O universo está descontrolado, expandindo-se aceleradamente. Um dia, toda a vida inteligente enfrentará o destino derradeiro — o grande congelamento e uma civilização avançada teria que embarcar na viagem final — a fuga para um universo paralelo. Na mitologia norueguesa, o Ragnarok — ou crepúsculo dos deuses —, começa quando a Terra é vítima de uma terrível onda de frio. O próprio céu congela e os deuses perecem em grandes batalhas travadas contra serpentes malignas e lobos assassinos. A escuridão eterna cai sobre a Terra exposta e congelada, enquanto o Sol e a Lua são devorados. Odin, o pai de todos os deuses, finalmente cai moribundo e o próprio tempo pára.
Será que essa antiga lenda prevê o nosso futuro? Desde o trabalho de Edwin Hubble na Década de 20, os cientistas sabem que o universo se expande, mas a maior parte deles acreditava que o processo de expansão se desacelerava a medida em que o universo envelhecia. No ano de 1998, astrônomos do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley e da Universidade Nacional Australiana calcularam o ritmo da expansão, estudando dezenas de poderosas explosões de supernovas em galáxias distantes — eventos capazes de iluminar o universo inteiro. Eles não acreditaram nos seus próprios dados.
Alguma força desconhecida fazia com que as galáxias se distanciassem umas das outras, o que implicava na aceleração da expansão do universo. Brian Schmidt, um dos líderes do grupo, conta: “Eu fiquei balançando a cabeça, sem acreditar, mas havíamos checado tudo. Relutei em dar a notícia a outras pessoas, porque acreditei sinceramente que seríamos massacrados”. Os físicos correram aos seus quadros-negros e perceberam que alguma energia escura de origem desconhecida, similar à Constante Cosmológica de Einstein, estava agindo como uma força antigravitacional.
Aparentemente, o próprio espaço vazio contém energia escura em quantidade suficiente para explodir o universo. Quanto mais o universo se expande, mais energia existe para fazer com que ele se expanda ainda mais rapidamente, levando a um modelo exponencial de escape. Em 2003, esse resultado surpreendente foi confirmado pelo satélite WMAP — sigla em inglês de Sonda Wilkinson de Medida da Anisotropia em Microondas. Girando em uma órbita localizada a cerca de 1,6 milhão de quilômetros da Terra, esse satélite é equipado com dois telescópios capazes de detectar a débil radiação de microondas que permeia o universo.
O aparelho é capaz de fotografar detalhadamente o brilho residual da radiação de microondas deixada pelo Big Bang, que ainda circula pelo universo. O satélite WMAP, de fato, nos forneceu fotos de uma época na qual o universo tinha apenas 380 mil anos de idade. O satélite resolveu a antiga questão referente à idade do universo que tem oficialmente 13,7 bilhões de anos — a margem de erro da estimativa é de 1%. Mas o mais notável é que os dados mostraram que a energia escura não é uma ocorrência fortuita, mas que compõe 73% da matéria e da energia de todo o universo.
Para tornar o mistério ainda mais profundo, os dados revelaram que 23% do universo consistem de matéria escura, uma forma bizarra que é invisível mas que ainda possui peso. Hidrogênio e hélio correspondem a 4%, do universo e os elementos mais pesados, você e eu incluídos, a apenas 0,03%. A energia escura e a maior parte da matéria escura não consistem de átomos, o que significa que, ao contrário daquilo no qual os antigos gregos acreditavam e àquilo que é ensinado em todo curso de Química, a maior parte do universo não é composta de átomos. À medida que o universo se expande, o seu conteúdo de energia se dilui e sua temperatura despenca para valores próximos ao zero absoluto, quando os átomos deixam de se mover.
Lei da Termodinâmica
Uma das leis incontornáveis da Física é a segunda Lei da Termodinâmica, que afirma que no fim tudo descamba para a decadência, que a entropia — desordem ou caos — total no universo sempre aumenta. Isso significa que o ferro sofre oxidação, nossos corpos envelhecem e desmoronam, impérios caem, estrelas exaurem seu combustível nuclear e o próprio universo acaba, à medida que as temperaturas descerem uniformemente rumo ao zero absoluto. Charles Darwin se referia a essa lei quando escreveu: “Acreditando, como eu acredito, que o homem em um futuro distante será bem mais perfeito do que aquela criatura que atualmente é, para mim é intolerável pensar que tanto ele quanto todos os outros seres conscientes estão condenados à completa aniquilação, depois de experimentar um progresso lento e de longa continuidade”.
