Hoje sabemos que desde a década de 60 os Estados Unidos dispunham de uma organização portadora da posição oficial, embora discutível, e do interesse do país acerca de objetos voadores não identificados, o chamado Projeto Livro Azul. No Brasil, esse interesse nunca havia sido oficialmente admitido — salvo raras exceções, ligadas a ocorrências específicas e assim mesmo registradas apenas em declarações oficiosas ou entrevistas de militares, facilmente desmentidas. Mas não é exatamente isso o que mostram documentos descobertos e publicados no site Vigília [www.vigilia.com.br] sobre um interessante caso ocorrido no interior de São Paulo. O material, fornecido por uma pessoa que preferiu não se identificar, revela toda a negociação para a obtenção da cópia de um material único na história da Ufologia Brasileira, que revelaria a forma como nossos militares lidam com casos ufológicos.
O documento, guardado por mais de 10 anos e finalmente revelado, é o ofício designado como CHF/S-0222, datado de 13 de junho de 1989 e emitido pelo então chefe do Serviço Regional de Proteção ao Voo de São Paulo (SRPV-SP), coronel aviador Hélio Pereira Rosa. O material havia sido preparado para remessa ao Núcleo do Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro (Nucomdabra), precursor do Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro (Comdabra) — atual órgão centralizador de relatos de UFOs no país. O ofício faz referência à comunicação RD 46/CRIP/0405/89 e à transcrição do diálogo entre o controlador de voo e o comandante de uma aeronave civil, que teria ocorrido no dia 30 de maio de 1989 — a citada RD é uma espécie de circular.
Com carimbos do IV Comando Aéreo Regional (COMAR 4), de São Paulo, e contendo as palavras criptografia e secreto, o documento orienta os núcleos 1 e 2 do Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (Cindacta), assim como os Serviços Regionais de Proteção ao Voo, a remeterem ao Nucomdabra todos os documentos pertinentes ao objeto observado — assim como comunicar àquela organização tudo referente ao assunto. Dessa forma, seguindo as instruções da referida RD, o coronel Rosa repassou em seu ofício as intrigantes informações. Depois de uma introdução explicando qual era seu conteúdo, o documento aponta que “tem sido frequente a visualização na tela do radar do APP-SP, durante o período noturno, de alvo de origem desconhecida, aparentemente sobre a mesma região. Entretanto, sem comprovação visual por parte de aeronave”. APP-SP é a sigla, em inglês, para controle de aproximação de São Paulo — a região mencionada é a cidade de Americana, no interior do estado.
Uma confirmação inequívoca
Até aquela data, não havia qualquer comprovação de que aquele era um evento ufológico, o que foi mudado posteriormente pela transcrição. Ela passa a ser, para a Ufologia Brasileira, mais uma prova documental da existência de episódios concretos de detecção de objetos insólitos por radar, ocorridos simultaneamente com o contato visual por parte de um observador experiente — fato que já foi muitas vezes desmentido nas declarações oficiais da FAB. É uma revelação e a prova definitiva de que o Fenômeno UFO, de origem ainda desconhecida, embora supostamente extraterrestre, é real. A transcrição tem início às 06h28 zulu, uma escala horária mundial que equivale à 03h28 no horário de Brasília. O trecho transcrito destaca o momento em que o operador do APP-SP contata uma aeronave próxima da região de Americana, na tentativa de conseguir confirmação visual de um objeto voador não identificado que, segundo suas próprias palavras, “já estava ali há um bom tempo”.
Com o questionamento do operador, e após as primeiras negativas do comandante da aeronave, finalmente é confirmada a presença do UFO. O voo em questão era o Marília 573, da empresa Táxi Aéreo Marília, a atual TAM. O piloto tem contato visual com o objeto voador não identificado e ouve a seguinte comunicação do operador da torre de controle: “Agora na posição quatro horas, aproximadamente a quatro milhas, o 573 avista um forte clarão, positivo? Uma luz normal um pouco esverdeada, positivo? Ela aparece e desaparece momentaneamente”. O piloto então informa ao controlador: “Positivo 573. Afirmativo. Ele está exatamente na posição reportada”.
A intermitência do sinal no radar coincide com a intermitência luminosa vista pela tripulação do voo TAM 573. Preocupado em dar detalhes do insólito fenômeno que observa, o comandante da aeronave ainda descreve o objeto como sendo circular e tendo tamanho aproximado de 50 m de diâmetro. Continuando, ele pede — e recebe — autorização para desviar sua rota, dar uma volta completa e tentar novamente uma passagem pelo UFO, dessa vez mais próximo. No entanto, a partir daí, o piloto perde o contato visual com o objeto, recebendo mais informações do APP-SP: “Positivo. Eu recebo a informação no ‘plote’ [Radar] primário. É intermitente também. A impressão que dá é que varia de altitude. Quando ela desce, perdemos o contato e por vezes aparece com brilho cinco. Agora ficou. Está bem atrás da sua aeronave agora. Está na retaguarda, aproximadamente a cinco milhas [8 km]”.
