Filho único de um rico industrial de tecidos, descendente de uma estirpe tradicional de burgueses, a vida de Cedric Allingham se confunde com a decadência do Império Colonial Britânico. Nascido em 1921 em uma das principais cidades da Índia, Bombaim, e levado à África do Sul, onde o pai, retirado dos negócios, fixara residência, acabou indo morar em definitivo na Velha Inglaterra. Lá o internaram em um sanatório devido a uma grave doença que o afastou de todas as atividades por dois anos.
Em 1941, envergando a farda do Exército, prestou serviço militar no Oriente Médio e ali permaneceu até o término da Segunda Guerra. Foi durante a estadia naquela região, onde as noites são claras e o céu oferece um espetáculo deslumbrante, que Allingham se interessou pela astronomia. O calor não o deixava dormir tão cedo e, assim, entretinha-se a observar os astros fulgurantes que no deserto pareciam fulgurar com mais intensidade. A nove semanas da rendição da Alemanha, o navio em que os pais de Allingham viajavam afundou torpedeado. Órfão, o astrônomo amador devotou-se com afinco ao seu entretenimento favorito.
Na sua casa de campo em Yorkshire, onde instalara um telescópio refletor de 27 cm, passava longas temporadas observando, repousando e escrevendo, sob pseudônimo, contos de ficção publicados em jornais e revistas. A astronomia era apenas um hobby para Allingham até o dia em que se convenceu de que a Terra não era o único planeta habitado. O seu livro Disco Voador de Marte [Flying Saucer from Mars] começa com essas palavras simples, mas categóricas: “Em 18 de fevereiro de 1954, encontrei um homem de outro mundo”. Boa parte do livro de Allingham é consagrada a Flying Saucers Have Landed, de George Adamski [Cujo caso foi tratado na edição anterior, UFO Especial 074], com quem compartilhava a paixão pela astronomia. Almejando galgar o mesmo posto do contatado, despontou como mais um escolhido pelos benevolentes seres do espaço. Na manhã daquele dia, conduzia seu trailer, devidamente equipado para a prática do campismo, por uma estrada litorânea do norte da Escócia, entre Lossiemouth e Buckie.
Além de astrônomo, Allingham também era ornitólogo amador, e seu intuito era estudar o habitat das aves da região. Parou em uma área quase desértica, desabitada. A certa altura, porém, um homem que lhe pareceu ser um pescador cruzou rapidamente com ele, tomando a direção contrária. Dez minutos depois, ouviu um ruído suave que associou ao de um pássaro de grande porte — entretanto, ao olhar para cima, o que viu foi um disco voador. Sem perder tempo, apontou a objetiva de sua máquina e disparou várias vezes, obtendo as fotografias que ilustrariam o seu livro. Na verdade, era um magnífico engenho aéreo e o seu acabamento causaria, certamente, inveja aos nossos construtores de aviões. Tinha 4,57 m de diâmetro e 6,10 m de altura. O casco, a parede central e a cúpula superior pareciam formados por uma chapa de metal — Allingham não conseguiu descobrir sinais de dobradiças ou cavilhas. Ele não soube dizer de que metal era feito. A sua cor e o seu brilho assemelhavam-se aos do alumínio polido. Havia duas fileiras de vigias, dispostas em grupos de três em torno da parede central, por cima da qual se notava um pequeno rebordo. Do cimo da cúpula saía uma haste vertical escura que lembrava um para-raios.
Um ser de outro mundo
Allingham não conseguiu descobrir a sua função — o aparelho esférico de aterragem, localizado em três pontos da parte interna da base do casco, era feito de material elástico, de consistência semelhante a da borracha. O homem sabia também estar em frente de um ser de outro mundo e acreditava que esse ser, quem quer que fosse, devia ter, de longe, mais conhecimentos científicos do que o mais culto homem terrestre. Ao aproximar-se do disco, uma espécie de porta corrediça situada na parte inferior deslizou para trás e um homem saltou, fácil e graciosamente, para o chão. Como avançasse em direção a ele, ergueu o braço em saudação. Ele fez o mesmo. E, então, durante algum tempo, encararam-se um ao outro. Natural é que assim tivessem procedido. Presumivelmente, ele já tinha visto outros homens da Terra, mas Allingham nunca tinha visto um homem do espaço.
O aspecto dele era semelhante ao nosso. A estatura de Allingham era de 1,76 m e a do alienígena deveria ser de 1,8 m. Pelos padrões terrestres, teria mais ou menos a mesma idade de Allingham na época, ou seja, 32 anos. E o cabelo dele, como o do contatado, era castanho e curto. A pele, porém, era de cor estranha, assim como um pardo carregado. Mesmo assim, estivesse ele vestido com roupas terrestres, não teria qualquer dificuldade em se passar por um inglês. A única diferença acentuada era sua testa, mais alta do que a de qualquer homem terrestre. Mas, posto que fisicamente era semelhante, o traje dele era absolutamente diferente do de Allingham.
