Este trabalho é o resultado de uma paciente investigação iniciada em 1982 e interrompida em algumas ocasiões por anos devido à necessidade de fazer transcorrer o tempo necessário para que sua proposta surtisse efeito. Foi possível seguir adiante graças à colaboração de muitas pessoas, civis e militares, que entenderam a importância deste tema vir a público. Vários pontos permanecem obscuros sobre o envolvimento das Forças Armadas argentinas com discos voadores — há casos de avistamentos incompletos, protagonistas de experiências que não querem falar, fotografias e documentos ainda mantidos secretos pelo governo ou desaparecidos etc. Tudo isso dificulta a investigação do tema.
Também há ainda situações adversas à continuidade da pesquisa, que mesmo assim seguem sendo investigadas e rastreadas.
A história da Ufologia Militar na Argentina começou muitos anos atrás e está é a primeira vez que é publicada fora do país. Assim, é conveniente que seja retratada passo a passo, incluindo neste relato testemunhos atuais de seus protagonistas, homens que sofreram pressão para permanecerem calados, mas que preferiram dizer a verdade ainda que à custa de um possível descrédito ou punição. Boa parte do que ocorreu com militares argentinos em relação a UFOs teve como palco as águas e terras geladas da Antártida, e é por ali que começamos a descrição destes fatos.
UFO silencioso sobre as bases
Era 03 de julho de 1965 quando observadores científicos de três países — Argentina, Chile e Inglaterra — viram passar sobre suas bases antárticas um objeto voador não identificado com características totalmente diferentes das conhecidas. A Secretaria da Marinha Argentina emitiu um comunicado em 04 de julho daquele ano reproduzindo as palavras dos protagonistas do avistamento: “No Destacamento Naval Decepción, na Antártida, foi observado no dia 03 de julho, às 19h40, um artefato voador de forma lenticular, com aspecto sólido, coloração predominantemente vermelha e verde que, em alguns momentos, adquiriu tonalidades amarelas, azuis, brancas e alaranjadas”. O documento ainda dizia que foi registrado o deslizamento do aparelho em direção leste, por vezes dirigindo-se a oeste, à altura de 45º sobre o horizonte e distância aproximada de 10 a 15 km.
Destacava-se a ausência de som, havendo variações de velocidade e permanecendo o objeto às vezes estacionário no espaço. O artefato foi avistado graças às condições meteorológicas, que podem ser consideradas excepcionais para aquela época do ano — céu aberto, nuvens estrato-cúmulo isoladas e Lua visível em quarto minguante. “O reconhecimento do UFO foi feito pelo observador meteorológico da base, juntamente com 10 pessoas. O intervalo da observação foi de 10 a 15 minutos, permitindo fotografias. O pessoal do Destacamento Naval Antártico Orcadas também observou o UFO em referência na tarde do mesmo dia. O aparelho se distanciou para noroeste, a cerca de 15 km”. Esta informação foi transmitida através de dois telegramas à Secretaria da Marinha, em Buenos Aires. Por sua vez, a Força Aérea Chilena (FACH) também reconheceu que nove membros de sua equipe na Base Antártica Pedro Aguirre Cerdá, próxima ao Destacamento Naval Decepción, observaram que o objeto brilhava com luz branca e deslizava em zigue-zague na direção sudoeste.
O fotógrafo do órgão obteve 10 imagens coloridas feitas com um teodolito e registrou oscilações no magnetômetro, semelhantes às que ocorreram na base das ilhas Orcadas. O UFO, como informou o comunicado chileno, além de deixar um rastro branco, às vezes parecia parado no espaço. Os britânicos avistaram o mesmo aparelho por cinco minutos depois de o destacamento argentino tê-lo visto. Eles descreveram sua coloração como vermelho-amarelada com variações para verde, com o brilho de uma grande estrela. No dia seguinte, jornalistas de Buenos Aires conversaram com o comandante da base em Decepción, e o então tenente-de-fragata Daniel Perissé deu sua visão dos fatos: “Referimo-nos unicamente ao que vimos: um objeto semelhante a uma estrela de primeira magnitude que deslizava para o norte com velocidade variável, às vezes estático, porém com repentinas acelerações e mudanças de rumo, ainda que sempre na direção norte e com cores brilhantes”.
