Ashtar Sheran é, de longe, o mais conhecido alegado extraterrestre entre os que presumivelmente entraram em contato com a humanidade. É muito fácil negá-lo, e mais fácil ainda aceitá-lo. Nós optamos aqui por analisá-lo. Antes de qualquer coisa, cabe esclarecer que toda sua história deveu-se ao contatado norte-americano George Van Tassel, que em 1952 revelou ter mantido contatos mediúnicos com o tal comandante sideral em seu livro Eu Viajei num Disco Voador. Logo de saída, Ashtar mostraria a que veio: criar uma nova seita com muita desinformação. A popularidade que alcançaria nas décadas seguintes chega a ser surpreendente, ainda mais considerando que a primeira de uma longa série de frustrações por promessas irrealizadas ocorreria já naquele ano, pois havia anunciado pousar oficialmente, e no entanto não o fez. Até hoje os que nele creem estão esperando tal aterrissagem.
Depois de Tassel, quem fundamentou praticamente toda a base do personagem Ashtar Sheran que persiste até hoje foi o médium alemão Herbert Speer, com sua obra psicografada A Grande Missão Celeste, ditada, segundo ele pelo próprio Ashtar. E para sedimentar de uma vez por todas as atividades do chamado Comando Ashtar, que o próprio ser lideraria — com suas naves invisíveis e 10 milhões de espaçonautas ao redor do planeta —, surgiu Thelma Terrel, autodenominada Tuella, que escreveu uma série de livros sobre o comandante, seus assistentes e sua missão na Terra. Na Europa, Eugênio Siragusa, desde a década de 60, foi um dos contatados e grandes divulgadores das mensagens de Ashtar, juntamente com Giorgio Bongiovanni e seu grupo Nonsiamosoli.
Ademais, Bongiovanni, cujo caso corre em paralelo ao de Siragusa, diz ter sido contatado pela Virgem de Fátima e estigmatizado por ela. O que pouco se comenta é que a tal Virgem errou ao criar seus estigmas. Sabe-se, histórica e cientificamente, que Jesus foi pregado na cruz pelos pulsos e não pelas palmas das mãos, como mostram os estigmas de Giorgio. A parapsicologia explica que pessoas imbuídas de intensa fé podem criar, pelo poder da mente, todo tipo de manifestações físicas, como marcas de flagelos ou estigmas da crucificação. Avançando um pouco nas hipóteses, creio que entidades espirituais negativas podem se passar por extraterrestres, santos ou mesmo virgens-marias e desencadear fenômenos induzidos ou espontâneos, como no caso de Bongiovanni, com objetivo de criar seitas e grupos de adeptos.
Tradição védica
No Brasil, o contatado baiano Paulo Fernandes foi orientado pelo próprio comandante a fundar um grupo de divulgação de suas mensagens espiritualistas, tendo assim surgido o Centro de Estudos Exobiológicos Ashtar Sheran (CEEAS), o mais antigo e conhecido em atuação do gênero. Levando em conta que centenas de médiuns ou sensitivos já receberam canalizações ou estiveram na presença de Ashtar ou de seus comandados, penso que não é como mito que devemos classificar todas essas histórias. Algo de bastante real existe nos bastidores desses presumidos contatos extraterrestres.
O nome Ashtar Sheran deriva do sânscrito e da tradição védica, significando “o Sol que mais brilha”. Os contatos ou canalizações com tal entidade sempre se deram por via mediúnica, tal qual na doutrina espírita. Seu comando não estaria no campo físico da matéria, porém num mundo sutil à nossa volta, trabalhando com mestres ascensionados da Teosofia ou Fraternidade Branca para transmitir ao homem supostas verdades superiores. Conforme estabelecido no Projeto de Evacuação Mundial, pessoas escolhidas seriam resgatadas de uma catástrofe apocalíptica iminente. Tudo isso, infelizmente, não difere em nada do que todas as demais religiões nos moldes cristãos já apregoaram.
Conforme o Projeto de Evacuação Mundial, pessoas escolhidas seriam resgatadas de uma catástrofe apocalíptica iminente. Tudo isso, infelizmente, não difere em nada do que todas as demais religiões nos moldes cristãos já apregoaram
Indo mais longe nesta análise, as canalizações de mensagens afirmam que o Comando Ashtar estaria sob coordenação e ordens de Sananda, o nosso Jesus Cristo, o que lhe conferiria toda a autoridade necessária para intervir no planeta. Diz Sananda numa mensagem canalizada: “Os milhões que vêm de outros mundos para ajudar a trazer paz à Terra contam com meu firme apoio e meu respaldo para todos os esforços empreendidos. Eles vêm em Meu Nome e servem à Minha Insígnia, como senhor deste planeta”. Isso soa por demais estranho. Será que divindades como Jesus, Miguel e os arcanjos necessitariam convocar extraterrestres para realizar o trabalho que lhes caberia? Seres de outros mundos seriam védicos, espíritas, cristãos e new age? Por que então, em nenhuma das tradições ou profecias antigas, aparece um personagem com o nome de Ashtar Sheran?
