Entre os assuntos espinhosos que envolvem a Ufologia, talvez nenhum se compare em estranheza e perigo ao fenômeno das abduções alienígenas. Assunto difícil de ser tratado, cheio de nuances e detalhes que não podem e não devem ser deixados de lado, elas já foram responsáveis pelo descrédito de muitos esquisadores que, por vaidade ou ingenuidade, derraparam nas pantanosas curvas que as envolvem. E é justamente sobre abduções que falaremos neste artigo, apresentando fatos e interpretações, mas deixando a cargo do leitor a conclusão sobre aquilo que for mostrado, uma vez que nesse campo de estudo não se pode descartar ou aceitar coisa alguma sem uma profunda reflexão crítica e desapaixonada. Infelizmente, é comum que a misteriosa aura que envolve supostos abduzidos e as “verdades messiânicas” que difundem levem ao surgimento de fraudes mal intencionadas que atrapalham o desenvolvimento da Ufologia.
Com o objetivo financeiro ou de atrair a atenção para si, essas pessoas buscam seguidores e posteriormente criam seitas ou cultos completamente insanos e despropositados. É desnecessário tratar aqui, por exemplo, das lastimáveis mortes promovidas pela seita Heaven’s Gate [Portão do Céu], que acreditava que seus membros poderiam ser abduzidos coletivamente, ou dos episódios envolvendo os chamados raelianos e sua suposta clonagem humana sob orientação extraterrestre. Fatos assim se espalham na Ufologia e a Revista UFO já dedicou incontáveis páginas sobre o tema, que o leitor poderá facilmente consultar no site da publicação ufo.com.br].
Entretanto, não é desses casos — a maioria de polícia ou hospício — que trataremos aqui. Vamos, isso sim, abordar o mais famoso e o impactante episódio de abdução de que se tem notícia, o Caso Travis Walton, ocorrido em 1975 e que permanece um desafio mesmo após tanto tempo. Walton estará novamente no Brasil neste mês, de 16 a 18, para apresentar sua experiência no II Fórum Mundial de Contatados, que a UFO promove em Curitiba, razão pela qual sua abordagem nesta edição é mais do que oportuna. Seu caso é ainda mais interessante para a Ufologia por ser o único em que o abduzido e as testemunhas envolvidas foram submetidos várias vezes a testes, inclusive de polígrafos, e os resultados continuam apontando que todos diziam a verdade. Antes de entrarmos no assunto e a título de esclarecimento, porém, cabe esclarecer rapidamente o que consiste a tão falada abdução alienígena.
A Ufologia e a abdução
Fenômeno muito difundido a partir da década de 60, com o Caso Betty e Barney Hill, a abdução é o rapto ou sequestro de uma pessoa por seres de outro planeta. Na maioria dos casos o indivíduo que passa por tal experiência alega que foi paralisado em sua cama ou dentro de seu automóvel e levado contra sua vontade envolta em algum tipo de raio de luz até uma sala de exames dentro de uma nave espacial. A partir deste ponto, as histórias divergem mais em forma do que em conteúdo. Vários abduzidos do sexo masculino alegam ter sido obrigados a manter relações sexuais com mulheres extraterrestres, enquanto inúmeras abduzidas declaram ter sido inseminadas artificialmente por eles. Também é comum o relato de exames clínicos dolorosos e de inserção de algum tipo de mecanismo de monitoramento no corpo das vítimas, os famosos implantes alienígenas. De modo geral, de acordo com os relatos, não há comunicação direta com os abdutores — mas quando ela ocorre, é quase sempre de forma telepática.
É comum o relato de exames clínicos dolorosos nos abduzidos a bordo das naves, assim como de inserção de algum tipo de mecanismo de monitoramento no corpo das vítimas, os famosos implantes alienígenas, que já chegaram a ser retirados
A pessoa sequestrada parece ser dominada não apenas física, mas também mentalmente por seus raptores. Sem controle algum sobre o que está lhe acontecendo, o indivíduo se vê posteriormente de volta à sua cama ou ao seu veículo, muitas vezes percebendo que algumas horas se passaram sem que possa explicar o lapso temporal. Nos dias subsequentes ao sequestro, sintomas como dores de cabeça, sangramentos nasais, problemas gastrointestinais, pesadelos, insônia, ataques de pânico, letargia e depressão começam a fazer parte da vida das vítimas de abdução. Algumas pessoas passam a recordar naturalmente do que viveram nessas situações, mas outras só conseguem reaver suas memórias por meio de sessões de hipnose regressiva. De qualquer forma, estas pessoas passam por grande sofrimento emocional juntamente com suas famílias, além de enfrentarem problemas profissionais e sociais, uma vez que os sintomas do estresse pós-traumático as impedem de seguirem com suas atividades e rotinas normais. Muitas vezes são necessários anos para que as vítimas de abdução consigam retomar o controle de suas vidas, e não são raros os casos em que isso jamais acontece de forma integral.
Como se fosse pouco tudo o que descrevemos acima, as vítimas de sequestro por aliens ainda precisam lidar com a compreensível incredulidade de amigos e familiares, além do estigma social que sofrem, das piadas de mau gosto e do sentimento de abandono, violação, terror e confusão. O quadro desenhado não é dos melhores e a ajuda necessária aos indivíduos traumatizados é oferecida muitas vezes não pela medicina — o que seria de se esperar —, mas pela Ufologia. Mas teriam os ufólogos capacidade técnica e o conhecimento necessário para lidar com traumas tão profundos?
Superando o ocorrido
Há longos estudos que indicam que experiências de paralisia do sono, delírios, alucinações e episódios de violência sexual ou física emocionalmente reprimidos podem surgir travestidos de experiências ufológicas nas mentes das pessoas, e nesses casos apenas profissionais como médicos, psicólogos e psiquiatras teriam o conhecimento necessário para tratar e ajudá-las a entenderem e superarem o ocorrido. E se é assim, como se pode discernir se o indivíduo realmente passou por uma abdução alienígena ou por algum outro tipo de processo? Médicos e psicólogos fazem uma detalhada anamnese neles, pedem exames físicos e buscam apoiar seus diagnósticos em dados concretos. Mas, infelizmente, há poucos deles atuando na Ufologia e, portanto, os ufólogos têm aqui um problema a mais.
