Muito se tem falado a respeito de mitos folclóricos, de figuras lendárias brasileiras e da rica cultura do mundo rural, principalmente na região amazônica, onde personagens como a mãe d’água, curupira, boitatá etc, são retratados por escritores como Monteiro Lobato, Câmara Cascudo e Basílio de Magalhães, entre outros. Esses seres lendários e folclóricos são fortes expressões populares, que representam a compreensão da vida e do mundo das classes populares, principalmente dos camponeses. Há certos refolhos [A parte mais íntima ou secreta da alma] do mundo mental – crendices, mitos e lendas – que só chegam ao nosso conhecimento por meio da abordagem do comum. É um pretexto para que a pessoa não seja tomada como tola, crédula, atrasada, ridícula ou ignorante.
Na acepção de Monteiro Lobato, o estudo das crendices populares revela o povo em sua íntima textura psíquica. Revelar é conhecer. O conhecimento do povo, e só ele, ensina os meios, os canais, a arte de educá-lo. Conforme a regionalização das lendas, mitos e crenças, se têm falado comumente sobre algumas aparições de “bolas de fogo”, principalmente nos céus da região da Baixada Maranhense. Esse fenômeno, que aparece com freqüência nos campos naturais daquela região e nas demais áreas alagadas do litoral do Maranhão, é conhecido como curacanga ou cunha an canga. Em tupi-guarani, o termo significa “mulher com cabeça de fogo”. Para alguns, trata-se de um abdutor, para outros é algo sobrenatural, um ser divino ou malévolo.
Já os céticos relacionam o fenômeno ao fogo-fátuo e a gases do pântano, ambos envolvendo a emanação do gás metano de origem animal, ou então a alguma experiência científica secreta. Tal personagem luminoso ainda não penetrou totalmente nos domínios da arte, embora já tenha se cristalizado na alma popular dos maranhenses, estilizado ao sabor da imaginação popular. Mas, afinal, o que será a curacanga, essa figura cintilante que rasga os céus nas noites de Lua? Sabe-se que as definições e as percepções são muitas sob o aspecto do mito, da ciência, da Ufologia e da crença popular seguida de devoção. Dessa forma, busca-se encontrar respostas fundamentadas sobre esse fenômeno luminoso, que podem ter influência ou não na vida das pessoas que se encontram na zona de aparições.
Percepções e constatações — Nosso interesse em abordar o tema surgiu a partir do momento em que os fenômenos luminosos ou bolas de fogo se tornaram notícia e ocorrência comum entre os maranhenses da Baixada. Sendo assim, torna-se importante reunir e analisar as diferentes opiniões e crenças de pessoas que viveram ou que encontraram “respostas” para as tais bolas de fogo por meio das suas diferentes percepções e constatações. Propusemo-nos a condensar os depoimentos dos entrevistados e dos especialistas para que obtivéssemos um documento completo e diversificado – nos aspectos folclóricos, naturais, científicos, ufológicos e religiosos –, de cunho educativo e pedagógico, respeitando as diversas opiniões. Apesar de registrar situações antagônicas, esperamos não desrespeitar nem desconsiderar, de maneira alguma, qualquer religião ou doutrina, pois todas encaminham o homem para o bem, nem tampouco influir na idéia de um Deus Criador e na crença popular.
As bolas de fogo chamadas comumente se apresentam na natureza sob diversos aspectos e intensidades, ora surgindo por influência de fatores físicos e químicos, ora por ação ou reação humana, nos diversos estágios e por situações ainda não esclarecidas. Na crença popular, principalmente dos ribeirinhos, caçadores, vaqueiros e pescadores da Baixada Maranhense, o mito da curacanga [E suas variações croacanga ou cavalacanga] é compreendido da seguinte forma: “Quando qualquer mulher tem sete filhas, a última vira curacanga, isto é, a cabeça lhe sai do corpo, à noite, e, em forma de bola de fogo, gira à toa pelos campos, apavorando quem encontrar nessa estranha vagabundeação. Há, porém, um meio infalível de se evitar esse horrendo fadário [Destino talhado por poder sobrenatural]. É tomar a mãe à filha mais velha para madrinha da caçula”.
