Às vésperas de inaugurar a máquina mais poderosa já construída por seres humanos – o acelerador de partículas LHC (Grande Colisor de Hádrons, sigla em inglês), que entrará em funcionamento no final deste ano – os físicos já começaram a planejar a construção de uma da próxima geração. Duas semanas atrás, ficou pronto a primeiro esboço geral do projeto do ILC (Colisor Linear Internacional), um acelerador que poderá dar um passo além na investigação sobre o que compõe o Universo.Não vai sair barato. “O custo estimado de construção do ILC deve ficar em torno de US$ 6,5 bilhões [mais que o dobro do LHC]”, disse o físico Jonathan Bagger, da Universidade Johns Hopkins (EUA), em uma palestra ontem no encontro anual da AAAS (Associação Americana para o Avanço da Ciência), em San Francisco (Califórnia).
Segundo Bagger, para se tornar viável, o projeto terá de ocorrer sob a forma de uma colaboração internacional com a participação de muitos países, o que envolverá uma intensa negociação sobre qual deles abrigará a máquina. Agenda. “Acredito que, dentro de dois anos, saberemos onde deverá ser construído o ILC – se ele for construído”, diz Bagger, um dos mentores do projeto. “A construção começaria por volta de 2012, para ele começar a operar lá pelo fim da próxima década”, afirma.
Pode parecer muito tempo, mas é uma agenda bastante razoável se comparada à do LHC, que começou a sair do papel em 1994 e só vai começar a operar em 2007. O ILC, na verdade, não vai ser tão poderoso quando o LHC, mas será capaz de fazer medições com mais precisão, o que é crucial para que os físicos teóricos possam aproveitar melhor os dados obtidos nos experimentos. Além disso, o tipo de partículas usadas na colisão será diferente, o que permite revelar propriedades diferentes da natureza. O que um colisor de partículas faz, grosso modo, é colocá-las em choque umas com as outras a altíssimas velocidades para “desmontá-las” e fazer com que seus componentes menores apareçam.Foi assim, por exemplo, que os físicos comprovaram que os prótons – partículas que compõem o núcleo dos átomos – na verdade são compostos por peças ainda mais fundamentais, chamadas quarks.
Onde está o Higgs? Algumas das partículas elementares que, por enquanto, existem só em teoria, poderão ser encontradas no LHC. Uma delas, batizada de bóson de Higgs, se existir, pode ser a explicação do porquê a matéria possui massa e peso. Mas há outras possibilidades ainda mais animadoras. David Gross, vencedor do Nobel de Física de 2004, outro palestrante na AAAS, acredita que o novo acelerador terá a chance de produzir as partículas que compõem aquilo que os físicos chamam de matéria escura. Essa é a matéria mais abundante no Universo, mas os físicos ainda não sabem quase nada sobre ela porque não sofre interação eletromagnética, o que torna os físicos incapazes de detectá-la diretamente. Só é possível observá-la por meio de sua interação gravitacional com outros planetas e galáxias. Com um bocado de força, porém, pode ser possível quebrar as partículas que a compõem em subcomponentes. “O LHC vai atingir a ordem de magnitude de energia que pode ser suficiente para isso”, diz Gross.
Independentemente do entusiasmo que o LHC está gerando no meio científico neste ano, construir o ILC e levar a física de partículas à frente pode ser uma tarefa das mais difíceis, não por falta de tecnologia, mas por um limite de dinheiro. “Parodiando Charles Dickens, hoje nós vivemos o melhor dos tempos e o pior dos tempos”, disse Richter Burton, outro Nobel de física, de 1976, presente na AAAS. “Estamos vivendo uma revolução na física de partículas que vai abrir muitas oportunidades. Mas cada uma dessas oportunidades custa caro, e teremos que manter o foco nos principais experimentos para compreender do que o Universo é feito e como ele funciona”.