Eles, quando se veem diante de c
asos de abdução, normalmente conversam com a vítima e sugerem a ela que se submeta a sessões de hipnose regressiva para recobrar a memória do que lhe aconteceu e conviver com as lembranças da experiência. É um procedimento arriscado, pois em uma sessão de hipnose muita coisa pode acontecer, desde a vontade da pessoa já tão traumatizada querer inconscientemente agradar ao hipnotizador e lhe fornecer respostas que não são necessariamente verdadeiros, como hipnotizadores inábeis plantarem falsas memórias na mente do hipnotizado — todo cuidado é pouco nesse campo e não é porque alguém se diz ufólogo e oferece ajuda em um momento de necessidade que está habilitado para lidar com a situação.
Como já foi dito, o terreno das abduções alienígenas é muito traiçoeiro e escorregadio. Deve-se caminhar por ele com muito cuidado e seriedade, lembrando-se sempre de que, muito mais importante do que saber se os alienígenas eram altos ou baixos, está preservar a sanidade e a integridade emocional da pessoa vitimada. Primeiro o ser humano, depois os alienígenas, esse é o caminho. Há, porém, casos em que a hipnose se mostra uma ferramenta eficiente não apenas para recuperar memórias, mas também para permitir a superação do medo de recordar os fatos ocorridos.
O cenário e os personagens
Nos idos de 1975, Travis Walton, então um rapaz de 22 anos cheio de energia e de planos, trabalhava de forma intermitente na derrubada de árvores no estado norte-americano do Arizona. Longe de ser um garoto pacato, Walton tinha personalidade aventureira e curiosa, praticava artes marciais, montava touros em rodeios apenas por diversão, gostava de ler e sonhava em ter uma loja que combinasse oficina e autopeças de motocicletas. Tinha, enfim, um tipo de personalidade vista com desconfiança pelos habitantes da pequena e pacata cidade de Snowflake — na época com três mil habitantes, a maioria pertencentes à religião Mormon.
Como todos os homens envolvidos no trabalho de derrubada de árvores, Walton era saudável, forte e muito resistente, pois, afinal, o trabalho é pesado e difícil, uma vez que se trabalha sob Sol, chuva e neve enfrentando os humores da natureza. Muitos homens se ferem mortalmente ou ficam inválidos por toda vida com os não tão raros acidentes de trabalho. Portanto, derrubar árvores não é o tipo da atividade que se possa combinar com ingestão de drogas ou de bebidas alcoólicas, algo importante de se ter em mente conforme formos nos aprofundando na história.
Em novembro de 1975, Travis Walton trabalhava com seu amigo e futuro cunhado Mike Rogers, na época com 28 anos, que há nove arregimentava trabalhadores para cumprirem contratos firmados com o Serviço Florestal dos Estados Unidos, sendo que o próprio Walton já trabalhara com Rogers em ocasiões anteriores. O trecho em que o grupo atuava na ocasião, uma floresta próxima a Turkey Springs, era o maior contrato que Rogers havia tido até então — mas o trabalho não estava exatamente em dia, o que indicava que ou ele não conseguiria terminar no prazo ou que precisaria alongar o expediente, o que passou a fazer, estendendo o horário de trabalho em duas horas. Normalmente os operários trabalhariam das 06h00 às 16h00, mas Mike Rogers estava levando a jornada até as 18h00. Todo o grupo ia e voltava junto ao campo de árvores na surrada caminhonete de Rogers, indicada para o tipo de terreno por onde trafegavam, uma estradinha de terra íngreme e cheia de obstáculos que, segundo Walton, seria mais bem descrita como “um percurso de obstáculos, do que uma estrada”.
Na equipe conduzida por Mike Rogers estavam, além dele próprio e de Walton, mais cinco homens cujas idades variavam entre 17 e 25 anos: Ken Peterson, John Goulette, Allen Dallis, Steve Pierce e Dwayne Smith. Embora todos passassem o dia juntos no trabalho, não havia entre eles amizade ou maior proximidade. Sobre eles sabemos que Dallis já havia tido problemas com a polícia, tinha um temperamento difícil e não se dava muito bem com Walton. Também soubemos que Smith era novo no grupo e que foi Goulette que o apresentou a Rogers, sugerindo que o contratasse. Pierce trabalhava com documentos adulterados por ele próprio para aumentar sua idade, pois estava com apenas 17 anos e precisava muito do emprego para ajudar a família que atravessava sérios problemas financeiros. Por fim, Peterson era conhecido como um rapaz sério, correto e muito religioso.
Detalhes importantes
Agora que conhecemos os personagens principais e o cenário, podemos ter uma melhor compreensão dos incríveis acontecimentos que envolveram os sete rapazes e que, mais do que deixar marcas, alteraram o curso de suas vidas. O dia em que tudo mudou era uma quarta-feira, 05 de novembro de 1975. Tudo começou como todos os outros dias para o grupo de rapazes: embarcaram na caminhonete, Walton e Rogers na frente e os outros cinco espremidos atrás, e seguiram para o trecho da floresta no qual trabalhariam naquele dia. As conversas pelo caminho giravam em torno de garotas, esportes e trivialidades — nada havia que indicasse que em poucas horas suas vidas jamais seriam as mesmas. Nas palavras do próprio Travis Walton: “Para nós, era um dia normal de trabalho. Não havia nada naquela ensolarada manhã de outono que prefigurasse o tremendo medo, choque e confusão que estaríamos sentindo quando caísse a escuridão”.
De repente estávamos eletrificados pela mais impressionante e incrível visão que tínhamos experimentado em toda a nossa vida. O UFO tinha entre 5 e 7 m de diâmetro e um brilho amarelo dourado que se mesclava a partes de metal sólidas e prateadas
O dia de trabalho também transcorreu quase sem incidentes e os únicos pontos que valem à pena destacar — e apenas porque seriam levantados mais tarde em tons acusatórios — foram uma discussão entre Walton e Dallis, quando o último cortou uma árvore sem avisar ao colega, o que poderia ter causado ferimentos sérios caso o acertasse, e a ausência de Mike Rogers por algum tempo no trabalho. Mas este ponto foi esclarecido mais tarde por um dos rapazes, que alegou que ele estava refazendo os feixes de madeira de acordo com as normas do Serviço Florestal. Enfim, dois fatos que ninguém jamais pensaria em destacar, caso o dia tivesse terminado como sempre. Mas, em se tratando de abdução, todos os detalhes contam, por menores que sejam.
