Em janeiro, misteriosos sinais circulares encontrados numa plantação nos arredores da cidade paulista de Votorantim chamaram a atenção da imprensa nacional, que, junto a segmentos da Comunidade Ufológica Brasileira, imaginaram que teriam origem extraterrestre, como marcas de um suposto pouso de UFOs. Apontados por um morador das proximidades do local, oito intrigantes círculos foram achados num pasto dentro de uma área particular. O fenômeno provocou interessantes discussões sobre sua provável origem e alimentou forte curiosidade popular. E o que parecia ser apenas algo corriqueiro dentro da Ufologia, caso tivesse confirmada sua origem não-terrestre, acabou somando algumas páginas a mais de história para a cidade e a vizinha Sorocaba, da qual Votorantim se emancipou em 1963.
As duas cidades têm um histórico ufológico muito semelhante. Reside até hoje na memória de grande parcela dos sorocabanos, dentre uma série de fenômenos de ordem reconhecidamente ufológica, algumas ondas de grande intensidade do fenômeno – o mesmo se aplicando a Votorantim, que chegou a ter um bairro apelidado de “Mirante dos OVNIs”. O caso de maior impacto na região aconteceu em 1979, quando o avistamento de esferas luminosas no céu provocou uma forte comoção popular que movimentou grandes massas para os locais atingidos. Tudo ocorreu em função de fatos perturbadores recheados de testemunhas, tanto que os fenômenos mereceram a atenção de inúmeros veículos de comunicação, entre eles a extinta revista O Cruzeiro, chegando até a obra do cético Max Sussol, que tentou resumir o caso numa abordagem crítica que tentava minimizar sua importância, em seu livro Os Falsos Discos Voadores [Editora Ibea, 1988]: “Assinalada a presença dos estranhos objetos, vistos por dezenas de pessoas e até mesmo por elementos da polícia militar de Sorocaba, o fato chamou a atenção de toda a imprensa e de emissoras de rádio, das quais uma delas acabou montando um posto de transmissões de boletins informativos nos locais onde os objetos apresentavam melhor e mais ampla visão”.
Uma das emissoras que cobriram os eventos foi a Rádio Capital, de São Paulo, da qual um radialista descrevia os esforços para a montagem de um forte esquema policial para evitar o registro de acidentes no deslocamento das pessoas ao local dos avistamentos: “Nunca Sorocaba viveu dias de tanta movimentação. Principalmente em se tratando de fatos estranhos à nossa inteligência”, dizia ele. Estima-se que aproximadamente 5.000 pessoas movimentaram-se pela cidade, numa das maiores vigílias do país – quiçá a maior.
Detalhes Surpreendentes — Tudo começou na madrugada de 08 de janeiro de 1979, por volta de 03h30, quando uma viatura da polícia militar foi surpreendida pelo pedido de ajuda de um rapaz visivelmente abalado que se dizia perseguido por uma luz misteriosa, em pleno centro da cidade. A vítima fora atendida pelos soldados, que iniciaram imediata ronda para verificação dos fatos e acabaram vendo o objeto. Dado o alarme para as demais radiopatrulhas de plantão, em pouco tempo oito equipes da PM, num total de cerca de 200 soldados, estavam envolvidos na operação, que terminou em frente à Pedreira São Domingos. No dia seguinte, a notícia já era quase de domínio público e o local virou centro da atenção de curiosos e estudiosos de várias localidades. Em poucos dias, milhares de pessoas acorreram ao local, configurando uma movimentação digna de figurar nos anais da Ufologia mundial.