Por se tratar de uma lenda exclusivamente maranhense, de onde parece não ter migrado para nenhuma outra circunscrição territorial do Brasil, a terminologia curacanga, segundo José Dias, no artigo Lendas Surdo-Mudas à Nova Geração [Jornal Folha de Pinheiro, 2000], vem da deturpação fonética do tupi-guarani cunhãancanga, que significaria “cabeça de mulher”. O lavrador Faustino Pereira, da cidade de São Bento (MA), declarou em 1977 que “a curacanga é a cabeça de uma pessoa que deixa o corpo em casa e sai viajando, transformada em bola de fogo. E se alguma pessoa for tocada por ela passa a sofrer a transformação. Aí a outra na hora fica curada, ficando uma pessoa normal”.
O temor às bolas de fogo ou à curacanga, que segundo os nativos é capaz de causar queimaduras, chupar sangue, deixar as vítimas “desmemoriadas” ou até matá-las, tem contribuído para reduzir os impactos ambientais na região da Baixada Maranhense e nas reentrâncias daquele estado. Como exemplo, podemos dizer que tem coibido a retirada de animais dos manguezais, a pesca predatória, a matança de aves migratórias e a queima dos campos. A curacanga, por causar medo, ficou simbolizada para alguns como um mito importante e que deve ser preservado, já que se trata de uma figura ecológica, protetora dos campos naturais e das matas maranhenses.
Boitatá e mãe do ouro — Existem algumas lendas brasileiras que se assemelham ao mito da curacanga, como a do boitatá, o lobis-mulher e a da mãe do ouro. O estudioso Basílio Magalhães, por exemplo, sustenta que o boitatá é um dos nossos mitos mais antigos. Em 31 de maio de 1560, o jesuíta José de Anchieta já escrevia sobre o m’bai- tatá, que na língua indígena, que quer dizer “coisa de fogo”. “Há também outros fantasmas máximes nas praias, que vivem a maior parte do tempo junto ao mar e dos rios e são chamados de ‘que é todo fogo’. Mas não se vê outra coisa senão um facho cintilante correndo para ali”, descreveu o religioso. A mãe do ouro é um mito folclórico muito presente também no interior do Paraná. Seria um fogo dourado que indicaria a presença de tesouros enterrados.
Outra lenda muito difundida em todo o Brasil, em especial na Amazônia, a boiúna, na definição de Franz Kreüther Pereira, autor de Painel de Mitos & Lendas da Amazônia [Editora Belém, 1994], seria uma serpente descomunal de cinco metros. O animal viveria no fundo de grandes lagos, rios e igarapés, num lugar chamado boi
açuquara ou “morada da cobra grande”. Seu corpo lustroso, refletindo a luz do luar, e seus olhos que brilham no escuro, como archotes, iludem os pescadores incautos que, pensando se tratar de um navio, dela se aproximam e são devorados.
Já a mula-sem-cabeça é uma personagem monstruosa que se transforma a mulher que praticou algum mal. No passado, diziam os nativos que mulher que namorasse padre ou compadre tinha esse destino. Acreditava-se que a metamorfose se dava na noite de quinta para sexta-feira e a mula-sem-cabeça sairia pelo campo soltando fogo pelas ventas e relinchando. Seu encanto, segundo a lenda, somente seria quebrado se alguém conseguisse tirar o freio de ferro que carrega na cabeça. Em seu lugar, apareceria uma mulher arrependida.
Chama azulada — Fatores naturais e científicos podem estar ligados a esses fenômenos luminosos. Para alguns pesquisadores, o mito da curacanga derivaria de algum acontecimento físico ou químico. A exemplo do fogo-fátuo, nos organismos animais em putrefação, o fósforo é eliminado na forma de fosfina, um gás que se inflama em contato com o ar, produzindo ácido fosfórico. Isso dá origem a uma chama azulada, que pode ser observada nos cemitérios ou nos campos da Baixada Maranhense e pelo Brasil afora, onde sempre existem animais mortos no período de estiagem. Como já se disse, os gases do pântano são na verdade metano de origem vegetal, ou seja, todo material orgânico vegetal em decomposição emana o gás metano. Este, em concentrações de aproximadamente 25% em mistura com o ar, pode se inflamar espontaneamente gerando brilho e luz por alguns segundos.