Quando o Sol já estava baixo e a luminosidade não permitia mais o trabalho, eles juntaram os equipamentos e ferramentas, embarcaram na caminhonete e foram embora. A estrada de terra que serpenteava por entre as árvores n&
atilde;o permitia a visão do horizonte e, portanto, quando os rapazes viram uma estranha luminosidade por entre elas, cada um deles tirou sua própria conclusão. Poderia ser a Lua nascendo ou uma fogueira acesa em algum lugar — eles estavam em plena temporada de caça e os acampamentos não eram novidade por ali. Todos prestavam atenção na inusitada luz, mas nenhum dos operários disse nada até que alguém chamou a atenção para o fato. O forte brilho, uma variação entre âmbar e laranja, foi ficando cada vez mais próximo e os rapazes pediram que Mike Rogers acelerasse, pois uma das possibilidades seria um incêndio na floresta ou um avião em chamas. Pelo menos essas foram as ideias ventiladas na hora. Posteriormente, no entanto, ao darem seus depoimentos à polícia, todos disseram que sabiam que não se tratava de nada daquilo, mas que buscavam uma explicação lógica para a misteriosa fonte da luz.
Conforme avançavam pela estrada, perceberam que a luminosidade era forte o suficiente para lançar a sombra das árvores sobre eles, até que algum tempo depois alcançaram uma pequena clareira e Rogers parou a caminhonete diante dos berros dos companheiros para que o fizesse. Nas palavras de Travis Walton: “De repente estávamos eletrificados pela mais impressionante e incrível visão que tínhamos experimentado em toda a nossa vida. Como a caminhonete derrapou um pouco antes de parar na estrada rochosa e empoeirada, eu abri a porta para ter uma visão mais clara da vista deslumbrante”. Nisso Dallis gritou: “Meu Deus, é um disco voador!” Todos ficaram parados e em silêncio olhando hipnotizados para um objeto dourado e brilhante em forma de disco flutuando diante deles, com os corações aos pulos, em uma mistura de medo e espanto.
Brilho amarelo dourado
A nave estava logo abaixo do topo das árvores e tinha contornos nítidos contra o azul escuro do céu. Tinha tamanho estimado entre 5 e 7 m de diâmetro, formato de duas bacias unidas pelas bocas e um brilho amarelo dourado que se mesclava a partes de metal sólidas e prateadas. O disco voador não emitia sons. Por um momento o tempo pareceu parar para os rapazes diante daquele artefato extraordinário. Então, para a surpresa de todos, Travis Walton saltou da caminhonete e começou a caminhar lentamente em direção ao objeto, enquanto seus colegas gritavam para que ele voltasse. O rapaz, entretanto, continuou em frente, um pouco, segundo ele mesmo confessou, para se exibir para os amigos e um pouco porque não queria perder a oportunidade de ver a nave de perto — afinal, provavelmente jamais teria outra chance.
Durante o trajeto ele pensou que “se algo ocorrer, ora, eu posso sair correndo”. Isso, porém, não foi o que aconteceu. Walton começou a ouvir um som baixo vindo da nave e percebeu uma alteração em seu movimento. Assustado, encolheu-se atrás de uma pedra, conforme o som aumentava de volume e, por fim, sentindo que havia ido longe demais em sua aventura, começou a erguer-se, preparando-se para correr, enquanto os gritos de seus apavorados colegas continuavam a chamá-lo. Ele não conseguiu, entretanto, ficar totalmente em pé. E enquanto tentava, um raio de cor azul-esverdeada partiu do fundo da nave e o atingiu no peito e na cabeça, erguendo o rapaz do solo. Pouco depois o raio sumiu, atirando o Walton inconsciente ao chão.
Dentro da caminhonete, os já apavorados rapazes chegaram ao ápice do terror e trataram de sair dali o mais rapidamente possível, temendo que o mesmo ocorresse com eles. Disparando pela perigosa estrada, por várias vezes Mike Rogers quase perdeu o controle do volante, levando os outros a temerem por suas vidas. Por fim, cerca de um quilômetro à frente, ele parou o veículo e, em decisão coletiva, o grupo voltou para procurar Walton, certo de que o encontrariam morto. Nenhum deles duvidava de que pudesse ter falecido em decorrência do ataque do disco voador.
Assassinato ou armação?
Ao voltarem ao local onde Travis Walton havia sido atingido, a noite já havia caído e os rapazes, utilizando os faróis da caminhonete e a luz da uma única lanterna, caminharam ombro a ombro, em linha reta, chamando pelo amigo enquanto vasculhavam a área, mas não havia qualquer sinal dele ou da nave que tinham visto. Ainda apavorados, mas conscientes de que não conseguiriam encontrar Walton durante a noite, embarcaram no veículo e decidiram voltar para casa, sem saberem direito o que fazer. A ideia de chamar a polícia e contar o que havia acontecido foi, a princípio, de Ken Peterson, e embora tenha sido aceita com dificuldade por Allen Dallis, que já tivera problemas com a lei, e pelos outros que achavam que a polícia jamais acreditaria neles, por fim todos concordaram.
Após dirigirem por alguns quilômetros, chegaram à cidade de Heber, a mais próxima, procuraram uma cabine telefônica e Peterson ligou para a polícia. Quem primeiro atendeu à chamada e depois se encontrou com os rapazes que o aguardavam ainda dentro da caminhonete em frente à cabine telefônica foi o subxerife Chuck Ellison, que, após ouvir a história do grupo, entrou em contato via radio com outro policial pedindo que fosse à casa de Walton verificar se ele havia chegado — ao mesmo tempo em que tentava contato via rádio com o xerife da região, Marlin Gillespie. O policial encarregado de verificar a casa de Walton retornou o chamado indicando que estava trancada e escura, que não havia ninguém lá.
