O aquecimento global está ocorrendo de forma mais rápida do que se imaginava e as temperaturas médias da Terra em 2100 serão ainda mais altas do que previam os cientistas. Quem diz é o vice-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC), o maior painel de climatologistas do mundo, que daqui a um ano divulgará um relatório com tudo o que a ciência sabe sobre o efeito estufa.
O cingalês Mohan Munasinghe esteve no Brasil participando do simpósio Dimensões Éticas das Mudanças Climáticas, promovido pelo Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas e pela Coppe – Coordenação de Pós-Graduação em Engenharia – da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e encerrado no Rio.
Ele disse à Folha que o 4º Relatório de Avaliação do IPCC reduz a incerteza que havia sobre o impacto da ação humana no clima e sobre suas dimensões -como quanto o planeta esquentará, em média, no fim do século. “Eu não posso dar o valor, porque isso seria revelar o resultado. Mas a previsão anterior foi 3,5ºC, e a nova não deve ser menor que isso. Provavelmente será maior”, afirmou.
O último Relatório de Avaliação do painel, divulgado em 2001, estabelece que as temperaturas do planeta em 2100 estarão de 1,5ºC a 5,8ºC mais altas. Ambos os extremos têm probabilidade baixa de acontecer. O cenário mais provável fala em mais de 3ºC, o que já seria suficiente para uma catástrofe global: a essa temperatura, por exemplo, a floresta amazônica entraria em colapso.
Uma versão preliminar do 4º relatório foi obtida pelo Congresso dos EUA e vazou para a imprensa em maio. Ela fala em até 4,5ºC de aumento nas médias globais. Munasinghe afirmou que a confiança nas projeções da temperatura aumentou bastante em relação à avaliação anterior do IPCC, órgão oficial da ONU para o tema aquecimento global, principalmente pelo aperfeiçoamento dos novos modelos climáticos existentes. Além disso, “temos agora um número muito maior de modelos. Isso dá mais confiança no sentido de direção, e alguma confiança sobre o valor médio das temperaturas.”
Segundo o pesquisador, as evidências de aceleração da mudança climática a serem apresentadas pelo IPCC vêm sobretudo de estudos geofísicos, como os que evidenciam o derretimento de geleiras e gelo marinho no Ártico e a aceleração do fluxo de geleiras na calota polar da Antártida ocidental. Nos últimos dois anos, várias pesquisas têm sido publicadas que indicam uma contribuição maior do degelo antártico para a elevação do nível do mar.
“Esses estudos dão essa indicação mesmo antes do quarto relatório”, afirmou o cientista. Criado nos anos 1990 para compilar toda a informação científica sobre o aquecimento global, o IPCC tem sofrido pressões políticas fortes, principalmente da administração dos EUA de George W. Bush -que em 2002 trocou a presidência do painel a pedido da Exxon. Bush acusa o IPCC de ser politicamente enviesado e de ter baixa representação americana -apesar de mais de 40% dos 3.000 cientistas do painel serem americanos.
“É difícil fazer as coisas mesmo sem pressão política num painel desses”, afirma o cingalês. Ele diz que as recomendações do 4º Relatório de Avaliação aos governos do mundo todo são simples: “É preciso tomar providências o quanto antes. Deveria haver pressões éticas dos cientistas por um corte maior de emissões. Mas isso não vai acontecer, na minha opinião, porque os países tomam decisões com base em interesses nacionais”.