Era um sábado aparentemente normal, 20 de agosto de 1966, quando tudo ocorreu. Nessa data, dois homens foram encontrados mortos no alto do Morro do Vintém, no bairro Santa Rosa, em Niterói, no Rio de Janeiro. Nenhum sinal de violência ou luta corporal foi registrado. Os corpos estavam próximos, um ao lado do outro, deitados de costas no chão em cima de uma espécie de cama feita com folhas de pintoba [Tipo de palmeira] cortadas com faca ou algo similar. Estavam bem vestidos com ternos limpos e capas de chuva. Já se encontravam em adiantado estado de putrefação quando foram achados e, ao seu lado, havia vários objetos interessantes, um estranho marco de cimento, uma garrafa de água mineral magnesiana, uma folha de papel laminado — que foi usada como copo — e um embrulho de papel com duas toalhas.
Mas o que mais chamou a atenção da polícia foram outros itens, entre eles um par de óculos pretos com uma aliança em uma das hastes, um lenço com as iniciais M. A. S., duas toscas máscaras de chumbo e um papel com equações básicas de eletrônica. Uma delas era a Lei de Ohm, envolvendo potência, tensão, corrente e resistência. Junto disso estava um curioso pedaço de papel com a seguinte escrita: “16h30 — Estar no local determinado. 18h30 — Ingerir cápsula. Após efeito,proteger metais. Aguardar sinal — Máscara”. No bolso de Manuel, um dos mortos em condições misteriosas, foi encontrado um maço de cigarros da marca Continental, praticamente quase no fim. Quem é fumante entende que a experiência que levou os dois à morte estava programada para ser curta, pois se fosse longa e tivessem que passar a noite no alto do morro, com certeza Manuel teria levado um maço extra.
A autópsia realizada nos cadáveres, pelo médico legista doutor Astor Pereira de Melo, nada revelou como causa mortis, pois não havia sinais de violência, envenenamento ou distúrbios orgânicos — além da total ausência de contaminação por radioatividade. Foram realizados diversos exames toxicológicos em várias amostras das vísceras dos mortos, e todos deram negativos. Os documentos que portavam permitiram facilmente identificar que eram os radiotécnicos Miguel José Viana, 34 anos, e Manoel Pereira da Cruz, 32 anos, moradores da cidade de Campos dos Goytacazes, no litoral norte daquele estado, e sócios em um pequeno negócio.
Objeto discoide na área
Exames grafotécnicos também foram realizados nos bilhetes encontrados, e provaram que a caligrafia era de Viana — mas as palavras utilizadas não faziam parte do vocabulário de nenhum dos dois, o que levou a polícia a acreditar que alguém ditou tais palavras para as vítimas. Para complicar ainda mais o quadro de mistério que se apresentava às autoridades que os encontraram, na mesma noite e horário que os radiotécnicos morreram, em 17 de agosto de 1966, uma quarta-feira, várias testemunhas viram um objeto discoide no alto do Morro do Vintém. Ele foi descrito como tendo forma arredondada, com um halo de luz alaranjada intensa e um anel de fogo soltando raios azuis. O objeto sobrevoou por alguns instantes o local exato onde foram encontrados os corpos.
Até hoje a polícia não soube explicar o que realmente aconteceu. Seria um simples latrocínio [Roubo seguido de assassinato] ou uma experiência parapsicológica mal sucedida? Uma experiência psicotrônica com um fim trágico ou um encontro fatal com tripulantes de um disco voador? Para tentar entender o que pode ter acontecido, vamos detalhar passo a passo o que Miguel José Viana e Manoel Pereira da Cruz fizeram desde que saíram de Campos dos Goytacazes, até que foram encontrados mortos em Niterói. Para começar, em agosto de 1966, as duas máscaras de chumbo foram feitas pelos radiotécnicos em sua oficina, pois lá foi encontrado o restante do material utilizado para confeccionar os artefatos.
Na noite de 16 de agosto, uma terça-feira, Viana informou a sua esposa Neli que iria para São Paulo, juntamente com Cruz, também casado, para comprar um carro usado e alguns componentes de eletrônica para o estoque da oficina. Ele embrulhou dois milhões e trezentos mil cruzeiros — cerca de mil dólares na época — para levar na viagem. No dia seguinte, às 09h00, os radiotécnicos tomaram o ônibus na rodoviária de Campos com destino a Niterói — e não a São Paulo, como haviam informado às suas famílias. Eles foram acompanhados pelo amigo Élcio Correia Gomes até a estação, e lá se despediram. Às 14h30 chegaram à rodoviária de Niterói e, desse horário até o instante em que morreram, a polícia descobriu que a dupla passou na loja de componentes eletrônicos Fluoscop, situada na Travessa Alberto Vitor, no centro da cidade — eles eram fregueses do estabelecimento, e assim foram facilmente reconhecidos.