Quando finalmente o xerife respondeu à chamada, Ellison lhe informou que tinha uma denúncia de uma pessoa desaparecida envolvendo também um UFO, o que fez o policial ir encontrá-los. Uma hora depois, Gillespie e outro subxerife, Ken Coplan, chegaram em uma caminhonete e foram conversar com os rapazes. Em dado momento, o xerife entrou no veículo de Mike Rogers para ficar mais próximo dos operários e também tentar perceber se estavam drogados ou bêbados, mas tudo o que concluiu foi que os rapazes, principalmente Steve Pierce, estavam mesmo é apavorados. Para Gillespie não havia dúvida: aqueles seis estavam falando a verdade, por mais estranho que pudesse parecer, e chegou a declarar que ele mesmo havia tido um avistamento há algum tempo, coisa que depois desmentiu.
A partir daquele momento, visando evitar pânico, a polícia tomou a decisão de não divulgar a estranha história dos rapazes para a população, mas sim tratar do caso como um desaparecimento como outro qualquer. Por outro lado, providências tinham que ser tomadas e Gillespie, junto com alguns dos rapazes, rumou para o local onde Travis Walton havia sumido para uma busca preliminar — mas não tiveram sorte, pois Travis não estava lá.
Curiosos e desocupados
No dia seguinte as buscas recomeçaram e se expandiram, assim como se espalharam as notícias do desaparecimento do rapaz. Emissoras de TV de Phoenix, capital do Arizona, que haviam interceptado as comunicações da polícia, rumaram para a pequena Snowflake, assim como uma multidão de desconhecidos, ufólogos, curiosos e desocupados. A notícia correu o mundo e logo havia repórteres até de outros países se juntando à legião de pessoas que buscavam qualquer caco de informação que lhes rendesse alguma matéria. Como sempre acontece em casos assim, manchetes e textos foram inventados e todos os limites foram ultrapassados pela imprensa — tanto que, ao se pesquisar jornais da época sobre o andamento do caso, é impossível encontrar coerência neles, já que a matéria de um dia desmentia a do dia anterior.
A cidade não gostou da invasão, mas as pessoas não paravam de chegar e de importunar os moradores e as famílias dos rapazes. Ao mesmo tempo, as buscas se intensificaram, envolvendo helicópteros, dezenas de policiais e voluntários, além de cães farejadores. Tudo o que foi encontrado, de garrafas vazias a carcaças de automóveis, foi levado ao escritório do xerife. Porém, a pergunta continuava na mente de todos: onde estava Travis Walton? As suspeitas em relação aos seis rapazes começaram a crescer e a teoria de que eles haviam assassinado o amigo e escondido o cadáver em algum lugar foi ganhando corpo, ainda mais com a pressão da mídia, que não dava sossego a ninguém, inclusive à polícia. Outra teoria que ganhou espaço foi de que eles haviam montado uma armação para ficarem famosos ou aparecerem em TVs e revistas. Na disso se confirmou, no entanto.
Com a confusão instalada na pequena Snowflake, casas foram invadidas, pessoas foram encurraladas por microfones e a cidade virou um inferno. Em meio à confusão, ufólogos se aproximaram da família e um deles se antecipou e pediu que a primeira urina de Travis, caso ele voltasse algum dia, fosse colhida para exames futuros, o que foi devidamente anotado por Duane Walton, o irmão do rapaz. Conforme as suspeitas cresciam e a polícia se via compelida a agir, foi proposto aos rapazes que se submetessem a um teste com polígrafo [Veja box]. Não foi uma decisão fácil de ser tomada, pois, afinal, eles não conheciam a técnica e não sabiam se podiam realmente confiar na polícia — principalmente depois de terem ouvido de alguns ufólogos que o governo sempre dava um jeito de “sumir” com testemunhas de casos ufológicos. E havia ainda entre eles Allen Dallis, cujo histórico não ajudava nem um pouco e que se mostrou muito reticente em concordar com a sugestão.
O teste com o polígrafo
Por fim, após deliberarem sobre o assunto, decidiram arriscar, uma vez que sabiam estar falando a verdade e que nenhum deles havia matado Walton. Os testes com o polígrafo aconteceram no domingo, 10 de novembro, em Holbrook, também Arizona. A demora na chegada do perito causou nervosismo e ansiedade aos rapazes, que já estavam com os nervos à flor da pele, temendo que seus estados emocionais acabassem por indicar que estavam mentindo sobre a morte do amigo e que acabassem condenados por um crime que não haviam cometido. Por fim, o especialista na chamada “máquina da verdade”, Cy Gilson, chegou e os testes começaram, um a um, com duração média de uma hora e meia cada.
Mas o que o polígrafo mostrou?
Cada um dos rapazes que se sentou diante de Gilson ouviu longas explicações sobre o teste, o que ele mostraria e como e cada um deles responderia a longos questionários antes da avaliação. Os operários foram testados com as mesmas perguntas, mas feitas de forma diferente, de modo a se compararem respostas para o resultado final. Embora estivessem desconfiados e só decidissem fazer o teste após o xerife Marlin Gillespie garantir que os resultados não seriam alterados e que Cy Gilson era o melhor em sua área, aos poucos eles se acalmaram e fizeram o exame. A exceção ficou por conta de Dallis, que perdeu a paciência no meio do procedimento e deixou a sala enfurecido, dizendo que aquilo de não passava de uma “armação” para incriminá-los.
Como eles não podiam ter contato uns com os outros após o teste e os resultados só sairiam depois que o último deles tivesse passado pelo polígrafo, os rapazes ficaram até a noite esperando por notícias de Cy Gilson. A multidão de repórteres e fotógrafos do lado de fora, cansada de esperar, havia partido — o que já era um alívio. Finalmente os testes foram concluídos e o especialista começou sua análise. Quando Duane, o irmão de Walton, entrou na sala do perito para saber quais eram os resultados, ele informou que ainda não poderia fornecê-los. Mas, diante da insistência, acabou por dizer que, pelo menos preliminarmente, todos haviam passado. O relatório divulgado mais tarde com os resultados dos testes mostrou que todos, mesmo Allen Dallis, que havia feito apenas parte do teste, estavam falando a verdade. Mais do que isso: todos haviam obtido um percentual beirando os 100% no que se refere à acuidade das respostas. Portanto, sua história era verdadeira.
