No seu livro, Figueiredo discorre sobre essa prática de sigilo à informação durante a ditadura, período compreendido entre os anos de 1964 e 1985, nos seguintes atos: preservar, esconder, mentir, calar.
Mas o que tem a ver informação sobre a ditadura com o Caso Varginha, ocorrido mais de 10 anos após a queda do regime de exceção e oito da nova Constituição Federal? Muita coisa! Esta semana, quando uma das leis complementares da Constituição, a Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação – LAI), completa exatos 11 anos de sua vigência efetiva, ainda vemos antigos vícios oriundos da ditadura presentes no trato do conhecimento público, especialmente a sigilosa.
É o que notamos após anos protocolando centenas de processos solicitando a abertura dos documentos ufológicos em arquivos institucionais públicos, desde o lançamento da campanha UFOs: Liberdade de Informação Já, no início do ano de 2005. As constantes negativas de acesso aos documentos, principalmente os do Exército, faz com que esses arquivos públicos institucionais sejam tratados como se privados fossem, ou seja, observamos a mesma prática suja e ilegal exposta pelo citado jornalista em sua obra. Segundo o Exército Brasileiro, os documentos pedidos pelos ufólogos estão em “Lugar Nenhum.”
Conforme levantamento feito pelo próprio governo, ufologia figura entre os temas mais frequentes visando requisições de acesso por meio de acionamento da LAI e, por questões óbvias, a quase totalidade é direcionada às três forças armadas (Ministério da Defesa). Sob nossa coordenação, neste ano de 2023 já foram protocolados pela Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU) 24 pedidos de acesso nesse sentido, cada um contendo em média oito solicitações de inteiro teor de documentos por nós identificados como sensíveis, dos anos de 1996 e 1997, oriundos da região militar do Exército onde ocorreu o Caso Varginha: 4ª RM/DE.
Além desses 24 protocolos relativos a documentos do Caso Varginha, enviamos mais um, solicitando as informações restantes da Operação Prato. Aquelas mesmas que foram solicitadas, mas não foram enviadas ao Arquivo Nacional, após a histórica reunião entre a CBU e oficiais militares no Ministério da Defesa, em abril de 2013.
Só de autoria deste articulista são 12 processos, um deles, também relativo à Varginha, foi direcionado ao Ministério das Relações Exteriores (MRE), tendo em vista a participação do Itamaraty nas negociações que possibilitaram um suposto traslado de uma nave alienígena acidentada, e seus tripulantes capturados por militares, para os Estados Unidos da América, o que obviamente demandaria ações daquele Ministério, gerando informações em documentos. Em respostas a todos esses processos, ficou patente pelo menos três dos atos dos militares, citados pelo jornalista Lucas Figueiredo: preservar, esconder e mentir, já que calar não seria mais uma opção, após a vigência da LAI.
Mas a coisa vem mudando, inclusive e principalmente durante a tramitação desses nossos processos. Ficou pior para aqueles que insistem em desvirtuar o princípio da moralidade e da transparência nos atos da governança militar, pois a partir de 2023 a Controladoria Geral da União (CGU), órgão ao qual se deve recorrer para solicitações via LAI denegadas nas primeiras instâncias onde são protocoladas, passou por uma notável reestruturação.
As profundas reformas pelas quais a nova administração impôs ao órgão, como determinação direta da Presidência da República, surtiram efeitos tanto do ponto de vista funcional como do legislativo, tendo seus efeitos sendo estendidos a pelo menos 300 órgãos da administração pública, incluindo os de estrutura militar. Quatro dessas mudanças valem ser destacadas, inclusive porque vieram em resposta às nossas recorrências, a partir da 3ª instância, todas elas estipuladas pela Portaria Normativa nº 71 da CGU, de 10/04/2023:
Enunciado CGU nº 6/2023 – Abertura de informações desclassificadas:
Transcorrido o prazo de classificação dos arquivos ou consumado o evento que consubstancie seu termo final, os dados se tornam automática e integralmente de acesso público (art. 24, § 4º), ressalvadas eventuais outras hipóteses legais de sigilo (art. 22) e a proteção de dados pessoais (art. 31), devendo o órgão ou entidade pública registrar tal desclassificação no rol de informações classificadas, que é de publicação obrigatória na Internet, nos termos da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011.
Enunciado CGU nº 9/2023 – Telegramas, despachos telegráficos e as circulares telegráficas produzidos pelo Ministério das Relações Exteriores:
Os telegramas, despachos e circulares telegráficas produzidos pelo Ministério das Relações Exteriores são documentos que devem ter seu acesso restringido somente quando o objeto a que se referem estritamente se enquadrar em uma das hipóteses legais de sigilo. A proteção das negociações e das relações diplomáticas do País não pode ser utilizada como fundamento geral e abstrato para se negar acesso a pedidos de informação. Havendo informações pessoais no documento ou processo que não podem ser disponibilizadas, aplicasse o disposto no § 2º do art. 7º da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, assegurando-se o acesso à parte não sigilosa por meio de certidão, extrato ou cópia com ocultação da parte sob sigilo.
