O primeiro caso de abdução alienígena da Era Moderna dos Discos Voadores, bem como o primeiro em que um ser humano teria mantido relações sexuais com uma suposta entidade biológica extraterrestre (EBE), acaba de completar 50 anos. Não foi por acaso que ocorreu justamente no Brasil, país onde a voluptuosidade, a devassidão, a liberação das fantasias libidinosas e a busca desenfreada por prazeres carnais sempre escaparam à rigidez da moral religiosa. De todos os casos da Ufologia Mundial, a “saga sexual” vivida por Antonio Villas Boas (1934-1991) permanece sendo a que mais me impressionou.
Muitos ufólogos com os quais conversei também admitiram o mesmo, e certamente não há nenhum deles, nem o mais isento de paixão e emotividade, que não tenha ficado de alguma forma impressionado ao tomar conhecimento da inusitada história daquele jovem lavrador de 23 anos. Na madrugada de 16 de outubro de 1957, Villas Boas arava a terra com o trator quando foi surpreendido por uma nave em forma de ovo, bojuda na parte de trás e com três hastes metálicas na frente, feito esporões, que aterrissou a uns 15 m de distância. Dela desceram pequenos seres vestindo máscaras e uniformes inteiriços, que o agarraram e o fizeram subir para bordo do objeto através de uma escada rudimentar.
Depois de ter sido despido, um líquido oleoso, mas que não deixava a pele engordurada, foi passado em seu corpo com uma espécie de esponja. Em outra sala, dois seres se aproximaram com um tipo de cálice, do qual saíam dois tubos flexíveis. Eles colocaram a extremidade de um dos tubos no objeto e a outra ponta, que tinha um “biquinho” semelhante a uma ventosa, num dos lados do queixo de Villas Boas. O agricultor não sentiu dor, apenas a sensação de que a pele estava sendo sugada. Seu sangue escorreu pelo tubo e se depositou no cálice, que encheu até a metade. Depois foi retirado e substituído pelo que ainda não havia sido usado, sendo colocado do outro lado do queixo, de onde se coletou mais sangue, até completar o vasilhame. A pele de Villas Boas ficou ardendo e coçando no lugar da sangria.
Deixado sozinho numa sala que exalava uma fumaça de cheiro desagradável e sufocante, que lhe provocou vômitos, Villas Boas esperou por um longo tempo até que, para seu espanto,surgiu uma mulher inteiramente nua, com a qual acabou tendo relações sexuais. No fim do processo, ela apontou para o próprio ventre e em seguida para o céu. Cumprida a missão, os seres se desinteressaram completamente pelo agricultor e o deixaram no mesmo local do rapto. Os humanóides, como ele próprio descreveu, mediam cerca de 1,57 m de altura, vestiam macacões cinzentos inteiriços e aderentes ao corpo, confeccionados com um tecido grosso, porém macio, com listras pretas aqui e ali. A vestimenta ia até o pescoço, onde se unia a um capacete de material mais duro e da mesma cor. Era reforçada na frente e atrás por lâminas de metal fino, sendo uma triangular e à altura do nariz.
O capacete só deixava entrever os olhos, de cor clara, que ficavam atrás de dois vidros redondos, semelhantes a lentes de óculos. Três tubos redondos e prateados, pouco mais finos do que uma mangueira de jardim, se embutiam na roupa – um no meio das costas e os outros dois, um de cada lado, se fixavam por baixo das axilas. As mangas do macacão iam até os punhos, onde terminavam em luvas grossas que dificultavam o movimento das mãos. Também não havia separação entre as calças e as botas, que pareciam ser uma continuação das vestes. As solas eram grossas e arqueadas para cima na parte da frente. Na altura do peito, os seres traziam um “escudo vermelho do tamanho de uma rodela de abacaxi”, segundo a testemunha. De vez em quando, aquilo emitia flashes luminosos. Do escudo descia uma tira de tecido prateado ou metal laminado que se unia a um cinto largo e justo, sem fivela ou presilhas.
Olhos azuis, grandes e oblíquos — A mulher com quem Villas Boas copulou era magra e media no máximo 1,33 m de altura. Tinha os seios empinados e bem separados, cintura fina, barriga pequena, quadris largos, coxas grossas, pés pequenos, mãos compridas e finas. Seus dedos e unhas eram normais, e sua pele branca era cheia de sardas nos braços. O cabelo era liso e abundante, quase branco. Repartido ao meio, chegava até a metade do pescoço. As pontas viravam para dentro. Os olhos eram azuis, grandes, oblíquos e excessivamente repuxados. O nariz, pequeno e reto, não era pontudo nem arrebitado. As maçãs do rosto eram pronunciadas, carnudas e macias ao toque. O rosto largo se estreitava na altura do queixo pontudo, conferindo uma feição triangular. Os lábios eram finos e a boca não passava de uma ranhura. As orelhas eram pequenas. O que mais chamou a atenção de Villas Boas foram os pêlos púbicos, que tinham cor vermelha. Ela não usava perfume, apenas “exalava cheiro de mulher”, declarou o abduzido.