E uma das passagens mais deprimentes da língua inglesa foi escrita por Bertrand Russel, que descreveu o desespero irredutível que sentiu ao pensar no futuro distante: “Nenhum fogo, heroísmo ou intensidade de pensamento ou sentimento é capaz de preservar uma vida para além da sepultura. Todos os trabalhos de eras, toda a devoção, toda a inspiração, todo o brilho intenso do gênio humano, estão condenados à extinção na vasta morte do sistema solar; e todo o templo das realizações humanas terá inevitavelmente que ser enterrado sob os destroços de um universo em ruínas”.
Russel escreveu essa passagem em uma era anterior às viagens espaciais. Atualmente, a morte do sol não parece tão catastrófica, mas o fim do universo inteiro parece ser inevitável. Assim, em algum dia de um futuro distante, a última estrela deixará de brilhar, e o universo estará repleto de detritos nucleares, estrelas de nêutrons mortas e buracos negros. Civilizações inteligentes, como moradores de rua esfarrapados, amontoados em volta de uma fogueira que se apaga, se reunirão em torno das últimas centelhas tremulantes oriundas de buracos negros emitindo uma débil radiação de Hawking.
A teoria das cordas seria a salvação?
Embora a termodinâmica e a cosmologia apontem para a morte inevitável de todas as formas de vida no universo, ainda existe uma esperança. Trata-se de uma lei da evolução que preconiza que quando o ambiente muda radicalmente a vida tem que se adaptar, fugir ou morrer. A primeira alternativa parece ser impossível. A última é indesejável. Isso nos deixa com apenas uma escolha — fugir do universo. Embora o conceito de abandonar o nosso universo moribundo para adentrar um outro pareça ser uma loucura total, não existe nenhuma lei da física que impeça a entrada em um universo paralelo. A Teoria da Relatividade de Einstein dá margem à existência de buracos de minhoca, ou portais que conectam universos paralelos, por vezes chamados de pontes de Eintein-Rosen. Mas ainda não se sabe se as correções quânticas permitiriam a realização de tal jornada.
Embora no passado tenha sido considerado uma idéia absurda, o conceito do multiverso — ou seja, que o nosso universo coexiste com um número i
nfinito de universos paralelos — gerou recentemente grande interesse em meio a físicos de várias tendências. Primeiro, a principal teoria consistente com os dados do WMAP é a teoria inflacionária, proposta por Alan Guth, do Massachusetts Institute of Technology [MIT], em 1979.Ela postula uma expansão turbinada do universo no início dos tempos. A idéia do universo inflacionário explica elegantemente vários mistérios cosmológicos persistentes, incluindo o achatamento e a uniformidade do universo. Mas, considerando que os físicos ainda não sabem o que motivou esse processo inflacionário rápido, ainda existe a possibilidade de que isso possa ocorrer novamente, em um ciclo interminável. Essa é a idéia inflacionária caótica de Andrei Linde, da Universidade Stanford, segundo a qual de “universos pais” brotam “universos bebês”, em um ciclo contínuo e eterno. Assim como bolhas de sabão que se dividem em duas bolhas menores, os universos podem brotar constantemente de outros universos. Mas o que causou o Big Bang e motivou tal inflação? Essa pergunta continua sem resposta. Considerando que esse foi um fenômeno tão intenso, temos que abandonar a Teoria da Relatividade de Einstein, que forma a estrutura subjacente de toda a cosmologia. Já a Teoria da Gravidade surge no instante do Big Bang e portanto não é capaz de responder às profundas questões filosóficas ou teológicas geradas por aquele evento. Em se tratando dessas temperaturas incríveis, precisamos incorporar a Teoria Quântica — a outra grande teoria que emergiu no século 20—, que governa a física do átomo.
A Teoria Quântica e da Relatividade de Einstein são opostas. A primeira governa o mundo do muito pequeno, o peculiar reino subatômico dos elétrons e quarks. Já a segunda governa o mundo do muito grande — dos buracos negros e dos universos em expansão. Portanto, a relatividade não é apropriada para explicar o instante no qual o universo era menor do que uma partícula subatômica. Naquele momento seria de se esperar que os efeitos da radiação suplantassem os da gravidade, e, sendo assim, precisamos de uma descrição quântica da gravidade. De fato, um dos maiores desafios para os físicos é unificar essas teorias em uma única e coerente de todas as forças do universo.
