Estudo científico inédito analisa saúde mental de testemunhas de UFOs
Quem se dedica à Ufologia já se habituou a enfrentar um problema que há décadas incomoda os ufólogos: seu objeto de estudo, ou seja, os discos voadores e seus tripulantes, não está à disposição para análises nos moldes concebidos pelo método científico — que consiste, basicamente, em encontrá-lo e estudá-lo de forma a constatar que as experiências obtidas com ele se repitam sempre da mesma maneira. Ora, como pedir para que um alienígena desça de sua nave e permita que perscrutemos o veículo, que analisemos seu corpo e identifiquemos sua procedência? Aparentemente, nossos visitantes pouco se importam se acreditamos ou não neles ou se podemos provar sua existência.
Apesar desse obstáculo, a Ufologia tem tido muito sucesso quando é praticada de forma “policialesca”, quando são empregadas técnicas investigativas semelhantes às usadas por peritos policias — uma espécie de “CSI ufológico”. Marcas de pouso, presença de radiação, queimaduras em plantações e até em pessoas, mutilações de animais, depoimentos de testemunhas etc, são todos elementos que contribuem para o levantamento de evidências que constatam a materialidade do Fenômeno UFO. Porém, do ponto de vista científico, eles ainda não representam uma prova definitiva. Como, então, seria possível tratar de Ufologia dentro de um método tão exigente? Uma luz surge no final do túnel quando, em vez de estudarmos discos voadores e seus tripulantes, concentrarmos nossa atenção no ser humano que vive experiências com eles. Será que os resultados não seriam mais profícuos?
Quebrando paradigmas
Em 20 de janeiro passado, o Instituto de Psicologia da prestigiada Universidade de São Paulo (USP) foi o cenário de uma tentativa desse tipo de abordagem, quando o psicólogo Leonardo Breno Martins, formado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), defendeu sua dissertação de mestrado diante de uma rigorosa banca, encarando o desafio de apresentar o Fenômeno UFO ao meio acadêmico, geralmente hostil à questão. E que desafio! Martins elaborou seu trabalho com base na hipótese de que pessoas que passam por experiências ufológicas podem ser consideradas mentalmente sadias, ao contrário do pensamento predominante. E ele testou seu argumento comparando testemunhas de avistamentos e abduções com pessoas que não viveram tais fatos.
Dissertação de mestrado defendida no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) indica um tipo de abordagem que pode ajudar a diminuir a resistência acadêmica ao estudo da presença alienígena na Terra.
Com o título Contatos Imediatos: Investigando Personalidade, Transtornos Mentais e Atribuição de Causalidade em Experiências Subjetivas com Óvnis e Alienígenas, a dissertação, em um primeiro momento, causou certa apreensão no meio ufológico, que temia que fosse apenas mais um trabalho acadêmico visando denegrir a área — isso gerou protestos de ufólogos das mais variadas matizes. Entretanto, a hipótese levantada no título foi solenemente refutada durante a defesa da dissertação, com a exposição do mestrando e comentários subjacentes que levaram cerca de duas horas e meia. Basicamente, a intenção de Martins não era discutir se UFOs e aliens existem, mas examinar os “experienciadores” de contatos com eles, as testemunhas.
Metodologia precisa
Para chegar a isso, o psicólogo investigou quatro grupos de pessoas. O primeiro e o terceiro eram, respectivamente, de experienciadores que alegavam ter avistado UFOs e extraterrestres, mas sem ter entrado em contato direto com eles, e de experienciadores que alegavam ter mantido contatos diretos com eles — tanto abduzidos quanto os ditos contatados. Já o segundo e o quarto grupo eram “de controle”, constituídos por pessoas que não alegavam nem uma coisa nem outra, mas que compartilham com os grupos anteriores as mesmas características demográficas. Ou seja, pela comparação dos indivíduos que afirmam tais experiências com aqueles que não afirmam, mas que têm condições de vida semelhantes, foi possível ao mestrando descobrir se os primeiros apresentavam alguma diferença que explicasse suas alegações.
Para atingir os resultados, foram aplicados métodos qualitativos e quantitativos de pesquisa, o que é considerado ótimo do ponto de vista metodológico, pois engloba tanto aspectos de profundidade (qualitativos) quanto uma eventual comprovação estatística (quantitativos). Foram também aplicados testes clássicos de psicologia para avaliar a sanidade mental dos 81 participantes da pesquisa. A partir dessa premissa metodológica, Martins alcançou os seguintes resultados:
As pessoas do primeiro grupo — experienciadores que alegavam ter avistado UFOs e extraterrestres, sem ter entrado em contato direto com eles — têm um grau de saúde mental um pouco maior do que as do seu grupo controle.