Enfim, o doloroso retorno
Mas por onde andaria Travis Walton? Ele voltaria algum dia? No meio da madrugada, alguns dias depois, o telefone tocou na casa da irmã de Walton, Alison, em Taylor, a única pessoa com telefone em casa nas redondezas. Seu marido, Grant Neff, atendeu a ligação e quase desligou, achando se tratar de mais um dos trotes que estavam recebendo nos últimos dias sobre o sumiço do cunhado. No entanto, a pessoa do outro lado da linha insistia em ser Travis Walton e pedia para que Neff fosse buscá-lo em certo lugar. Desconfiado, o homem perguntou ao interlocutor onde ele estava, pediu que ficasse ali e foi até a casa de Walton. Lá conversou com Duane, o irmão de Walton, e ambos acharam se tratar mesmo de um trote. Mesmo assim, por via das dúvidas, resolveram ir ao local indicado.
Travis Walton foi encontrado sentado dentro de uma cabine telefônica na cidade de Heber, do lado de fora de um posto de serviços da Exxon. Exausto e enfraquecido, tentava contar o que lhe havia acontecido enquanto o cunhado pedia a ele para que se acalmasse, que haveria tempo mais tarde para isso. Walton, porém, queria descrever o que havia vivido, mas não conseguia ir além de dizer que “os seres eram horríveis, brancos e possuíam olhos aterrorizantes”. Embora se lembrasse de tudo o que havia passado, o terror que sentia ao se recordar daqueles olhos o impedia de prosseguir. O irmão, tenta
ndo distraí-lo, disse que todos estavam muito preocupados e que era uma grande alegria que ele tivesse voltado. Walton respondeu que imaginava ter estado inconsciente por algumas horas, já que pelos seus cálculos passara cerca de uma hora e meia dentro da nave e que, como já era mais de meia-noite, provavelmente estivera desmaiado.
Ao retornar de sua abdução, Travis Walton não estava em condições de conversar com ninguém, muito menos de ser entrevistado por jornalistas ou de ser interrogado pela polícia. Ele foi a um hospital e acabou submetido a uma bateria completa de exames
Neste momento o irmão lhe falou que haviam se passado cinco dias desde seu desaparecimento, para total espanto do rapaz. Diante do choque de Walton, Duane lhe disse para passar a mão no rosto e sentir o quanto sua barba havia crescido — o abduzido não sabia o que dizer, pois para ele nada daquilo fazia sentido. Após levá-lo para casa, Duane decidiu que o melhor seria que ele fosse logo para Phoenix, onde Walton poderia passar por exames médicos e descansar longe da loucura da pequena Snowflake. Ele não estava em condições de conversar com ninguém, muito menos de ser entrevistado por jornalistas ou de ser interrogado pela polícia. Durante sua ausência, o mesmo ufólogo que pedira para guardar a primeira urina do irmão, William Spaulding, também havia entregado um cartão a Duane pedindo que o contatasse, pois poderia lhe indicar um médico de sua confiança para examinar Travis Walton de forma confidencial, assim como um hospital para fazer todos os exames necessários, uma vez que a entidade a que pertencia poderia lhe proporcionar tais facilidades. É importante se ter em mente que todas as pessoas envolvidas neste caso, embora não fossem ignorantes, eram simples. Para elas, em um momento como aquele, um pesquisador de Ufologia parecia abalizado e de confiança para ajudá-los.
Os ufólogos e o Caso Travis Walton
Ao procurarem por Spaulding em Phoenix, este lhes forneceu um endereço, pedindo que fossem até o doutor Lester Steward. Duane então ligou para o xerife Gillespie e lhe informou da volta de Travis Walton, mas omitindo estarem em Phoenix, segundo o próprio Walton, “para me proteger emocionalmente durante os primeiros dias de meu retorno”. Mas o médico indicado por Spaulding mostrou ser uma grande decepção, pois descobriu-se que se tratava apenas de um hipnoterapeuta sem formação universitária, cujo “consultório” ficava em um quarto de hotel de segunda linha e que não fora avisado por seu colega da visita dos irmãos Walton. Além disso, o homem não sabia o que fazer com o frasco de urina que lhe foi entregue. Diante de tal cenário, os dois voltaram para casa de Duane — Walton estava exausto, faminto e com uma sede que não o deixava, além de sentir-se indisposto e letárgico.
Enquanto isso, a mídia corria atrás do abduzido em todos os hospitais de Tucson, outra cidade do Arizona para a qual Duane disse ao xerife que havia levado o irmão — embora, mais tarde, no mesmo dia, tivesse contado a verdade a Gillespie. Enquanto isso, Spaulding tentava levar Travis Walton de volta ao seu grupo de pesquisas, o Ground Saucer Watch (GSW). Mas depois da decepção com o “médico” que ele indicou, os irmãos recusaram qualquer contato com o ufólogo, o que acabou fazendo com que Spaulding se transformasse em seu inimigo, lançando-se em uma cruzada para que o caso fosse tratado como uma farsa.
Nesse intervalo de tempo, outro grupo ufológico do Arizona, a Aerial Phenomena Research Organization (APRO), um dos pioneiros nos Estados Unidos e muito mais conceituado, aproximou-se dos irmãos com métodos bem mais confiáveis. Coral Lorenzen, diretora do grupo, finalmente conseguiu falar com Duane, explicando a ele que o caso de Walton era um entre muitos que estavam pesquisando no momento e que poderia ajudá-los com os exames médicos necessários, mantendo total confidencialidade. Naquela mesma tarde, dois médicos foram à casa de Duane, mas falaram apenas sobre a saúde de Walton, pois o irmão estava traumatizado demais para se aprofundar em outros assuntos. No mesmo dia receberam ainda uma visita de Gillespie, quando Walton aceitou também passar por um exame de polígrafo, desde que em total sigilo.
Bateria completa de exames
No dia seguinte, conforme havia acertado com Coral, Travis Walton foi a um hospital e acabou submetido a uma bateria completa de exames, sem que ninguém soubesse quem ele era. Com o estado emocional ainda muito fragilizado, não havia como conduzir entrevistas mais aprofundadas com o rapaz, muito menos na casa de seu irmão, mas constatou-se que não havia ferimentos, marcas ou cortes em seu corpo, exceto por uma marca na parte interna do cotovelo, similar àquela que seria deixada por uma injeção intravenosa — o detalhe é que o local da marca não correspondia a nenhuma veia importante e não seria indicado para injeções. A ideia foi de que Travis fosse examinado por alguns pesquisadores, mas os irmãos não tinham dinheiro para bancar hospedagens e despesas em hotéis. Coral então sugeriu que fizessem um acordo com o jornal National Inquirer, famosa publicação norte-americana que por anos dedicou-se a veicular matérias sobre UFOs, para que bancasse as despesas de hospedagem em troca de uma matéria, o que foi aceito pelos dois.