Teoria de tudo
Atualmente os físicos estão procurando por essa “teoria de tudo”. Várias propostas foram feitas no decorrer dos últimos 50 anos, mas todas se revelaram inconsistentes ou incompletas. Até o momento, a principal candidata (na verdade, a única) é a teoria das cordas. A mais recente encarnação da teoria das cordas, a Teoria-M, pode responder a uma questão que há séculos confunde os defensores das dimensões superiores: “Onde estão essas dimensões? A fumaça é capaz de se expandir e de preencher uma sala inteira, sem entretanto se desvanecer no hiperespaço?”.
Sendo assim, as dimensões superiores, se é que existem, devem ser menores do que um átomo. Se o espaço de dimensões superiores fosse maior do que um átomo, deveríamos ver os átomos penetrando e desaparecendo misteriosamente em uma dimensão mais elevada, algo que não observamos no laboratório. Na velha concepção de teoria das cordas, era necessário enrolar ou dobrar seis de dez dimensões originais, para que sobrasse o atual universo tetradimensional. Essas dimensões indesejáveis eram compactadas em uma minúscula bola — denominado espaço Calabi-Yau —, demasiadamente pequena para ser observada.
Mas a Teoria-M acrescenta uma novidade a esse quadro, que é o tamanho de algumas dessas dimensões superiores pode ser grande, ou mesmo infinito. Imagine duas folhas paralelas de papel. Se uma formiga vivesse em cada uma das folhas, cada um dos insetos veria a sua folha como sendo todo o universo, sem saber da existência de um outro universo vizinho. De fato, o outro universo seria invisível.A formiga levaria a sua vida sem saber da existência de um outro universo a apenas alguns centímetros de distância. De maneira similar, o nosso universo pode ser uma membrana flutuando em um hiperespaço de 11 dimensões, e pode ser que desconheçamos a existência dos universos paralelos que flutuam nas nossas vizinhanças. Uma versão interessante da cosmologia da teoria-M é o universo ekpirótico —derivado da palavra grega para conflagração —, proposto por Paul Steinhardt, Burt Ovrut e Neil Turok. Segundo essa concepção um universo é uma membrana achatada e infinita flutuando em um espaço multidimensional. Mas, ocasionalmente, a gravidade atrai uma membrana vizinha. Cada um desses universos paralelos se desloca velozmente na direção do outro até colidirem, liberando uma quantidade colossal de energia. Essa explosão cria o nosso universo conhecido e faz com que os dois universos paralelos sejam arremessados em direções opostas do hiperespaço.
Procurando dimensões superiores
O interesse intenso pelas dimensões superiores, gerado pela teoria das cordas, se infiltrou lentamente no mundo da física experimental. Conversas mantidas durante jantares acabaram por se traduzir em experiências multimilionárias de física. Na Universidade do Colorado em Denver, foi realizada a primeira experiência para a procura de um universo paralelo, talvez localizado a apenas milímetros de distância. Os físicos procuraram por minúsculos desvios da lei de Newton do inverso do quadrado da distância para a gravidade.