Enunciado CGU nº 11/2023 – Restrições de acesso em virtude da desarrazoabilidade ou desproporcionalidade do pedido:
Pedidos de acesso à informação somente podem ser negados sob o fundamento da “desarrazoabilidade” se o órgão ou entidade pública demonstrar haver risco concreto associado à divulgação da informação ou se a contextualização do pedido de acesso não for real ou quando os fatos que consubstanciarem o pedido não estiverem expostos conforme a verdade; e, por sua vez, somente podem ser negados sob o fundamento da “desproporcionalidade” se o órgão evidenciar não possuir recursos, humanos ou tecnológicos, para atender o pedido.
Para as duas situações, não podem tais argumentos serem utilizados como fundamento geral e abstrato para a negativa de acesso. Além disso, quando restar configurada a desproporcionalidade do pedido, o órgão ou entidade deve disponibilizar os meios para que o cidadão realize a consulta in loco, para efetuar a reprodução ou obter os documentos desejados, em conformidade com o disposto no art. 11, §1º, I, da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011.
Enunciado CGU nº 12/2023 – Informação pessoal:
O fundamento “informações pessoais” não pode ser utilizado de forma geral e abstrata para se negar pedidos de acesso a documentos ou processos que contenham dados pessoais, uma vez que esses podem ser tratados (tarjados, excluídos, omitidos, descaracterizados etc.) para que, devidamente protegidos, o restante dos documentos ou processos solicitados sejam fornecidos, conforme preceitua o § 2º do art. 7º da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, assegurando-se o acesso à parte não sigilosa por meio de certidão, extrato ou cópia com ocultação da parte sob sigilo.
Além disso, a proteção de dados pessoais deve ser compatibilizada com a garantia do direito de acesso à informação, podendo aquela ser flexibilizada quando, no caso concreto, a proteção do interesse público geral e preponderante se impuser, nos termos do art. 31, § 3º, inciso V da Lei n. 12.527, de 2011, e dos arts. 7º, § 3º, e 23, caput, da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018.
E é extremamente perceptível a diferença no trato aos processos que este ano passaram a tramitar nas instâncias superiores. Para se ter uma ideia, desses 25 processos protocolados por membros da CBU no MD e no MRE, quase todos protocolos ou não foram atendidos por inteiro, ou vieram em partes, incompletos e faltando diversos documentos, todos atingidos por pelo menos a ausência de um desses “Enunciados” acima. Por esta razão tivemos que recorrer em quase todos os eles, consequentemente, todos os protocolos que foram encaminhados à CGU. Dessa forma, nessa instância superior ou tiveram a solicitação deferida, ou estão em vias de julgamento naquela, tudo exatamente ocorrendo após a publicação da Portaria Normativa nº 71.
Dentro dessas perspectivas de mudança, esperamos muito provavelmente para junho de 2023 já ter os primeiros resultados concretos de uma verdadeira operação pente fino, que estamos fazendo nos arquivos militares. Estão previstos para o segundo semestre o surgimento de documentos governamentais que comprovam tudo o que vem sendo divulgado pela ufologia brasileira, basta acompanhar.
E, concomitantemente aos esforços que estão sendo postos em prática por alguns membros e colaboradores da CBU, em conjunto com os principais pesquisadores do Caso Varginha, como Vitório Pacaccini e Marco Petit, é certo e líquido que ainda este ano teremos uma verdadeira reviravolta tanto no Caso Varginha, quanto no que ocorreu com os filmes e fotografias originais da Operação Prato.
Por Fernando Aragão Ramalho
Ufólogo, conferencista, autor de inúmeros artigos, principalmente dentro do contexto militar. Foi coordenador da Comissão Brasileira de Ufólogos ao longo dos anos mais importantes da história da CBU, com ações, inclusive, dentro do Congresso Nacional. Como coeditor da Revista UFO, assinou inúmeros artigos contra o acobertamento ufológico nas páginas da referida publicação. Hoje, Ramalho está de volta tanto a Revista UFO, como a própria CBU e assina com o Ufólogo e Escritor Marco Petit a presente campanha, específica para o Caso Varginha.
Consultoria jurídica: Dr. Flori Tasca (OAB-PR) e Luiz Azenha (OAB-RJ).
ATENÇÃO: Postagens de Petit, Fernando Aragão Ramalho (e convidados) toda quinta-feira nesta página. Compartilhem esse e os outros conteúdos que serão divulgados. Curtam e sigam a página da campanha.
Contato: WhatsApp (21) 995841014