Eis o relato do mecânico Sérgio Pregnoletto, que primeiro avistou a luz, numa das avenidas centrais da cidade: “Eu estava para entrar na garagem de minha casa quando apareceu uma luz estranha, passando por cima de mim. Era quase como se fosse dia. Assustei-me e corri atrás da polícia”. Soldados da viatura número 13, os PMs Pandulfo e Sérgio Costa, declararam que enviaram sinais de luz ao objeto com o holofote do veículo. “E parece que ele respondeu. Suas luzes não se apagaram totalmente, mas dava para perceber que diminuíam de intensidade. Quando a gente acendia e apagava o holofote, as luzes do objeto se tornavam foscas e depois aumentavam de intensidade. Quando acendemos a luz vermelha da sirene, parece que eles responderam claramente”. O PM Carlos Doles, que estava numa viatura vinda da vizinha Votorantim, disse que eram cinco bolas de luz multicoloridas. Também falou para os repórteres, na época, o sargento Maurício Caruso, compondo um quadro de testemunhas totalmente confiável. Os objetos permaneceram até o dia raiar, quando então sumiram. Mas voltaram no outro dia.
Armando Aparecido Monteiro, integrante do grupo ufológico que pesquisou os círculos misteriosos de Votorantim, encontrados em janeiro desse ano, na época dos acontecimentos de 1979, morava próximo ao local. Ele é fiel testemunha de que vários globos de luz sobrevoaram a área. Outras pessoas, como o dentista Bem Hur de Camargo, que nunca foram consultadas por nenhuma reportagem, também observaram o fenômeno, somando-se a um número indefinido de pessoas que preferem não prestar depoimento público por razões de foro íntimo. Em sua edição de 10 de janeiro daquele ano, o jornal Cruzeiro do Sul publicou em matéria de capa uma foto da misteriosa luz feita pelo fotógrafo Pedro Evaldo Moraes.
“Para surpresa do grande número de pessoas que na madrugada de ontem se postava no alto da Rua Nogueira Padilha, o objeto luminoso surgiu no céu de Sorocaba. A aparição causou uma série de outros fenômenos paralelos, como dois rápidos blecautes e clarões repentinos, semelhantes a relâmpagos”. A matéria registrou uma explosão próxima à Represa Itupararanga, que abastece a região, sendo também área de forte casuística ufológica. O jornal ainda informou que, segundo a Light, empresa responsável pelo abastecimento de energia na época, a explicação seria de que “houve um desligamento na linha de transmissão de energia. Os engenheiros, no entanto, não souberam explicar a causa da misteriosa explosão antes que as luzes se apagassem”. Com todo esse fantástico contexto em desenvolvimento, o jornal veiculou uma seqüência de reportagens que manteve a cidade em polvorosa. Em três semanas, estoques de telescópios e binóculos desapareceram das lojas. Comentários nos meios jornalísticos davam conta de que os fatos já teriam inclusive chegado ao conhecimento de técnicos da NASA – mas, na prática, apenas estudiosos da Colômbia vieram a Sorocaba.
Antes que o tumultuado mês findasse, oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB) procederam a observações próximas do Morro
de Ipanema, outro foco de aparições da região. Até o Supermercado Vem Ká, que, na confusão, fora sobrevoado por um UFO, entrou na onda e lançou propaganda nos jornais valendo-se do “interesse dos ETs por seus preços baixos”, conforme dizia a campanha. E, claro, pela proximidade do calendário, o tema dominou o carnaval de rua daquele ano, que se chamou “Carnaval Espacial”.
Lugar Onde o Sol se Esconde — Tema recorrente na região, as aparições de estranhas luzes sobre o Morro de Ipanema, aproximadamente 20 km de Sorocaba, são comuns. Trata-se de uma importante formação geológica que possui cinco picos com altitudes que variam de 550 a 971 m. Está à 115 km da capital, dentro de uma unidade de conservação do Ibama, a Floresta Nacional de Ipanema (FLONA), que tem uma área de 5.000 hectares. O lugar tem ainda imensas riquezas naturais e um conjunto arquitetônico que atesta o início da siderurgia brasileira, sendo importantíssima fonte de estudos históricos. Habitantes da região apontam fenômenos luminosos como algo comum na história do morro. Uma foto noturna de um objeto luminoso no céu, sobrevoando o lugar, obtida nos anos 80 pelo professor de desenho técnico Josué Fernandes Pires, estudioso de Ufologia de Tatuí (SP), chegou inclusive às mãos do falecido e eminente J. Allen Hynek.
