O Sol lançou violentamente no espaço mais de 1 bilhão de toneladas de partículas durante esta ejeção de massa coronal em 8 de janeiro de 2002O Sol dispara raios X e partículas de alta energia durante os flares, o que força os astronautas que estão além do campo de proteção da Terra a procurar abrigo. A radiação penetra a pele com facilidade e pode danificar seriamente o DNA.
A quantidade de radiação que o corpo humano pode tolerar é um fator crucial se a Nasa decidir enviar astronautas novamente à Lua, a Marte e além desse planeta. A agência espacial deve encontrar uma forma de proteger os astronautas. A radiação prejudica as espaçonaves e, naturalmente, as pessoas, causando desde o descontrole do aparelho digestivo até a falência do sistema nervoso central. Os efeitos da exposição à radiação são sérios problemas que as missões espaciais tripuladas devem resolver.
A Terra nos protege da maior parte da radiação que preenche o Universo. O campo magnético terrestre expulsa ou aprisiona partículas nocivas de alta energia emitidas pelo Sol. As partículas aprisionadas espiralam indefinidamente entre os pólos norte e sul magnéticos, formando os cinturões de radiação de Van Allen. A atmosfera da Terra espalha e absorve os raios cósmicos – protegendo ainda mais a vida.
Felizmente, os cinturões de radiação da Terra se estendem no espaço o suficiente para que a Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês) orbite no interior da magnetosfera. De fato, a Terra possui um campo de força natural capaz de proteger os astronautas da ISS da maior parte da radiação que chega do espaço. Na verdade, com exceção das missões com duração de uma semana para a Lua, todos os vôos espaciais tripulados, até agora, ocorreram dentro da proteção provida pela magnetosfera terrestre.
A radiação espacial é formada por átomos isolados. À medida que esses átomos são acelerados até quase a velocidade da luz, seus elétrons são arrancados (ficam ionizados) e somente os núcleos atômicos permanecem. Esses núcleos contêm tanta energia que conseguem arrancar elétrons de qualquer coisa com que se choquem. Se eles atingirem uma nave espacial, ou pior, um corpo humano, causarão um dano considerável.
Nem a Lua nem Marte possuem campo magnético que os proteja, mas a massa sólida de cada mundo provê certa blindagem. A radiação que atinge astronautas na Lua ou em Marte vem somente de cima, mas, no espaço, ela vem de todos os lados.
A Lua não possui atmosfera e Marte dispõe de uma atmosfera muito tênue, de cerca de 1% da atmosfera da Terra, mas ainda assim consegue bloquear boa parte das partículas solares que se precipitam na sua superfície. Infelizmente, essa atmosfera tão rarefeita não é suficiente para impedir que os raios cósmicos – partículas de alta energia do espaço – cheguem até a superfície do planeta. Por isso, a proteção da radiação para os humanos que viajam fora da magnetosfera terrestre é um assunto desafiador – e um problema e tanto.
No espaço existem duas fontes principais de radiação. A primeira, e mais óbvia, é o Sol. Na dinâmica solar, há períodos em que o astro se mostra relativamente “calmo” e outros em que se comporta como um monstro furioso, alternando esses dois comportamentos em ciclos de aproximadamente 11 anos. No máximo do ciclo, surgem manchas solares por toda a superfície solar. Flares e emissão de massa coronal (CME, na sigla em inglês) ocorrem com freqüência, lançando no espaço nuvens de bilhões de toneladas de material altamente energético.
Um flare ocorre quando a energia magnética contida no Sol se acumula – formando um pico próximo da superfície -, explode e desencadeia a liberação repentina de partículas de alta energia pelo espaço afora.
As CMEs ocorrem quando as linhas do campo magnético se rompem. Uma grande CME pode lançar bilhões de toneladas de partículas carregadas e de gás quente para o espaço a centenas de milhares de quilômetros por hora.
Durante os dois tipos de eventos, as partículas mais energéticas atingem a Terra em poucos minutos. Em períodos em que a atividade solar está no máximo, vários flares e CMEs entram em erupção diariamente. Mas mesmo períodos de baixa atividade não garantem segurança total para os astronautas. A atividade solar, embora baixa em alguns momentos, nunca cessa.