No dia seguinte, Travis Walton compareceria ao teste de polígrafo arranjado por Gillespie e que seria aplicado pelo mesmo Cy Gilson que examinara seus amigos, mas um telefonema da imprensa perguntando a Walton se ele realmente faria o procedimento irritou os dois irmãos — eles haviam pedido sigilo ao xerife e, como parecia que o homem não havia mantido sua palavra, Walton decidiu não comparecer ao teste. Mais tarde se soube que não fora Gillespie, mas Spaulding quem descobrira e vazara o fato para a imprensa. De qualquer forma, ao relatar o fato para o pessoal do Inquirer, o jornal se encarregou de providenciar outro teste para Walton com pessoas igualmente gabaritadas e o resultado, divulgado em 15 de novembro, foi positivo, ou seja, ele não estava mentindo.
Na noite anterior à divulgação dos resultados, Travis Walton passou por uma sessão de hipnose regressiva assistido por três psiquiatras, e só então teve condições de superar o medo que sentia e liberar suas memórias. Ele mesmo diz que a hipnose não lhe trouxe nenhuma lembrança perdida, mas o auxiliou a não sentir medo de se recordar do que vivera. A seguir vamos examinar o relato de Walton sobre sua experiência dentro na nave, mas, antes de fazê-lo, cabe uma importante informação. Em 1993 foi lançado o filme Fogo no Céu, baseado no livro que Travis Wal
ton havia escrito contando sua versão dos fatos. A primeira parte do filme, segundo o próprio abduzido, é bastante fiel ao que aconteceu, mas já a segunda é totalmente inverídica e saiu apenas da cabeça do roteirista Tracy Tormé. Portanto, o leitor que tenha assistido ao filme com certeza irá se surpreender com o relato a seguir. Foi também por meio do lançamento de Fogo no Céu que a história de Walton correu o mundo.
O relato de Travis Walton
Após ser atingido pelo raio vindo da nave, Travis Walton perdeu a consciência e voltou a recuperá-la lentamente. Segundo relata, quando começou a voltar a si, percebeu-se deitado sobre uma mesa ou maca e julgou estar em um hospital. Sua jaqueta e camisa estavam erguidas até o queixo e ele pensou que deveria estar gravemente ferido para que os médicos não o tivessem despido. A dor que sentia no peito e na cabeça não permitia que se mexesse e aos poucos, conforme sua visão voltava, pôde perceber que estava cercado por pessoas que julgou serem médicos ou enfermeiros. Ainda sem muita consciência do que lhe acontecia, notou a incrível dificuldade que sentia para respirar, como se o ar fosse pesado, úmido e muito quente. Tentou acalmar-se usando as técnicas de respiração que havia aprendido em lições de arte marcial, mas a dor era extrema, impossibilitando qualquer movimento.
Ao retornar de sua abdução, Travis Walton não estava em condições de conversar com ninguém, muito menos de ser entrevistado por jornalistas ou de ser interrogado pela polícia. Ele foi a um hospital e acabou submetido a uma bateria completa de exames
Ainda julgando que devia estar realmente mal, não se assustou quando viu pessoas curvadas sobre ele, fazendo algo em seu corpo. Mas quando sua visão melhorou, o que se deu repentinamente, apavorou-se ao ver que estava cercado por pequenas criaturas de pele muito branca e que o olhavam com enormes olhos castanhos, cujas íris ocupavam quase toda a cavidade ocular. Apavorado pela visão daqueles seres, tentou se levantar e só então percebeu que sobre seu peito havia algum tipo de objeto de metal ou plástico de cor escura que o envolvia. Mesmo estando com dores e com dificuldade para respirar, o medo foi maior e o rapaz jogou o aparelho para o lado, empurrando um dos seres, que caiu imediatamente. Ainda segundo seu relato, o ar pesado o fazia suar muito, mas mesmo assim ele tentou se erguer, o que o fez cair sobre uma espécie de prateleira cheia de instrumentos, que ele não reconheceu.
Cada vez mais apavorado, agarrou a primeira coisa que pôde, um tubo fino de vidro, e com ele ameaçou as criaturas que o cercavam. O ambiente onde se encontrava era uma sala curva com iluminação difusa, onde havia uma mesa e a tal prateleira encravada na parede, feita de material metálico. Havia apenas uma porta e Walton estava no lado contrário a ela. Portanto, tinha que passar pelos seres para fugir por ela — grogue e cheio de dores, ele avançou em direção às criaturas com o instrumento em punho, enquanto gritava e xingava, e os pequenos seres brancos simplesmente saíram correndo, deixando-o só.
A escuridão do cosmos
Travis Walton, então, cambaleou até a porta e andou por um corredor curvo, seguindo na direção contrária à que as criaturas haviam tomado. Após correr sem saber por onde seguia ou onde estava, ele finalmente entrou em uma sala onde havia apenas uma poltrona. Com muito medo de se deparar com uma das criaturas sentada ali, avançou lentamente, notando que havia nas paredes metálicas o recorte de alguns retângulos que julgou serem portas, mesmo sem notar encaixes ou maçanetas, enfim, nada que lhe permitisse abrir uma delas.
Lentamente ele começou a se aproximar da cadeira e então notou que algo estranho acontecia enquanto andava pela sala: as paredes antes cinzas e metálicas, de aspecto sólido, tornavam-se transparentes, mostrando a escuridão do cosmos e alguns pontos brilhantes. Julgando estar em algum tipo de planetário ou sala de projeções, deu-se conta de que aquilo que via não era uma projeção, mas o espaço sideral observado de dentro da nave. Ainda mais apavorado do que antes, julgando estar fora da Terra e sem uma maneira de sair dali, aproximou-se da cadeira e nela percebeu um tipo de console com botões e uma alavanca curva — notou também que podia ver linhas diante de si, como se dividindo o espaço à sua frente em sessões.