Um exemplo da grandeza da casuística local é o fato recente que envolveu funcionários da Flona. Na noite de 14 de julho de 2001, uma grande manifestação luminosa surpreendeu dois integrantes da brigada de incêndio da floresta, que trabalhavam numa das torres de observação na mata. Os guias Márcio Antônio Rosa e Jackson Siqueira Campolim viram surgir de uma fenda existente na encosta do morro uma luz intensa, que os deixou sob forte impacto emocional. A surpreendente luz realizou uma série de manobras no céu, sendo registradas pelas aturdidas testemunhas. O jornal Cruzeiro do Sul publicou quatro fotografias, que renderam matéria de capa sobre o fato. E até mesmo presumíveis marcas de pouso de naves apareceram no local. Dois anos antes, conforme relato de Oscar Willmersdorf, engenheiro agrônomo e chefe da fiscalização da Flona, “enormes círculos surgiram estampados no mato rasteiro, numa área do topo do morro, próxima da jazida Ipanema”.
Willmersdorf havia informado que o capim de dentro dos círculos fora totalmente queimado e por um bom tempo nada renasceu ali. A partir disso, surgiram outras informações acrescidas por um empresário de Araçoiaba da Serra, cidade com aproximadamente 20 mil habitantes que, juntamente com Iperó, divide parte da extensão da montanha. Eraldo Arcoverde Piovesan, também testemunha e estudioso do assunto, que havia feito fotos dos círculos de 2001, observou as marcas pelo período de três meses com a acurada anotação de todos os detalhes. O jornalista Walter Rinaldi Leite confirma que Piovesan chegou a sobrevoar o morro, conseguindo constatar, do alto, que o círculo era mesmo perfeito. “Do avião, vi que o negócio era bem nítido, bem circular e perfeito. Dava para supor que em torno do círculo havia ocorrido vento e calor muito forte, pois o mato estava deitado. Também vi que havia galhos queimados nas imediações. Algumas pequenas pedras que estavam dentro dos anéis estavam mais escuras, como se tivessem recebido calor muito forte”, declarou Piovesan.
Além das fotos, o empresário guarda um vídeo que fez em abril de 2001, no qual aparece um objeto luminoso sobrevoando o morro, indo em direção a Araçoiaba da Serra, mas que desapareceu antes de chegar à cidade. Araçoyaba, na língua dos índios tupiniquins, habitantes originais da região, significa “Esconderijo do Sol”. Em verdade, o local esconde mais mistérios e mais sóis do que supõe a vaga concepção de seus ocasionais observadores.
Nave Sobrevoa Automóvel — Outro caso, narrado por Erotides Sebastião Aparecido, em janeiro de 1994, confirma o alto potencial casuístico da região. Na época secretário da Câmara Municipal de Votorantim, Aparecido relatou que, na noite do dia 10 de janeiro, por volta de 23h30, convidou seu sobrinho Delvani Daniel Siqueira para tomar uma cerveja. Ao passar com o seu carro na altura do número 128 da Rua João Laureano, avistou uma espécie de estrela muito brilhante, distante cerca de 4 km. “Embora impressionado com a forte luz emitida pelo objeto, continuei meu trajeto. Ao perceber que aquela imagem permanecia visível sob qualquer ângulo, resolvi parar o carro diante do número 546 da Avenida Luiz do Patrocínio Fernandes”. Com o veículo parado, Aparecido tentou um contato com o suposto UFO por meio do farol alto do carro e, coincidência ou não, obteve resposta.