Atitudes nervosas e estranhas
As vítimas do estranho acontecimento também foram a uma loja de roupas e compraram capas de chuva. Em um bar situado na Avenida Marquês do Paraná eles compraram uma garrafa de água mineral magnesiana — não se esquecendo de pegar o comprovante do vasilhame para poder devolver depois, como se fazia na época. A pessoa que os atendeu nesse último estabelecimento disse que Viana parecia estar nervoso e a todo o momento consultava as horas. Aquele dia estava chuvoso e escurecendo rapidamente. O vigia Raulino de Matos, morador do local, viu quando Manoel e Miguel chegaram ao Morro do Vintém em um jipe, juntamente com outras duas pessoas, até hoje não identificadas. As vítimas desceram do veículo e subiram o morro a pé, o que chamou a atenção de Matos, pois já estava perto do anoitecer e o tempo piorava a cada minuto.
Na manhã seguinte, 18 de agosto de 1966, quinta-feira, o jovem Paulo Cordeiro Azevedo dos Santos estava caçando passarinhos no morro quando viu os corpos e avisou o guarda Antônio Guerra, que servia na antiga Companhia de Radiopatrulha carioca. Posteriormente, o policial foi ouvido pelo delegado Venâncio Bittencourt, que comandou as investigações, para saber por que demorou dois dias para ir ao local onde foram achados os corpos — pensava que Guerra ou outra pessoa teria revistado os cadáveres para se apropriar de algum dinheiro, mas nada ficou comprovado.
Continuando, dois dias depois do falecimento de Viana e Cruz, em 20 de agosto, o fatídico sábado, por volta das 18h00, o garoto Jorge da Costa Alves estava procurando sua pipa junto com outros meninos no morro quando todos sentiram um forte mau c
heiro e localizaram os corpos. O menino avisou a Segunda Delegacia de Polícia (2ª DP), de Niterói, mas somente no domingo de manhã, 21 de agosto, policiais e bombeiros subiram o Morro do Vintém para resgatar os corpos, sendo acompanhados por jornalistas e curiosos. No bolso de um dos mortos foi encontrada a quantia de 157 mil cruzeiros e, no do outro, quatro mil cruzeiros, respectivamente cerca de 68 dólares e menos de dois dólares na época. Seus relógios tinham sido tirados dos pulsos e também acomodados nos bolsos. Assim, com os fatos em mãos, a polícia iniciou as investigações desse espantoso incidente.
Um dos bilhetes encontrados e o sumiço de boa parte dos dois milhões e trezentos mil cruzeiros que portavam ao saírem de Campos dos Goytacazes reforçaram a hipótese de um terceiro personagem na cena — a ausência de uma faca ou objeto cortante, que teria sido usado para aparar as folhas de pintoba, também estimulou essa hipótese. Mas as máscaras de chumbo encontradas não combinavam com a situação e nem a estranha nota escrita. A tese de uma terceira pessoa indicava que ela teria dirigido o eventual experimento que Miguel José Viana e Manoel Pereira da Cruz realizariam em cima do morro, mas não teria participado. Seja como for, uma coisa é certa: os dois radiotécnicos foram ao local por livre e espontânea vontade.
Versões e contradições
Dias mais tarde da descoberta dos corpos, a polícia prendeu o amigo dos falecidos, Élcio Correia Gomes, que os acompanhou até a rodoviária de Campos dos Goytacazes. Ele era espírita e introduziu os dois radiotécnicos em estranhas experiências. Em uma delas, tempos antes do incidente, os três causaram uma enorme explosão na Praia de Atafona, também no litoral do Rio de Janeiro — o estrondo foi tão grande e causou um clarão tão impressionante que a população pensou que estava ocorrendo um terremoto. Esse acidente foi objeto de investigação por parte da Marinha Brasileira. Mas, quanto a Élcio, como a polícia não encontrou provas de nada que o incriminasse, ele acabou sendo libertado.
