unicamente o estudo de exosseres inteligentes. O resto seria consequência disso.
A Ufologia deve ser submetida ao método científico, pois ele é um conjunto de regras básicas de procedimentos que visam criar conhecimento. Esse processo está baseado em juntar evidências empíricas verificáveis, baseadas na observação sistemática e controlada.
O senhor imaginaria um método que pudesse ser aplicado a tal objeto?
O método científico tradicional deve ser aplicado sempre, independentemente do objeto estudado. Se o objeto da Ufologia fosse o estudo de exosseres inteligentes, o método ainda seria válido. Obviamente, existiria a possibilidade de termos que desenvolver novas tecnologias para viabilizar a sua aplicação. Mas a sequência de passos do método, baseada em uma visão empírica da comprovação de qualquer fenômeno, deve prevalecer sempre. Nesse, como no estudo de qualquer outro fenômeno, devemos ter sempre presente a máxima que diz que “a ausência de prova não é prova da ausência”, e devemos ser absolutamente intransigentes quanto a cair no erro de utilizarmos o denominado argumento da ignorância.
O senhor disse que a Ufologia vem se misturando perigosamente com a religião. No Brasil, ela nasceu buscando a ciência e produziu os maiores ufólogos do planeta nessa linha, que desenvolveram suas próprias metodologias ou utilizaram outras existentes. Faltaria à Ufologia extrair o conhecimento que a metodologia encerra?
Ufologia e religião são áreas completa e intrinsecamente diferentes. Ou pelo menos deveriam ser. Forçar a sua junção no atual estado de ambas me parece, dentre outras coisas, uma atitude muito pouco inteligente, principalmente por parte dos ufólogos tradicionais. Como já mencionamos na resposta à outra questão, a Ufologia — que na verdade e em bom português deveria ser denominada de Ovniologia, ou seja, o conjunto de conhecimentos relativo aos objetos voadores não identificados — é uma área de conhecimento relativamente nova, com apenas algumas décadas de existência. Provavelmente, ela se iniciou com o Caso Roswell, em 1947. A Ufologia não está necessariamente relacionada com o estudo da existência de vida extraterrestre nem com a sua visita ao nosso planeta. Qualquer objeto que voe e que seja desconhecido pode ser objeto de estudo desta área. Obviamente, então, ela também inclui o estudo dos fenômenos extraterrestres, mas não se limita a eles.
Há algum espaço, mesmo que mínimo, para o conceito de fé na Ufologia?
Seguindo os argumentos que expressei em respostas anteriores, o conceito de fé não deveria ter espaço em lugar nenhum na Ufologia! Mas em religião, qualquer que seja, a fé é um fator primordial e essencial. Como já mencionei, o conceito de fé implica em se ter uma atitude contrária a toda e qualquer dúvida, e está associado com a crença total em algo ou alguém, mesmo que não existam evidências que fundamentem que a proposição em causa seja verdadeira. Como podemos ler em Hebreus 11.1: “Ora, a fé é a certeza de coisas que se esperam. É a convicção de fatos que não se vêm”. Por isso, religião é definida como a crença na existência de um poder ou princípio superior, sobrenatural, do qual depende o destino do ser humano e ao qual se deve respeito e obediência. Desde o início dos tempos nós, humanos, temos desenvolvido um profundo respeito e devoção pela coisa divina, por meio das mais diversas formas de culto. Então, fica claro que Ufologia e religião são áreas diametralmente opostas em todos os aspectos e que, a meu ver, atualmente não devem ser misturadas — principalmente visando a aceitação da Ufologia pelos setores a ela mais refratários. Assim como as ciências ortodoxas não se misturam a conceitos religiosos e se baseiam exclusivamente no método científico, a Ufologia deve trilhar o mesmo caminho se quer chegar a ser uma ciência universalmente respeitada como o são a física ou a química.
O que o futuro nos reserva?