Quem descobriu o Caso Villas Boas foi ninguém menos do que o repórter João Martins (1916-1998), da então popular e badalada revista semanal de informações O Cruzeiro, logo extinta. Martins já havia inaugurado o interesse pelos UFOs no país ao fotografar, junto com seu amigo, o repórter fotográfico Ed Keffel, um suposto disco voador sobrevoando a Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, na tarde de 07 de maio de 1952 – que muitos garantem ser apenas uma maquete. Ele agora acrescentaria um novo componente à incipiente fenomenologia ufológica da época: o sexual.
Porém, ao contrário do Caso Barra da Tijuca, que seria divulgado imediatamente como um sensacional furo de reportagem, com direito a suplemento extra na edição de O Cruzeiro de 17 de maio de 1952, o Caso Villas Boas permaneceria em segredo absoluto por cinco anos. Nesse ínterim, foi desbancado pelo fato sucedido ao casal inter-racial norte-americano Betty e Barney Hill, raptados na noite de 19 de setembro de 1961, na estrada de Indian Head, por seres cinzentos que os submeteram a vários tipos de exames médicos, inclusive de natureza sexual. O Caso Betty e Barney Hill acabou entrando para a história como o primeiro caso moderno de seqüestro por extraterrestres, desencadeando a febre de abduções que começou a tomar proporções de uma síndrome mundial, de caráter epidêmico, a partir dos anos 80.
Assim, se o Brasil deixou de tomar a dianteira e ocupar o posto de vanguarda no que tange às abduções alienígenas, foi porque João Martins e os demais pesquisadores do caso, receando uma reação contrária do público, preferiram resguardar a si mesmos e o protagonista. De tão fantásticos e inusitados que eram os aspectos env
olvidos no Caso Villas Boas, temiam que ele não seria aceito como verídico. Tanto que Antonio Villas Boas era conhecido apenas pelas iniciais AVB. Mas o episódio devolveria ao Brasil a dianteira perdida quando, anos depois, o ufólogo e embaixador Gordon Creighton – ex-cônsul inglês em Recife (PE) – definiria o episódio de Villas Boas como “o caso mais espantoso de todos”, em sua prestigiosa e pioneira revista Flying Saucer Review. A frase ficou célebre na Ufologia Mundial.
Equilíbrio, honestidade e coerência — No final de 1957, Martins publicou em O Cruzeiro uma série de reportagens especiais sobre discos voadores em que convidava os leitores a enviarem cartas contando experiências que tivessem vivido. Entre as centenas que foram recebidas, a de um jovem agricultor que morava com os pais e irmãos em uma fazenda do distrito de São Francisco de Sales, no Triângulo Mineiro, chamou-lhe tanto a atenção que resolveu custear sua viagem até o Rio de Janeiro, onde exporia pessoalmente o ocorrido. Antonio Villas Boas foi ao Rio e, em 22 de fevereiro de 1958, no consultório do médico gastroenterologista e ufólogo Olavo Teixeira Fontes, prestou um longo e detalhado depoimento, que só foi tomado depois de um interrogatório minucioso e friamente elaborado, que durou nada menos do que quatro horas, durante as quais se pôs à prova seu equilíbrio, sua honestidade, sua ambição, sua coerência de atitudes e de intenções. Fontes foi um dos primeiros ufólogos do país.
Membro do corpo docente da Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil, era representante da Organização de Pesquisa de Fenômenos Aéreos [Aerial Phenomena Research Organization, APRO]. O depoimento de Villas Boas se deu na presença do jornalista João Martins e do médico e ufólogo alemão Walter Karl Bühler (1933-1996). Apesar do trio não ter encontrado nenhum indício de fraude, mesmo após submeter Villas Boas a hábeis interrogatórios, métodos psicológicos intimidatórios e de insinuar-lhe que queria ver seu retrato nos jornais para ganhar dinheiro com sua história – para averiguar se era movido pela vaidade ou ambição –, o jovem se manteve firme com seu depoimento. Mesmo assim, foi submetido a exames médicos e psiquiátricos e interrogado novamente depois de várias semanas, a fim de surpreendê-lo em alguma contradição. Villas Boas não mudou uma só palavra de seu depoimento. E mesmo assim, Fontes e Martins decidiram arquivar a pesquisa “para esperar o aparecimento de um caso de características semelhantes em outro lugar, que validasse a ocorrência”. Apesar dos cuidados, parte do relato do agricultor vazou e chegou a ser parcialmente comentado.