Temeroso, Aparecido relembra que, nessa hora, o objeto diminuiu a intensidade da luz e com raios mais tímidos, nas cores vermelho, azul e branco, rumou para perto do seu carro. “Por quase cinco minutos o aparelho ficou sobre o veículo, a 50 m do chão. Sem emitir nenhum som, o objeto seguiu para o Morro da Mariquinha”. Tal morro fica bem perto da Pedreira São Domingos, ponto estacionário das aparições de 1979, na Rodovia Raposo Tavares. Uma matéria sobre o caso de Aparecido, publicada num jornal da época, cita ainda que mais quatro rapazes viram o objeto, que sumiu por volta de 23h55. Delvani Daniel Siqueira e seu tio acordaram na manhã seguinte com uma inexplicável e profunda sensação de tristeza, “… como se alguma coisa terrível lhes tivesse acontecido”. A experiência marcou de tal forma a vida de Aparecido que ele nunca mais parou de pesquisar o assunto.
Os Círculos de Votorantim — Nos primeiros dias de fevereiro de 2004, o analista de logística Pedro Roberto Gomes Alves, telefonou ao jornal sorocabano Cruzeiro do Sul, e relatou à jornalista Telma Silvério que há aproximadamente cinco meses via da janela de seu apartamento, voltada para uma fazenda, sete círculos num gramado que serve de pasto para gado. O analista afirmou que não havia relatado o fato antes porque temia que o assunto o levasse a ser alvo de chacota. Telma decidiu fazer uma matéria sobre o caso, contando com a ajuda dos autores, que também contactaram os pesquisadores João Carlos Belo, especialista em fotografia, e Armando Aparecido Monteiro. Os ufólogos fizeram os primeiros registros fotográficos do fenômeno pela janela do apartamento de Alves e colheram informações adicionais de que este também notara um certo enfraquecimento das marcas com o passar dos meses.
No local, ospesquisadores descobriram que se tratavam de oito círculos, e não sete, havendo um mais distante e em segundo plano. Verificaram ainda estarem os círculos circunscritos num perímetro escuro, onde o capim do tipo braquiária possuía ma
ior fertilidade aparente. Isso destacava o perímetro em relação ao centro do círculo e também no campo externo a eles. As primeiras conclusões eram de que a faixa escura do halo do círculo estivesse mais fertilizada e clorofilada, e com maior índice de nitrogênio. Diante dessa possibilidade, os autores procuraram o Laboratório de Química Agrícola S & F Ltda., onde foram atendidos pelos analistas Maria Salete de Brito Basseto e o Evair Wagner Basseto. Os especialistas, ao observarem as fotos, disseram nunca ter visto algo parecido e atentaram também para uma provável maior fertilidade por presença de nitrogênio. Neste laboratório, os ufólogos contrataram análises químicas nutricionais de solo e do tecido vegetal.
Enquanto faziam a coleta de amostras no local, foi notado um outro dado que havia passado despercebido: na faixa escura do perímetro dos círculos estavam se desenvolvendo cogumelos brancos, que também foram coletados. Enquanto o Laboratório S & F analisaria as amostras de solo e vegetação da faixa escura, central e externa dos círculos, o Instituto Biológico do Estado de São Paulo se encarregaria de analisar os cogumelos. A agrônoma Ana Maria Sanazzero, do órgão, revelouser possível a realização de exames parasitológicos no capim e disse que enviaria os cogumelos para São Paulo, o que foi feito dias após. Em ambos os laboratórios era visível a estranheza desses especialistas quanto às marcas circulares. A agrônoma informava não conhecer fato semelhante em seus anos dedicados à agronomia.