Acredito que no futuro possam vir a aparecer evidências disruptivas que forneçam subsídios para tornar válida a criação de uma nova área que resulte da junção da Ufologia com a religião. Mas, penso que o atual conhecimento não permite isso nem minimamente, por mais que os diretamente envolvidos assim o manifestem. Nesse contexto existe um caso particular muito interessante que considero essencial ser discutido no escopo desta pergunta, e que mencionei em outra questão: a Ufologia Espiritualista. À luz do que falei há pouco, essa área da Ufologia se constitui claramente em uma pseudociência. De acordo com o autor Gílson de Oliveira, “o Espiritismo é uma ciência que trata da natureza, origem e destino dos espíritos, bem como de suas relações com o mundo corporal”. Por outro lado, de acordo com o Dicionário Online de Português, o termo pode ser definido como “a doutrina de teor religioso e filosófico que busca o aprimoramento moral do indivíduo, por meio dos ensinamentos passados pel
os espíritos, almas desencarnadas, cuja comunicação com os vivos é realizada pelos médiuns”.
A dita Ufologia Espiritualista deriva, em grande parte, de uma mescla de pseudociências e fé a cujo caldo se misturou a Doutrina Espírita, esta em todo seu rigor.
Segundo dizia Allan Kardec, “assim como o rosto de nenhum homem é igual ao de outro, da mesma forma são diversas as civilizações espalhadas pelo espaço. Elas divergem segundo as condições que lhes foram prescritas e de acordo com o papel que cabe a cada uma no cenário universal”. Dessa maneira, a tal Ufologia Espiritualista trataria, segundo os seus seguidores, da presença ostensiva de espíritos extraterrestres em centros espíritas do Brasil e do mundo, que, por meio de um contato puramente espiritual, estariam trocando informações conosco, visando propiciar um ambiente adequado para que um hipotético contato em massa não venha a provocar efeitos catastróficos indesejados tais como caos, pânico, suicídios em massa etc.
FONTE: GEIPAN
A rica e abundante casuística ufológica deve ser escrutinada cientificamente para que dela se construa conhecimento válido
O Espiritismo serve à Ufologia?
Bem, já vimos que uma religião é um conjunto de sistemas culturais e de crenças que estabelece os símbolos que relacionam a humanidade com a espiritualidade e seus próprios valores morais, tendo narrativas, símbolos, tradições e histórias sagradas que se destinam a dar sentido à vida ou explicar tanto a sua origem quanto a do próprio universo. Dessa maneira, não há dúvidas de que o Espiritismo seja não uma ciência, mas sim uma religião. Então, parece claro que a Ufologia Espiritualista nada mais é do que a religião espírita que conhecemos há décadas, agora aplicada a outra categoria de entidades espirituais, neste caso, de origem extraterrestre. Ou seja, ela continua sendo uma religião independentemente do objeto de estudo ou tipo de entidade espiritual, terrestre ou extraterrestre, a que ela se aplique.
Existem espíritos terrestres ou extraterrestres?
Pessoalmente, penso que acreditar que existem espíritos terrestres ou extraterrestres que se comunicam conosco não é racional, mas sim uma questão de fé, caracterizando esse como sendo um ato religioso pessoal — a fé de quem crê em alguma coisa não pode ser colocada em dúvida pela opinião pessoal de outro indivíduo, seja ele cientista ou não. A fé, base da religião, não se fundamenta em argumentos racionais. Então, obviamente, não faz sentido utilizar a racionalidade da ciência para sustentá-la. A fé, por definição, deve ser inabalável. Mas, se aparecerem evidências científicas robustas que cheguem a abalar essa fé, é porque ela não era inabalável, ou seja, nem tão forte nem tão cega como se acreditava que fosse.
Então, a ciência vence?
Sim. É justamente por isso que a ciência sempre triunfa. Ela não é dogmática nem permanente, subjetiva ou tendenciosa. Ela é construída aos poucos, por meio do rigoroso seguimento do método científico, de forma objetiva, sistemática, de maneira comprovável e com padrões e leis que mostram — e permitem entender — seus mecanismos, e que, ainda, permitem construir modelos autoconsistentes, que nos dão a possibilidade de extrapolar o conceito atual para novas fronteiras e novas leis, em um movimento dinâmico perpétuo de aperfeiçoamento de nosso conhecimento do universo. No caso da Ufologia Espiritualista, o problema aparece quando se tenta qualificar uma religião como sendo uma ciência, e substituir fé por uma suposta e duvidosa racionalidade, que, por sua vez, não sobrevive sequer superficialmente à aplicação do método científico. Definitivamente, esse ramo da Ufologia não é, nem de perto, uma ciência.
