Alexander Zakharov revela planos russos para futuro da exploração espacial. Primeira missão, em 2009, tentará trazer amostras de Fobos, maior das luas marcianas. Após mais de uma década de retiro, a Rússia voltará a realizar missões interplanetárias. É o que afirma Alexander Zakharov, pesquisador do Instituto de Pesquisas Espaciais da Rússia envolvido num projeto audacioso: enviar uma sonda até os arredores de Marte para coletar amostras de uma de suas luas e então retornar à Terra. A missão Fobos-Grunt (“Solo de Fobos”, na tradução) tem lançamento marcado para outubro de 2009, e os cientistas estão ansiosos pela conclusão do projeto. A última tentativa de enviar alguma coisa russa aos arredores marcianos ocorreu em 1996, mas uma falha no foguete impediu o sucesso.
O alvo desta vez será Fobos, a maior das duas luas marcianas, e o objetivo será investigar o próprio nascimento do Sistema Solar. “Fobos e Deimos poderiam possuir materiais pristinos da época em que os planetas nasceram, por conta da ausência de processos interiores a eles típicos de objetos maiores. É muito importante estudar esses materiais para investigar o processo de nascimento e evolução do Sistema Solar”, explica o cientista. O desafio é imenso. A Fobos-Grunt terá de chegar até a órbita de Marte, aterrissar em Fobos, coletar amostras e então decolar, para voltar a seu planeta de origem. O único local do Sistema Solar em que uma missão dessas conseguiu ter 100% de sucesso foi a Lua – pelas mãos dos próprios russos.
Agora, depois de uma crise econômica que quase destruiu o programa espacial russo nos anos 1990, o país volta a ter a perspectiva de fazer bonito em missões não-tripuladas. E Zakharov espera que esse seja apenas o primeiro projeto de uma renascença nas pesquisas interplanetárias russas – que podem até incluir, no futuro, uma missão de retorno de amostras de Marte. Confira abaixo a entrevista que ele concedeu ao G1.
G1 – Faz muitos anos que a Rússia não lança uma missão interplanetária, então é impossível não perguntar: por quanto tempo vocês estiveram desenvolvendo o conceito dessa missão de retorno de amostras de Fobos? Zakharov – Acho que você sabe que nossa última missão interplanetária mais ou menos bem-sucedida foi em 1988-1989 – as sondas Fobos 1 e Fobos 2. A espaçonave Fobos 1 foi perdida durante a travessia entre a Terra e Marte. A Fobos 2 foi colocada em órbita de Marte e após várias modificações em sua órbita ela ficou muito perto da órbita de Fobos ao redor de Marte. Então, segundo o planejamento da missão, um pequeno módulo de pouso deveria ter se separado da espaçonave e pousado na superfície da lua. Entretanto, por causa de um defeito no sistema de controle da espaçonave, ela perdeu contato com a Terra e a missão foi terminada. O principal elemento da missão não foi implementado.
G1 – Ainda assim, a missão produziu resultados científicos relevantes, não? Zakharov – Sim. Durante cerca de dois meses em órbita marciana, a Fobos 2 conseguiu coletar muitas imagens da superfície de Fobos, em vídeo e em infravermelho, e fez medições do ambiente de plasma marciano e de sua interação com o vento solar – a propósito, a maior parte do nosso conhecimento atual sobre o ambiente de plasma marciano veio das missões russas. Enfim, após a Fobos 2, a Academia Russa de Ciências e a agência espacial russa prepararam mais uma missão marciana – a Mars-96. Entretanto, o lançamento dessa missão fracassou.Como você sabe, nesse período, após o colapso da União Soviética, a economia russa estava em depressão e esses eventos tiveram um papel negativo nas atividades espaciais russas. Desde aquela época não tivemos mais nenhuma missão interplanetária.
G1 – E por que essa retomada novamente com Fobos? Zakharov – A Academia Russa de Ciências e a agência espacial russa escolheram essa missão por conta de várias razões. As luas marcianas, Fobos e Deimos, são corpos pequenos do Sistema Solar e isso significa que eles poderiam possuir materiais pristinos da época em que os planetas nasceram, por conta da ausência de processos interiores a eles típicos de objetos maiores. É muito importante estudar esses materiais para investigar o processo de nascimento e evolução do Sistema Solar.Além disso, as luas marcianas têm um atrativo a mais entre outros corpos do Sistema Solar – elas são marcianas. Estudá-las pode solucionar um grande mistério: sua origem. Será que elas foram capturadas pela gravidade marciana, ou nasceram nas vizinhanças de Marte, ou seriam ainda fragmentos de Marte ejetados do planeta após uma colisão violenta ocorrida no princípio da história do Sistema Solar?
G1 – Tirando de lado a ciência, há razões de engenharia por trás dessa decisão? Zakharov – Claro. O retorno de amostras é o método mais poderoso de exploração do Sistema Solar. Um retorno de amostras de Fobos propiciaria uma base científica e técnica muito boa para a realização futura de coleta e retorno de amostras de outros corpos, inclusive Marte. E Fobos é um alvo que já tentamos atingir antes, com a missão Fobos 2, então temos uma herança técnica e científica. E também há uma motivação extra para fazermos isso: Fobos é um alvo que não é contemplado nos programas das outras agências espaciais, então não faremos competição com ninguém. Por outro lado, essa missão é uma boa base para cooperação.
G1 – Isso toca num ponto importante. Recentemente, a China anunciou que colaboraria com a missão. Zakharov – Sim, e, além da China, vários países estão participando com instrumentos científicos, como França, Itália, Alemanha e Hungria. Mas esta é uma missão russa.
G1 – E como está caminhando o financiamento para a missão? Zakharov – A preparação desse projeto está avançando de acordo com os prazos previstos. Estimamos que o custo de preparação da missão fique em torno de US$ 80 milhões. E o lançamento está marcado para outubro de 2009.
G1 – Essa missão lembra um pouco a da espaçonave japonesa Hayabusa, que tentou coletar amostras do asteróide Itokawa em 2005, mas teve muitas dificuldades. Vocês tiraram alguma lição do esforço deles? Zakharov – Nós não cooperamos com a Jaxa [agência espacial japonesa] na espaçonave Hayabusa e infelizmente também não estamos cooperando com o Japão na missão de Fobos. Entretanto, nós estudamos todas as missões planetárias estrangeiras.
G1 – Depois disso, o próximo passo seria uma missão de retorno de amostras de Marte? Muitos consideram um projeto desses o mais importante ligado ao planeta vermelho, tirando um vôo tripulado. Zakharov – Como eu disse, partes da missão de Fobos poderiam ser tecnicamente p
recursoras desse esforço. Mas nós não temos essa missão nos planos do programa espacial russo, pelo menos até 2016.
G1 – De toda forma, pode ser esse o começo de uma renascença para os projetos de espaçonaves interplanetárias na Rússia? Zakharov – Torcemos para que seja.