Perturbação nos barômetros
Perissé esclareceu ainda que as características do objeto e sua evolução lhe permitiam afirmar que não se tratava de sonda, estrela ou avião. “A observação foi puramente visual, contudo, de acordo com a informação fornecida pela base argentina das ilhas Orcadas, o fenômeno foi registrado nos magnetobarômetros lá instalados. Creio que esses dados são de extraordinária importância”, concluiu. No final de fevereiro de 1985 este autor localizou o tenente-de-fragata Miguel Sosa, chefe do destacamento em questão, no exato momento em que as pistas deste incrível incidente pareciam se desvanecer no tempo. Sosa recordava o episódio como se o mesmo tivesse acontecido no dia anterior: “Nas Orcadas, o artefato foi visto em tempo menor do que em Decepción. Porém, o que pude avistar nitidamente ocorreu exatamente às 21h35 do dia 03. A brevidade do tempo impediu a obtenção de fotografias, mas registrou-se uma leve perturbação nos barômetros do observatório meteorológico”.
Como se estivesse esperando minha visita, Sosa apanhou um exemplar do número 172 do Boletim Informativo da Secretaria da Marinha e mostrou seu informe original do episódio. Ali estava declarado que o objeto era redondo, de cor branca e movia-se de leste para oeste com movimentos parabólicos. Como o militar, os meteorologistas José Mazzuchelli e Eduardo Jarrier acompanharam o fenômeno, descartando qualquer possibilidade de alucinação ou de efeito atmosférico. E o que viram os chilenos? Junto ao boletim havia um recorte de certo jornal que reproduzia as palavras do comandante Mario Jahn Barrera, da base antártica chilena: “Foi algo real. O artefato voava a uma velocidade assombrosa e fazia evoluções. Desprendia uma luz azul-esverdeada e causava interferências nos aparatos eletromagnéticos da base argentina, em frente à nossa. Essa é a segunda vez que observamos esses objetos — a primeira ocorreu em 18 de junho, às 09h30 — e toda a lotação de 12 homens presenciou o UFO enquanto fazíamos medições atmosf&ea
cute;ricas. Ele apresentava cor vermelho-amarelada, por vezes alternando para verde, amarela e alaranjada”.
Barrera continua seu impressionante relato dizendo que o UFO estava a curta distância, em ângulo de 45º em relação ao seu pessoal e sobre o extremo norte da ilha. Mas logo desapareceu em zigue-zague, sendo que, em uma de suas evoluções, ficou parado estático no ar. “Rapidamente, com os instrumentos à mão — teodolito e binóculo de longo alcance —, observamos que o objeto permaneceu imóvel durante 20 minutos. O cabo Vladislao Durán Martínez, fotógrafo da equipe, buscou sua câmara e bateu 10 fotos que, de acordo com sua experiência, estavam perfeitas”, complementou — sem, no entanto, informar onde estão estas imagens para uma avaliação atual.
Perissé desmente astrônomos
A informação que saiu nos jornais da época destacava as últimas declarações do comandante Mario Jahn Barrera: “Nossa observação não foi alucinação coletiva ou psicose. Estamos na base para cumprir tarefas científicas, e o que vemos, tratamos de analisar a partir deste ponto de vista. Posso dizer que aquilo não era uma estrela, pois apresentava movimento rápido e contínuo. Para mim, era um objeto que não posso identificar. Pertenço à Força Aérea Chilena (FACH) e dentro de meus conhecimentos sobre aparatos construídos pelo homem não há nada parecido com sua forma, velocidade e manobrabilidade”. Com isso, o militar afastou completamente a possibilidade de taxarem-no do que quer que fosse — mas nem por isso ele deixou de receber críticas, como os outros observadores.
Ainda assim, a coragem desses homens, que sustentaram o conteúdo de suas observações, provocou comunicados oficiais que confirmaram os avistamentos nos céus antárticos e se mostraria um marco em âmbito mundial. Porém, também surgiram aqueles que procuraram encontrar explicações alternativas para o fenômeno. Por exemplo, membros do Observatório Astronômico de La Plata, na província de Buenos Aires, deduziram que o pessoal do destacamento teria visto apenas um satélite, provavelmente o Eco II. Um dos astrônomos disse à imprensa: “Nossas autoridades nos têm feito cair no ridículo perante o mundo científico com tais declarações. Isso ocorre por não consultarem cientistas antes de falarem estas coisas”. O astrônomo em questão talvez tenha se esquecido de ler no relatório oficial que o UFO movia-se em zigue-zague — coisa que nenhum satélite faz.