Possíveis ocorrências com fungos, outros fatos naturais ou ainda de manejo humano, normalmente, se caracterizam por círculos cheios, e não em forma de halo. Em contato com o administrador da fazenda para se obter informações sobre o histórico de manejo nesses campos, bem como indagá-lo sobre os sinais, este informou que os círculos eram oriundos dos destocamentos de eucaliptos realizados há quinze anos na propriedade. Segundo ele, os círculos nada mais seriam do que a deposição de restos da matéria vegetal dos eucaliptos, que resultou em maior fertilidade nas áreas atingidas. Essas eram importantes informações, ainda que nãosoassem satisfatórias. Embora a medição com trena revelasse que os círculos não eram totalmente perfeitos, pois o desenvolvimento do capim braquiária apresenta-se em direções diferentes, o formato circular era regular e pronunciado. O círculo maior tinha cerca de 23 m de diâmetro, com pouquíssima incoerência no traçado do perímetro. Os menores apresentavam ainda menos incoerência e diâmetro entre 12 e 13 m.
Nenhum trator conseguiria tal perfeição, além do fato de que o destocamentodeu-se, segundo informações do proprietário da fazenda, no ano de 1972 – e foram retirados alguns tocos velhos há 15 anos. Neste ínterim, a fazenda já teria passado pelo cultivo de feijão e milho, o que pressupõe manejo de solo, com seu revolvimento e movimento de massa. Esses detalhes da pesquisa apenas aumentavam a estranheza dos círculos, demandando ainda mais investigação e análises. Como exemplo de tal estranheza, os círculos teriam seus centros rebaixados pela retirada da raiz dos eucaliptos e a reposição da terra, tiradanovamente do buraco, viria carregada de restos da madeira, produzindo manchas incoerentes no centro dos círculos, e não um halo. Já as leguminosas plantadas também seriam responsáveis pelo aumento de nitrogênio na terra. Logo, todo o campo deveria ter uma nitrificação regular.
O proprietário da fazenda tinha ainda outra opinião sobre os círculos, o da implosão de concreções de cupins. Segundo ele, as formigas não se alimentam do capim do entorno direto de sua casa porque instintivamente sabem que o vegetal é um protetor natural contra erosão. Assim, cavam túneis que possibilitem a saída longe do entorno de onde pegam o alimento. Isto faria com que a grama intocada se tornasse mais aparente. Mas é preciso lembrar que os círculos não são cheios, efeito que existiria se a explicação do proprietário fosse a mais indicada. Ele informou ainda que o tipo de braquiária existente no campo onde os círculos estão é diferente do resto da fazenda. O capim daárea atingida é do tipo brachiaria decunbens.
Nitrogênio e Enxofre — O primeiro resultado dos exames nutricionais do solo e do capim, feitos pelo laboratório S & F, revelou que o capim braquiária da faixa escura possuía mais nitrogênio – 15,1 gramas por quilo – contra 9,80 do centro e 8,40 da área externa. De enxofre, a faixa escura também possui um pouco mais que as áreas externa e interna. A faixa escura também possuía maior quantidade de manganês, zinco, cobre e matéria orgânica que as demais. Havia, porém, mais matéria orgânica externamente que internamente nos círculos. Quanto ao elemento químico boro, sua quantidade coincidiana faixa escura e no centro. Os micronutrientes citados são responsáveis pelo aumento de nitrogênio na terra. Em análise, foi preciso entender que havia pouca diferença nutricional dentro e fora dos círculos, e que era estranha em formações tão bem feitas uma presença maior de micronutrientes minerais. Verificou-se também, desta vez no solo da faixa escura, teor um pouco mais alto de boro, cálcio e fósforo, embora não muito significativo. Demais substâncias, como magnésio, coincidem na faixa escura e externa. O ferro está mais presente na parte externa, bem como o potássio.
