Observatórios nos EUA vão virar a madrugada de domingo de olho no ex-planeta. No Brasil, dois fenômenos do tipo são aguardados para maio e junho.
Neste domingo, um “eclipse” nos confins do Sistema Solar vai ocupar astrônomos nos Estados Unidos. Plutão vai passar em frente a uma estrela, ocultando sua luz e permitindo que a atmosfera do agora planeta anão seja estudada com detalhes.
Há uma grande expectativa para o acontecimento, que só será visto no Sudoeste dos Estados Unidos e no Norte do México (mas, calma, o Brasil será contemplado por duas ocultações de Plutão daqui a pouco: em maio e em junho). Além da importância do evento, que vai ajudar a missão New Horizons, da Nasa, que ruma ao agora ex-planeta, o estado americano do Arizona tem um carinho especial por Plutão.
Foi no Arizona, especificamente no Observatório Lowell, na cidade de Flagstaff, que o astrônomo Clyde Tombaugh descobriu a existência de Plutão, em 1930. Tombaugh foi o único americano a descobrir um planeta no Sistema Solar (ou era, antes da União Astronômica Mundial rebaixar sua descoberta). Também foi em Lowell que a maior lua de Plutão, Caronte, foi encontrada, pelo astrônomo James Christy. Caronte é o barqueiro que leva ao inferno na mitologia grega – em inglês, Charon, o nome foi usado também para fazer uma homenagem à mulher de Christy, Charlene.
É compreensível, então, a confissão que o astrônomo Don McCarthy, que operará um telescópio de Lowell, neste domingo, fez ao G1: “eu só espero não estragar tudo.” McCarthy usará um instrumento que faz observações em infravermelho, enquanto dois astrônomos convidados do Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT) utilizam câmeras que observarão na luz visível.
“Será um trabalho desafiador. Plutão não estará diretamente na nossa frente, estará quase no horizonte, o que deixa tudo mais difícil, porque a nossa atmosfera interfere mais. E tudo deve durar cerca de quatro minutos. A pressão é enorme”, confessa ele.
Mas McCarthy e seus colegas não estarão sozinhos. Todos os telescópios da região, na verdade, estarão com os olhos voltados para Plutão quando ele se aproximar da estrela, na constelação de Sagitário, já nas últimas horas da manhã, por volta das 4h. Nesse momento, Plutão vai ocultar a luz da estrela, jogando uma pequena sombra na Terra. De seu lado, conforme passa pela atmosfera do planeta anão, a estrela vai expor, por poucos instantes, a atmosfera de Plutão.
Para quê tanto trabalho? Os cientistas esperam, entre outras surpresas que podem encontrar pelo caminho, verificar se o ex-planeta possui estações, como verão e inverno. “É verdade que Plutão está tão longe do Sol que seria esperado que ele fosse apenas um grande bloco de gelo. Mas a órbita de Plutão é em forma de elipse. Há momentos em que ele está mais perto e outros em que ele está mais longe do Sol. Por isso acreditamos que ele pode ter momentos mais quentes e mais frios”.
Neste momento, Plutão se afasta do Sol. Segundo o astrônomo francês Bruno Sicardy, que viaja aos Estados Unidos especialmente para fazer essa observação, os cientistas acreditavam que, por isso, a atmosfera iria congelar e desaparecer. No entanto, eles foram surpreendidos com um fenômeno exatamente oposto. “É bastante surpreendente, porque, na verdade, parece estar ocorrendo um derretimento”, diz ele. “Achamos que isso acontece porque Plutão está mostrando pouco a pouco seu pólo Sul ao Sol. O calor vai aquecendo camadas de gelo, que evaporam. Mas ninguém sabe quando esse fenômeno vai parar e queremos ver isso”, explica.
O trabalho vai ajudar a sonda New Horizons, de US$ 620 milhões, que acaba de receber uma ajudinha da gravidade de Júpiter para continuar sua viagem a Plutão, onde deve chegar em 2015. “Não queremos aprender a mesma coisa duas vezes. Então precisamos fazer a lição-de-casa,” explica McCarthy. “Não queremos gastar os recursos de uma sonda como a New Horizons para descobrir coisas que podemos ver daqui. Quanto mais informações tivermos daqui, melhores serão as perguntas que faremos à New Horizons e mais avançadas serão as informações que vamos ter”, diz ele.
Além disso, o astrônomo afirma que entender a atmosfera de Plutão pode gerar frutos para entender como atmosferas funcionam no Sistema Solar como um todo – inclusive na Terra. “No fim, saberemos mais sobre nós mesmos também”.
As ocultações de Plutão nos últimos anos foram eventos raros. Agora, no entanto, o planeta passa em frente a uma parte bem “povoada” da Via Láctea, então mais eventos do tipo são esperados. Em maio e em junho, outras duas ocultações ocorrerão e essas poderão ser vistas pelos telescópios do Brasil. Astrônomos brasileiros já começam a se preparar. Amadores com equipamento adequado podem até se aventurar, mas os cientistas alertam que será uma tarefa árdua.
“O mais difícil para um amador é simplesmente encontrar Plutão. Ele é muito pequeno e fica em uma área onde há vários objetos mais ou menos do seu tamanho. Então meu conselho é que quem quer observar o evento comece a se preparar com bastante antecedência. Vá olhando o céu dias antes, para conseguir encontrar Plutão repetidas vezes e ir vendo conforme ele se aproxima da estrela. É possível, mas vai exigir dedicação”, diz McCarthy.