O reconhecimento do UFO foi feito pelo observador meteorológico da base, juntamente com 10 pessoas. O intervalo da observação foi de 10 a 15 minutos, permitindo fotografias. No Destacamento Orcadas também se observou o UFO na tarde do mesmo dia
E o que dizer de o artefato também ficar parado no ar em alguns momentos, ou de ter deixado atrás de si rastros de vapor, ou ainda de ter alterado medições nos magnetobarômetros? O pessoal dos destacamentos dos três países também era composto por meteorologistas, geólogos e profissionais especialmente treinados para cumprir tarefas de observação e investigação científica. Por tudo isso, a Secretaria da Marinha não deu ouvidos às declarações dos astrônomos e, em outro comunicado, reproduziu os dizeres do tenente Perissé: “As características do artefato e seu voo permitem afirmar que não se tratava de uma sonda, nem de estrela ou avião. O número de pessoas que viram o artefato foi expressivo, 17 ao todo, entre elas três oficiais chilenos que conversavam conosco. Os equipamentos do Destacamento Naval de Orcadas também acusaram perturbações no campo magnético, registradas na fita de tais aparatos”.
“Nada sabemos”
Infelizmente, no entanto, os militares nunca voltaram a falar sobre tais fenômenos, assim como nunca chegaram a exibir as fotografias. Mesmo passadas décadas dos fatos, qualquer oficial de imprensa, de relações públicas ou de Inteligência da Marinha, quando consultado sobre estes fatos, invariavelmente responde da mesma maneira: “Não sabemos de nada”. Ainda assim, se há algo que caracterize o tratamento desses fenômenos na Argentina é o manejo das opiniões oficiais, assemelhando-se, coincidentemente ou não, à manipulação de informações feita pela Força Aérea Norte-Americana (USAF) antes, durante e depois de a CIA assumir o assunto, nos anos 60. Vale dizer que entre 1947 e 1951 — quando o governo norte-americano criou o Projeto Sign para estudar os UFOs —, os comunicados militares admitiam como “muito provável” a hipótese extraterrestre para sua origem. Isso se refletia também na Argentina.
Já de 1953 até 1959, a CIA, por meio do chamado Comitê Robertson, planejou o Projeto Grudge com a finalidade de ridicularizar as testemunhas de avistamentos. Um ano mais tarde, quando o major Héctor Quintanilla e o capitão Edward Ruppelt foram postos à frente do Projeto Livro Azul, a USAF voltou a considerar o assunto como digno de atenção — embora sem despertar demasiadas expectativas. Em 1969, coincidente com o célebre e triste Relatório Condon, encerrou-se o projeto e conclui-se que nada nos relatos ufológicos vindos da população justificava a continuidade de um estudo científico. A situação perdurou até que, finalmente, a partir dos anos 80, antigos militares já aposentados começaram a trazer à tona relevantes casos ufológicos — o mesmo ocorreu além das fronteiras dos Estados Unidos, e até mesmo no Hemisfério Sul, a exemplo do Chile, Argentina e Brasil.
Na Argentina, entre 1945 e 1955, as publicações oficiais ou extraoficiais do governo — como a Revista Nacional de Aeronáutica, hoje Aeroespacio — alertavam sobre a procedência extraterrestre dos UFOs. Por exemplo, em 1953, o Boletim Informativo Del Comando General de La Defensa Antiaérea, em seu número 84, reproduz conceitos tomados de publicações especializadas norte-americanas, chegando às seguintes conclusões:
“1. Discos, cilindros e objetos similares de forma geométrica, luminosos e sólidos, têm sobrevoado a atmosfera terrestre. O que fazem aqui? É algo que nenhum mortal imagina. Até onde se sabe, as explorações feitas por eles têm demonstrado caráter pacífico. Entretanto, cabe perguntar: continuarão agindo assim?