Não conseguindo mais ver o objeto voador não identificado, o comandante do TAM 573 volta para a sua rota original e segue viagem normalmente — e nesse momento o controle do voo é transferido para o Cindacta 1, em Brasília. Passaram-se cerca de 35 minutos do contato com o APP-SP. Está encerrada a experiência descrita no documento, que foi submetido à análise de dois importantes pesquisadores, já familiarizados com procedimentos militares e documentos oficiais. O primeiro é o conselheiro especial da Revista UFO Ricardo Varela Côrrea, engenheiro do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) que trabalhou em um centro de monitoração por radar. Côrrea estranhou o enorme desvio de rota da aeronave, mas acredita que não há razão para duvidar da autenticidade do documento. “A linguagem do documento é coerente com a utilizada nos diálogos entre piloto e controle”, garantiu.
O segundo especialista a quem o material foi entregue era o engenheiro e ufólogo Claudeir Covo, recentemente falecido, que foi presidente do Inst
ituto Nacional de Investigação de Fenômenos Aeroespaciais (INFA) e coeditor de UFO. Covo concordou com sua autenticidade. “Após analisar o teor do documento por diversas vezes, bem como conversar com dois pilotos e um militar da Aeronáutica que o leram — inclusive o pesquisador e hipnólogo Mário Nogueira Rangel, que também é piloto —, não tenho dúvidas de que ele é totalmente autêntico”, destacou. Covo acreditava que o objeto avistado não poderia ser um avião de grande porte, já que o TAM 573 teve autorização para desviar a rota. “Caso fosse um avião cheio de passageiros, provavelmente o comandante não correria esse risco”, avaliou. Para o engenheiro, o objeto aéreo não identificado ficou quase parado sobre a região noroeste de Americana por, no mínimo, 35 minutos.
“Ele era circular, com um diâmetro aproximado de 50 m e ficou apagado a maior parte do tempo”. Apesar de seu tamanho e da boa visibilidade, no entanto, o comandante não o viu em um primeiro momento — porque provavelmente o UFO só acendeu suas luzes quando o Marília 573 se aproximou. “Se tivesse ficado aceso o tempo todo, com certeza os ufólogos teriam centenas de depoimentos de pessoas que o observariam do solo”, confirmou o ufólogo. Ele ressaltou ainda a importância do ofício que acompanha a transcrição — nele, o Serviço Regional de Proteção ao Voo de São Paulo afirma ser frequente a visualização, na tela de seus radares, de alvos de origem desconhecida.
Interceptação de UFOs por caças
Ainda de acordo com Claudeir Covo, é comum encontrar relatos de avistamento de UFOs na comunicação entre pilotos e controladores de radar, sempre informados ao Comdabra. “Isso ficou muito claro no evento de 19 de maio de 1986, quando o major Ney Antônio Cerqueira, chefe do Centro de Operações de Defesa Aérea (CODA), relatou um avistamento à imprensa”, lembrou, fazendo menção ao episódio em que caças da FAB foram acionados para perseguir 21 objetos que apareceram nos radares sobre o Rio e São Paulo — o caso ficou conhecido como Noite Oficial dos UFOs no Brasil. Na época, o então ministro da Aeronáutica, brigadeiro Octávio Júlio Moreira Lima, informou em diversas entrevistas que é rotina caças levantarem voo para rastrear objetos voadores não identificados. “A transcrição das fitas é realizada para novos estudos posteriores. Nesse caso não sabemos se algum caça levantou voo, mas com certeza vários estavam de prontidão”, finalizou Covo.
Desde a época da revelação do fato, procurada por diversas vezes para prestar esclarecimentos, a Força Aérea Brasileira (FAB) não se manifestou especificamente em relação ao documento. Contudo, pouco depois, o Centro de Comunicação Social da Aeronáutica (Cecomsaer) respondeu a um dos e-mails enviados. Iniciando com uma rápida explanação sobre a missão da Aeronáutica, a resposta destacou que, “quando esses movimentos [Dos objetos aéreos] não oferecem elementos que possibilitem uma identificação positiva pelos radares dos órgãos de controle de tráfego aéreo, são averiguados pelo Comdabra, órgão responsável pela soberania do nosso espaço aéreo — que, caso necessário, aciona as aeronaves de defesa aérea”. O Cecomsaer afirmou ainda que a Aeronáutica tem como objetivo maior a repressão do uso hostil ou clandestino do espaço aéreo brasileiro, e não há setor específico nela que trate ou investigue discos voadores.