O relâmpago de fogo é outro fenômeno atmosférico raríssimo, que pode ser confundido com Fenômeno UFO. São esferas brilhantes que flutuam perto do solo, tendo ao seu redor um halo azul. Existem registros de acontecimentos desde a Idade Média. Essas esferas assumem diversos tamanhos, sendo que o maior chega a ser do diâmetro de uma bola de futebol. Conforme explica William L. Moore no livro O Mistério das Bolas de Fogo Verdes [William L. Moore Publications, 1983], o fogo de santelmo, muitas vezes associado a UFOs, é também um fenômeno atmosférico raríssimo. Ele surge da eletricidade estática gerada pelo atrito de grandes massas de ar, de diferentes temperaturas, em movimento na atmosfera. Esse atrito arranca partículas de materiais condutores, tornando-as carregadas positivamente. Essa superfície com carga elétrica, se relativamente próxima de uma nuvem também carregada, apresentará atração e repulsão de cargas elétricas, que se concentrarão nas pontas das superfícies. Observaremos, então, uma chama azulada cintilante.
O raio globular ou raio-bola é outro fenômeno muito comum, gerador tanto de lendas como de observações ufológicas. Ele atravessa vidros, paredes ou cortinas sem provocar qualquer incêndio ou estrago, como se tivesse o poder de se materializar à vontade. O pesquisador francês Patrice Gaston argumenta no livro Desaparições Misteriosas [Livraria Bertrand, 2000], que esse tipo especial de descarga elétrica consiste geralmente num balão de plasma ou gás fortemente ionizado. Se as bolas de fogo verde ainda não têm explicação científica definitiva, o que se dirá dessas esferas que são feitas de plasma – a mesma matéria de que são feitas estrelas como o Sol – e que podem ser geradas por uma explosão violenta? Relatos autênticos de “ataques” de misteriosas bolas de luz foram documentados até mesmo pela Força Aérea Brasileira (FAB) em várias regiões da Amazônia. Seriam UFOs? Seriam fenômenos atmosféricos?
Processos químicos — Em nosso planeta temos 92 elementos naturais, sólidos, líquidos e gasosos, que podem formar infinitas substâncias quando associadas adequadamente. A própria Agência Espacial Norte-Americana (NASA) tem realizado experiências para formar novas substâncias no espaço, na ausência da força gravitacional. Existem processos químicos em que muitas substâncias têm a característica de emitir luz, como nos seguintes processos:
Luminescência — É o fenômeno físico que consiste em irradiação de luz em temperaturas relativamente baixas, estudado por diversas disciplinas da física.
Fotoluminescência — Fenômeno físico que consiste na emissão de luz de certas substâncias, mesmo depois de cessada a excitação que a provocou.
Fluorescência — Fenômeno físico que consiste na emissão de luz de certas substâncias quando excitadas por descargas elétricas, apagando quando cessa a excitação.
Organismos noctilucentes — Existe um grupo de protozoário da ordem dos dinoflagelados, classe dos mastigóforos, de 2 mm aproximadamente, caracterizados pela fosforescência. Observados à noite nos mares e nas praias, brilham e confundem as testemunhas.
Plantas luminescentes — Algumas árvores, na presença de certos campos eletromagnéticos, se tornam luminescentes. Pelo menos três delas já são conhecidas: o azevinho, azevinheiro ou azinheira, o assa-peixe ou cambará-guaçu e o terebinto.
Efeitos paranormais — Na parapsicologia têm sido pesquisados casos raros de pessoas que conseguem emitir uma energia mental a ponto de causar efeitos às vezes luminosos.
Miragem — Sabe-se que em algumas ocasiões as pessoas que viajam por regiões áridas vêem à distância um lago que desaparece quando dele se aproximam. Na realidade, não existe tal lago, ele é apenas miragem, uma imagem que o ar forma. Nos dias de verão muito quentes, podemos observar a miragem em algumas rodovias. Parece que vemos poças d’água ou um disco voador.
Fraudes — Histórias contadas por moradores da Baixada Maranhense dão conta de que algumas pessoas aproveitavam a fama do mito da curacanga para ludibriar os pescadores e criadores de pequenos animais ou auferir vantagens nas atividades produtivas desenvolvidas nos campos naturais. Ladrões de patos ou de peixes simulavam a curacanga usando tochas de fogo feitas com uma grande lamparina ou com panos embebidos em querosene, que eram colocadas dentro de uma cumbuca ou cui
a e estendidas por uma vara comprida, que oscilava nas noites escuras. Com isso, assustavam todos que avistavam aquelas chamas e roubavam os seus pertences.