Consultado a respeito, o agrônomo e administrador territorial da empresa Iharabras Indústrias Químicas S.A., José Antonio de Souza Júnior, entendeu que as diferenças que proporcionaram a existência dos círculospodiam ser nutricionais e que seria preciso encaminhar amostras para um especialista em solos. Ele também considerou estranha a formatação dos círculos, desconhecendo fenômeno semelhante em sua experiência de campo. A pesquisa ainda aguardava resultado de análises parasitológicas, embora a agrônoma Ana Maria, do Instituto Biológico, tivesse adiantado que o capim tinha aparência muito saudável. Exames do cogumelo encontrado na área também deveriam ajudar a solucionar o enigma. E assim, mais especialistas de áreas específicas da agronomia, capazes de oferecer análises genéticas e outras, foram aos poucos sendo ouvidos, consolidando uma pesquisa metodológica e sistemática, preceitos que a Ufologia requer para tratar da intensa casuística registrada.
Hipótese de Pouso de UFO — Até
este ponto da pesquisa, o fenômeno se mostrava estranho e não inexplicável. Mas uma natureza eventualmente ufológica dos fatos ainda não podia ser afirmada, bem como não podia ser descartada. Até o momento, podia-se apenas dizer que micronutrientes como manganês e enxofre, capazes de contribuir para a nitrificação apresentada pelas amostras, necessitavam ser justificados. E precisaria ser explicado se eles, na intensidade que estavam nas amostras, seriam capazes de produzir o fenômeno observado e quando poderiam se dispor em círculos. O ufólogo paranaense Carlos Alberto Machado, consultor da Revista Ufo e presidente do Centro de Investigações e Pesquisas Exobiológicas (CIPEX), lembrou aos autores um importante caso semelhante, investigado até pelo astrofísico Joseph A. Hynek, ocorrido no Canadá. Nele, não somente a forma circular estava presente, como também, em sua faixa fértil, havia boa quantidade de cogumelos. Na busca de testemunhas de algum evento ufológico na região, que pudesse levar a solidificar a hipótese do pouso de uma nave como tendo causado o fenômeno, pouco se encontrou. Joel de Morais, morador bem próximo da fazenda, disse acordar muito durante a noite para observar sua criação de suínos, mas que nunca avistou nada de estranho no local.
Assim como ele, jovens das imediações que visitam a fazenda clandestinamente para nadar e pescar num açude em seu interior, nada viram nas imediações, de dia ou de noite. Um fato que também mereceu investigação foi o de um prestador de serviços do jornal Cruzeiro do Sul, que é morador próximo do Mirante dos OVNIs, um bairro de Votorantim distante cerca de 3 km da fazenda. Anos antes, ele registrou em vídeo as evoluções de um objeto voador não identificado numa área muito próxima ao local dos fatos. O artefato não aparentava similaridade com aeronaves convencionais, lembrando uma rosca – algo que também já fora relatado por outros observadores.
Os resultados dos primeiros exames e a opinião de especialistas somente agregaram dúvidas sobre os misteriosos círculos. Ainda assim, por justificável excesso de zelo, procuramos o especialista em fitopatologia Hiroshi Kimati, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALC), de Piracicaba (SP). A instituição é uma das melhores escolas de agronomia do país. Kimati foi o primeiro profissional consultado, entre tantos, que apresentou uma explicação conclusiva para o fenômeno dos círculos em Votorantim.
Desfeito o Mistério — Segundo ele, analisando cuidadosamente as fotos que oferecemos, os desenhos na plantação de braquiária seriam fairy rings, ou anéis de fada, como são conhecidos. Tratam-se de círculos produzidos por fungos da família dos basidiomicetos, muito comuns no Canadá e nos EUA. Recebem esse nome em função da alegoria e lenda dos antigos de que lindas fadinhas dançavam em círculos, encantando e tornando mais vivas as plantas herbáceas a seus pés.
O professor Kimati dispensou as amostragens de solo e capim, detendo-se em sua análise nas amostras de cogumelos que entregamos. Eis sua manifestação, uma semana após nosso contato: “Em resposta à sua consulta sobre a identidade do fungo, associado às formações de áreas mais esverdeadas e circulares nas pastagens, tenho a lhe informar que meu colega de departamento, professor Nelson Massola, concluiu ser o fungo basidiomiceto Lycoperdon perlatum, o que confirma nosso diagnóstico de que tais formações constituem o fairy ring, ou anel de fada”. Pronto, estava encerrado o mistério, tendo o professor Kimati ainda emitido o seguinte parecer final: “O desenvolvimento de tais anéis pode muitas vezes ser visto acompanhando os restos de matéria orgânica do solo, como raízes, troncos e cavacos de madeira não decompostos”.
