Hoje idoso, objeto surgiu “só” 500 milhões de anos após a origem do Universo. Estudo dá pistas de como deve ter sido a química no princípio do cosmos.
Um grupo de astrônomos nos Estados Unidos acaba de descobrir uma estrela que por pouco não foi “testemunha ocular” do início do Universo. Enquanto estima-se que o famoso Big Bang tenha ocorrido cerca de 13,7 bilhões de anos atrás, esse astro recém-identificado parece estar por aí pelos últimos 13,2 bilhões de anos.
Trata-se de um astro chamado HE 1523-0901, localizado na borda da Via Láctea, a galáxia na qual o Sistema Solar está inserido. A estrela anciã no momento vive a fase conhecida como “gigante vermelha” – uma das últimas etapas na vida de astros similares ao Sol. “É verdade, mas essa estrela ainda vai estar aí por um bom tempo”, disse ao G1 a astrônoma alemã Anna Frebel, da Universidade do Texas. Ela liderou a pesquisa, que saiu publicada na última edição do periódico científico “Astrophysical Journal”.
A HE 1523-0901 é um pouco menor que o Sol (com 80% de sua massa) e, por isso, vive naturalmente um pouco mais que ele. Para calcular a idade de uma estrela dessas, os cientistas têm de confiar num método parecido com o do carbono-14 (velho conhecido das datações arqueológicas), só que adaptado para as escalas de tempo cósmicas. A idéia por trás de ambos os sistemas é que certos elementos possuem um tempo de vida médio, antes de decaírem e se transformarem em outros átomos. Sabendo em que tempo médio certos átomos levam para virar outros e comparando a proporção entre um e outro tipo numa dada amostra, é possível estimar há quanto tempo eles estão por lá.
Foi justamente comparando as presenças de átomos de urânio e tório (elementos radioativos, que tendem a se transformar) com chumbo (o resultado), usando como calibradores os elementos estáveis európio, ósmio e irídio, que Frebel e seus colegas conseguiram extrair a idade dessa estrela: ela nasceu apenas cerca de 500 milhões de anos após o Big Bang. As observações foram feitas do Observatório Europeu do Sul, no Chile.
Química cósmica
Embora seja muito velha, essa estrela certamente não foi a primeira a surgir no Universo. Ela foi precedida por outras, ainda mais antigas, que já não existem mais – elas teriam sido compostas apenas pelos elementos originários da “grande explosão” que deu início ao cosmos: hidrogênio e hélio. A partir dessa matéria-prima, elas criaram os demais elementos químicos (processo conhecido como “nucleossíntese”).
Mas essas estrelas pioneiras tiveram vida curtíssima (cerca de 1 milhão de anos), após o quê explodiram, produzindo as primeiras supernovas. Na explosão, os elementos pesados foram espalhados pelo cosmos, para que pudessem ser incorporados à geração seguinte de estrelas – da qual o astro recém-descoberto faz parte.
Encontrar um astro tão antigo quanto a HE 1523-0901 é raríssimo. Até hoje, somente uma outra estrela tem idade semelhante – foi um astro do mesmo tipo descoberto em 2001 por um grupo que teve a participação de Beatriz Barbuy, astrônoma da Universidade de São Paulo. E o mais engraçado é que os cientistas têm “segundas intenções” sobre essas estrelas – não é só questão de estudá-las; eles querem usá-las para sondar indiretamente o que estava rolando no Universo antes.
“Um dos nosso objetivos é descobrir e entender o que estava acontecendo, quimicamente, após o Big Bang”, diz Frebel. “Essa informação química pode ser extraída de astros desse tipo”.