Alguns dos flares mais violentos ocorrem em anos após o máximo solar. As erupções são tão imprevisíveis e acontecem tão rapidamente que os astronautas teriam muito pouco tempo para se proteger. Os flares são mais comuns que as CMEs e podem causar danos mais graves por radiação. É imprescindível dispor de um serviço de previsão da atividade solar quando se planeja passar períodos mais longos no espaço.
A segunda, e mais previsível, fonte de radiação do espaço são os raios cósmicos galácticos. Supostamente produzidos durante explosões de supernovas, essas partículas bombardeiam o Sistema Solar vindas de todas as direções. A taxa do fluxo dessas partículas é baixa, mas elas viajam a altíssimas velocidades. Os raios cósmicos são constituídos de prótons, núcleos de elementos pesados de alta energia. Os núcleos que podem afetar significativamente as funções biológicas vão desde o hidrogênio até o ferro. Núcleos pesados – como o ferro – são os mais perigosos.”
Os raios cósmicos galácticos são formados por partículas altamente ionizadas e podem prejudicar seriamente os tecidos”, afirma Cary Zeitlin, especialista em radiação do Lawrence Berkeley National Laboratory, em Berkeley, Califórnia. “No entanto, o fluxo dessas partículas é muito baixo.” Mesmo um evento de partículas solares intenso produz muito poucas partículas tão perigosas. Uma partícula isolada, gerada por um evento solar típico, produz danos muito menores que um íon pesado gerado por raios cósmicos. Mas, além dessas partículas, o Sol produz outras.
Os raios cósmicos penetram com facilidade as naves espaciais e a pele dos astronautas. Esta é a fonte de radiação dominante, da qual os astronautas da ISS precisam se proteger. Os raios cósmicos também serão um grande desafio para os astronautas a caminho de Marte. Ao mesmo tempo em que os riscos devidos ao Sol diminuem durante o mínimo de atividade, o perigo devido aos raios cósmicos aumenta. À medida que a atividade solar diminui, o campo magnético vai se enfraquecendo e não consegue mais defletir os raios cósmicos com a mesma eficiência. Então, a intensidade dos raios cósmicos aumenta.
A profissão de astronauta é considerada de alto risco, comparável aos profissionais que se exp&oti
lde;em a altos níveis de radiação no seu trabalho diário (operadores de aparelhos de raios X). A Nasa vem monitorando o nível de radiação a que são submetidos os astronautas em todos os seus vôos tripulados desde que o Projeto Mercury começou, em 1961. Os membros da tripulação a bordo de naves fortemente blindadas como a ISS usam dosímetros para monitorar os níveis de radiação. A radiação medida pode alertar os tripulantes sobre perturbações solares. Durante um flare solar extremamente intenso, um astronauta da ISS que não se proteger pode receber, em algumas horas, uma dose de radiação muito superior à máxima anual permitida.
O Mars Radiation Environment Experiment (Marie – Experimento para Medir a Radiação Ambiental de Marte) da Nasa, a bordo da Mars Odyssey, coletou dados sobre a radiação do ambiente espacial e em órbitas próximas de Marte antes de parar de funcionar. O equipamento ficou mudo ao registrar a tempestade solar de outubro de 2003, vítima da intensa radiação. Resultados preliminares sugerem que os astronautas que viajem a Marte numa missão de três anos podem se expor a doses de radiação próximas dos limites de segurança estabelecidos para a vida toda. “Pessoalmente, acredito que o problema da radiação tenha solução”, assegura Paul Delaune, da equipe Marie. “O problema da dose total acumulada tem duas variáveis: taxa de radiação e tempo de exposição. Nosso objetivo é reduzir uma delas, ou ambas, de modo a baixar os níveis de exposição acumulada a doses aceitáveis”.
Sistemas de propulsão avançados poderiam encurtar o tempo de viagem para Marte e, assim, diminuir o tempo de exposição. Blindagens especiais também reduziriam as doses de radiação durante os períodos em que os astronautas estivessem expostos ao ambiente espacial. Os materiais utilizados devem bloquear as partículas energéticas e também evitar que a radiação secundária seja criada pela interação da radiação primária com a matéria.