A luz de uma vela se dilui à medida que se dispersa, diminuindo segundo o inverso do quadrado da distância da sua fonte. De forma similar, segundo a lei de Newton, a gravidade também se dispersa pelo espaço e diminui da mesma maneira. Mas em um universo tetradimensional é maior o campo no qual a luz e a gravidade se disseminam, de forma que os valores decrescem segundo o cubo da distância. Assim, ao procurar por desvios ínfimos da lei do inverso do quadrado, é necessário determinar a presença da quarta dimensão. A lei de Newton do inverso do quadrado é tão precisa que é capaz de guiar as nossas sondas espaciais através do sistema solar. Mas ninguém sabe se ela funciona em uma escala milimétrica. Até o momento, tais experiências não deram nenhum resultado. Outros grupos estão buscando desvios ainda menores. Físicos da Universidade Purdue, em Indiana, procuram testar a lei no nível atômico, utilizando a nanotecnologia. Outras possibilidades também são exploradas. Em 2007, o acelerador de partículas de alta energia LHC — Large Hadron Collider —, capaz de bombardear partículas subatômicas com uma energia colossal de 14 trilhões de elétron-volts — uma energia 10 trilhões de vezes maior do que a de uma reação química típica—, será ativado próximo a Genebra, na Suíça. Essa máquina enorme, que é o maior fragmentador de átomos do mundo,com uma circunferência de 27 quilômetros, localizada na fronteira entre França e Suíça, trab
alhará com dimensões dez mil vezes menores do que a de um próton. Os físicos esperam descobrir todo um grupo novo de partículas subatômicas que não aparecem desde o Big Bang. Eles prevêem que o LHC poderá criar partículas exóticas como mini buracos negros e partículas supersimétricas, apelidadas de “spartículas”, que fornecerão evidências indiretas para apoiar a teoria das cordas. Segundo essa teoria, toda partícula possui uma super-parceira. O parceiro de um elétron é um “selétron”, o de um quark um “squark”, e assim por diante. Além do mais, por volta de 2012, o detector de ondas gravitacionais Lisa — sigla em inglês de Antena Espacial de Inteferômetro a Laser — será colocado em órbita. O Lisa será capaz de detectar as ondas gravitacionais de choque emitidas menos de um trilionésimo de segundo após o Big Bang. Ele consistirá de três satélites orbitando o Sol, conectados por feixes de laser, formando um grande triângulo espacial no qual cada lado terá cinco milhões de quilômetros. Qualquer onda gravitacional que atingir o Lisa perturbará os lasers, e essa pequena distorção será captada por instrumentos, assinalando a colisão de dois buracos negros ou a própria onda de choque do Big Bang. O Lisa é capaz de medir distorções da ordem de um décimo do diâmetro de um átomo, que poderá testar vários dos cenários propostos para o universo pré-big-bang, incluindo a teoria das cordas.
Passos para deixar o universo
Infelizmente, a energia necessária para manipular essas dimensões mais altas, em vez de apenas observá-las, fica bem além de qualquer recurso que estará à nossa disposição em um futuro visível — 1019 bilhões de elétron-volts, ou um quadrilhão de vezes a energia do LHC. Para operações em tal escala é necessária a tecnologia de uma civilização super avançada. A fim de organizar uma discussão a respeito de civilizações extraterrestres avançadas, os astrofísicos utilizam freqüentemente a classificação de civilizações dos tipos I, II e III, introduzida pelo astrofísico russo Nikolai Kardashev, nos anos 60, que categorizou tais civilizações segundo níveis de consumo de energia.
Poderia-se esperar que uma civilização Tipo III, utilizando toda a capacidade dos seus inimagináveis recursos galácticos, fosse capaz de escapar do grande congelamento. Os corpos dos cidadãos de tal civilização, por exemplo, poderiam ser geneticamente alterados e os seus órgãos substituídos por implantes computadorizados, representando uma fusão sofisticada de tecnologias de silício e carbono.
Mas até mesmo esses corpos super-humanos não sobreviveriam ao grande congelamento. Isso porque nós definimos inteligência como sendo a capacidade de processar informação. Segundo os físicos, todas as máquinas, sejam computadores, foguetes, locomotivas ou máquinas a vapor, dependem em última instância da extração da energia dos diferenciais de temperatura — as máquinas a vapor, por exemplo, trabalham por meio da extração de energia da água em ebulição.
Mas o processamento de informações, e, por conseguinte, a inteligência, exige energia fornecida por máquinas e motores, algo que se torna impossível quando os diferenciais de temperatura caem para zero. Segundo as leis da física, em um universo uniformemente gelado, onde inexistam diferenças de temperatura, a vida inteligente não poderia sobreviver. Mas considerando que provavelmente faltam ainda bilhões ou trilhões de anos para o grande congelamento, existe tempo para que uma civilização do tipo III elabore a única estratégia consistente com as leis da física — fugir deste universo. Para fazer tal coisa, uma civilização avançada teria primeiro que descobrir as leis da gravidade quântica, que podem ou não vir a ser a teoria das cordas.Essas leis serão cruciais para o cálculo de vários fatores desconhecidos, tais como a estabilidade dos buracos de minhoca que nos conectam a universos paralelos, e a maneira como saberemos qual será o aspecto de tais mundos paralelos. Antes de saltarmos para o desconhecido, precisamos saber o que existe do outro lado. Mas como dar tal salto? Eis aqui algumas maneiras. Encontrar um buraco de minhoca criado por causas naturais, uma civilização avançada que colonizou a galáxia pode ter se deparado durante as suas explorações passadas com resíduos exóticos primordiais do Big Bang. A expansão original foi tão rápida e explosiva que até mesmo buracos de minhoca diminutos podem ter sido estendidos e violentamente expandidos até adquirirem dimensões macroscópicas. Buracos de minhoca, cordas cósmicas, matéria negativa, energia negativa, falsos vácuos e outras criaturas exóticas da física podem ser relíquias deixadas pela criação.