Como chegaremos a conhecer os mistérios do universo?
Será sempre a ciência, e não a religião, quem nos dará a única base concreta e segura do aprendizado científico e da expansão de nosso conhecimento sobre as leis do universo. Ser ou não religioso é independente de se ser ou não um cientista competente. Pessoalmente, acho inacreditável que um cientista, perante a grandiosidade e a perfeição do universo, possa pensar que tudo isso seja obra do acaso negando, assim, a existência de um ser supremo. Certamente, esse não é o meu caso. Mas, novamente, essa é uma questão pessoal que é irrelevante do ponto de vista científico.
O que vamos dizer aos chamados ufólogos espiritualistas?
Vejo que alguns seguidores da Ufologia Espiritualista tentam encontrar argumentos para validar seus estudos, qualificando cientistas importantes como sendo religiosos. Por exemplo, nesse sentido é comum encontrar a citação da famosa frase de Albert Einstein, “a ciência sem religião é manca, e a religião sem ciência é cega”. Usada desse jeito, ela está fora de seu contexto original e, portanto, a sua utilização não é válida da maneira que alguns adeptos da Ufologia Espiritualista o vêm fazendo. Quem é realmente informado sabe perfeitamente que Einstein não acreditava em Deus — isso fica fora de toda dúvida ao ler um texto escrito por ele, no qual expressa suas opiniões sobre religião e que é conhecido como Carta de Deus. Essa missiva de Einstein, escrita à mão em alemão em 03 de janeiro de 1954, aproximadamente um ano antes de o cientista morrer, era destinada ao filósofo Erik Gutkind, de quem ele havia lido a obra Choose Life: The Biblical Call for Revolt [Escolha a Vida: O Apelo Bíblico Pela Revolta. H. Schuman Editors, 1952].
A Ufologia atual não tem claramente definido o seu objeto de estudo, pois assumir a existência de objetos voadores não identificados não é a mesma coisa que admitir a existência de vida, inteligente ou não, externa ao nosso planeta. Estas são coisas diferentes.
O que há neste texto?
Na carta, Einstein disse: “A palavra Deus para mim é nada mais do que a expressão e produto da fraqueza humana. A Bíblia é uma coleção de lendas honradas, mas ainda assim primitivas, que são bastante infantis”. Einstein não apenas deixa clara sua posição em relação a Deus, como também a sua posição como judeu, dizendo “para mim, a religião judaica, como todas as outras, é a encarnação de algumas das superstições mais infantis. E o povo judeu, ao qual tenho o prazer de pertencer e com cuja mentalidade tenho grande afinidade, não tem qualquer diferença de qualidade para mim em relação aos outros povos”.
Como entender a ciência e a religião aplicadas à Ufologia?
Considero que ciência e religião são complementares, o que nos abre a possibilidade de termos uma formação humana mais completa, mais de acordo com o nosso papel no universo. Em meu caso, como cientista, a religião, a filosofia, a música erudita, dentre outras áreas, são o que alimenta a minha alma. Para mim, ter fé religiosa é um privilégio tão importante quanto ter racionalidade científica. Mas, dentro do laboratório, seja da área que for, tenho de ser absolutamente racional, focando nos fatos e na aplicação do método científico. Nessa situação, certamente posso manifestar o sentimento de fé, mas não do ponto de vista religioso — é a fé de estar no caminho certo, a fé de que vou conseguir atingir o objetivo que me programei alcançar etc. Por si, a fé religiosa não vai fazer que uma reação química ocorra ou que um fenômeno físico aconteça ou deixe de acontecer.
Nessa situação o que vale é apenas a lei natural correspondente e as suas condições de contorno, e a minha competência científica para evidenciá-la nessas circunstâncias específicas. Assim, fé religiosa e racionalidade podem caminhar juntas, mas fora do experimento e, principalmente,
fora do laboratório. A Ufologia está no caminho de se tornar uma ciência, e, devido às suas características, ela também precisa de um laboratório e de conhecimento puramente racional para chegar lá. Sem religião. Por isso, definitivamente, a mistura da Ufologia tradicional com segmentos religiosos é um caminho perigoso para a sua própria sobrevivência como futura ciência.
