Naturalmente, dentro da prática da investigação ufológica existem pormenores que não se enquadram devidamente no âmbito geral do assunto. Entre as muitas possibilidades deste controverso tema, há inúmeras questões que hoje podem ser descartadas, como se fossem peças de ficção e não tivessem mais utilidade para compreender a extensão da presença alienígena na Terra. Ao mesmo tempo, nos últimos anos tem havido uma farta e indesejada expressividade dos assim chamados “contatados” e “messianistas”, além, é claro, de sinceros aproveitadores da ocasião. O leitor não necessita pensar muito para saber de quem se trata. Hoje, por exemplo, com os conhecimentos atuais de que a Ufologia dispõe, podemos reservar a um limbo respeitoso um tal de George Adamski e seu disco voador venusiano, repleto de janelas e parafusos. Ora, quem ainda acredita em uma nave com janelinhas e repleta de parafusos? Por outro lado, há ainda hoje quem duvide que Neil Armstrong colocou os pés no solo lunar em 20 julho de 1969. Como pode a maior odisséia da humanidade ser desacreditada? É incrível, mas há quem pense assim. Como disse Albert Einstein, pessoas essas retrogradam no tempo, ou, antes, nunca deveriam ter nascido.
No entanto, há dois pesquisadores contemporâneos, sérios e competentes – e disso não se pode duvidar –, que foram além na questão que envolve a credibilidade da Ufologia, e lançaram-se numa tentativa exagerada de, a partir de casos dos referidos contatados e messianistas, negar todo o resto do contexto ufológico. Falamos de Carlos Alberto Reis, ex-consultor e ex-ombudsman da Revista UFO, e Ubirajara Franco Rodrigues, que já foi igualmente consultor, co-editor e advogado da publicação, tendo nela vários artigos publicados. Ambos, seguramente, fazem jus ao seu extenso e maravilhoso currículo. Rodrigues, por exemplo, foi quem levantou detalhes da captura de estranhos seres pelo Exército e Corpo de Bombeiros em Minas Gerais, em 1996, e foi o principal investigador do caso. O episódio foi detalhadamente descrito em um livro escrito por ele, O Caso Varginha, publicado pela coleção Biblioteca UFO [Código LIV-008. Confira na seção Shopping UFO desta edição e no Portal UFO: ufo.com.br]. Rodrigues foi também peça central de uma grande polêmica recente, gerada por sua contundente entrevista à UFO, Virando a Mesa da Ufologia Brasileira, publicada em duas partes nas edições 153 e 154.
Ótica no mínimo inadequada
Reis e Rodrigues fizeram uma tentativa de analisar a Ufologia através de uma ótica no mínimo inadequada, em seu recente livro Desconstrução de um Mito [Editora Livro Pronto, 2009], com o impressionante subtítulo Um Mito Nada Moderno Sobre Coisas Vistas na Terra: Porque os Discos Voadores Podem Não Existir – uma clara referência a uma obra da metade do século passado, Um Mito Moderno Sobre Coisas Vistas no Céu, de ninguém menos do que o psiquiatra Carl Gustav Jung [Reeditado pela Editora Vozes, em 1991]. O livro foi lançado em São Paulo, em julho passado, para uma pequena audiência, embora causasse uma polêmica desproporcionalmente maior na internet [Veja seção Giro Literário da edição UFO 158]. Devo dizer que trabalhei durante muitos anos com um dos autores, Reis, de quem fui parceiro em muitas jornadas investigativas e promissoras. De Rodrigues sou amigo há mais de duas décadas.
Recebi recentemente dos autores e li com atenção A Desconstrução de um Mito, tirando dele muitas conclusões que gostaria de compartilhar com os leitores da Revista UFO, uma vez que foi nesta publicação que um deles, Rodrigues, em sua entrevista, se referiu tão negativamente à Ufologia e sobretudo aos ufólogos, causando perplexidade em muitos e atingindo a indignação de alguns. O texto da obra é excelente, maravilhosamente bem escrito, além de objetivo, claro, veemente, chocante e real – muito real mesmo. Ainda que, por real, possamos questionar muitas possibilidades e diretrizes de investigação. A Desconstrução de um Mito, sendo um livro formidável, acrescenta ainda um alerta significativo quanto aos ditos contatados e exploradores de plantão, que muito prejuízo têm causado à Ufologia, devido às intermináveis e infundadas profecias que lançam – algumas até incluindo a figura de Jesus Cristo no centro do panorama, como apóstolo de uma nova era de “capitães cósmicos” e “guardiães das frotas interestelares”.