“2. Globos de fogo verde, tão ou mais brilhan
tes do que a Lua cheia, cruzam frequentemente nosso céu. A tese sustentada em princípio pela ciência, de que se trataria de meteoros, é inadmissível. A aviação militar norte-americana tem poderosas razões para crer que são naves de retropropulsão. Porém, pela velocidade que alcançam, deduz-se que sua procedência é extraterrestre — recordemos que os Estados Unidos lançaram vários projetos para estudos do fenômeno.
“3. As condições que circundam esses objetos voadores não identificados não podem ser explicadas a partir do termo ambíguo ‘fenômenos naturais’ porque é óbvio que foram construídos e são operados por inteligência superior à humana, ao menos no momento.
“4. Finalmente, não existe força motriz na Terra que se possa igualar à sua velocidade”.
Posições oficiais sobre UFOs
O artigo do Boletim Informativo Del Comando General de La Defensa Antiaérea que inclui todos os itens acima tem o sugestivo título de Discos Voadores Não Estão Apenas Nas Nossas Mentes, e pode ser encontrado na Biblioteca Nacional de Aeronáutica. Já o número 615, de março de 1954, do Boletim do Centro Naval do país inclui outro interessante artigo, assinado pelo capitão R. Clerquin, que contém essa passagem: “Em resumo, por sua variação de velocidade e aceleração, manobrabilidade e imaterialidade, os discos voadores desafiam as atuais leis da física, da aerodinâmica, da resistência de materiais. E certamente são tripulados”. Estes são apenas dois exemplos de declarações altamente favoráveis à materialidade e à procedência extraterrestre do Fenômeno UFO, emitidas por órgãos oficiais do Governo Argentino. Mas há mais.
A Biblioteca do Círculo Aeronáutico Argentino adquiriu em 1955 os direitos do livro Flying Saucers from Outer Space [Discos Voadores do Espaço Exterior, Holt Regnery Editors, 1953], do major reformado norte-americano Donald Keyhoe, publicando-o com tradução do capitão Jorge Milberg. Por quê? Em uma série de artigos publicados com sua assinatura na Revista Nacional de Aeronáutica, entre abril e junho de 1955, o capitão afirma textualmente: “Em vez de dizer que as opiniões aqui são de responsabilidade de seus autores, permitam-me falar que tudo o que aqui se dirá conta com a minha mais firme aprovação e que em todo momento faço minhas as palavras transcritas, aceitando a veracidade dos fatos relatados”.
Sob o título Crer ou Não Crer, o que o militar avaliza no texto são nada menos do que as declarações publicadas por George Adamski, que afirmava estar em contato com venusianos, mostrando fotografias que, para os órgãos civis de investigação, não passavam de fraudes — neste caso, curiosamente, a publicação referendaria sua autenticidade. E mais: também se exibiria, pela primeira vez, uma fotografia de uma dessas naves venusianas com comentários sobre a funcionalidade e praticidade dos componentes ali mostrados. Pode soar contraditório que naquelas décadas em que os militares argentinos se manifestavam favoráveis à existência e procedência extraterrestre dos discos voadores, especialmente motivados pelas observações na Antártida, alguém faça uma defesa do Caso Adamski…
UFOs no aeroporto de Córdoba
Já em dezembro de 1954 a Força Aérea Argentina (FAA) havia divulgado publicamente uma singular observação ufológica realizada em 25 de novembro daquele ano por um grupo de testemunhas qualificadas, a partir da torre de controle do Aeroporto de Córdoba. Durante uma hora, foi avistada uma estranha luz por importantes profissionais daquela instalação, entre eles o chefe da central meteorológica da cidade Marco Guerci, o operador da torre de controle Hugo Bassoli, o auxiliar do departamento de plano de voo Orfilio Moreira e ainda por Luis Rafael Gómez e Antonio Cubiles, operadores de rádio, Alberto Baxter, funcionário da companhia Aerolíneas Argentinas, e Amadeo de La Cruz Faria, outro funcionário do aeroporto.
