Astrônomos americanos anunciaram neste final de semana a detecção de um astro do tipo terrestre fora do Sistema Solar. A façanha veio do maior grupo de caçadores de planetas do mundo, liderado pelos americanos Geoffrey Marcy e Paul Butler, respectivamente da Universidade da Califórnia em Berkeley e da Instituição Carnegie de Washington. A descoberta foi feita com a ajuda do Observatório Keck, no Havaí. O planeta está girando ao redor da estrela Gliese 876, uma anã vermelha (tipo de astro um pouco menor, mas similar ao Sol) localizada na constelação de Aquário, a uns 15 anos-luz de distância -uma verdadeira ninharia, em termos astronômicos (a estrela mais próxima do Sol, por exemplo, está a quatro anos-luz daqui). A detecção foi feita, como a maioria das descobertas até hoje, a partir do estudo do “bamboleio” que a estrela faz, conforme os planetas que giram ao redor dela puxam-na levemente em sua direção, pela força da gravidade. Foi desse mesmo jeito que dois outros planetas haviam sido descobertos ao redor de Gliese 876, anos atrás. Mas essas descobertas anteriores eram de astros muito parecidos com Júpiter, planetas gigantes gasosos em que a vida, ao menos nas formas que existem na Terra, não pode florescer. O terceiro planeta detectado ao redor da anã vermelha, no entanto, é de outro tipo.
Com cerca de duas vezes o diâmetro da Terra e aproximadamente 7,5 vezes mais maciço, ele entra na categoria dos chamados planetas terrestres – o que quer dizer que têm um chão rochoso e uma dinâmica geológica similar à da Terra. Mas não necessariamente são habitáveis. O astro recém-descoberto, por exemplo, é tudo, menos hospitaleiro. Ele tem uma órbita muito pequena em torno de sua estrela, com uns 2% do diâmetro da órbita terrestre ao redor do Sol. Em outras palavras, ele está sempre muito colado à estrela. A temperatura superficial nesse planeta, segundo estimam os cientistas, varia de 200 a 400 graus Celsius durante o dia. Ele consegue completar uma volta inteira ao redor da estrela – um ano local – em menos de dois dias terrestres. Com seu tamanho, ele não pode ser um gigante gasoso. Em compensação, no Sistema Solar, não há nenhum planeta terrestre com esse porte. O maior por aqui é a Terra, com quase o mesmo tamanho de Vênus. Marte e Mercúrio, os outros dois “terrestres” locais, são ainda menores. Sua órbita curta também em nada lembra as dos planetas ao redor do Sol. “Esse é o menor planeta extra-solar já detectado e o primeiro de uma nova classe de planetas terrestres”, disse Paul Butler. “É como um primo maior da Terra”.
A busca por iguais. “Por que todos os sistemas descobertos teimam em ser tão diferentes do nosso?”, diz Cássio Leandro Barbosa, do IAG (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas) da USP, astrônomo não envolvido no achado. “Dois planetas do porte de Júpiter e um rochoso com período de dois dias? Começo a crer que os outros sistemas são os normais, o nosso é que é esquisito”. A busca por planetas extra-solares tem por objetivo justamente entender o quanto o Sistema Solar e a Terra são raros no Universo. Embora esse novo achado enfatize as diferenças entre os membros solares e os mais de 150 planetas já detectados em outras estrelas, Marcy e Butler têm a expectativa de reverter esse quadro. O grupo continuará trabalhando para identificar planetas em distâncias mais palatáveis da estrela, na chamada zona habitável, onde água em estado líquido possa ser estável na superfície. “Nós continuamos empurrando os limites do que podemos detectar, e estamos chegando mais e mais perto de encontrar Terras”, disse Steven Vogt, da Universidade da Califórnia em Santa Cruz, também membro do grupo. De fato, até essa descoberta, os menores planetas detectáveis eram do porte de Urano e Netuno. A partir de agora, está aberta a temporada de caça aos mundos rochosos. E a corrida deve esquentar mesmo depois de 2006. “Com as técnicas atuais, não se consegue ainda detectar um planeta rochoso na zona habitável”, diz Eduardo Janot Pacheco, astrônomo do IAG da USP. “Por essa razão é que estamos esperando com ansiedade o Corot e o Kepler”, respectivamente satélites europeu (com participação brasileira) e americano que farão detecção de planetas nessas condições, a partir de 2006 e 2008.