O senhor considera isso um retrocesso?
Sim. Se a Ufologia quer, de fato, chegar a ser uma ciência nos moldes das ciências tradicionais já consagradas, ela deve formular sua própria metodologia, baseada exclusivamente em fatos e conclusões derivadas da aplicação rigorosa do método científico — mas isso não será possível se a fé religiosa formar parte dessa metodologia. Nem o Instituto de Pesquisa Astronômica do Vaticano, conhecido como Observatório do Vaticano e também chamado de Specola Vaticana, coloca a fé como parte da sua metodologia. Seria inimaginável isso acontecer em suas linhas de pesquisa científica, que incluem fotometria e espectroscopia sobre aglomerados estelares, distribuição espacial das estrelas de diferentes tipos espectrais, órbitas de estrelas duplas, produção de atlas de espectro de interesse astrofísico, entre outras.
Do que mais a Ufologia precisa para ter reconhecimento?
Penso que, além da aplicação rigorosa do método científico, para se tornar uma ciência a Ufologia deve ter consciência de seu caráter multi, inter e transdisciplinar e seus adeptos devem ter estudo formal em uma ou mais das áreas que a compõem. Um exemplo disso, que também já mencionei, é o estudo realizado no agroglifo de Prudentópolis, de 2016, no qual a convergência do conhecimento puramente científico, vindo de especialistas das mais diversas áreas, resultou em informações extraordinárias. Qual foi a participação da fé religiosa nesse processo? Nenhuma! Só conhecimento, racionalidade e a aplicação rigorosa do método científico permitiram chegar aos resultados. Adquirir conhecimento científico é tremendamente meritocrático e ninguém o obtém de maneira séria senão por meio dos livros e de muito tempo neles debruçado. É muito trabalhoso estudar e entender as forças e os mecanismos básicos que regem o universo.
Hoje fala-se muito em física quântica quando se discute Ufologia.
É verdade. No mundo da Ufologia, a cada dia é mais comum encontrarmos pessoas honestas e de boa-fé que acreditam trabalhar com física quântica, mas sem nunca a terem estudado adequadamente. Alguém acha que entende de física quântica? Então, faça um teste: entenda, explique e resolva as equações de Schrödinger, dependente e independente do tempo. Não existe nada mais simples nessa área do que resolver essa equação. Todo o resto em física quântica é mais difícil e abstrato. Seja bem-vindo à verdadeira ciência! A Ufologia é, sem dúvidas, uma mistura de tudo isso. Há mais de 40 anos o seu estudo continua me fazendo brilhar os olhos quando tenho a chance de falar sobre seus assuntos. Considero que não existe nada mais fascinante do que a Ufologia, que espero, em algum momento, poder chamar de ciência. Sem religião.
Ufologia e religião são áreas completa e intrinsecamente diferentes. Ou pelo menos deveriam ser. Forçar a sua junção no atual estado de ambas me parece, dentre outras coisas, uma atitude pouco inteligente, principalmente por parte dos ufólogos tradicionais.
A Ufologia é tão imaterial e inexata quanto a antropologia, a história, a sociologia e a psicanálise, mas é inegável que o conhecimento que essas ciências trouxeram participa largamente do bem-estar social. Poderia comentar essa questão?
Em primeiro lugar, eu não atribuo unicamente às ciências exatas o bem-estar social atual. Mas não tenho nenhuma dúvida de que elas são, sim, junto com as diferentes áreas da engenharia, as grandes responsáveis por isso. Creio que deixei isso claro quando mostrei a influência da ciência na qualidade de vida, traduzida em maior expectativa de vida e aumento da população mundial nos últimos 20 séculos. A humanidade demorou dezenas de milhares de anos para alcançar o primeiro bilhão de habitantes, o que aconteceu por volta do ano de 1800. Em seguida, foram necessários mais 130 anos para dobrar a população, alcançando assim o planeta, por volta do ano de 1930, os dois bilhões de habitantes. O terceiro bilhão foi atingido 30 anos depois, em 1960, e assim por diante, em uma evolução exponencial. E a expectativa de vida nesse mesmo período? Passou de aproximadamente 40 anos no início do Cristianismo para mais de 80 anos atualmente.