Quando comparamos as pessoas do terceiro grupo — experienciadores que alegavam ter mantido contatos diretos com extraterrestres — com o quarto grupo, de controle, para Martins a conclusão é de que “as descobertas são controversas e demandam novos estudos em relação a certas características na infância”.
O mestrando esclarece que isso não quer dizer que quem alega ter visto discos voadores ou mantido contatos diretos com extraterrestres pode ser desequilibrado, uma vez que de forma geral tais pessoas não têm diferenças de sanidade mental com seus grupos de controle, nem para mais, nem para menos. Em outras palavras, o comportamento desse público não é patológico. Segundo Martins, “toda pesquisa requer replicação de seus achados, ainda mais nesse caso, com um tema tão difícil. Seria interessante frisar que encontramos evidências de uma não patologia”. Sem dúvida, essa conclusão não tem precedente quando se trata da aplicação do método científico à Ufologia, acabando definitivamente com um velho preconceito do senso comum — e também dos cientistas — de que “quem vê disco voador ou conversa com extraterrestres é louco”. Daqui para frente, o ufólogo que voltar a ouvir isso de alguém pode apresentar como argumento contrário a tese do psicólogo Leonardo Breno Martins [Disponível no Portal da Ufologia Brasileira, o site da UFO: ufo.com.br].
Postura raramente vista
Além do orientador do mestrando, o professor Wellington Zangari, estavam presentes o doutor Geraldo José de Paiva, experiente professor do Instituto de Psicologia da USP e referência dentro da instituição, e a doutora Fátima Regina Machado, cujo trabalho de doutorado tratou do fenômeno poltergeist. Durante a defesa da dissertação, foi surpreendente ver o grau de maturidade demonstrado pelos integrantes da banca em relação ao Fenômeno UFO — obviamente não no sentido de acreditar ou não que discos voadores e seus tripulantes existam, mas em levar a sério e de forma pertinente o objeto de estudo, ou seja, as pessoas que dizem ter tido experiências com eles. Simplesmente não houve qualquer ridicularização da Ufologia no ambiente. “Tive a sorte de ter uma banca como essa para avaliar minha tese”, disse Martins após a defesa, humilde. De fato, a instituição onde isso ocorreu está de parabéns por ter e receber profissionais tão qualificados e sem preconceitos, como a ciência em geral deveria ser.
Vai chegar o dia em que a ciência será chamada à razão e deverá analisar o Fenômeno UFO, que ela negligencia de maneira escandalosa. E quando isso ocorrer, os cientistas e tecnocratas do meio acadêmico haverão de reconhecer a dívida que eles têm com os ufólogos. — J. A. Hynek
Em suas exposições, os integrantes da banca sugeriram fortemente que o mestrando devesse seguir com o assunto até o grau de doutorado — foi inclusive oferecido a ele que sua defesa fosse candidata a esse título, pulando a fase anterior, mas ele recusou. Passadas as considerações finais, seguiu-se uma avaliação do trabalho a portas fechadas, chegando-se a um desfecho positivo para Martins — que será o primeiro mestre na área de psicologia do Brasil com uma dissertação tratando do espinhoso tema das experiências ufológicas. A Revista UFO sente-se particularmente feliz com o resultado, visto que o psicólogo revelou ser seu assíduo leitor desde os tempos da série Ufologia Nacional & Internacional, precursora da UFO nos anos 80.
Martins também é visivelmente interessado por Ufologia, tendo participado de inúmeras vigílias no interior de Minas Gerais e revelando que recebeu grande influência para escolher o curso de psicologia na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), entre outros, do professor Húlvio Brandt Aleixo, conhecido pioneiro da Ufologia Brasileira, a quem ela tanto deve [Veja entrevista com ele na edição UFO 138, agora disponível na íntegra em ufo.com.br].
Mas o trabalho de Leonardo Breno Martins não deve ser considerado um ponto final na questão ufológica, muito pelo contrário. A constatação de que os experienciadores não são pessoas desequilibradas é somente o começo. Espera-se agora que a dissertação inspire outros trabalhos a também buscar novos caminhos visando a maior aceitação da Ufologia em um meio geralmente tão hostil a ela. O futuro se encarregará de nos mostrar os novos capítulos dessa fascinante caminhada.