A resposta do órgão foi encerrada informando-se ao remetente que “esse Centro de Comunicação Social não poderá atendê-lo com referência à solicitação em pauta”. A nota representou uma mudança sutil, embora importante, na atitude da FAB em relação aos questionamentos pertinentes à Ufologia. Pela primeira vez em uma resposta oficial à imprensa militares admitem que o Comdabra monitora a atividade de objetos voadores não identificados [Nota do editor: fato amplamente confirmado por meio dos resultados alcançados com a campanha UFOs: Liberdade de Informação Já, movida pela Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU) através da Revista UFO].
“Alvo não identificado no monitor”
No entanto, mesmo admitindo a situação, o Nucomdabra fez a ressalva de que não há setores específicos destinados à investigação das ocorrências ufológicas no país, aproveitando-se do significado conceitual e popular da expressão “discos voadores” como forma de desvincular os contextos. Embora ganhe agora caráter oficial, a rigor essa informação não era exatamente nova — mas seu conhecimento era bastante restrito. Ela quase passou despercebida em documentos obtidos pelo deputado federal João Caldas, do Alagoas, em 1999, durante o processo que o levou a apresentar o Projeto de Lei 2.324, que previa a divulgação de informações secretas referentes aos UFOs em poder das Forças Armadas.
A proposta de Caldas viria a ser vetada em seguida, mas o empenho do deputado produzia a primeira informação oficial — e documental — realmente contundente sobre os procedimentos específicos que vêm sendo empregados pela Aeronáutica quanto aos discos voadores, no presente e no passado recente. Em resposta a um pedido de informações do deputado, o Ministério da Defesa revelou, na época, não somente que há ocorrências de UFOs, como essas — denominadas oficialmente de “tráfego hotel” — são registradas pelos radares e apuradas, ainda que sigilosamente, pelo Comdabra. Isso vai contra a resposta prestada pela FAB à imprensa na ocasião, segundo a qual não existe qualquer setor destinado à investigação de naves alienígenas. “Situações esporádicas, como essas [Registros de alvos não identificados], decorrem de anomalias eletromagnéticas que, dependendo da intensidade, chegam a sensibilizar os receptores do radar, produzindo momentaneamente um alvo não identificado na tela do monitor”, informou um porta-voz da Força Aérea.
Preocupado em dar detalhes do fenômeno que observa, o comandante da aeronave descreve o objeto como sendo circular e tendo tamanho aproximado de 50 m de diâmetro. E ele pede e recebe autorização para desviar sua rota< /p>
Tal informação já havia sido transmitida anteriormente ao site Vigília, e a TV Bandeirantes, pouco depois, quando tentou convidar um representante da Aeronáutica para participar de um programa sobre Ufologia, recebeu um fax do Cecomsaer com o mesmo dado. Ao longo desse tempo, podemos constatar uma tentativa oficial de descaracterizar tanto quanto possível a eventual detecção de objetos voadores não identificados pelos radares do Cindacta. Ouvido pela imprensa em diversas oportunidades, o ex-ministro da Aeronáutica Octávio Júlio Moreira Lima negou o contato visual simultâneo à detecção por radar durante aquela que é uma das mais famosas ocorrências do gênero em toda a história da Ufologia, o citado episódio de maio de 1986, quando quase duas dúzias de objetos voadores não identificados foram perseguidos por caças militares.
Contudo, o próprio sistema de defesa havia sido acionado por um comunicado do então presidente da Embraer, o coronel Ozires Silva, que era passageiro de um avião Xingu em voo entre Brasília e São José dos Campos, na rota da esquadrilha de UFOs. A aeronave de Ozires mantinha contato visual com um dos objetos, que assumia cores vermelhas, brancas e verdes, e se aproximara perigosamente do avião. Como o episódio envolvia uma alta autoridade, todo o sistema de defesa foi colocado em alerta. Posteriormente, em entrevista ao coeditor da Revista UFO Marco Antonio Petit, Moreira Lima voltou atrás em sua declaração e confirmou o contato visual — a versão ficou, assim, mais coerente com o que foi amplamente divulgado na época, na entrevista coletiva concedida pelos pilotos dos caças Mirage que perseguiram os objetos, incluindo o major Cerqueira, o chefe do CODA citado pelo pesquisador Covo em sua análise do documento.