“O caso dos prótons solares é um problema simples de engenharia”, afirma Frank Cucinotta, do Space Radiation Health Project (Projeto de Saúde da Radiação Espacial) que a Nasa desenvolve no Johnson Space Center. “A energia dos prótons é tal que uma blindagem já é suficiente. Alguns centímetros de qualquer material já conseguem reduzir a dose de prótons solares a um nível mais baixo”.
Mas no caso dos raios cósmicos de alta energia a blindagem tem efeito limitado. “Até agora, não há dados suficientes em humanos para que os cientistas possam prever os riscos reais causados pelos raios cósmicos galácticos em missões espaciais de longa duração”, diz Cucinotta.
Os locais onde os astronautas passam a maior parte do tempo na ISS, como as áreas de descanso, têm uma blindagem adicional. Os astronautas podem deslocar-se dentro dessas áreas mesmo que uma nuvem de partículas carregadas esteja a caminho. Os cientistas descobriram que os materiais de massa atômica baixa, particularmente o hidrogênio funcionam melhor como blindagem contra a radiação. Estruturas de compostos de carbono com alto conteúdo de hidrogênio bloqueiam eficientemente a radiação. Os projetos mais avançados para as futuras espaçonaves procuram proteger os astronautas envolvendo o espaço onde eles circulam com o reservatório de água da nave (a água – H2O – contém grandes quantidades de hidrogênio) ou com os próprios tanques de combustível de hidrogênio líquido.
Os plásticos também absorvem a radiação porque são bastante hidrogenados. A Nasa desenvolveu um polietileno reforçado que é dez vezes mais forte que o alumínio, e muito mais leve. Esse material já está sendo usado na blindagem de algumas partes da ISS.
Várias idéias para uma proteção eficiente – usando plasma ou um campo magnético intenso – estão sendo consideradas na construção das futuras naves espaciais e para a criação de bases em outros planetas. Um desses projetos utiliza campos elétricos para desviar as partículas carregadas.
Os estilistas do espaço terão de modificar os trajes espaciais dos astronautas – os abrigos terão de resistir a esse ambiente hostil e ser ainda mais leves e mais flexíveis que os trajes da Apollo. Os projetistas poderão instalar também pequenos sensores para alertar os astronautas sobre altos níveis de radiação e a proximidade de materiais tóxicos.
A maior preocupação com a saúde dos astronautas é a possibilidade de desenvolverem câncer. A Nasa monitora o nível da radiação espacial tendo em vista o risco da doença. Há outros efeitos que uma longa exposição pode causar como catarata, doença da radiação (também conhecida como envenenamento por radiação), danos ao sistema nervoso central e imunológico e até doenças cardíacas.
Algumas pessoas são mais susceptíveis à radiação que outras. Para as pessoas idosas os riscos são menores, porque o câncer tem menos tempo para se desenvolver. Em geral, a doença mata mais homens que mulheres.
A radiação afeta as células humanas em escala molecular. O DNA, tijolo básico da vida, está presente em cada célula do nosso corpo. Como a radiação ionizante penetra o tecido vivo, pode romper as cadeias do DNA.
É possível administrar as baixas doses de radiação durante períodos prolongados, pois o corpo tem tempo de reparar o mal causado. Mas no caso de doses altas, por exemplo, de um intenso flare solar – o efeito pode ser mais grave. As células podem sofrer danos irreparáveis e produzir células cancerosas. Este efeito é difícil de medir. Pode levar décadas entre a exposição à radiação e o aparecimento de um tumor. No caso extremo, o dano celular interrompe o funcionamento dos tecidos do corpo e aí pode ocorrer a doença da radiação ou mesmo a morte.