Uma meia-lua e uma esfera luminosa permaneceram à vista das testemunhas desde as 05h45 até que a crescente luz do Sol as fez desaparecer, muito tempo depois. Às 12h32 do mesmo dia, o operador da torre de controle Dalmiro Santiago Castex viu desfilar lentamente outro artefato luminoso de cor alumínio. Todos estes homens, por serem da Aeronáutica, não podem ser qualificados de visionários — pelo contrário, são observadores treinados e de alta credibilidade. O caso alcançou tamanha repercussão que, em julho de 1955, a Revista Nacional de Aeronáutica, em extenso editorial, deixava clara sua postura: “Nós adotamos posição neutra com tendência à credulidade”. A publicação pertencia oficialmente à Aeronáutica do país, como todas as que na Argentina recebem o título “nacional”.
Discos, cilindros e objetos similares de forma geométrica, luminosos e sólidos, têm sobrevoado a atmosfera terrestre. O que fazem aqui? É algo que nenhum mortal imagina. Até onde se sabe, as explorações feitas por eles têm demonstrado caráter pacífico
O critério do editorial da Revista Nacional de Aeronáutica seria pautado em fevereiro de 1957, na mesma publicação, quando se reproduziu uma descrição das evoluções de uma frota de UFOs sobre a Casa Branca, sede do governo norte-americano, segundo relatado pelos controladores de radar do Aeroporto de Washington. Ou seja, os militares argentinos estavam permanentemente atentos ao que seus colegas dos Estados Unidos registravam quanto à fenomenologia ufológica. Tanto que um comentarista da Revista Nacional de Aeronáutica desmentiu a “explicação” para o caso difundida pelo Projeto Grudge, pelo qual o episódio foi taxado apenas como um “fenômeno atmosférico”.
Eles nos conhecem bem
Naquela época, em 1961, após o comentário do comandante da Força Aérea Argentina (FAA) Gustavo Alberto Ezquerra, de que “talvez os extraterrestres nos conheçam melhor do que acreditamos”, as publicações oficiais sobre o tema silenciaram, salvo honrosas exceções. O Relatório Condon, o fechamento do Projeto Livro Azul e suas sequelas fizeram com que o silêncio quanto aos UFOs imperasse em praticamente todo o mundo — como consequência, aumentou o número de arquivos oficiais com casos denomina
dos “inexplicáveis”, o que, na visão de alguns, era clara reafirmação de que outras naves estavam sulcando nossos céus, diferentemente das posições oficiais então assumidas.
Na Argentina, alguns militares entenderam que, em vez de sepultar o assunto, como pretenderam fazer os norte-americanos, seria necessária uma nova metodologia para o estudo do Fenômeno UFO. Por isso, em uma publicação da Escola de Comando e Estado Maior da Força Aérea, o major Juan Carlos Sáez criou uma planilha de relatos ufológicos que iam se tornando conhecidos dos militares. O padrão de registro adotado seguia aquele desenvolvido pelo Centro de Inteligência Técnica Aeronáutica [Aerial Technical Intelligence Centre, ou ATIC], então com sede na Base Aérea de Edwards, na Califórnia. Parece que aquela metodologia de registro dos casos pelo órgão foi entendida como a mais apropriada pelos militares argentinos — embora seu emprego, nos Estados Unidos, visava mais a informar as autoridades e às manobras de acobertamento ufológico que lá ocorriam.
Depois dos anos 70, renasceu o interesse pelo Fenômeno UFO de maneira mais dinâmica na Argentina, ainda que o período tenha sido marcado por mais sugestões e comentários de militares do que por afirmações oficiais. O renascimento do tema se deu devido a episódios que causaram comoção na população, como a queda de um UFO na Serra El Zaire, na província de Salta, e a destruição de uma igreja por um objeto voador não identificado em um povoado de Londres, na província de Catamarca. Já em 1979, o então comandante da FAA, brigadeiro Omar Rubens Graffigna, deu ordens ao capitão Augusto Lima, até então oficial de inteligência da Comissão Nacional de Investigações Especiais (CNIE), para que fosse criada uma División UFO dentro da instituição.