São números significativos.
São. Mas o que é o bem-estar social e de quais fatores ele depende, de fato? Podemos considerá-lo como sendo um conjunto de condições que determinam a qualidade de vida de uma pessoa, permitindo-lhe manter uma existência tranquila, sem privações e, principalmente, com um estado de satisfação permanente. Vejamos, então, a contribuição das diferentes áreas da ciência para o bem-estar social. É inegável que as ciências humanas como as mencionadas na pergunta, têm desempenhado um papel fundamental para termos alcançado o nível de bem-estar social hoje presente no mundo ocidental.
Qual das ciências humanas mais lhe atrai?
É aquela que considero a mais fascinante e que é provavelmente a mais desconhecida do grande público, a antropologia. Podemos defini-la como sendo a “ciência da humanidade e da cultura”, cujo vasto campo de investigação abrange toda a Terra habitada, pelo menos dois milhões de anos de história e, ainda, todas as populações socialmente organizadas — sua atuação fica mais evidente ao considerarmos o seu campo de estudos, que se divide em antropologia física, também denominada de biológica, e antropologia cultural, igualmente chamada de social. Essa última está focada no principal conceito desta ciência, que é a cultura.
As pessoas têm conhecimento da contribuição da antropologia para nosso conhecimento atual?
Considerando novamente o grande público, acredito que ele seja pouco consciente desta contribuição e também daquela das demais ciências humanas para o bem-estar social. Acho que essa contribuição das ciências humanas, comparada com aquela associada às ciências exatas e à tecnologia — por meio das diferentes áreas da engenharia —, seja muitíssimo menor em termos de impacto real e visível. Será? Vamos supor que as ciências exatas não tivessem conseguido, nem minimamente, o avanço que tiveram nos últimos 150 anos, mas a antropologia, a história, a sociologia e a psicanálise sim. De tal modo, hoje disporíamos de uma sociedade organizada, consciente de seu passado, equilibrada mental e economicamente etc, usufruindo das máximas contribuições das ciências humanas antes mencionadas.
Entretanto, nessa situação hipotética não disporíamos de energia elétrica, água limpa, métodos de tratamento e diagnóstico em medicina, antibióticos, anticoncepcionais, antidepressivos, vacinas, satélites, computadores, tablets, telefone, celulares e smartphones, televisão, transportes aéreos e terrestres, roupas eficientes e uma infinidade de outros itens que são consequência direta das ciências exatas — que representam uma fatia gigantesca na denominada sensação de bem-estar social. Em qual situação o grande público consideraria ter maior qualidade de vida e bem-estar social? Certamente na situação atual real onde pode dispor de todos esses recursos. Os intelectuais dirão que estou sendo materialista. Pode até ser. Mas estou sendo, sim, realista e muito pragmático. Desafio esses intelectuais a viverem sem esses itens tecnológicos que mencionei. O incremento da contribuição das ciências exatas e da tecnologia para o aumento da qualidade de vida e do bem-estar social tem
sido fabuloso, principalmente nos últimos 50 anos.
Qual das ciências, exatas ou humanas, é a mais importante?
As duas por igual, pois elas alimentam aspectos diferentes do ser humano. As ciências humanas alimentam mais proficuamente a nossa alma, o nosso espírito. As ciências exatas atendem de maneira mais eficaz às nossas necessidades físicas, fisiológicas e materiais. Essa situação de contribuição assimétrica entre as ciências exatas e as ciências humanas também é crítica na Ufologia. Mais do que apenas as ciências sociais, todas as ciências humanas participam, na Ufologia, da mesma dificuldade de não ter a prerrogativa nem de criar nem de reproduzir, de maneira controlada, os eventos que estudam. Mas é verdade que, de uma ou outra maneira, ambas desenvolveram metodologias próprias, cumprindo assim uma das exigências para que um dado conhecimento possa vir a ser considerado científico, ou seja, o estabelecimento de metodologias de pesquisa.
