Os boatos sobre um fim catastrófico para o universo foram um bocado exagerados, de acordo com um grupo de cosmólogos brasileiros. Eles dizem ter mostrado que a fase de crescimento acelerado pela qual o cosmos passa hoje deve arrefecer daqui a 6 bilhões de anos, levando estrelas, galáxias e tudo o que existe a uma morte relativamente sossegada.
O trabalho é, por enquanto, teórico. Mas segundo o coordenador do estudo, Jailson Alcaniz, do Observatório Nacional, no Rio de Janeiro, confirmar suas conclusões por meio de dados experimentais é uma possibilidade mais próxima do que se imagina.
“Daqui a alguns poucos anos, é possível que nós já tenhamos dados para descartar ou confirmar essa proposta. Para isso, ainda é preciso melhorar a precisão das medições de fenômenos como as explosões de supernovas, a radiação cósmica de fundo – o \’eco\’ da explosão que criou o universo – e a estrutura dos aglomerados de galáxias”, afirma o cosmólogo.
O trabalho de Alcaniz e colegas do Observatório Nacional, da USP e da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (Uern), acaba de ser publicado na revista científica Physical Review Letters. A idéia é entender as conseqüências últimas de um fato inquestionável: o universo está inflando a um ritmo acelerado. Medições da luz distante de supernovas – estrelas de grande massa que explodiram – estão entre as principais provas dessa expansão acelerada.
Para explicar esse processo, os cientistas propõem a existência da chamada energia escura, que agiria de forma oposta à da gravidade: por ter propriedades repulsivas, ela faria as coisas se afastarem umas das outras, em vez de promover a atração entre elas, como faz a força gravitacional.
Para os cosmólogos, o grande problema é imaginar que essa expansão acelerada continue para sempre. “Se isso acontecer, você acaba tendo um horizonte de eventos futuro, ou mesmo uma singularidade”, diz Alcaniz. Ambos os termos, tirados da física dos buracos negros, referem-se a uma situação em que as leis do cosmos simplesmente não valem mais -na singularidade de um buraco negro, por exemplo, a gravidade e a pressão seriam infinitas.
A imensa maioria dos físicos rejeita a existência de singularidades porque a presença delas no mundo real faria com que o universo deixasse, na prática, de fazer sentido.Em particular, a chamada teoria das cordas – hoje a principal candidata a explicar todos os fenômenos cósmicos de maneira coerente – não poderia ser formulada se a expansão desenfreada do universo realmente desembocar num horizonte de eventos. Uma expansão acelerada eterna levaria a um “Big Rip” [grande rasgão, em inglês], um tipo de morte cósmica na qual galáxias, estrelas e até os próprios átomos seriam dilacerados.
Alcaniz e seus colegas escaparam desse dilema conciliando as observações sobre a expansão com o conceito de campo escalar. O lado interessante do campo escalar é que ele é dinâmico, “evolui ao longo do tempo e do espaço na histórica cósmica”, explica o pesquisador. “Nesse contexto, a expansão teria sido desacelerada no passado, teria começado a acelerar há 5 bilhões de anos e, daqui a 6 bilhões de anos, pararia de acelerar de novo”, diz ele.
Dessa forma, o risco de um “Big Rip” seria afastado. Ao invés de ser feito em pedacinhos no fim de sua história, o universo continuaria a se expandir, mas num ritmo cada vez mais lento, tornando-se, pouco a pouco, mais rarefeito e mais frio e morrendo suavemente. “É um final como o que imaginávamos antigamente para o cosmos”, resume Alcaniz.