Este fungo identificado surge num ponto inicial da plantação, onde antes existiam restos de madeira e raízes não totalmente decompostas, que enriquecem o solo de matéria orgânica. O fungo degrada a matéria orgânica e, à medida que exaure o ponto original, migra a colônia formada radialmente em formato circular, o que ocorrerá sucessivamente. Os anéis formados são frentes pioneiras de degradação. O fungo atinge indiretamente o capim braquiária de maneira que o interior da área afetada ficará mais fraco, menos nutrido e mais claro, pois o solo onde está foi degradado e tem menos matéria orgânica disponível. O capim do perímetro (ou frente pioneira do fungo) fica mais verde, pois com o processo de degradação há a liberação de mais nitrogênio no solo, otimizadamente absorvido pelo capim. A vegetação externa está em solo não degradado e ainda rico em matéria orgânica, mas não conta no momento com o nitrogênio liberado pela degradação ocasionada pelo fungo. Logo, está mais claro. Assim, fica explicada a existência do perímetro verde, circular, por ação radial e homogênea.
Apenas quando estiver totalmente extinta a possibilidade de aplicar ao Fenômeno UFO as regras sistemáticas da metodologia de investigação científica é que se deve buscar respostas mais complexas e não ortodoxas
— J. Allen Hynek,ufólogo falecido em 1986
Renovando Métodos — As constatações são verdadeiras sobre o que ocorreu em Votorantim. Mesmo os exames de solo anteriormente feitos revelaram mais presença de matéria orgânica externa aos círculos, o que ajuda a confirmar ser área ainda não atingida pelos fungos. O Lycoperdon e seus parentes de igual ação são fungos raros na tropicalidade brasileira. É possível entender isso quando se verifica serem mais comuns em coníferas ou florestas frias do Canadá – no caso de Votorantim, o fato atingiu restos de eucalipto, que também é uma conífera. A raridade do fenômeno é indiscutível, e o fato de ser tão incomum pode ser uma explicação para que muitos círculos estranhos, observados em várias partes do Brasil, principalmente em plantações, recebam a explicação proporcionada pelo fungo. Isso, evidentemente, em detrimento de uma explicação mais inusitada e extraordinária para a origem de tais enigmáticos círculos, muitas vezes precipitadamente atribuídos a pousos de UFOs.
Os autores também descobriram círculos causados por fungos num campo de futebol da Faculdade de Engenharia de
Sorocaba (Facens), por indicação do agrônomo José Antonio. É surpreendente que o fungo age de forma idêntica no gramado delicado e mimoso como o do campo, que, para existir, sofreu nivelamento com a retirada de toneladas de terra, a ponto de atingir vários metros de altura em toda a extensão de sua área. Isto lança dúvidas sobre restos de madeira à flor do solo? Esta é uma questão que permanece.
Seria ainda relevante lembrar que o mencionado caso de círculos com cogumelos brancos, pesquisado pelo tão respeitado J. Allen Hynek tenha ocorrido justamente no Canadá, país de grande incidência dos fungos citados. É pertinente alertar para o fato de que, talvez, ainda fossem incipientes os estudos sobre os basidiomicetos na época de sua observação. É certo, que para cada descoberta feita nas diligências de campo de qualquer disciplina que se considere, novas indagações são levantadas. Mas desejamos que os efeitos desta pesquisa possam constituir como um ponto esclarecedor para ocorrências análogas que forem sendo descobertas, que, a exemplo de outras no passado, deixaram muitos ufólogos pelo mundo afora sem respostas.