A Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU) recebeu, no final de julho, um volumoso pacote de novos documentos ufológicos do Governo Brasileiro, que revelam em detalhes o funcionamento do órgão oficial que a Aeronáutica criou, em 1969, em plena Ditadura Militar, para pesquisar a presença alienígena em nosso país, o Sistema de Investigação de Objetos Aéreos Não Identificados (Sioani). Desta vez, no entanto, o novo lote de documentos não veio diretamente do Governo, como resultado da campanha UFOs: Liberdade de Informação Já, que produziu até agora três aberturas oficiais, sendo a maior e mais expressiva delas em 04 de maio [Veja edição UFO 155]. O material foi entregue à CBU pelo ufólogo paulista Edison Boaventura Júnior, presidente do Grupo Ufológico do Guarujá (GUG), que atuou como consultor da Revista UFO há alguns anos e depois desligou-se.
Boaventura recebeu o acervo de presente de um militar aposentado da Força Aérea Brasileira (FAB), em 2001, e o reteve até então. No entanto, solicitado pelos integrantes da CBU durante o III Fórum Mundial de Ufologia, realizado em junho, em Curitiba, concordou em doar todo o pacote para a campanha pela liberdade de informações. “Quero contribuir com este trabalho e por isso, em meu nome e no de meu grupo, encaminho para publicação na Revista UFO e em seu site, como colaboração e para somar à campanha empreendida pelo CBU”, declarou. Semanas depois ele enviou ao editor A. J. Gevaerd um DVD de dados contendo a espantosa quantidade de 1.310 páginas de documentos inéditos do Sioani, além de 28 croquis coloridos e 64 fotos produzidas pela Aeronáutica nos anos 60. Junto vieram 137 páginas de dossiês também coloridos com três croquis e 17 fotos, tudo material oficial.
“Esqueça meu nome para sempre”
O ufólogo, assim, cumpriu a promessa de repassar à toda a Comunidade Ufológica Brasileira, através da Revista UFO e como parte do movimento UFOs: Liberdade de Informação Já,, um material de grande importância e significado, e que não consta das liberações governamentais feitas até aqui – talvez porque, em se tratando de originais nas mãos de um civil, o Governo não tinha o que liberar. Boaventura explicou que conseguiu o material através de um militar de São Paulo. Disse que, em 1997, estabeleceu contato com o major-aviador Gilberto Zani de Mello, chefe operacional do Sioani na época em que estava ativo, que o encaminhou a um oficial aposentado que tinha o calhamaço em seu poder. O ufólogo encontrou-o no interior do estado, quando obteve o acervo. Ele informou a Boaventura que recebera todos os documentos diretamente do major-brigadeiro José Vaz da Silva, fundador do órgão, mas que estava cedendo-lhe apenas parte do que lhe fora confiado, pois outra quantidade – não se sabe de que tamanho – ele teria dado a um ufólogo do Paraná de identidade ignorada. Também não se sabe quem possa ser.
Boaventura acrescentou ainda que sua fonte também descreveu em detalhes o funcionamento do Sioani, e disse que resolveu ceder-lhe o acervo para que viesse a público no futuro, “para conhecimento da sociedade e preservação da memória da pesquisa ufológica oficial empreendida pelo órgão”. E pediu ao ufólogo: “esqueça meu nome e não me procure mais”. O oficial já tinha cerca de 70 anos quando se conheceram e gozava de boa saúde, mas não se sabe se ainda vive. Boaventura, no entanto, guardou todo este importante acervo por quase uma década, mostrando-o para alguns colegas e amigos, entre eles os ufólogos Osmar de Freitas e Marcos R. Silva [Já falecido], do Grupo de Estudos de Objetos Não Identificados (Geoni), e Josef Prado, da lista de discussões eletrônicas Burn. Os consultores da Revista UFO Pablo Villarrubia Mauso e Arismaris Baraldi Dias [Também já falecido], teriam tido contato com o material. Informações breves sobre seu conteúdo foram publicadas em alguns sites nacionais.
Enquanto não decidia divulgar amplamente documentos de tamanho significado – o que seria apropriado e que certamente mudaria radicalmente o rumo da abertura ufológica em nosso país –, Edison Boaventura Júnior disse que ficou vários anos analisando o calhamaço e revendo casos pesquisados, visitando locais de avistamentos e entrevistando testemunhas e militares que ainda estavam vivos. “Pretendo fazer uma abordagem histórica do assunto em um livro que editarei em breve, preservando a memória da pesquisa ufológica militar no Brasil e trazendo à tona detalhes não escritos nos dossiês”, disse. Ele esclareceu que o acervo que recebeu era composto de várias pastas amareladas pelo tempo e dossiês corroídos pela má conservação. “Algumas pastas eram numeradas e coincidentes com os números dos casos apresentados resumidamente no boletim número 2 do Sioani, editado em agosto de 1969, e outras não continham nenhuma numeração”.