Segundo a ótica de Reis e Rodrigues, não se deve estranhar porque a comunidade científica vigente não se torna aliada da Ufologia na pesquisa do fenômeno dos discos voadores, e ainda se afasta cada vez mais deste terreno contaminado. Neste aspecto, seu livro é certeiro e não deixa margens à dúvidas quanto ao desgosto ou desassossego que os incautos exploradores acima referidos causam no meio ufológico. Entretanto, não se pode reduzir a Ufologia a isso, ou apenas a partir disso fazer uma análise que lhe resulte completamente desfavorável – e foi aí que Reis e Rodrigues cometem seu maior equívoco. Ainda que a capacidade investigativa destes dois formidáveis estudiosos e pesquisadores não possa ser colocada em questão, há que se ter em conta que o pré-julgamento que fazem da fenomenologia ufológica ao final de seu livro é, pelos menos, ambíguo. Eles afirmam, taxativamente, que simplesmente não há discos voadores. Ou então, se existem, não passam de erros de interpretação gerados pelo nosso incomensurável e desconhecido inconsciente.
Avaliações precipitadas
Para Reis e Rodrigues – e isso está patente em A Desconstrução de um Mito –, os casos de observação de discos voadores não passam de relatórios com falhas de verificação e erros de análise, contendo avaliações precipitadas e desonestidade disfarçada ou declarada de testemunhas que os relatam ou dos pesquisadores que os investigaram. Neste caso, se estiverem certo, o livro atende à uma emergente necessidade de reavaliar o conteúdo total da Ufologia, de ponta a ponta. Também é interessante observar na obra que a totalidade de seu conteúdo expressa uma indagação um tanto disforme, por parte dos autores, e alimenta uma indescritível e contínua falta de reflexão. Ora, se não há discos voadores, como pretendem Reis e Rodrigues, onde colocamos as “dezenas de relatórios” de militares de pilotos, cientistas e até a
stronautas, por exemplo, que fomentam o crescimento da casuística ufológica de forma brutal nas últimas décadas, e ainda apoiados em inúmeros filmes, incontáveis fotos, detecções confirmadas por radares etc. E olhe que estamos falando apenas de “dezenas de relatórios”, que fiz questão de colocar entre aspas, para deixarmos o número mais palatável, e não milhares de casos, como defendem alguns.
Noutra linha de questionamento sobre as conclusões de Reis e Rodrigues, mais para nossa realidade, o que será que os autores nos sugeririam fazer, por exemplo, com a Operação Prato, a espantosa missão militar que a Força Aérea Brasileira (FAB) desenvolveu secretamente na Amazônia, em 1977, que foi denunciada pela Revista UFO e que agora vem à tona em incríveis detalhes através de centenas de páginas de documentos liberados pelo Governo? Ou, então, o que dizer das fotos de uma nave discóide feitas por Almiro Baraúna a bordo do navio-escola da Marinha Almirante Saldanha, em 1958, diante de mais de duas dúzias de estupefatos militares e testemunhas presentes na embarcação – fotos estas que foram apreciadas até mesmo pelo presidente Juscelino Kubitschek, na época em que eclodiu o Caso da Ilha Trindade? Vamos colocar estes episódios na mesma gaveta onde repousam, por exemplo, o Caso Barra da Tijuca, da mesma época, que a própria Ufologia Brasileira declarou como fraude – esta mesma Ufologia que deu à Operação Prato e às fotos de Baraúna nota máxima em credibilidade?
Se os UFOs não existem, como pretendem Rodrigues e Reis, então é necessário avisar urgentemente os governos de dezenas de países, inclusive o nosso, pois estão gastando fortunas e empregando milhares de especialistas civis e militares para investigar algo inexistente, há seis décadas. Alguns deles chegaram até a liberar milhares de páginas de documentos antes secretos sobre o que os autores chamam de “mito”
— Marco Antonio Petit, co-editor da Revista UFO
Muita prudência se faz necessária neste caso, já que a ambigüidade das afirmações dos autores é notória. Como também é importante dizer que não se pretende, aqui, ofendê-los ou a sua moral, mas ressaltar com veemência o que existe de sério a ser considerado na Ufologia, ainda que ela esteja fincada num terreno pantanoso. O que se pretende julgar, neste artigo, não é o caráter dos autores, que está acima de qualquer questionamento, mas sua pesquisa e, sobretudo, suas conclusões em A Desconstrução de um Mito, que parecem um tanto precipitadas, como um pré-julgamento de fatos. Simplesmente, não podemos e não devemos taxar de incompetentes e visionários tantos ufólogos, estudiosos e até cientistas que vêm se dedicando obstinadamente à pesquisa ufológica.