Além das hipóteses citadas, existem outros fatores relacionados aos avistamentos de fenômenos luminosos que podem ser confundidos com UFOs. Na órbita terrestre há diversos tipos de satélites naturais e artificiais. Segundo informações da FAB e do Centro de Lançamento de Foguetes de Alcântara, pesquisas geoespaciais são realizadas com o uso de plataformas tipo balões meteorológicos e radiossondas, aparelhos que verificam as condições físicas e meteorológicas. Existe a possibilidade de que essas plataformas tenham sido avistadas na região da Baixada e do litoral maranhense e confundidas com UFOs.
Balões atmosféricos — Segundo informações de meteorologistas de Alcântara, regularmente são realizadas pesquisas com esse tipo de balão, que pode se deslocar nos céus silenciosamente, encantando os observadores. Alertam ainda que o balão pode ser confundido com um UFO por refletir a luz do Sol ou da Lua. As plataformas têm formatos diferentes e se assemelham aos objetos avistados de longe por pessoas da Baixada Maranhense, conforme matéria divulgada no jornal O Estado do Maranhão, de 17 de julho de 1977. Naquela época, o artefato avistado no estado, segundo alguns depoentes, tinha o formato de uma geladeira ou de um balão, ou seja, semelhante ao aspecto das plataformas de um balão meteorológico.
Não faltam relatos no Maranhão de pessoas que viram os fenômenos e até chegaram a encará-los como sendo de origem extraterrestre, mencionando inclusive as abduções. Entre os acontecimentos mais notórios pesquisados por ufólogos abalizados está o mundialmente conhecido Caso Bogéa. A jornalista Kely Padilha, em artigo publicado na Revista UFO 74, de outubro de 2000, relata o fato acontecido em 1977. José Benedito Bogéa, que faleceu em 2006, teria passado 36 horas em poder de extraterrestres. “Eles se comunicavam telepaticamente, mas eu não entendia nada do que diziam. Apontavam-me muitas coisas e me levaram a uma cidade parecida com Brasília, mas lá não havia Sol ou calor, nem velhos ou negros. Fiquei impressionado com a beleza do lugar e cheguei a pensar que fosse o céu”, contou Bogéa. Apesar disso, com extraordinário bom humor, assegurava que somos “apenas colônia dos extraterrestres. Deixar de acreditar neles é uma tremenda burrice”.
Ufólogos e jornalistas concentraram suas pesquisas na região da Baixada e do litoral, principalmente nas ilha dos Caranguejos e do Cajual. Entre os jornalistas maranhenses, destaca-se a citada Kely, pesquisadora e catalogadora de casos ufológicos referenciais. O repórter e ufólogo norte-americano Bob Pratt também esteve na região e incluiu casos maranhenses em seu livro Perigo Alienígena no Brasil: Perseguições, Terror e Morte no Nordeste [Código LIV-014 da coleção Biblioteca UFO]. O astrofísico e ufólogo francês Jacques Vallée também realizou importantes pesquisas no estado.
O enigmático chupa-chupa — Outro estranho fenômeno se abateu em 1977 sobre a região norte do Brasil, mais precisamente no Pará e na Baixada Maranhense. Chupa-chupa foi o apelido dado às luzes que eram observadas no céu da região, uma vez que as pessoas atacadas apresentavam anemia profunda, como se o sangue tivesse sido drenado de seus corpos. A situação era tão alarmante que a população pedia explicações e mais segurança às autoridades. O pânico foi tanto que a Aeronáutica decidiu estudar sigilosamente o fenômeno. O então capitão Uyrangê Bolívar Soares Nogueira de Hollanda Lima comandou a missão, que se estendeu de setembro a dezembro daquele ano. Mais de 500 fotos e pelo menos quatro filmes de UFOs, com 16 horas de duração, foram produzidos pela Operação Prato, exaustivamente tratada pela Revista UFO [Veja edições 114 a 117]. O escritor, explorador e ufólogo Pablo Villarrubia Mauso, autor do livro Mistérios do Brasil: 20.000 Quilômetros Através de uma Geografia Oculta [Editora Mercuryo, 1997] esteve no Maranhão em 1996 visitando os locais dos ataques e entrevistando pesquisadores e testemunhas. Mauso justificou que o fenômeno chupa-chupa o fascina.