Desesperado para sair dali, começou a apertar os botões da cadeira e percebeu que as linhas e as estrelas se moviam conforme acionava alguns, mas que nada ocorria quando acionava outros. Sem ter a mínima noção do que estava fazendo, sentou-se na cadeira e puxou a alavanca, o que fez com que as estrelas que o rodeavam parecessem se transformar diante de seus olhos. Assustado, largou a alavanca e levantou-se, mas, ao se virar para porta, viu que não estava sozinho — havia ali um ser humano que o observava com olhos calmos, fazendo com que Walton achasse que estava salvo.
ETs ou apenas humanos?
O homem que o olhava era alto e bem forte, loiro, de pele morena e com peculiares olhos castanhos. Vestia um macacão azul sem insígnias ou identificações e usava um globo transparente envolvendo a cabeça. Travis correu para ele achando que estava salvo e começou a crivá-lo de perguntas, nenhuma delas respondida. O desconhecido o pegou gentilmente pelo braço e o guiou pelos corredores, levando o rapaz a vários lugares da nave, enquanto as perguntas continuavam sem respostas. Em dado momento, concluiu que o desconhecido não respondia porque não podia ouvi-lo, pois, afinal, usava aquele capacete transparente que provavelmente bloqueava o som [Veja box].
O homem o levou até uma sala onde estavam três outros humanos, dois homens e uma mulher, todos parecidos entre si, embora essas novas pessoas não usassem o globo envolvendo a cabeça. De resto, vestiam roupas idênticas e tinham os mesmos olhos de formato peculiar. Certo de que aquelas pessoas poderiam ouvi-lo, Walton recomeçou suas perguntas, mas nada lhe foi dito. Irritado, começou a gritar e a xingar, pedindo explicações e ajuda. Os outros se aproximaram dele e o forçaram a deitar-se sobre uma mesa de metal — Walton lutava para se levantar, mas os homens mantiveram as mãos sobre seu corpo de forma gentil, porém firme.
Desesperado para sair da nave, Travis Walton começou a apertar os botões da cadeira que encontrou em uma de suas salas e percebeu que as linhas e as estrelas se moviam conforme acionava alguns, mas que nada ocorria quando apertava outros
Enquanto gritava e brigava, Travis Walton viu a mulher pegar uma máscara muito parecida co
m estas de oxigênio, porém sem fios ou tubo, e encaixar nela uma esfera negra. A máscara foi colocada sobre seu rosto e a próxima coisa de que ele se lembra é de estar deitado em uma estrada com o rosto contra o asfalto. O rapaz recobrou a consciência lentamente e, ao olhar para cima, viu a nave pairando vários metros acima dele. Quando se moveu, o disco arrancou e simplesmente sumiu no espaço. Mesmo cansado, zonzo e enfraquecido, ele reconheceu as luzes ao longe como sendo da cidade de Heber e correu para lá o mais rápido que conseguiu, até encontrar a cabine telefônica e ligar para a irmã.
Há quase 40 anos, essa foi a história contada por Travis Walton e seus amigos. De lá para cá, diversos testes de polígrafos foram feitos não apenas com o abduzido, mas também com seus companheiros, e os resultados vêm se mantendo consistentes ao longo das décadas. Mas passar por um detector de mentiras é o suficiente para se provar uma abdução? E as críticas e argumentações paralelas, o que dizem?
Uma grande farsa?
Travis Walton foi acusado de muita coisa e de ter montado, juntamente com seu amigo Mike Rogers, toda essa “história” do disco voador e da abdução porque Rogers estava perto de perder o contrato com o Serviço Florestal dos Estados Unidos, uma vez que não conseguiria terminar o trabalho de corte de árvores dentro do prazo estipulado. Caso isso acontecesse, ele não receberia pelo trabalho já prestado e nem teria como pagar seus funcionários. Porém, o contrato formalizado com o governo tinha uma cláusula sobre “circunstâncias além do controle humano” em relação ao atraso no serviço. Ou seja, caso algo extraordinário ocorresse, o contrato continuaria valendo e os pagamentos seriam feitos. Essa teoria para explicar a abdução alienígena foi defendida principalmente pelo notório cético ufológico Phillip Klass, sem credibilidade no meio ufológico [Veja box].
Se Travis Walton ou Mike Rogers montaram essa trama, foram geniais a ponto de conseguirem efeitos e maquetes perfeitas, autocontrole para enganar o polígrafo repetidas vezes e ainda uma atitude assustadora de mentir deslavadamente para amigos e familiares. Mas não é o caso e os argumentos levantados contra Walton não se sustentam — o que não significa automaticamente que o relato dos rapazes seja verdadeiro, mas que não há uma convincente explicação lógica alternativa a ele. A narrativa de Walton é complexa e cheia de detalhes e o depoimento dos outros seis rapazes sobre o que viram naquela noite é algo que não se pode descartar, por menos confiável que seja um exame de polígrafo.
Dentro da Ufologia há aqueles que acreditam piamente em tudo o que Travis Walton contou e há os que olham para o caso com simpatia, mas se reservam o direito da dúvida. O próprio abduzido, após passar décadas tentando convencer as pessoas de que dizia a verdade, terminou por não se importar mais com a opinião alheia. “Relato minha história, mas no fim das contas cada um acredita naquilo que tem condições de acreditar”, diz hoje.
Há também a versão da polícia para os fatos. Obviamente, para qualquer policial relativamente equilibrado, ouvir a denúncia de que uma pessoa foi levada por um disco voador após ser atingido por um raio bem diante de vários amigos é algo que suscita suspeitas. E é bom que seja assim, já que a polícia é paga para investigar crimes e não acreditar em declarações sem provas — e isso foi exatamente o que a polícia fez no caso de Travis Walton, ou seja, foi em busca de provas. Foram feitas seguidas e exaustivas buscas pela mata, suspeitos foram interrogados e levados para testes de polígrafo, que, naquela época mais do que agora, era algo tido como confiável. O que mais poderia a polícia ter feito?