O interesse dos Estados Unidos
Ainda a respeito do episódio de maio de 1986, pouca gente sabe, mas o assunto não interessou apenas aos militares brasileiros. O governo dos Estados Unidos, motivado por processos impetrados com base na Lei de Liberdade de Informações, liberou um documento do arquivo do Departamento de Defesa no qual se vê que um agente da embaixada norte-americana em Brasília informara o ocorrido em maio de 1986. O documento, conseguido pelo Grupo Ufológico do Guarujá (GUG) com algumas rasuras de censura por parte do Departamento, finaliza com um comentário intrigante: “Embora o RO [Acrônimo para Reporting Officer, oficial do relatório] não acredite em UFOs e em toda a excitação que cercou relatos anteriores, há aqui muito para ser ignorado. Três contatos visuais e três contatos positivos no radar de três sistemas diferentes nos conduzem a acreditar que algo chegou ao Brasil na noite de 19 de maio”.
Como se vê, curiosamente, o oficial usou o termo chegou, ao invés de aconteceu. Mas não é só. Vários documentos mostram que discos voadores sempre foram objeto de interesse militar — um dos mais contundentes foi divulgado pelo próprio Covo, o texto NPA-09C. Trata-se de uma norma de procedimento aeronáutico do Serviço de Proteção ao Voo do Rio de Janeiro que estabelece ações padrões para os casos de avistamentos de UFOs. O documento, que entrou em vigor em setembro de 1990, é acompanhado por um questionário que deve ser aplicado pelos operadores do sistema e controle de tráfego aéreo no país às testemunhas de ocorrências ufológicas. Dois outros documentos, no entanto, comprovam ações regionais de investigação do Fenômeno UFO. Um dos mais famosos e polêmicos é o relatório da Operação Prato, secretamente desenvolvida pela Aeronáutica na Amazônia, entre setembro e dezembro de 1977, como já se publicou amplamente na Revista UFO.
Na época, a região passava por um momento delicado, com os populares relatando ataques de uma luz vermelha, conhecida como chupa-chupa, que sugava o sangue de suas vítimas. O relatório daquela operação militar, do qual quase 400 páginas já são conhecidas, contém uma detalhada descrição da atividade diária das equipes da Força Aérea em campo, relatos dos moradores e experiências insólitas vividas pelos próprios soldados. Outros documentos importantes somam-se à lista, como os boletins do Sistema de Investigação dos Objetos Aéreos Não Identificados (Sioani), órgão estabelecido na antiga 4ª Zona Aérea, atual IV Comando Aéreo Regional (COMAR 4), em São Paulo.
Complexa rede de informações
A história do Sioani teve início em 1969 e logo o órgão divulgou dois desses boletins, em abril e agosto daquele ano, com relatórios e extensos comentários a respeito de ocorrências registradas por uma complexa rede de informações — única ação de colaboração mútua entre pesquisadores civis e militares de que se tem conhecimento. Desde então, segundo apontam os documentos oficiais, todo o know how da FAB na investigação de objetos voadores não identificados foi centralizado em Brasília. Inicialmente sob a guarda do Comando Geral do Ar, o tema foi repassado ao Núcleo do Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro, que teve esse nome enquanto passava por sua fase de implantação. Em 1995, o órgão se transformou no atual Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro (Comdabra), entidade combinada e ligada diretamente ao presidente da República e, em tempo de paz, subordinada ao Comando Geral do Ar.
É provavelmente no Comdabra, em Brasília, que funciona o ‘Projeto Livro Azul Brasileiro’ — ou talvez verde-amarelo —, com algumas diferenças que o fazem parecer mais eficiente que seu primo norte-americano
Com base nos documentos obtidos ao longo dos últimos anos, os ufólogos suspeitam que segredos guardados a sete chaves pela Força Aérea Brasileira (FAB) a respeito de UFOs podem estar nas gavetas de algum arquivo esquecido (ou não) no edifício sede do Comdabra, em Brasília — a verdadeira Caixa de Pandora da Ufologia Brasileira. É provavelmente ali que funciona o “Projeto Livro Azul Brasileiro” — ou talvez verde-amarelo —, com algumas diferenças que o fazem parecer mais eficiente que seu primo norte-americano. Ao contrário desse, o nosso não tem o objetivo de ser público nem pretensões de explicar definitivamente o Fenômeno UFO em tão curto espaço de tempo. E mais: é um sistema que existe como um conjunto de organizações, algumas vezes de ação regionalizada e, em outras, de âmbito nacional, acompanhando e catalogando
as ocorrências ufológicas, centralizando em Brasília o destino das informações. Por essa razão, o “Livro Verde-Amarelo” continua aberto.