Conotação religiosa — As bolas de fogo observadas têm quase sempre as mesmas características. Muitas vezes são encaradas como um sinal divino ou do fim dos tempos, ou ainda associadas à presença de Jesus Cristo e da Virgem Maria. Há quem acredite que alguma divindade secundária, como os orixás, da religião de origem ioruba, esteja por trás dos fenômenos. Mas pela predominância de católicos, evangélicos e de sincréticos religiosos, as interpretações se fundamentam nos relatos da Bíblia, que cita em várias passagens aparições de luz, bolas fogo, sarça ardente, tochas etc associadas às mensagens e profecias. Otacílio Boaventura de Brito, religioso da cidade de São Bento (MA), pregava em 1977 que “a misteriosa luz chupa-chupa significa que Jesus está voltando à Terra para levar ao Reino do Céu os que seguiram seus ensinamentos”.
O terceiro capítulo do Êxodo bíblico diz que “um dia, tendo conduzido seu rebanho para o deserto, chegando ao Monte de Deus, o Senhor ali apareceu em uma chama de fogo, do meio de uma sarça. Moisés via a sarça arder sem se consumir”. No Monte Sinai é que se concentravam sobremaneira tais fenômenos: “Todo o Monte Sinai fumegava, porque o Senhor baixara sobre ele no meio de chamas. O fumo subia como se fora de uma fornalha e o monte inteiro incutia pavor” [Êxodo 19]. Uma importante narração de Ezequiel atesta que ele teve contato com um UFO e seus tripulantes: “Eis que veio do norte um vento de tempestade e uma grande e espessa nuvem com fulgurações de um fogo todo resplandecente. E ela encerrava uma espécie metal brilhante, que estava completamente inflamado. Tinham também a semelhança de quatro seres vivos e eis qual era o seu aspecto: pareciam-se homens” [Ezequiel 10].
A Bíblia relata ainda fatos relacionados à vida e à história da humanidade no decorrer dos milênios. Inúmeras outras passagens mencionam fenômenos luminosos que a maioria dos fiéis prefere continuar tratando como manifestações divinas. Afinal, Deus é o criador de tudo. O que eles se esquecem, todavia, é que um ser onipotente, onipresente e onisciente não precisaria de naves para vir ao nosso planeta. A historiadora Luciana Lemos Bocchetti, em seu livro Mistérios Antigos [Edição particular, 2002] alude a vários registros antigos a respeito de fenômenos luminosos que têm sido interpretados como sinais divinos. Para Luciana, não se admite que seres espirituais precisassem de veículos de qualquer espécie para chegar até nós. Aviões e helicópteros não poderiam ser, já que antes do século XX não existiam.
O fenômeno das bolas de fogo é anterior aos tempos bíblicos, no entanto. Nos escritos que descrevem as façanhas de Tutmés III, redigidos entre 1504 e 1450 a.C., consta que escribas viram no céu círculos de fogo que, em seguida, subiram mais alto e se dirigiram para o sul. Em 163 a.C., em Concius, um homem foi queimado por um raio que veio de um “espelho no céu”. Julius Obsequens, em Prodigiorum Libellus, cita que em 166 d.C., em Capua, o Sol brilhou à noite. Tito Livius escreveu que em Albae viram-se dois sóis à noite. Em De Divination, Cícero fala sobre dois sóis e três luas vistas no céu. Seriam naves alienígenas? Seriam fenômenos luminosos precursores da curacanga?
Como disse a escritora e engenheira maranhense Rosa Mochel Martins em seu livro O Mundo Lendário do Homem [Edição particular, 1978], “o homem iniciou seu mundo pelo mito, pelo mistério, e até hoje tenta investigar a natureza”. Em outras eras, o homem já se identificava com o fogo, o trovão, a chuva, o Sol e a Lua, e mesmo assim não foi capaz de se libertar das reminiscências do mistério, parecendo não lutar pela verdade como fim. Que ela se esconda, persistindo o espírito de investigação. O homem precisa estar sempre atento e curioso, pois lendas sempre existirão. Elas nascem da imaginação popular, estimulada por fenômenos zoomórficos, antropomórficos ou mesmo cosmogônicos.
Os fenômenos luminosos ou as bolas de fogo, curiosamente chamados de curacanga pelos camponeses maranhenses, se revestem de realces mitológicos. São fatos mundiais, que neste texto tiveram seu aspecto regional examinado, já que no Maranhão esses mistérios estão embutidos na cultura popular. Os mitos e lendas do folclore são depositários de elementos criativos das populações. Diante de tantos e tão diferentes aspectos, é difícil chegar a uma conclusão ou fornecer explicações sensatas para eles. Só a intensa pesquisa de sua real natureza, seja de fenômenos meteorológicos ou atmosféricos, ou ainda de origem extraterrestre, pode trazer a resposta.