O disco voador de Dudignac
Aparentemente, nos anos seguintes, todo o material das Forças Armadas Argentinas sobre discos voadores havia sido enviado à nova División UFO. Foi o que admitiu o chefe de imprensa da Marinha na época ao responder a uma pergunta deste autor sobre o paradeiro de alguns arquivos: “Aqui não sabemos o que aconteceu com o material que tínhamos sobre UFOs. Suponho que tenha sido transferido para a CNIE”, referindo-se ao órgão que recebera a División UFO. Dias depois este autor também ouviu uma resposta parecida quando buscava documentos ufológicos no Serviço Hidrográfico Naval: “Aqui não estão. Devem estar no Edifício Libertad, a sede da Marinha, ou na CNIE”. Não tardou à Comissão Nacional de Investigações Especiais (CNIE) finalmente admitir que, enfim, tinha algumas pastas em sua División UFO: “Sim, nós temos aqui material ufológico da Aeronáutica. Mas os da Marinha é ela que os possui”.
Em um dos arquivos encontrados e consultados, descobriram-se algumas pistas que aparentemente contradizem essa desorientação no que concerne ao destino do material ufológico da Aeronáutica e da Marinha. Em documentos recuperados no processo ficou-se sabendo, por exemplo, do caso ocorrido em 20 de agosto de 1955 com o senhor Francisco Navarro, residente na localidade de Dudignac, província de Buenos Aires. Navarro se dirigiu à praça central de sua cidade para tirar umas fotos do local e surpreendeu-se ao ver que o centro das nuvens que estavam sobre si parecia realizar movimentos giratórios — ele acreditou estar assistindo a algum insólito fenômeno meteorológico e fotografou aquilo, revelando difusamente nas imagens um objeto em formato clássico de disco voador deslizando entre as nuvens.
O então interventor local da Direção de Aeronáutica, capitão-de-corveta Santiago Salvador Ambrogio, se dispôs a investigar o ocorrido. Sua conclusão final, emitida em 25 de outubro daquele ano, atestava que: “O informe pericial desse órgão deduz que é certo que houve a passagem de um objeto aéreo desconhecido na localidade de Dudignac, província de Buenos Aires, no dia 20 de agosto do corrente ano, aproximadamente entre 09h30 e 10h00”. Porém, isso era só o início da história.
Mais um oficial vem a público
O processo de investigação começava a se desenvolver com resultados inesperados. O Caso Dudignac levou à descoberta de outros episódios investigados por diversos órgãos das Forças Armadas e nunca revelados até aquele momento, envolvendo inclusive encontros de militares argentinos com extraterrestres. Era material que havia estado por muito tempo longe da opinião pública e a que, até então, nenhum civil havia tido acesso. Um dos episódios a vir à tona ocorreu no princípio da década de 60, quando o capitão Sánchez Moreno era chefe da Divisão de Informações da Marinha Argentina.
Muitos anos depois ele fez uma admissão impressionante sobre a ligação dos militares do país com UFOs e ETs: “A Marinha de Guerra mantém, desde 1952, constante preocupação com o fenômeno da manifestação de objetos voadores não identificados em nossos céus, como também faz a Aeronáutica. Em tal atividade, compartilhamos a preocupação que existe igualmente em muitos países do mundo. Logicamente que nem sempre as informações que nos chegam podem ser tomadas ao pé da letra. Temos instruções precisas acerca do registro desses objetos e a elas nos atemos. Aceitamos que se deva guardar cautela com o assunto, fruto da reflexão e de análise de cada caso em particular”.
Quando questionado acerca da possibilidade de que tais objetos existam materialmente e venham do espaço exterior, o capitão Moreno respondeu: “Particularmente, posso dizer que eu já os vi e que são reais. Um caso ocorreu em fevereiro de 1955, em Mar Del Plata, e o avistamento se deu com um capitão-de-fragata e um sinaleiro da Marinha, repetindo-se várias vezes durante 12 minutos, tanto à noite como de dia. Logicamente, não se tratava de estrelas ou planetas, mas de corpos móveis em deslizamentos incríveis e irregulares em seu itinerário”. Para o chefe da Divisão de Informações da Marinha, como para muitos outros oficiais, era óbvio que discos voadores existiam e mereciam atenção.
Interesse constante pelos UFOs
Mas a posição do capitão Sánchez Moreno se mostrou bem mais abrangente quando ele continuou sua explanação: &ldqu
o;Cabe investigar mais para se corroborar estes acontecimentos. Os relatos oferecidos coincidem com casos anteriores. Aquelas pessoas citadas estavam viajando de automóvel às 04h30 e viram três objetos luminosos a uma distância muito pequena”. Moreno acrescentou que as testemunhas íam na mesma direção dos artefatos, que desprendiam uma luz deslumbrante a tal ponto que, dentro do veículo, cada passageiro podia ver-se a si mesmo e a todo interior do automóvel como se fosse pleno dia. “Esses discos deslizam sobre o horizonte ou abaixo dele. Ou seja, é possível distingui-los claramente no céu”, finalizou o militar.