Após os jornais terem anunciado com estardalhaço as duas estranhas mortes, finalmente surgiu uma testemunha. Gracinda Barbosa Coutinho de Sousa informou que, na noite de 17 de agosto, pouco antes de 20h00, juntamente com seus três filhos, duas meninas e um rapaz, estava passando de carro pela Alameda São Boaventura, no bairro Fonseca, quando Denise, a filha de sete anos, chamou a atenção de todos para algo no alto do morro. Viram, então, um objeto multicolorido e discoide com um halo de luz alaranjada intensa, e também o tal anel de fogo de onde saíam raios azuis em várias direções. O depoimento de Gracinda foi igualmente publicado pelos jornais, o que atraiu outros testemunhos de fatos inusitados naquele dia e local — várias pessoas se encorajaram e ligaram para a polícia informando que também tinham visto o estranho artefato luminoso.
Polêmica e paranormalidade
Como parte das investigações, técnicos em eletrônica consultados na época fundamentaram a hipótese de que Viana e Cruz haviam sido mortos por um raio, pois naquela noite chovia muito. Argumentaram que estariam em um local alto e com uma máscara de chumbo no rosto, o que aumentaria as possibilidades de serem atingidos por uma descarga elétrica. Mas seus corpos sofreram apenas ligeiras queimaduras, confirmadas pelo médico legista, e elas só não foram constatadas na autópsia porque as marcas se desfizeram com a decomposição dos cadáveres. Como a cada momento se revelava de forma mais nítida, o incidente estava envolto em muita polêmica e suposições — as circunstâncias da morte eram obscuras e não havia indícios concretos que pudessem levar as autoridades a uma conclusão.
Enquanto perdurava a incerteza, a imprensa explorava o caso com sensacionalismo. Assim, atraído por esse estardalhaço, o padre Oscar González Quevedo, professor de parapsicologia na época, deu um depoimento ao jornal O Globo informando que máscaras de chumbo eram usadas em testes mortais de ocultismo. Disse que essa prática admitia que emanassem de novos mundos irradiações luminosas capazes, por exemplo, de afetar aquilo a que chamava de “terceiro olho”. Quevedo assinalou que essas experiências poderiam fulminar seus praticantes, mas as máscaras serviriam para dar-lhes alguma proteção. Nesse tipo de experimento, a pessoa deveria ingerir uma quantidade de determinada droga que lhe permita entrar em transe — e deve ainda estar em jejum para provocar desequilíbrio físico e mental.
Esses inusitados rituais são conhecidos como psigama e hiperestesia. No primeiro caso, o experimentador procura “liberar a alma” para conseguir captações espirituais e, no segundo, seus nervos hiperexcitados são o instrumento pelo qual procura sentir aspectos sutis da realidade que o cerca. O padre frisou que, “para se conseguir êxito em qualquer uma dessas práticas, são indispensáveis muitos exercícios e perfeito estado físico”.
Exumação dos cadáveres
A situação ficou ainda mais complicada quando a polícia descobriu uma morte semelhante a dos radiotécnicos, quatro anos antes. José de Sousa Arêas informou que, em 1962, outro profissional da área — agora um técnico de televisão — foi encontrado morto no Morro do Cruzeiro, na localidade de Neves, sem qualquer tipo de violência e com todos os seus pertences. Tal como no caso do Morro do Vintém, também havia junto do corpo uma máscara de chumbo — a vítima desse caso se chamava Hermes e teria ido ao alto do morro para tentar captar sinais de televisão sem o auxílio de um aparelho eletrônico, apenas “mentalmente”.
Disse que o morto desse episódio engoliu um comprimido redondo e morreu porque “não estava fisicamente preparado para a empreitada, que oferecia possibilidade de morte”. A polícia investigou o caso, mas nada descobriu de concreto sobre ele. Depois de muitas diligências e várias hipóteses levantadas, em 25 de agosto de 1967, praticamente um ano depois, os corpos de Miguel José Viana e Manoel Pereira da Cruz foram exumados para ser realizada uma nova série de exames, dessa vez, simultaneamente no Rio
de Janeiro e em São Paulo — mas, novamente, nada de concreto foi descoberto
sobre a causa mortis.