Mas se esses portais surgidos devido a causas naturais não forem encontrados, a civilização precisará tomar medidas mais complexas e árduas como enviar uma sonda através de um buraco negro. Atualmente sabemos que os buracos negros são abundantes e que existe um deles assentado no centro da nossa galáxia, dotado de uma massa aproximada de três milhões de sóis. Sondas enviadas através de um buraco negro poderiam esclarecer algumas questões não resolvidas. Em 1963, o matemático Roy Kerr demonstrou que um buraco negro que gire rapidamente não entraria em colapso até se transformar em um mero ponto. Em vez disso se tornaria um anel rotatório, impedido de entrar em colapso gravitacional devido às forças centrífugas.Todo buraco negro é cercado por um horizonte de eventos, ou ponto de não retorno: a passagem pelo horizonte de eventos é uma viagem sem volta. É de se imaginar que para uma viagem de ida e volta seriam necessários dois desses buracos negros. Mas para uma civilização avançada fugindo do grande congelamento uma viagem só de ida seria o bastante. O que acontece com alguém que passa pelo anel de Kerr ainda é um assunto que gera polêmicas. Alguns acreditam que o ato de entrar em um buraco de minhoca faria com que este se fechasse, tornando-se instável. E a luz que caísse em um buraco negro seria desviada para o azul, criando a possibilidade de que quem passasse para um universo paralelo fosse literalmente fritado.
Ninguém sabe ao certo, e por isso é necessário que se façam experiências. Essa controvérsia esquentou no ano passado quando Stephen Hawking admitiu que cometeu um erro 30 anos atrás, quando apostou que os buracos negros devoram tudo, incluindo informação. Talvez a informação seja esmagada para sempre ou ela passe para o universo paralelo no outro lado do anel de Kerr. Segundo a mais recente idéia de Hawking a informação não se perde totalmente. Mas ninguém acredita que tenha sido proferida a palavra final a respeito dessa quest&at
ilde;o delicada. Para obter dados extras a respeito de espaços-tempos estendidos até o ponto de ruptura, uma civilização avançada precisaria criar um buraco negro lento. Em 1939, Einstein analisou a massa rotatória de restos estelares que passavam por um lento processo de colapso gravitacional. Embora Einstein tenha demonstrado que essa massa rotatória não entraria em um colapso que resultasse em um buraco negro, uma civilização avançada poderia duplicar esse experimento em “câmera lenta”, coletando uma porção giratória de estrelas de nêutrons com massa menor do que a de cerca de três sóis. A seguir, injetar-se-ia gradualmente nessa massa um material estelar extra, forçando-a a entrar em colapso gravitacional. Ao invés de progredir no processo de colapso até se tornar um ponto, a massa estelar se transformaria em um anel, possibilitando assim que os cientistas testemunhassem a formação de um buraco negro de Kerr em câmera lenta.
Criar energia negativa
Caso os anéis de Kerr se mostrem demasiadamente instáveis ou letais, poderiam também cogitar em abrir buracos de minhoca por meio de matéria e energia negativas. Em 1988, Kip Thorne e os seus colegas do Instituto de Tecnologia da Califórnia demonstraram que se alguém contasse com matéria ou energia negativas em quantidade suficiente, poderia usá-las para a criação de um buraco de minhoca “atravessável” — um buraco de minhoca pelo qual se pudesse passar livremente em uma viagem de ida e volta entre o laboratório e um ponto distante no espaço e até no tempo. A matéria e a energia negativas seriam suficientes para manter a entrada do buraco de minhoca aberta para tal viagem.
Infelizmente, ninguém jamais viu a matéria negativa. Em princípio, ela deveria pesar menos que o nada e cair para cima, em vez de para baixo. Mesmo que ela existisse quando a Terra foi criada, teria sido repelida pela gravidade terrestre e se deslocado para o espaço. Porém, a energia negativa foi vista em laboratório na forma do efeito Casimir. Normalmente, a força existente entre duas placas paralelas descarregadas deveria ser zero.