A ligação dos militares argentinos com o Fenômeno UFO ía se revelando cada vez mais profunda. Outro exemplo está no Manual de Informações publicado pelo Departamento de Ação Psicológica, impresso nas gráficas do Exército, em sua divisão de Inteligência. Na edição do terceiro bimestre de 1962 pode-se ler o seguinte parágrafo: “Há que se notar que UFOs foram observados a partir da Base Naval de Puerto Belgrano, onde inclusive seu próprio comandante, o contra-almirante Eladio Vásquez, foi testemunha de tais evoluções, o mesmo ocorrendo a partir da Base Aeronaval do Comandante Espora. Destaca-se o interesse que as atividades dos UFOs sempre despertam em nossa Marinha de Guerra, que, desde 1952, mantém uma comissão encarregada do estudo desses problemas”.
Anunciou o capitão: ‘Estamos vendo cair de grande altitude um artefato estranho, ao que parece em chamas. Ele se precipitará no mar’. Foi então iniciada a busca por náufragos, o que se mostrou tarefa difícil, dadas as circunstâncias meteorológicas
Pois foi precisamente um integrante dessa comissão, o capitão-de-fragata e médico Constantino Nuñez, quem partiu de Buenos Aires com a missão de recolher toda informação possível sobre as manifestações ocorridas na região de Baía Blanca, entre 21 e 22 de maio daquele ano. Na esteira de tais publicações e afirmações oficiais também se descobriu o que poderia ser visto como um naufrágio extraterrestre. Em 11 de agosto de 1964, o capitão-de-corveta Saul E. Salgado pilotava um avião Beechcraft 5-G2 quando o fato se deu. Já eram 17h00 quando, voando a 2.500 m próximo ao Cabo Vírgenes, Salgado avistou um artefato luminoso reverberante que flutuava errático sobre o mar. Em princípio, pensou que se tratasse de um barco refletindo os raios solares. Porém, ao vê-lo voar, entrou em contato com a torre de controle de Rio Gallegos para indagar se havia alguma aeronave naquela região — soube então que o único aparelho era um DC-3 naval, avistado em seguida adiante de si.
Intrigado, baixou de altitude e notou que o UFO se achava então a uns 50 m do mar, movendo-se “como um avião, lateralmente ou bem atrás”. O capitão Salgado decidiu persegui-lo, partindo então na direção oposta até perder-se no firmamento. Uns anos antes, em 11 de outubro de 1960, do Curtiss Super C-46 que realizava o voo 803 entre Rio Grande e Buenos Aires, o copiloto Gonzalo Gil já havia advertido sobre um estranho artefato flutuando sobre o mar naquelas imediações. Neste caso, ocorrido às 18h17, o avião estava a 2.100 m e a 30 km ao sul de Belén, no Golfo San Matías, província de Rio Negro. Sem diminuir a altitude, o comandante Luis Bochatey efetuou uma manobra que permitiu observar uma figura circular sobre o oceano — a visão também foi possível ao operador de rádio Celso Labeta e ao senhor Mario Munlet, que viajava na cabine.
Submarinos fantasmas
Algumas semanas antes do incidente de Cabo Vírgenes havia ocorrido mais um fato surpreendente em alto-mar. Foi em 28 de julho de 1964, quando o capitão do barco norueguês Sumber emitiu por rádio um anúncio dramático: “Estamos vendo cair de grande altitude um artefato estranho, ao que parece em chamas. Ele se precipitará no mar”. Por sua vez, a cerca de 70 km à sudeste de Puerto Rawson, a partir do navio-tanque argentino Cazador, escutaram-se vozes na água como que de pessoas em aflição de afogamento, sem que se conseguisse localizar o ponto de origem. A embarcação navegava de Comodoro Rivadavia ao porto de Buenos Aires, minutos depois daquele chamado anterior angustiante, por volta das 21h00. Ainda que carecesse de notícias sobre qualquer barco navegando naquelas imediações, o capitão anunciou em tom de emergência: “Que se inicie a busca por náufragos. Será tarefa difícil, dadas as circunstâncias, já que é noite de céu encoberto”. Realmente, não foi nada fácil trabalhar sob aquelas circunstâncias. Nada puderam encontrar, mas a suspeita de pilotos, navegadores e outras testemunhas, no que concordam os militares argentinos envolvidos, era de que a queda foi de um disco voador, e não de um avião.