O que dizia Carl Sagan sobre as pseudociências
Cada área da ciência tem o seu próprio complemento de pseudociência. Os geofísicos têm de se haver com Terras chatas, Terras ocas, Terras com eixos loucamente oscilantes, continentes que emergem e afundam rapidamente, além de profetas de terremotos. Os botânicos têm plantas cuja ardente vida emocional pode ser monitorada com detectores de mentiras. Os antropólogos têm homens-macacos sobreviventes, os zoólogos têm dinossauros remanescentes e os biólogos evolutivos têm os literalistas bíblicos mordendo o seu flanco. Os arqueólogos têm astronautas antigos, runas forjadas e estatuária espúria. Os físicos têm máquinas de movimento perpétuo, uma multidão de refutadores amadores da teoria da relatividade, e talvez a fusão a frio. Os químicos ainda têm a alquimia. Os psicólogos têm grande parte da psicanálise e quase toda a parapsicologia. Os economistas têm previsões econômicas de longo alcance. Até agora, os meteorologistas têm a previsão do tempo a longo prazo a partir das manchas solares, como no Farmer’s Almanac, embora a previsão do clima a longo prazo seja outra história. A astronomia tem, como sua pseudociência mais importante, a astrologia, a disciplina que lhe deu origem. Enfim, as pseudociências às vezes se cruzam, combinando a confusão — como nas buscas telepáticas dos tesouros enterrados de Atlântida ou em previsões econômicas astrológicas”.
Onde se vê isso com mais ênfase?
Isso é muito claro nas ciências humanas, mas nem tanto em relação à Ufologia, que, como dito há pouco, não acredito que possa ser ainda considerada como uma ciência, justamente pela impossibilidade de se aplicar a ela, de maneira rigorosa, o método científico em termos de ciências exatas. Também é verdade que alguns campos da Ufologia são tão imateriais e inexatos quanto a antropologia, a história, a sociologia e a psicanálise. O erro nessa comparação está no fato de que a Ufologia, em uma primeira fase, deveria ser estudada essencialmente por meio das ciências exatas, enquanto que as ciências humanas, em geral, quase podem prescindir da física, química etc.
As ciências humanas podem ser imateriais e inexatas?
Sim, pois elas funcionam em função daquilo que é o seu objeto de estudo. Na Ufologia isso é crítico porque não é possível estudar uma nave alienígena invisível e nem um ser extraterrestre imaterial. Essa invisibilidade, imaterialidade e inexatidão atingem o seu ápice quando se trata do estudo de um suposto extraterrestre espiritual, por meio da Ufologia Espiritualista. Nesse sentido, conheço em todo o Brasil inúmeros físicos e engenheiros de excelência que também são espíritas e médiuns respeitadíssimos. Converso com eles de maneira frequente e, curiosamente, nenhum deles confirmou, nem minimamente, a presença nos centros espíritas dos quais participam, de entidades espirituais consideradas extraterrestres — isso é uma pena, pois seria uma oportunidade ímpar de troca de conhecimentos técnicos e científicos entre humanos e extraterrestres, que em tese falariam a mesma linguagem técnico-científica em prol da melhoria de nosso mundo, que parece ser o que eles desejam. Infelizmente, em função de a Ufologia Espiritualista não permitir a aplicação rigorosa do método científico, esse tipo de interação humano-extraterrestre não é possível de ser verificada, o que é um ponto essencial para que ela possa ser considerada como informação científica. Espiritismo é religião e Ufologia Espiritualista é pseudociência.
O senhor faz parte de duas ordens esotéricas iniciáticas, a Maçonaria e os Templários. A iniciação esotérica é geralmente uma experiência subjetiva que vale para todos a partir da adesão individual a um sistema simbólico, e a instância simbólica é comum a todos os humanos, sendo considerada o que nos diferencia dos animais. Como se socializa o conhecimento iniciático e qual a sua importância na vida social?
De acordo com a literatura, o conceito geral de iniciação remete a um novo começo ou a ascensão a partir de um nível de existência inicial, que é abandonado, para um nível superior que é alcançado. Nas sociedades iniciáticas, o processo é um tipo de cerimônia na qual é introduzido um novo membro após alguma tarefa ou ritual particular, que envolve a condução do novato, também chamado de profano, neófito etc, por um membro veterano do grupo, e costuma consistir na exposição de novos conhecimentos que podem ser segredos dessa sociedade iniciática.