Dez minutos depois, ouviu um ruído suave que associou ao de um pássaro de grande porte. Entretanto, ao olhar para cima, o que viu foi um disco voador. Sem perder tempo, apontou a objetiva de sua máquina e disparou várias vezes
Naqueles tempos de ficção científica, muitos já tinham visto desenhos de trajes do espaço em uma só peça que os heróis envergavam, enquanto andavam a saltar de um mundo a outro. Assaz estranhamente, os escritores de ficção não estavam longe da verdade, nesse caso — o vestuário do homem do espaço era realmente algo desse tipo. Cobria-o completamente, do pescoço aos pés e deixava apenas as mãos livres. Não se notava calçado, os pés estavam como que encaixados no vestuário. O próprio vestuário lembrou a Allingham uma cota de malhas muito apertada, presumivelmente isolante e flexível. Havia ainda outra coisa que atraiu imediatamente sua atenção: o nariz dele, ou, antes, alguma coisa ligada ao nariz dele.
Um dos sérios problemas do voo interplanetário foi sempre este: se conseguirmos alcançar outros mundos, como haveremos de respirar? E, se seres de outros mundos nos visitarem, como respirarão na nossa atmosfera? Vênus, como sabemos, tem uma atmosfera em que predomina o dióxido de carbono, enquanto que o ar de Marte é constituído, principalmente, de azoto e contêm muito pouco oxigênio livre. A comunicação se realizou por gestos, como no caso de Adamski. Com Allingham, porém, não houve colóquio telepático. Apenas desenhos e sinais com as mãos. O alienígena, cujo nariz era coberto por uma espécie de aparelho respiratório, sorria para ele, demonstrando contentamento.
O funcionamento do disco voador
Allingham traçou um diagrama representando o Sol e os três planetas mais próximos, fazendo com que o visitante apontasse para um deles. E o que ele indicou não foi Vênus, e sim Marte. Pronunciando o nome dos planetas em voz alta, Allingham forçou-o a imitá-lo. A tonalidade do som emitido pelo marciano era diferente de
tudo o que ouvira. Allingham não conseguiu fazer-se entender tão bem quanto desejava. Achou graça dos seus esforços inúteis, e seu interlocutor riu junto com ele. Sofregamente, de gesto em gesto, indagou acerca do funcionamento do disco voador, depreendendo ser ele acionado por energia nuclear. Ademais, o marciano consentiu, e nisso foi muito mais generoso do que o venusiano de Adamski, que Allingham o fotografasse. Para externar amizade, Allingham presenteou-lhe com uma caneta tinteiro com a qual desenhara as figuras no seu bloco de notas. O marciano enfiou a caneta no bolso — aliás, não visível — de sua indumentária, um tanto semelhante a do venusiano, visto que não possuía botões ou costuras. Novamente por gestos, o marciano alertou-o para o fato de os povos da Terra estarem prestes a desencadear outra guerra. Nesse momento sua feição tornou-se séria e apreensiva.
Lembrando-se dos famosos canais marcianos anunciados por Schiapparelli, Allingham tentou confirmar algo a respeito. Os gestos do marciano o convenceram de que Schiapparelli tinha razão. A superfície de Marte seria cortada por canais que distribuíam a água represada na faixa central para as zonas agrícolas situadas em ambas as margens — insistindo na mímica, soube que o marciano estivera antes na Lua e em Vênus e que Mercúrio é inabitável. Embora Allingham tencionasse saber mais, o marciano não se mostrou disposto a permanecer mais tempo ali. Chegara, pois, o momento da despedida. Após fotografar o engenho voador, Allingham focalizou o marciano, mas quando este já se encaminhava de volta. A foto, de baixa nitidez e fora de foco, infelizmente mostra o marciano apenas de costas, vestido com um traje de peça única, aparentemente flexível. De qualquer modo, essa foi uma das primeiras imagens propaladas como sendo a de um “habitante de outro planeta”, pois nem o próprio Adamski lograra fotografar o seu venusiano.
Falecimento precoce
Com um misto de júbilo e decepção, Allingham assistiu à partida do marciano, que se despediu de mão erguida. O disco se afastou primeiro devagar, depois velozmente até desaparecer no céu. Eram exatamente 16h25. A entrevista, demasiadamente curta para quem tanto desejava saber, durou cerca de meia hora. Pouco depois, Allingham tornou a ver o homem com quem cruzara. Conversando com ele, soube que também vira o disco voador. Allingham pediu ao homem, que era um pescador e se chamava James Duncan, que fizesse uma declaração por escrito. Com esse álibi, Allingham, que faleceria precocemente em setembro de 1956 em um hospital da Suíça, vítima de tuberculose, pretendia não ser visto como um caprichoso contador de mentiras mirabolantes. Conto de pescador? Este fantástico caso, ainda não totalmente esclarecido, encontra-se narrado em pormenores na obra de Hugo Rocha, O Enigma dos Discos Voadores ou a Maior Interrogação de Nosso Tempo [Gráfica Biblos, 1959].