Mas se flutuações quânticas fora das placas fossem maiores do que as flutuações entre as placas, uma força resultante de compressão seria criada. As flutuações que empurram as placas a partir de fora são maiores do que as flutuações que as empurram para fora a partir dos seus interiores, de forma que essas placas descarregadas se atraem mutuamente. Esse fenômeno foi previsto pela primeira vez em 1948 e registrado em 1958. No entanto, a energia Casimir é minúscula, sendo inversamente proporcional à distância entre as placas elevada à quarta potência. Para a utilização do efeito Casimir seria necessária uma tecnologia avançada para comprimir essas placas até que a separação entre elas fosse extremamente pequena. Se essas placas paralelas fossem remodeladas em formato de uma esfera de duas camadas, e se grandes quantidades de energia fossem utilizadas para comprimir as duas placas esféricas uma contra a outra, poderia ser gerada uma quantidade suficiente de energia negativa para que o interior da esfera se separasse do resto do universo.Uma outra fonte de energia de negativas é o raio laser. Pulsos de energia laser contêm estados comprimidos, que são dotados tanto de energia negativa quanto de positiva. O problema é separar a energia negativa da positiva dentro de um feixe de laser. Embora isso seja teoricamente possível, trata-se de algo extremamente difícil. Se uma civilização sofisticada fosse capaz de fazê-lo, então poderosos raios laser poderiam gerar energia negativa suficiente para que a esfera se descolasse do restante do universo. Até mesmo buracos negros possuem energia negativa a sua volta, nas proximidades dos seus horizontes de eventos. Em princípio, isso poderia gerar grandes quantidades de energia negativa. No entanto, os problemas técnicos relacionados à extração de energia negativa tão perto de um buraco negro são extremamente complexos.
Criar um universo bebê
Segundo a inflação, apenas algumas gramas de matéria seriam suficientes para a criação de um universo bebê. Isso porque a energia positiva da matéria anularia a energia negativa da gravidade. Se o universo fosse fechado, elas se anulariam em proporções exatas. De certa forma, o universo pode ser uma espécie de refeição gratuita, conforme enfatizou Guth. Por mais estranho que pareça, não é necessária nenhuma energia externa para a criação de um universo inteiro.
Os universos bebês são em princípio criados naturalmente quando uma certa região do espaço-tempo se torna instável e entra em um estado chamado de “falso vácuo”, que desestabiliza a composição do espaço-tempo. Uma civilização avançada poderia fazer tal coisa deliberadamente ao concentrar energia em uma única região. Isso exigiria a compressão de matéria até uma densidade de 1080 g/cm3, ou que ela fosse aquecida até uma temperatura de 1029 graus Kelvin. Para a criação das condições fantásticas necessárias à abertura de um buraco de minhoca com energia negativa, ou à criação de um falso vácuo com energia positiva, talvez fosse necessário um esmagador cósmico de átomos. Os físicos estão tentando construir aceleradores de mesa que poderiam, a princípio, gerar bilhões de elétron-volts em uma mesa de cozinha. Eles utilizaram poderosos raios laser para conseguir uma energia de aceleração de 200 bilhões de elétron-volts por metro, um novo recorde.
O progresso é rápido, e a energia obtida aumenta dez vezes a cada cinco anos. Embora problemas técnicos ainda impeçam a criação de um verdadeiro acelerador de mesa, uma civilização avançada conta com bilhões de anos para aperfeiçoar esse e outros artefatos. Para atingir a energia de Planck (1028 eV) com essa tecnologia de laser seria necessário um esmagador de átomos com um comprimento de 10 anos luz, uma distância maior do que a que nos separa da estrela mais próxima, algo que poderia estar muito bem ao alcance tecnológico de uma civilização do Tipo III.
Considerando que o vácuo do espaço vazio é melhor do que qualquer vácuo conseguido na Terra, talvez não fosse necessária uma tubulação com anos-luz de comprimento para conter o feixe de partículas subatômicas. Este poderia ser disparado no espaço vazio. Estações de força precisariam ser instaladas ao longo da trajetória para bombear energia laser no feixe e focalizá-lo. Uma outra possibilidade seria curvar a trajetória em um círculo, de forma que ela coubesse no sistema solar. Magnetos gigantes poderiam ser instalados em asteróides a fim de curvar e focar o feixe em uma trajetória circular em torno do Sol. O campo magnético necessário para curvar o feixe seria tão grande que a passagem de energia pelas bobinas poderia derretê-las, o que significa que talvez só pude
ssem ser utilizadas uma única vez. Após a passagem do feixe, as bobinas derretidas teriam que ser descartadas e substituídas a tempo para a próxima passagem.
