Pavel Vinogradov já morou na estação Mir e na Estação Espacial Internacional. Para ele, rumos da exploração espacial passarão por uma base lunar.Para os russos, o futuro do programa espacial está em uma base na Lua. É o que diz o cosmonauta Pavel Vinogradov, 54, um dos dois companheiros de viagem do astronauta brasileiro Marcos Cesar Pontes em sua ida à Estação Espacial Internacional (ISS).
“Os planos da Rússia e dos Estados Unidos hoje em dia se concentram, é lógico, na questão da Lua. Eles querem não só mandar uma pessoa para lá fazer um pouco de pesquisa, andar um pouquinho e voltar, mas sim montar uma base”, afirmou o viajante espacial veterano, em entrevista exclusiva ao G1. “É um projeto que já anda, tanto nos Estados Unidos quanto na Rússia. Mas tem de se resolver um monte de coisas ainda”.
Para Vinogradov, que também se beneficiou de uma estadia de longa duração na famosa estação espacial russa Mir, houve grandes avanços na construção da ISS. E ele não vê com saudosismo a iminente aposentadoria dos ônibus espaciais americanos, marcada para 2010. “Na minha opinião, acredito que o futuro está realmente para naves mais como a Soyuz”, afirma o cosmonauta, referindo-se à venerável espaçonave russa que iniciou operações em 1967 e continua trabalhando até hoje.
G1 – O que o inspirou a seguir uma carreira no espaço? Pavel Vinogradov – Como todo rapaz, eu era muito interessado em aviões, navios, submarinos, esse tipo de coisa. Depois, comecei a me interessar mais por vôos espaciais e foguetes. Dei um passo além. Depois de terminar a faculdade, comecei a ir mais fundo nessa direção. E a partir daí era só isso que eu queria: ir ao espaço.
G1 – O sr. viveu tanto na estação russa Mir quanto na Estação Espacial Internacional. Como compara as duas experiências? Vinogradov – Há muitas diferenças, mas a maior parte delas é cronológica. É lógico que, vindo depois de todo o trabalho com a Mir, a Estação Espacial Internacional é muito melhor, porque é muito mais moderna e tem muito mais recursos. Tive a oportunidade de conhecer as duas e, comparando ao longo dos anos, é claro que esta, a Internacional, é muito melhor. É uma questão de tempo, de tecnologia. É uma continuação lógica.Em si, as duas missões que fiz foram completamente diferentes. Eu participei da 24ª expedição da Mir. Na época, isso foi pouco depois de uma colisão que tivemos no espaço. Fiquei seis meses trabalhando com outro russo, o comandante Anatoly Solovyev [atual recordista de horas passadas em caminhadas espaciais], na Mir só para consertar os estragos da colisão.A missão à Estação Espacial Internacional, com o Jeffrey [Williams], foi completamente diferente, foi mais para pesquisas mesmo. Tivemos muito mais proveito, em geral, muito mais tempo para desenvolver coisas.
G1 – Falando um pouco de vôos espaciais, há um debate no momento sobre o futuro da área após a aposentadoria dos ônibus espaciais da Nasa. Na sua opinião, a exploração espacial funciona melhor com veículos reutilizáveis, como os ônibus, ou com cápsulas, como a Soyuz? Vinogradov – Tanto americanos quanto russos estão pensando exatamente em tudo isso agora, em desenvolver ou algo parecido com as coisas que já temos ou em inventar um novo método de ir ao espaço. Hoje, para eles, o futuro, pelo menos para missões como essas de abastecimento da Estação Espacial Internacional, está em naves mais parecidas ou com a Soyuz ou com a americana Apollo. É quase um consenso.Um projeto diferente é difícil por causa da questão financeira. Há muito dinheiro envolvido. Por isso há preferência por essas naves menores, ou pelo menos não tão grandes, quanto o das supernaves para abastecer a estação.Na minha opinião, acredito que o futuro está realmente para naves mais como a Soyuz.
G1 – O sr. trabalhou como engenheiro da RSC Energia, companhia criadora da Soyuz e do Sputnik, e a empresa está enfrentando uma série de problemas no momento. Gostaria de saber qual é o impacto dessas dificuldades para o programa espacial russo? Vinogradov – Eu entendo que é lógico que isso vazou para o mundo inteiro, e essas questões são muito sérias. Mas como toda grande empresa de alta tecnologia, quando há uma modificação dos principais membros do corpo diretivo, há também outras mudanças, de objetivos, de desenvolvimento. Isso causa conflitos. Eu acredito que a Energia sempre cumpriu com todas as suas obrigações perante não só o programa espacial russo, mas também o programa espacial internacional. Acredito que não vai haver qualquer tipo de dano posterior, nem para o projeto russo, nem para o projeto internacional. É lógico que, para isso, vamos precisar resolver muitas coisas, mas eu acredito que elas serão resolvidas.
G1 – O sr. voou com o primeiro astronauta brasileiro, Marcos Pontes. A viagem dele foi alvo de muitas críticas por aqui. Muitas pessoas afirmaram que o dinheiro gasto com isso poderia ser mais bem empregado em um país em desenvolvimento. O que o sr. tem a dizer sobre isso? Qual é a importância da figura de um astronauta para um país como o Brasil? Vinogradov – É muito, muito importante. Sempre há críticas em relação a qualquer tipo de gasto de dinheiro. A própria Rússia, então União Soviética, enfrentou muitas críticas na época do primeiro vôo do Gagarin. Isso ocorreu logo depois da Segunda Guerra Mundial e o país tinha perdido milhares de vidas. Muitas pessoas não gostaram de ver dinheiro gasto no espaço. Foi muito criticado. Porém, eu acredito que isso é um salto de qualidade para um país. Um salto que vai ser seguido por outros e iniciar todo um processo. Se esse dinheiro fosse gasto com outra coisa, de repente o país não daria esse salto, em um setor que eu considero importantíssimo, o setor de desenvolvimento de tecnologia futura. Isso é muito importante e não se pode pensar de outro jeito.
G1 – Falando em futuro, gostaria de saber quais projetos espaciais futuros são mais animadores, na sua opinião? Viagem a Marte, volta à Lua? E o sr. tem expectativa de ser selecionado para voltar ao espaço em um desses projetos? Vinogradov – Eu gostaria muito, é claro, de ter mais uma oportunidade de ir para o cosmo, para fazer mais alguns giros em órbita. Mas não sei o que vai acontecer, quais serão os planos que serão traçados para mim. Isso não sou eu quem decide.Os planos da Rússia e dos Estados Unidos hoje em dia se concentram, é lógico, na questão da Lua. Eles querem não só mandar uma pessoa para lá fazer um pouco de pesquisa, andar um pouquinho e voltar, mas sim montar uma base. É um projeto que já anda, tanto nos Estados Unidos quanto na Rússia. Mas tem de se resolver um monte de coisas ainda. Para mim, especificamente, não sei qual é o futuro. Mas o futuro da exploração
espacial acredito que esteja em uma base na Lua.