Responder a essa pergunta parece simples, mas não é. Seria fácil esboçar um modelo idealizado de como deveria ser um ufólogo, coisa que se resolve apelando-se aos critérios pessoais um tanto ambíguos de quem já é profissional da área. Essa pessoa acredita que “ufólogo sou eu e quem pensa igual a mim. Os outros não são, ainda que falem o tempo todo de discos voadores”. Vamos examinar esse aspecto neste texto. Primeiro, não existe universidade alguma que dê diploma válido de pesquisador do Fenômeno UFO e ninguém se gradua em Ufologia. Isso facilita muito as coisas, pois derruba as barreiras educacionais que poderiam impedir a apropriação de tal denominação. Assim, estudioso da casuística ufológica pode ser qualquer um, não importando a idade, formação acadêmica, nem a quantidade de tempo dispensada para a pesquisa do tema. Logo, concluímos que ufólogo é todo indivíduo que goste de se autodenominar como tal, não existindo um organismo reconhecido que o habilite, homologue, matricule ou conceda referente título.
Quem o detém estará em seu real direito. Seguramente, alguém que dedique sua vida à Ufologia fará algo mais do que ler livros ou devorar vídeos sobre o Fenômeno UFO. É um pesquisador quem encara de maneira autodidata tarefas de investigação, compilação ou estudo relacionados ao assunto – ainda que sejam mínimos –, sem se importar com o método ou enfoque particular. Também é aquele que se comunica com outros denominados ufólogos, que o ratificam em sua identidade e presença no grupo, de forma que passa a integrar essa comunidade que discute temas afins. Esses três critérios parecem condições indispensáveis para que o indivíduo possa se considerar um investigador de ocorrências relacionadas aos discos voadores. Mas se pelos menos um só deles se cumprisse, já estaria satisfeita a condição necessária para que alguém possa ser definido como um estudioso de tal fenômeno.
O pensador Serrat dizia que “a verdade nunca é triste, pois que para ela não existe remédio”. E a realidade sobre a Ufologia nos obriga a revisar as idealizações consideradas bem intencionadas. Os ufólogos que defendem uma pesquisa científica do Fenômeno UFO preconizam o conceito de que é primordial depurar as informações e converter o estudo dos dados em tarefa científica. Um deles é o doutor Oscar A. Galíndez que afirma: “Entendemos que chegou a hora de desmistificar o assunto, despojando-o de todo elemento metacientífico”. Esse é um nobre objetivo, sem dúvida. Mas é realmente obrigatório que o estudioso tenha uma atitude científica? Em rigor, nada exige isso, já que a Ufologia está fora do círculo acadêmico. Um determinado ufólogo pode preferir um trabalho investigativo do tema alheio ao rigor e o longo tempo de duração do método científico ou a busca de contato com possíveis visitantes cósmicos, se essa for sua verdadeira pretensão ao estudar o fenômeno. É correto, ainda, que outros se aprofundem no tema com o objetivo de responder suas questões pessoais íntimas. Tudo isso é válido.
Entendendo a Ufologia — O ufólogo espanhol Vicente Juan Ballester Olmos propôs que se enfoque o estudo do Fenômeno UFO desapaixonadamente e, sobretudo, sem idéias preconcebidas. Comecemos pelo segundo item. É possível não contar com opiniões premeditadas quando se analisa a manifestação ufológica? Certamente não a tal ponto quando Ballester Olmos escreveu seu livro OVNIs, El Fenómeno Aterrizaje [UFOs, O Fenômeno Aterrissagem, Editorial Plaza & Janes, 1978]. Ele implicava desde o título da obra que alguma coisa havia aterrissado. Mas isso não desqualifica sua proposta e é bom que seu pensamento continue evoluindo. Ocorre que na vida toda experiência capitalizada nos condiciona a enfrentar com maiores ou menores recursos as situações futuras. Essa experiência acumulada nos proporciona uma determinada disponibilidade psicológica para o futuro.
Assim, quanto mais diversos, enriquecidos e tumultuados forem os conceitos que adquirimos, melhor será o arsenal de respostas possíveis às eventualidades que venhamos a encontrar. Logo, não é ruim ter muitas idéias preconcebidas – o ruim é ter poucas e más opiniões. Quando um ufólogo defende que todo o Fenômeno UFO faz parte de um mito moderno – como muitos estudiosos que adotam Carl Jung como farol de suas conclusões –, o faz com essa idéia embasada em suas experiências e conhecimentos. O mesmo acontece com quem sustenta que os discos voadores vêm de outra galáxia ou mesmo de Ganimedes, a festejada lua de Júpiter, lar de nove em cada 10 supostos aliens que canalizam mensagens através de contatados terrestres.