Construir uma máquina de implosão a laser
Em princípio, seria possível criar raios laser de energia ilimitada; os únicos empecilhos são a estabilidade do material e a fonte de energia. No laboratório, os lasers de terawatt (um trilhão de watts) atualmente são comuns, e os de petawatt (um quadrilhão de watts) estão se tornando lentamente factíveis (a título de comparação, uma usina nuclear comercial gera apenas um bilhão de watts de energia contínua).
É possível até pensar em um raio-X laser alimentado pela liberação de energia de uma bomba de hidrogênio, que poderia inserir uma quantidade inimaginável de energia no feixe de radiação. No Laboratório Nacional Lawrence Livermore, uma bateria de lasers é disparada radialmente contra um pequeno fragmento de um composto de deutério e lítio, o ingrediente ativo da bomba de hidrogênio, a fim de domar o poder de uma fusão termonuclear. Uma civilização avançada poderia criar enormes estações de laser nos asteróides e, a seguir, disparar milhões de raios laser contra um único ponto, criando temperaturas e pressões extremas, atualmente inimagináveis.
Enviar um nano-robô para recriar a civilizaçãoSe os buracos de minhoca criados segundo os passos anteriormente descritos forem muito pequenos, instáveis, ou se os efeitos da radiação forem demasiadamente intensos, então talvez se pudesse enviar apenas partículas de dimensões atômicas através de um buraco de minhoca. Nesse caso, a civilização poderia adotar a derradeira solução, enviar uma semente de dimensões atômicas pelo buraco de minhoca, capaz de regenerar a civilização do outro lado.Esse processo é comumente encontrado na natureza. A semente de um carvalho, por exemplo, é compacta, rugosa e elaborada para sobreviver a uma longa jornada e para sobreviver fora da terra. Ela também contém todas as informações genéticas necessárias para a regeneração da árvore. Uma civilização avançada poderia querer enviar informação suficiente pelo buraco de minhoca para a criação de um “nano-robô” — uma máquina de dimensões atômicas auto-replicadora, construída com nanotecnologia. Ele seria capaz de viajar a uma velocidade próxima a da luz porque teria o tamanho de uma molécula. O artefato pousaria em uma lua árida e a seguir utilizaria a matéria-prima encontrada para criar uma fábrica química capaz de gerar milhões de cópias da máquina microscópica.
Uma legião desses robôs viajaria a seguir para outras luas em outros sistemas planetários e criaria novas fábricas químicas. Esse processo se repetiria muitas vezes, criando milhões e milhões de cópias do robô original. Começando a partir de um único robô, haveria uma esfera de trilhões de tais sondas-robôs se expandindo a uma velocidade próxima a da luz, colonizando toda a galáxia. Essa foi a base para o filme 2001: Uma Odisséia no Espaço, provavelmente a descrição ficcional mais cientificamente precisa de um encontro com uma forma de vida extraterrestre. Ao invés do encontro com discos voadores ou com a USS Enterprise, a possibilidade mais realista é a de que façamos contato com uma sonda robô deixada na Lua por uma civilização do Tipo III que esteve por aqui de passagem. Esse processo foi descrito por cientistas nos minutos iniciais do filme, mas Stanley Kubrick cortou as entrevistas da edição final.
A seguir, essas sondas-robôs criariam grandes laboratórios de biotecnologia. As seqüências de DNA dos criadores das sondas teriam sido cuidadosamente gravadas, e os robôs seriam projetados para injetar essa informação em incubadoras, que a seguir clonariam toda a espécie. Uma civilização avançada poderia também codificar personalidades e memórias dos seus habitantes e inseri-las nos clones, permitindo que toda a raça reencarnasse. Embora pareça fantástico, esse cenário é consistente com as leis conhecidas da física e da biologia, e está ao alcance de uma civilização do Tipo III. Não há nada nas leis da ciência que impeça a regeneração de uma civilização avançada a partir do nível molecular. Para uma civilização moribunda aprisionada em um universo em processo de congelamento, essa poderia ser a última esperança.