Apesar da autoridade que lhe foi supostamente investida, ele pede nossa autorização para intervir: “Uma resolução breve, tomada pelos próprios habitantes da Terra, deve preceder à nossa entrada maciça em cena. Peçam e receberão. Só então nossos poderes superiores, que ultrapassam em muito os que vocês têm atualmente, poderão ser utilizados”. Grosso modo, isso me faz lembrar as histórias de vampiros, nas quais eles só podem entrar na casa de alguém quando convidados, usando o próprio livre arbítrio das vítimas, burlando portanto sua proteção divina e natural. Todas as forças negativas nunca têm poder diante da Luz. Por isso, vez por outra, se passam por entidades amigas para adentrar onde não lhes é permitido. Estão aqui desde sempre, mas ainda não detêm o domínio total da situação como desejam.
Concílios secretos
Sananda pede ainda, na suposta mensagem: “Seria uma grande ajuda se vocês quisessem manter em relação a nós sentimentos amistosos e de confiança, sentimentos de boas-vindas”. Confiança e fé cega? Utilizando-se de sensitivos, Ashtar tem criado vários grupos de “voluntários especiais”, “concílios secretos” e “escolhidos” para seguir suas instruções e auxiliar na consecução de seus alegados trabalhos. Devemos nos perguntar, afinal, por que milhões de seres espaciais superiores, liderados pelo próprio Cristo, precisariam tanto do voluntarismo de seres humanos comuns para executar suas diretrizes?
De qu
alquer forma, esse personagem tão controverso incita uma discussão benéfica para a Ufologia na medida em que nos obriga a examinar com maior rigor e profundidade todos os casos de canalização, de entrantes, de contatos psíquicos etc. Relegá-los ao plano puramente imaginário, mítico ou psicológico equivale a jogar fora a chave do entendimento do Fenômeno UFO como um todo. A Ufologia Científica precisa romper seus preconceitos e buscar as respostas onde quer que elas estejam. Independente de nossas crenças e seja lá o que for, o Comando Ashtar está aí há décadas, impactando de uma maneira ou outra a Ufologia. Certas correntes da psicologia atribuem as canalizações ou mensagens à dissonância cognitiva ou devaneios da mente humana, reforçados pela nossa necessidade simples e pura de crer. Logicamente, isso explica uma boa parcela dos casos, mas creio que forças invisíveis utilizam-se desses grupos que, em princípio, se formam dessa maneira para depois evoluírem para contatos espíritas ou extraterrestres.
Os tais comandantes siderais parecem fazer parte mais do mundo espiritual do que da exobiologia. Eric Norman, Gordon Cove, Dan Lloyd e John Weldon são apenas alguns dos escritores que acreditam que Ashtar seja uma manifestação moderna das entidades demoníacas do passado. Compartilho da visão de Remy Bastien: “Duendes, seres angelicais, diabos e criaturas aparentemente extraterrestres seriam somente disfarces de entidades desconhecidas, físicas, espirituais ou mentais, que coabitariam este planeta conosco”.
A influência de Ashtar Sheran no pensamento ufológico
Na década de 70, um grupo de jovens estudiosos da espiritualidade e de mistérios em geral — que posteriormente viriam a fundar o Núcleo Tron — acidentalmente canalizou ou recebeu mensagens telepáticas de uma entidade que se intitulava Ishtar ou Ashtar, conforme entenderam alguns. Mas como se tratavam apenas de ensaios e não se tinham mais notícias acerca desse personagem que posteriormente viria a causar tanta polêmica, as experiências não foram adiante. Em meados da década seguinte, começaram a circular cópias, em fitas cassete de áudio, de mensagens a ele atribuídas, entre elas uma saudação ao povo da Terra e um projeto para a salvação do planeta. Boatos e notícias pululavam aqui e ali, dando conta de que outras pessoas também teriam gravado mensagens parecidas de Ashtar Sheran. Até que, em função delas, grupos dedicados a este que é, sem dúvida, um dos personagens mais inusitados da Ufologia, se formaram em várias cidades, configurando um fenômeno persistente e duradouro, uma vez que até hoje novos grupos continuam se formando e se multiplicando, embora nunca houvesse nada de concreto.
Não há como referendar a fonte de uma mensagem recebida por meio mediúnico ou canalizado, conforme admitem os próprios espiritualistas. Na literatura desse segmento, aliás, por tantas vezes já se alertou quanto ao risco de uma entidade se passar por outra, enganando seus assistentes. Outra questão no mínimo curiosa, para não dizer inaceitável, é que, em suas mensagens iniciais, Ashtar se dizia vir em nome do Cristo planetário, mas ao mesmo tempo solicitava que pedíssemos sua intervenção, incorrendo em tremenda contradição, incompatível para alguém de seu porte. Ao que se saiba, até o momento nenhum instrumento dos órgãos governamentais que monitoram o planeta e o espaço chegaram a registrar sua imensa frota de naves espaciais, que estaria estacionada próxima à Terra. Por tudo isso, Ashtar é visto com grande ceticismo pelos integrantes da Ufologia Científica, que pouco ou nada o consideram, enquanto que, por outro lado, é adorado por grupos místicos e esotéricos. — Atílio Coelho