Apaziguando ânimos exaltados
Tendo dedicado algumas décadas de minha vida a fazer o mesmo, perseguindo com persistência a busca de respostas para o Fenômeno UFO e o tendo esclarecido suficientemente em suas bases, contesto de maneira incisiva as conclusões de Reis e Rodrigues, e me manifesto de maneira igualmente convicta: sem dúvida, há discos voadores! E mais: afirmo que são veículos ou sondas de origem interplanetária, concebidos, projetados e construídos por civilizações que, pelo menos sob o ponto de vista tecnológico, atingiram evolução em tal estágio que já se lançaram ao espaço em busca de espécies semelhantes – ou não –, tal como o homem terrestre vem fazendo há décadas com incontáveis viagens ao espaço, porém mais modestamente.
Já posso ouvir as vozes de Reis e de Rodrigues, veementes e discordantes, perguntando: “mas cadê as provas disso? Mostre-nos as provas!” Ora, se colocarmos tudo no terreno subjetivo, qualquer coisa que pretendamos ressaltar como verdadeira carecerá sempre de provas. Não há como ser diferente, mas não é este viés por onde a questão deve ser analisada, até porque, se assim fosse, está tão errado dizer que há discos voadores quanto dizer que não há discos voadores, como fazem os autores. Mas, para não incendiar o diálogo ou colocar lenha desnecessária na fogueira das hipóteses, poderíamos simplificar tudo ao que já nos ensinava o falecido astrofísico J. Allen Hynek, um dos principais patronos da Ufologia: “Os discos voadores existem, mas eu não sei o que são”. Ficaria, assim, estabelecido um meio-termo para a questão, que, em hipótese, poderia apaziguar os ânimos mais exaltados. Não é o que se deseja, diante de tudo o que já se sabe sobre o assunto, mas, por hora, já ajudaria.
De qualquer forma, sugiro fortemente ao leitor que adquira e leia A Desconstrução de um Mito, não somente por que é excelente, mas por predispor à indagação, embora erre flagrantemente em suas conclusões. Seu conteúdo possibilita uma reflexão e constitui um alerta – nesse sentido nada ambíguo – quanto aos exploradores que abundam no caldo ufológico, que necessitam urgentemente ser filtrados e dele eliminados. Neste sentido, A. J. Gevaerd, editor da Revista UFO, tem sido sério e incansável, como pesquisador e divulgador de mente atenta ao que existe de possível no terreno da pesquisa ufológica nacional e internacional. Devemos a ele, e de muitas formas possíveis, o estágio em que se encontra a situação de abertura dos documentos secretos dos militares brasileiros sobre o Fenômeno UFO. Como colegas, partilhamos da mesma indignação ante à obra de Reis e Rodrigues – relativa apenas à sua pesquisa e conclusão, pois nada temos de pessoal ou subjetivo a acrescentar fora delas.
Coisas pessoais mal resolvidas
E esta indignação, igualmente compartilhada por muitos ufólogos brasileiros, refere-se apenas a não substancialidade factual do conteúdo de A Desconstrução de um Mito, que, na opinião deste crítico, destoa imensamente do bom senso e promove um indesejado constrangimento. Para se ter uma idéia da contradição de Reis e Rodrigues na obra, eles afirmam que não há provas de que os impressionantes agroglífos nas plantações inglesas e de tantos outros países – inclusive o Brasil –, observados e pesquisados tão dedicadamente por uma constelação de ufólogos e cientistas, foram produzidos por extraterrestres [Veja edições UFO 146 e 149]. No entanto, os autores também não explicam – sob sua visão – como foram feitos! Simplesmente, fazem uma afirmação negativa e ponto final. Parece-me que a pesquisa vai bem além disso, e que tal fenômeno não pode, de forma tão simplista, ser colocado, junto de outros igualmente impactantes, em uma situação de “faz de conta”. Que tal uma boa dose de imparcialidade a&iacut
e;? Sim, ela se faz necessária, já que, da mesma forma, negar por negar também é algo anti-científico.
Enfim, a controvérsia levantada por Carlos Reis e Ubirajara Rodrigues, em A Desconstrução de um Mito, parece ter sido originada mais por questões subjetivas do que propriamente científicas, deixando transparecer evidentes resquícios de coisas mal resolvidas no campo pessoal dos autores, algo costumeiro em qualquer área. E se assim for, seria uma excelente iniciativa se tiverem seus ânimos serenados. Uma coisa é a discussão estéril, capciosa e sem fundamento, outra é o Fenômeno UFO em si, cujas características vão muito além dessas misérias intelectuais, e cujas conseqüências podem fazê-las perder o sentido por completo, logo de partida. Se ponderarmos sobre isso, só teremos a ganhar. Ainda assim, toda a tentativa de esclarecer sua natureza será sempre bem-vinda, pois somente desperta a possibilidade de novas reflexões, ainda que para este autor nada disso seja necessário, pois os UFOs são reais, substanciais e contundentes por si mesmos.