O oficial não lhe cobrou nada, nem dinheiro, nem favores, pelo material cedido, como também não impôs qualquer condição para que Boaventura o tivesse. Ele teria participado ativamente das atividades militares realizadas, que ocorriam quase sempre com o envio de grupos de três ou mais integrantes do Sioani para levantamento dos casos e colheita de depoimento das testemunhas. Na estimativa do ufólogo, o que lhe foi entregue corresponde a pouco mais de 60% de todo o material gerado pelo Sistema de Investigação de Objetos Aéreos Não Identificados (Sioani) em seu período de atividade. Não se sabe o que permanece em poder do tal ufólogo paranaense não identificado, a quem também foi entregue material, e nem porque este ainda não resolveu apresentá-lo à Comunidade Ufológica Brasileira, como agora, finalmente, faz Boaventura.
Surpresa no meio ufológico
Ainda segundo o militar aposentado, os relatórios de casos ufológicos investigados pelo Sioani eram encaminhados para análise em laboratórios especializados, e muitas vezes seguiam para um endereço não sabido em Brasília. Disse que a temática ufológica era de suma importância para Vaz da Silva e para o alto Comando da Aeronáutica, e que o trabalho era desenvolvido com metodologia científica, seguindo-se regras específicas na condução das entrevistas com testemunhas, que chegavam a ser submetidas a exames psiquiátricos por um oficial médico da Força Aérea Brasileira (FAB). Sabe-se que alguns integrantes do Sioani participavam de reuniões periódicas com militares de outros
países para troca de informações, tanto que parte do material gerado pelo órgão era traduzido para o inglês e encaminhado para departamentos de pesquisas dos Estados Unidos.
Em maio de 2008, Edison Boaventura Júnior – que mesmo passados sete anos da data em que recebeu o material ainda não o tinha liberado inteiramente – surpreendeu a Comunidade Ufológica Brasileira ao oferecer todo o acervo para venda. Não se suspeitava, na época, que o volume de tal calhamaço chegasse a impressionantes 1.310 páginas de relatórios, dossiês e boletins de pesquisa ufológica oficial. Mas Boaventura fez uma pequena descrição de seu conteúdo no anúncio de venda, pela internet, o que irritou alguns ufólogos que sustentavam – como ainda o fazem hoje – que tais documentos deveriam ser conhecidos imediatamente, desde que os recebeu, e jamais sido mantidos longe do meio ufológico ou mostrados a apenas alguns investigadores. “Eu estava com problemas financeiros, e se tivesse vendido o acervo na época, teria sido somente para pessoas idôneas”, declarou dizendo-se realizado, hoje, por ter colocado tudo à disposição.
Entre os ufólogos que questionaram a atitude de Boaventura de manter o fantástico acervo oculto por tanto tempo está o conselheiro especial da Revista UFO Roberto Affonso Beck, presidente da Entidade de Estudos Extraterrestres (EBE-ET), de Brasília. Em agosto de 2003, durante a realização da II Expo UFO, promovida por sua entidade em Brasília, Boaventura mostrou a Beck e a alguns presentes os documentos, mas, aconselhado a apresentar a documentação à toda a Comunidade Ufológica Brasileira, negou a possibilidade, dizendo que havia um compromisso verbal de não fazê-lo, firmado com o tal oficial da Aeronáutica. No entanto, hoje Boaventura esclarece isso, confirmando em e-mail que sua fonte não o proibiu de nada e ainda disse que estava lhe dando o material para que fosse tornado público. Boaventura manteve sua decisão de não fazê-lo até julho passado, quando então cedeu à solicitação da Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU) e entregou todo o calhamaço.
Volume que aumenta a cada dia
O Portal UFO [ufo.com.br] já disponibilizou cerca de 1.200 páginas de documentos e mais de 200 fotografias das atividades do Sioani e da Operação Prato, realizada na Amazônia, em 1977. Mas nada disso, que a CBU recebeu do próprio Governo Brasileiro, conteve, por exemplo, desenhos coloridos de UFOs feitos por militares que trabalharam no Sioani, nem fotografias de testemunhas – como o pacote agora recebido de Boaventura. Nele estão incluídas, por exemplo, fotos como as da enfermeira Maria Cintra, que teve um contato direto com um ser extraterrestre na madrugada do dia 25 de agosto 1968, em Lins (SP), um caso clássico da Ufologia Brasileira pesquisado pelos militares em sigilo. O pacote contém também os procedimentos de pesquisas de dezenas de casos ufológicos, que jamais vieram a público antes [Veja matéria nesta edição].
Por sugestão do conselheiro especial da Revista UFO, Fernando de Aragão Ramalho, todo o material doado por Boaventura também foi enviado por ele à Coordenadoria Regional do Arquivo Nacional, em Brasília, que, por sua vez, já teve sua recepção oficialmente comunicada à Casa Civil da Presidência da República. Desta forma, ele passa automaticamente a fazer parte do processo encabeçado pelo Dossiê UFO Brasil, e certamente exercerá mais pressão para que o Governo libere novas pastas sobre UFOs e o envolvimento militar nas pesquisas brasileiras. “Os questionamentos por Boaventura ter mantido para si material de tamanha importância já não pesam mais, visto que o que importa agora é tirar proveito estratégico deste acervo para fins de mais abertura ufológica em nosso país”, declarou o co-editor da Revista UFO, Marco Antonio Petit. “Espero que este material agregue conhecimento a tudo o que já foi disponibilizado pelo Ministério da Aeronáutica”, complementou Edison Boaventura Júnior, informando que disponibilizou os documentos também no site do Grupo Ufológico do Guarujá [www.gugonline.com.br].