Dois anos após, em 1969, houve uma reviravolta nos fatos e o bandido Hamilton Bezani, que se encontrava confinado em um presídio de alta segurança em São Paulo, disse que esteve envolvido na morte dos dois radiotécnicos, junto de outras três pessoas. Bezani afirmou que ele e seus comparsas deram veneno às vítimas e roubaram seis milhões de cruzeiros. Diante dessas novas informações, o criminoso foi levado a Niterói para novos depoimentos, mas caiu em inúmeras contradições na reconstituição dos fatos — a começar pela importância em dinheiro, a posição dos corpos e detalhes de como foram encontrados. Enfim, ainda não seria essa a explicação do mistério. A polícia chegou à conclusão de que Bezani tinha inventado toda a história para poder permanecer no presídio de Niterói, de onde já tinha fugido duas vezes e vislumbrava uma terceira possibilidade. Mas acabou sendo devolvido à unidade de alta segurança em São Paulo.
Local insólito e macabro
Apesar de todo o enigma, e por falta de provas, em maio de 1969 a justiça arquivou o processo da estranha morte, mas o caso ainda não estaria encerrado. Em 1980, um novo mistério agitou o cenário. O matemático e ufólogo francês Jacques Vallée, naturalizado norte-americano, que trabalhou para a NASA, veio ao Brasil exclusivamente para pesquisar o incidente e foi ao local em companhia de sua esposa Janine, do detetive Saulo Soares de Souza, do repórter policial Mário Dias, do fotógrafo Alberto Dirma e de um intérprete. Todos subiram o morro e lá ficaram estarrecidos — no local onde foram encontrados os corpos, 14 anos antes, não havia vegetação e estavam demarcadas as silhuetas dos corpos no solo, como se alguém tivesse contornado os mesmos. O terreno apresentava sinais de ter sido calcinado.
Testemunhas viram um misterioso objeto discoide no alto do Morro do Vintém, sobre o local onde os corpos foram encontrados. Ele tinha forma arredondada, com um halo de luz alaranjada e um anel de fogo soltando raios azuis
O espantoso acontecimento em Niterói assumiu proporções ainda mais misteriosas e atraiu o interesse de muitos outros estudiosos e jornalistas. Em 1997, por exemplo, o repórter Saulo Gomes esteve no Morro do Vintém para fazer uma longa matéria sobre o fato. Ele e sua equipe constataram que no local onde tudo aconteceu ainda não havia crescido qualquer tipo de vegetação. Gomes confirmou ao editor da Revista UFO, A. J. Gevaerd, que o local parece insólito e macabro. E constatou o que Vallée descobrira ainda em 1980, que o solo encontrava-se calcinado — o que só poderia ser produzido com altas temperaturas.
Nesse detalhe reside um aspecto muito curioso do incidente. Viana e Cruz morreram na quarta-feira à noite e só foram retirados do local no domingo pela manhã. Ora, os cadáveres passaram quatro noites e três dias no local, sob chuva e Sol forte, e não foram atacados por nenhum animal predador, nem por ratos ou urubus. Evidentemente, quando foram encontrados, os corpos estavam em decomposição, mas não apresentavam sinais de terem sido atacados. Na época de sua retirada, é claro, ainda não era possível se verificar a morte da vegetação ou calcinamento do terreno.
Fato e fatos, a diferença
Como se pode constatar, esse é um caso extraordinário e único na Ufologia Mundial — e essa disciplina não vive de fato, no singular, e sim de fatos, no plural. O que o liga definitivamente ao Fenômeno UFO são os inúmeros depoimentos de moradores de Niterói, que descreveram com riqueza de detalhes um disco voador luminoso no alto do Morro do Vintém, no mesmo dia e hora em que os radiotécnicos morreram. E ao contrário da grande explosão que ocorreu na Praia de Atafona, durante esse novo experimento dos rapazes de Campos de Goytacazes não houve nenhum ruído ou estrondo — somente o silencioso sobrevoo de um objeto voador não identificado.
Dessa forma, o Caso das Máscaras de Chumbo, como foi chamado pela Comunidade Ufológica Brasileira, continua até hoje sendo uma grande incógnita. Nem a diligente polícia da época, nem o poder judiciário conseguiram esclarecer o que aconteceu — e talvez nunca o saibamos. Após quase três décadas de pesquisas e suposições, muitas investigações e testemunhos, diversas análises e até a exumação dos cadáveres, não sabemos o que aconteceu a Miguel José Viana e Manoel Pereira da Cruz. Talvez seja o caso de adotarmos a corajosa postura do ufólogo Jacques Vallée, tão bem descrita em seu livro Confrontos: A Busca de um Cientista por um Contato Alienígena [Editora Best Seller, 1982], e declarar: “É hora de deixar de lado velhas teorias e procurar por novas provas”.