Qual é o elemento mais marcante nestes cerimoniais?
Neles se destacam o aprendizado de valores fundamentais para a vida, quando o iniciado deve aprender a se fortalecer com o isolamento, sobreviver em condições precárias, estar preparado para as dificuldades da vida etc. Se observamos atentamente, estamos rodeados por processos de iniciação — ser batizado em determinada religião, entrar em uma universidade, ingressar em uma ordem profissional etc, são todos processos iniciáticos diferentes, porém apenas o primeiro é de caráter esotérico. Nesse caso, o Esoterismo é o conjunto de tradições e interpretações filosóficas das doutrinas e religiões — ou mesmo das fraternidades iniciáticas — que buscam transmitir um rol acerca de determinados assuntos que dizem respeito a aspectos da natureza da vida e que estão sutilmente ocultos. Popularmente, o Esoterismo dá a ideia de transmitir um conhecimento enigmático ou incomum, sempre de maneira oculta. Segundo alguns pesquisadores, ele está relacionado àquelas doutrinas cujos princípios e conhecimentos não podem ou não devem ser vulgarizados e, por isso, devem ser transmitidos apenas aos membros do grupo que formam uma sociedade iniciática particular.
Trata-se de uma transmutação?
Bem, no caso de uma iniciação esotérica, ela deve estar relacionada com a “morte metafórica” do indivíduo atual e ao seu renascimento dentro da sociedade iniciática como sendo o seu mais novo membro. Dentro da ordem iniciática esotérica, ele vai se submeter a um sistema de graus de conhecimento, de modo que seus pares mais antigos possam identificar sua evolução didática relacionada a estudos geralmente ligados à filosofia e à metafísica, e redigidos com diferentes objetivos. Já vivenciei essa “morte” e esse renascimento iniciático em diversas oportunidades. Considero que meu lado esotérico é tão intenso quanto o meu lado científico.
Quando o senhor se associou a ordens esotéricas?
Há mais de 20 anos ingressei na Sagrada Ordem do Templo, também conhecida como Templários, e há 14 entrei na Maçonaria, estando nesta última jurisdicionado ao Grande Orie
nte de São Paulo (GOSP) e federado ao Grande Oriente do Brasil (GOB). Desde 2016 estou desempenhando o papel de presidente de minha loja, como se chama uma unidade maçônica, posição que internamente denominamos de venerável mestre. Além disso, há mais de 10 anos recebi todos os graus do Reiki. Por isso, sou triplamente mestre: mestre templário, mestre maçom e mestre reikiano. Participo ativamente dessas três atividades desde que fui iniciado em cada uma delas. Compartilho esse ambiente esotérico com as minhas atividades religiosas — que não são poucas, mas são muito discretas — e com a minha vida de docente, pesquisador e cientista no que considero um conjunto de atividades que se complementa de maneira extraordinária.
O que vale mais, a razão ou a intuição?
Ambas. Considero-me um ser tanto racional quanto intuitivo, o que me permite um trânsito tranquilo entre áreas tão diferentes. Mas é fundamental mencionar que o meu porto seguro em todas as áreas é a ciência. Então, embora a iniciação esotérica seja geralmente, e para a maioria das pessoas, uma experiência subjetiva, para mim é algo bem objetivo. Procurei encontrar a justificativa e o fundamento científico, que sempre existe, de cada etapa do processo iniciático, mas que quase nunca é explicado abertamente. Então, a minha adesão individual ao sistema simbólico de cada sociedade iniciática foi por meio da razão, do conhecimento e do entendimento, e não por meio de uma fé cega e dogmática como acontece em geral.
Como é possível conciliar conceitos esotéricos com ciência ortodoxa?
Novamente isso é um processo simples, mas no qual o iniciado precisa conhecer profundamente, por meio de muito estudo formal, os fundamentos de ambas as partes — a esotérica e a científica — envolvidas em um assunto específico. Por exemplo, quando aplico o Reiki em alguém, que é um fator esotérico, sempre considero a sua energia como tendo determinado comprimento de onda, ou seja, tendo uma cor específica, isso de acordo com o m