Caso igualmente interessante ocorreu à embarcação Fuerza Tarefa de Instrucción, em 30 de janeiro de 1960, quando conduzia os cadetes da Escola Naval Militar que realizavam seu cruzeiro anual pelo Oceano Atlântico. Às 09h30, nas proximidades de Golfo Nuevo, na província de Chubut, o sonar de bordo registrou um provável submarino — ante tal inusitada ocorrência, efetuou-se uma patrulha permanente pela região durante vários dias, operação levada a cabo pelo destroier Cervantes e pelas lanchas patrulhas King e Murature. Os envolvidos nas atividades concluíram que, se o intruso saísse à superfície, poderia ser reconhecido e então determinado o motivo de estar em águas argentinas. Mas, emergindo próximo ao navio Engenheiro Gada, o aparelho deixou visíveis suas estranhas características: era um cone alto em nada se parecendo com um submarino, e sim com uma nave alienígena.
Para se tirar a dúvida, foi emitida uma comunicação do fato a todos os países da região, que responderam negativamente à possibilidade de terem submarinos operando naquela zona. Em 15 de fevereiro, um porta-voz da base argentina de submarinos disse o seguinte à imprensa: “Quando o Fuerza Tarefa que opera no Golfo Nuevo iniciar a utilização de novas armas adquiridas dos Estados Unidos, o submarino invasor terá uma desagradável surpresa. Até o momento ele vem obtendo vantagem nesse jogo de gato e rato, já há 16 dias”. Ou seja, há mais de duas semanas que os militares vinham detectando e vendo ora emergir, ora submergir aquele “submarino fantasma”. Porém, o vaticínio não se cumpriu e nunca se volto
u a ver o curioso cone. No dia 25, a Secretaria da Marinha então anunciou o final das operações, “sem que isso signifique que tenhamos fracassado no cumprimento de nossa missão de resguardar a soberania marítima argentina”. Muitas pessoas depois discutiriam se houve mesmo o cumprimento do dever, o que, para alguns, não é fato.
Violência contra os invasores
O problema desses estranhos submarinos teve início em 21 de maio de 1958, quando uma força de destroieres localizou a nordeste do Porto Cracker, com equipamentos de escuta subaquática, um objeto em navegação submersa. O então presidente da Argentina Arturo Frondizi confirmou a grave notícia em comunicado à imprensa, dois dias depois. Posteriormente, quando as autoridades se dispuseram a realizar uma investigação, a partir das declarações efetuadas por tripulantes de navios petroleiros, que alegavam ter avistado objetos misteriosos ao sul de Baía Blanca, a Marinha de Guerra realizou ação violenta contra os supostos invasores. Em 19 de outubro, a fragata Heroína, operando na região de Comodoro Rivadavia, assim que obteve contato de sonar com o artefato e percebeu que “era algo como um disco”, abriu fogo com sua artilharia, sem resultados visíveis.
O aparelho submergiu, porém o contato foi retomado a 01h46 do dia 20, quando reiniciou o ataque com armas de proa e cargas de profundidade. Nessa mesma jornada, o torpedeiro Buenos Aires estabeleceu por sonar a presença de outros corpos estranhos entre Porto Madryn e Ushuaia, lançando quatro bóias para deixar demarcada a última indicação assinalada. O comando de Operações Navais iniciou a exploração aérea com a Força Antissubmarina de Caça e Ataque, concentrando no porta-aviões Independência. Em 18 de janeiro de 1961, duas embarcações realizavam manobras a 80 km de El Rincón quando, às 10h45, foi detectado um artefato cilíndrico navegando a 180º. Diante a possibilidade de um eventual ataque, lançaram-se quatro bombas no intruso — e começou assim uma perseguição de duas horas, tendo o misterioso visitante sumido na área do sonar.