Ora, é possível ser investigador ufológico e crer que naves tripuladas por seres extraterrestres visitam nosso planeta. Como também ser um estudioso do Fenômeno UFO, mas ao mesmo tempo cético em relação à origem alienígena dos objetos não identificados. Também há aqueles que pensam que os UFOs são viajantes do tempo ou manifestações plasmáticas, ou ainda, hologramas cósmicos com o propósito de induzir conceitos na população terrestre. Podem se considerar ufólogos os que acreditam que manifestações ufológicas sejam um fato psicossocial, de arquétipos junguianos ou mesmo revelações parapsicológicas.
Enfim, a lista é longa e as pesquisas sobre a casuística ufológica seguem seu caminho. Diante desse panorama um ícone máximo da Comunidade Ufológica Mundial, o astrofísico e escritor franco-americano Jacques Vallée, resolveu afastar-se das discussões e “reservar-se nos bastidores da Ufologia”, segundo ele. A reclusão de Vallée se deu de maneira bastante decisiva, a tal ponto que seu site na internet simplesmente omite qualquer referência à sua vasta produção ufológica, limitando-se a apresentar apenas seu currículo com as realizações profissionais. “Não encontro uma forma de justificar o porquê de ficar associado à Ufologia tal como é apresentada ao público hoje em dia”, disse Vallée recentemente. Segundo resumiu o jornalista Gregory Gutierrez, que o entrevistou, “o cenário ufológico está nas mãos dos piores aficionados do tema que caem em todas as armadilhas que o fenômeno nos prega e esmagam a si mesmos com as teorias fantasiosas e irreais, em detrimento de uma investigação científica rigorosa”.
Subsistência do ufólogo — Diante disso, ainda que contrariando mais uma vez Olmos, passemos à sua segunda assertiva: “investigar desapaixonadamente”. Esse certamente é outro mandamento difícil de cumprir. É como se fosse dito a um desportista para praticar seu esporte preferido sem colocar paixão nisso, apenas tomando parte das atividades ou competições sem nada sentir. Ou que se pedisse a um engenheiro que construísse um lindo e imponente prédio, mas sem que empenhasse seus sentimentos nele. Como isso é possível? Na realidade o conceito da proposta de Olmos não é isolado, pois quase todos os manuais de Ufologia, formais e informais, aconselham paternalmente ser desapaixonado com o assunto, mostrar-se totalmente objetivo e sem preconceitos, agindo de maneira racional e inquisidora, com a capacidade de questionar-se radicalmente e a seus colegas com perspicácia, sangue frio etc. Ora, é melhor que paremos aqui com essa lista de adjetivos, porque uma pessoa que se enquadre neles não deve ser uma boa companhia!
Cruzada pessoal — Uma vez que tal pesquisa na vida de uma pessoa advém de uma vontade voluntária, a paixão, o entusiasmo e o compromisso emocional estarão sempre presentes. Assim como o gosto por reunir-se para conversar com outros ufólogos, um condimento fundamental para desfrutar da tarefa de fazer Ufologia. O contrário disso, ou seja, o arrefecimento dessa paixão – caso o Fenômeno UFO causasse ao praticante mais desgosto do que prazer –, seria então um indicativo para deixar o tema de lado e dedicar-se a algo mais compensador. Outro dilema espinhoso que enfrenta o estudioso está em combinar sua dedicação pelo assunto às suas necessidades de subsistência. Noutras palavras, é correto que um ufólogo ganhe dinheiro com sua atividade? Milton Hourcade em seu livro Elementos de Ovnilogia [1989], escreveu que “um ufólogo não vive dos UFOs, e sim para eles”. Quase as mesmas palavras também foram proferidas pelo contatado argentino Carlos Salerno, causando polêmica pelo fato de afirmar ter contato com seres extraterrestres. Longe de terem a mesma visão cósmica, é possível que nessa expressão terminem todas as coincidências entre Hourcade e Salerno.
Na mesma linha de pensamento, o ufólogo argentino Guillermo Roncoroni, em determinada ocasião, empreendeu uma espécie de cruzada pessoal contra aqueles que ganham dinheiro com o assunto, “que lucram enganando o público”, como publicou em seu país. Mas o que isso significa? Talvez que os ufólogos seriam mercenários? Certamente não. Veja que em todas as épocas os pesquisadores reconhecidos como sérios e competentes receberam honorários por editar livros, publicar artigos, participar de programas de televisão, proferir conferências, organizar congressos internacionais etc. Desde que o trabalho seja coeso e visando como qualquer outra atividade comercial lícita o bem comum, que pecado há nisso? O pensamento se emprega também a toda empresa editorial ou televisiva que paga pontualmente seus colaboradores na área ufológica, sejam eles ufólogos ou não. No fundo, cobrar pelo que se faz é natural e parece inevitável em um mundo em que o capitalismo derrubou algo mais que um muro de cimento em Berlim, Alemanha. Mas tudo isso é bom ou mau? É difícil dizer, pois cada um deve buscar suas repostas e agir de acordo com elas. É preciso evitar fazer juízos de valor, permitindo que as coisas sejam sentidas e percebidas exatamente como são, ainda que não seja o que gostaríamos. Em outras palavras “a verdade nunca é triste, pois que para ela não existe remédio”.