Os cientistas estão desenvolvendo suplementos alimentares e drogas capazes de proteger os astronautas desses danos biológicos, com prioridade na prevenção de câncer. Segundo o especialista em radiação Zeitlin, “independentemente do tipo de blindagem, as partículas virão com tudo, e os astronautas sempre irão receber doses muito maiores de radiação que as pessoas na Terra. Isso aumenta o risco de câncer e de outras doenças que eles podem desenvolver. Seria extremamente útil encontrar uma droga ou um suplemento alimentar, ou uma combinação de ambos que ajudasse a minimizar esses riscos”.
Os astronautas que viajam além dos limites de proteção da Terra estarão submetidos a doses mais altas de radiações prejudiciais à saúde. Com efeito, astronautas já relataram ter visto flashes de luz azul quando raios cósmicos atravessam rapidame
nte o globo ocular (ver “Uma experiência ocular”, acima) e muitos ex-astronautas adquiriram catarata.
Há até bem pouco tempo, os efeitos biológicos da radiação no espaço não eram muito conhecidos. Apesar de o conhecimento ter melhorado bastante, ainda não é suficiente para garantir a segurança dos astronautas em missões de três anos ou mais.
Precisamos conhecer que efeitos as viagens espaciais de longa duração produzem no corpo humano e como proteger os futuros passageiros do espaço, antes de ousar chegar aonde ninguém jamais chegou, com total segurança.
A radiação não está presente somente no espaço. Muitos objetos no solo são radioativos. Cada um de nós está sujeito a uma exposição de aproximadamente 360 milirém (mrem) por ano. (Um rem relaciona a dose absorvida com o dano biológico produzido). Oitenta e dois por cento dessa radiação vem de fontes naturais: do ar, do solo, de alimentos e do cosmos. Os 18% restantes são produzidos pelo homem: aparelhos de raios X e eletroeletrônicos (TVs, telefones celulares etc.). A dose máxima de radiação ocupacional para trabalhadores nessas áreas é de 5.000 mrem/ano.
Doses muito mais altas que essas representam riscos sérios à saúde. O dano causado por uma elevada dose de radiação, num curto período, será maior do que se a mesma quantidade de radiação for acumulada ao longo de vários anos. Se você receber uma dose de 75 rem terá a doença da radiação. Já com uma dose de 300 a 500 rem, haverá risco de 50% de morrer em 30 dias. Doses tão altas são absolutamente indesejáveis para os profissionais que trabalham com radiação e para os astronautas.
As partículas de alta energia bombardeiam continuamente a atmosfera da Terra. A maior parte delas – chamadas de raios cósmicos primários – são prótons e outros núcleos atômicos. Elas interagem com os núcleos de gases da atmosfera, produzindo uma chuva de partículas de baixa energia – os raios cósmicos secundários. Esse processo se repete e acaba produzindo um chuveiro de partículas na baixa atmosfera.
Se a energia dos raios cósmicos primários for suficientemente alta, as partículas criadas pelo chuveiro atmosférico chegarão até a superfície da Terra. Essas partículas são principalmente múons, elétrons, pósitrons e neutrinos. Os raios gama acompanham essas partículas. Se a partícula que deu início ao chuveiro não tiver energia suficientemente alta – a maioria não tem -, a partícula não atinge a superfície.
Uma forma de detectar partículas de alta energia no solo é através de um efeito secundário que elas produzem, chamado de radiação Cerenkov. Quando a luz se propaga em qualquer meio que não seja o vácuo, sua velocidade diminui, mas as partículas de alta energia sofrem menos esse efeito. Quando essas partículas de alta energia se propagam pela água ou pela atmosfera, têm uma velocidade que é maior que a velocidade da luz naquele meio e geram uma “onda de choque óptica”. Isso equivale ao estrondo sonoro criado por uma aeronave que se desloca com velocidade maior que a velocidade do som no ar.
Astronautas dos ônibus espaciais, da ISS e da Apollo relatam ter visto flashes de luz quando estavam em completa escuridão ou com os olhos fechados. Esses flashes ocorrem porque uma substância semelhante a um gel – chamada de humor vítreo – preenche cerca de 80% do globo ocular humano. Como o humor vítreo é basicamente água, os olhos dos astronautas funcionam como detectores de radiação Cerenkov. A onda de choque óptica se move através do humor vítreo e a retina a detecta na forma de um flash de luz. – L. K.