Mario Eugenio Saturno é tecnologista sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), professor universitário e foi o primeiro brasileiro a controlar o SCD-1 em órbita. Em 9 de fevereiro de 1993, foi lançado o primeiro satélite brasileiro, de coleta de dados, chamado SCD-1, projetado e construído no Brasil pelo Inpe e com a participação de diversas empresas Nacionais. E ainda está funcionando.
Quatorze anos atestando o empreendedorismo espacial brasileiro. E o que faz o governo? Quase nada!O Brasil investe uma soma considerável na área espacial, em torno de US$ 100 milhões, porém essa quantia não é suficiente nem para manter a pouca capacidade adquirida a duras penas nas décadas passadas. Para se ter uma idéia, a Índia investe 700 milhões de dólares; a China gasta 1,6 bilhão; o Japão, 2,1 bi e os EUA nada menos que vinte bilhões. Já passou da hora dos brasileiros acordarem e escolherem – queremos ser uma nação?
Precisamos despertar a classe política desse país. Às vezes, acredito que os políticos e mesmo o povo se esqueçam que o Brasil é um país continental, é um gigante, adormecido, talvez, para os investimentos em C&T. Não recebemos nem receberemos tecnologias de áreas estratégicas. E o que não é estratégico hoje em dia? E por ser continental, o Brasil necessita de satélites para fazer controle ambiental, navegação, localização de transportes, agricultura e planejamento urbano e regional; não esquecemos dos satélites de telecomunicações para voz, dados e imagens, usados em telefonia, transmissões de televisão, Internet e até interligando empresas para videoconferência.
E ainda, a meteorologia, com satélites sendo usados na previsão do tempo; o sensoriamento remoto, os sistemas de busca e salvamento, por exemplo, de navios ou aviões acidentados. Somente estes exemplos já justificariam um Programa Espacial ambicioso e merecedor de verba bem maior que os cem milhões destinados. Não estamos falando de luxo, mas de necessidades básicas para um futuro imediato. Falamos de soberania em um planeta cada vez mais submetido à tecnologia.
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) destaca-se entre as instituições que contribuem para a soberania e independência tecnológica do Brasil.Mas vive seu dilema; se nada for feito urgentemente, as cabeças da instituição serão aposentadas em menos de dez anos. E não se contratam nem se treinam substitutos.Isso sem falar da tabela salarial que é das menores entre pesquisadores. Mas o mais grave é tratar pesquisadores tecnologistas como cientistas, com critérios de avaliação de cientistas. Pior, no final da década de 80 fez-se a divisão, beneficiando a tecnologia e, após o sucesso do primeiro artefato, os tecnologistas foram traídos. E, não custa lembrar, a indústria nacional “rouba” os tecnologistas e não os cientistas, ou seja, sem uma política salarial agressiva não se formará a próxima geração.
A nação jogará fora um marco nacional que se iniciou em 3 de agosto de 1961, quando o presidente Jânio Quadros assinou o decreto que criou o Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (conhecida como CNAE) e que mais tarde deu tornou-se o Inpe. E, junto com a instituição, todo o conhecimento e alguns bilhões de dólares já investidos em quase meio século. O programa espacial já gerou dividendos, além dos satélites de coleta de dados, desenvolveu-se a parceria com a China que resultou no Cbers (China-Brazil Earth Resources Satellite ou Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres).
Este programa conjunto é a primeira grande cooperação tecnológica entre dois países em desenvolvimento. A parceria, iniciada em 1988, une dois países semelhantes em extensão territorial e riquezas naturais.Tive a felicidade de entrar no Inpe a tempo de participar do projeto e construção do primeiro satélite e, depois, desenvolver uma estação de controle e recepção para o lançamento do SCD-1.
Sem dúvida, minha atuação no computador mais meu empenho em querer “nacionalizar” estes tipos de equipamentos caríssimos despertou a confiança do gerente em apostar na prataria da casa. É isso que falta, investir nas instituições, desenvolver e envolver a indústria nacional. Invejo os norte-americanos, ex-presidentes adversários dão-se as mãos para fazer triunfar os EUA. E por aqui, quando isso acontecerá?