Quebra-cabeças difícil de montar
Os rapazes juravam convincentemente que não haviam matado o colega e que haviam visto um disco voador. A volta de Travis Walton provou que diziam a verdade e que o perito que fez os testes de polígrafo interpretara corretamente as respostas. Enfim, havia ali um quebra-cabeças difícil para os policiais montarem. A opinião inicial do xerife Marlin Gillespie, conforme declarou na época, era a de que os rapazes haviam feito a polícia de boba e que gostaria muito de saber a verdade dos fatos. Para Gillespie, no começo, tudo havia sido armado para chamar a atenção sobre os rapazes, para ficarem famosos ou apenas como uma grande brincadeira. Mas, apesar de sua opinião, o xerife encerrou o caso, uma vez que a denúncia era de desaparecimento de uma pessoa e como a tal pessoa reapareceu sem qualquer indício de violência, não havia mais o que investigar.
Após o retorno de Travis Walton e de todas as pesquisas, entrevistas e matérias que o fato rendeu, a vida não ficou mais fácil para nenhum dos envolvidos. Alguns trocaram de nome, outros mudaram do Arizona — isso sem falar que relacionamentos pessoais passaram por tal carga de estresse que alguns casamentos terminaram. Walton foi bombardeado de todas as formas pela mídia, assim como seus amigos, e nenhum deles nunca alterou uma vírgula no que haviam dito. Passado o primeiro momento de agitação, Walton arrumou outro emprego e tentou seguir com sua vida, mas, diante do assédio e das ofensas que lhe foram dirigidas, decidiu escrever um livro contando sua história. The Walton Experience [Berkley Press] foi lançado em 1979 narrando tudo o que envolveu o incidente. Foi a tentativa do abduzido de contar sua versão dos fatos e de se livrar da perseguição que enfrentava.
A história dos sete rapazes de uma cidadezinha do Arizona ganhou o mundo e se tornou o caso de abdução mais importante da Ufologia. E o livro de Travis Walton que trata do episódio em primeira pessoa agora chega ao Brasil por meio da Revista UFO
Uma década depois, Walton foi procurado pelo já citado roteirista de Hollywood Tracy Tormé, que estava interessado em fazer um filme sobre o incidente. Relutante e desconfiado, concordou em recebê-lo em Snowflake e aos poucos Tormé conseguiu vencer a resistência do homem e passou a entrevistar todos os envolvidos no caso, além de residentes da cidade, pessoas contra e a favor da história dos rapazes. Seis anos e meio depois, o filme começou a ser produzido. Apesar do baixo orçamento e das mudanças constantes que Walton fazia no roteiro, Fogo no Céu foi finalmente lançado em 1993, sendo distribuído para boa parte do planeta em formato VHS e recebendo boas palavras da crítica.
O que faltou dizer
A históri
a dos sete rapazes moradores de uma cidadezinha do Arizona ganhou o mundo e se tornou o caso de abdução mais importante e conhecido da Ufologia. Sobre o filme, Walton diz que acabou fazendo concessões à imaginação de Tormé porque, afinal, Hollywood tem sua própria maneira de contar as histórias. Mas isso não o impediu de afirmar, desde que o filme foi lançado, que a parte mostrada dentro da nave é completamente inventada. “Nada daquilo aconteceu. Mas eu acho que no negócio de produção de filmes as coisas são assim mesmo”, declara.
A complexidade do Caso Travis Walton não é pouca e várias questões vêm à mente quando se observam as pesquisas feitas sobre ele. A primeira envolve o trafego aéreo na região da abdução, pois o estado do Arizona tem várias bases militares e, portanto, seria interessante saber o que os radares registraram naquela noite, assim como ouvir controladores de tráfego aéreo a respeito. Outro ponto que chama a atenção é o fato de que, apesar de todo o barulho produzido pelo caso, Walton e seus amigos jamais foram diretamente contatados por nenhum órgão governamental, oficial ou extraoficialmente. Parece que a lenda da perseguição governamental aos ufólogos não se aplicou a esse caso, o que nos leva a pensar que, dentro da Ufologia, muitas vezes a mitologia fala mais alto do que os fatos.
Alguns aspectos do episódio também carecem de mais detalhes e de descrições mais minuciosas, como, por exemplo, o que diz respeito ao som que Travis Walton alega ter ouvido vindo do UFO e como ele foi percebido pelos rapazes dentro da caminhonete, ou sobre o mapa estelar que viu dentro da nave e a marca de agulha que havia na parte interna de seu braço, que agora já não pode mais ser examinada. Igualmente, a área onde se deram os acontecimentos fica perto de reservas indígenas e foi impossível encontrar referências a quaisquer pesquisas feitas naqueles territórios, o que seria enriquecedor.
Por fim, após tudo que apresentamos aqui, cabe a pergunta: como encarar o relato de Travis Walton e de seus amigos? Alguns o verão como verdadeiro, outros, como Phillip Klass, dirão que foi um golpe. Alguns mais, como o xerife Marlin Gillespie, pensarão que se tratou de uma brincadeira que foi longe demais e sobre a qual os rapazes perderam o controle. Seja qual for a conclusão do leitor, uma coisa é certa: o Caso Travis Walton continua resistindo ao tempo e desafiando todas as tentativas de explicá-lo por outro viés. Como tudo dentro da Ufologia, termina-se onde se começa: uma grande interrogação e a incessante busca por respostas.
Afinal, como já disse alguém, são as perguntas, e não as respostas, que impulsionam o progresso da humanidade.
Ceticismo versus critério e razão
Foi Phillip J. Klass, um engenheiro mundialmente conhecido por seu ceticismo quanto à Ufologia, quem primeiro defendeu a tese de que todo o caso não passava de uma farsa perpetrada por Travis Walton e Mike Rogers para ludibriar o Serviço Florestal dos Estados Unidos. A postura cética de Klass se transformou em uma espécie de perseguição ao abduzido, uma obsessão dele por negar algo simplesmente por escapar a uma explicação lógica e consistente que o satisfizesse.
Analisando os papéis de Klass [Foto] e as “evidências” que ele juntou ao longo dos anos em relação ao Caso Travis Walton, percebe-se que cai por terra quando confrontada com a realidade. É verdade que Rogers perderia seu contrato com o governo se não terminasse o trabalho, porém não seria a primeira vez que isso aconteceria. Rogers já havia perdido contratos antes e mesmo assim conseguira firmar novos com o Serviço Florestal — e ele realmente perdeu o contrato por conta do desaparecimento de Walton, ou seja, se foi uma farsa, não funcionou.