Ainda em 1957, um dos melhores anos para a Ufologia, Bühler havia fundado no Rio de Janeiro a Sociedade Brasileira de Estudos sobre Discos Voadores (SBEDV), uma das primeiras entidades civis do gênero a surgir no país, que editava os referenciais Boletins da SBEDV. Os boletins veiculavam estudos pormenorizados sobre todos os tipos de casos, principalmente envolvendo humanóides, e às vezes continham até transcrições completas de questionários com testemunhas. Bühler publicaria suas primeiras ponderações sobre o Caso Villas Boas na edição nº 26-27 do periódico, de abril a julho de 1962. O artigo, integralmente em inglês – idioma que o ufólogo preferia quando tratava de casos importantes e que demandavam divulgação prioritária no exterior –, seria reproduzido na edição de janeiro e fevereiro de 1965 da citada Flying Saucer Review, do inglês Creighton, que tinha circulação mundial através de assinaturas. Isso contribuiu imensamente para projetar a Ufologia Brasileira no cenário internacional.
Uma versão em português do artigo só seria publicada por Bühler no Brasil em 1975, numa edição especial do Boletim da SBEDV, que trazia uma seleção dos 40 melhores casos de contatos imediatos com ufonautas ocorridos até então. Entre eles, logicamente, estava o de Antonio Villas Boas, enquadrado no “subgrupo A-F”, que incluía os episódios de aproximação forçada de ETs. Já a reportagem integral de Martins – sob o pseudônimo de Heitor Durville –, foi publicada em 1968, na série Detras de la Cortina de Silencio, mantida em espanhol pelas Ediciones O Cruzeiro, em Buenos Aires, com acesso apenas aos leitores argentinos. O texto foi acompanhado dos resultados dos testes clínicos realizados pelo médico e ufólogo Olavo Fontes, e através dele se ficou sabendo que AVB era Antonio Villas Boas, um agricultor de 23 anos que estudava por correspondência [Cabe ressalvar que não há parentesco próximo com os já falecidos irmãos indigenistas e sertanistas Leonardo, Cláudio e Orlando Villas Boas].
Em 1971, João Martins achou que não havia mais razão para ocultar o ocorrido e publicou um resumo do caso no suplemento carioca da revista semanal Domingo Ilustrado, edição 03, de 10 de outubro. “AVB foi submetido por nós aos mais sofisticados métodos de interrogatório, sem que tenha caído em qualquer contradição”, trazia a matéria. “Escapou de todas as armadilhas que fizemos para testar se ele estava em busca de fama ou dinheiro. Acurados exames médicos revelaram um estado de total equilíbrio físico e mental. Sua reputação na região onde vivia era a de um homem trabalhador, sério e honesto”. E completou Martins: “É muito provável que em algum lugar do universo haja uma estranha criança que talvez esteja sendo preparada para voltar aqui”.
Rompendo a cortina de silêncio — A versão de Martins, Fontes e Bühler sobre o Caso Villas Boas, repetida à exaustão nas últimas décadas como uma espécie de cânone por todos os jornalistas, pesquisadores e ufólogos que se seguiram, consagrou-se em termos absolutos e penetrou fundo no imaginário coletivo, onde permanecerá incólume à revisões ou correções de qualquer tipo, por mais embasadas que sejam, e sempre manterá uma influência residual, quase hipnótica. Enquanto isso, nunca foram lançadas novas investigações sobre o caso e nem a comunidade ufológica se preocupou em fazer certos questionamentos a seu respeito. Se hoje lamento isso é porque, de todos os episódios da casuística ufológica, este seja talvez o mais rico e multilateral, o mais im
pressionante pela originalidade e pioneirismo, e o mais fascinante sob o ponto de vista da expressão sócio-cultural. O Caso Villas Boas deve ser colocado, sem hesitação, entre os melhores da história da Ufologia Mundial de todos os tempos.
Mas é sobretudo como historiador que lamento que um caso de tamanha importância esteja eivado de tantos enganos e falsidades, erros e omissões. O limite da descrição do caso produz o efeito de fazer com que ela seja renovada indefinidamente, e seus muitos hiatos e lacunas sejam preenchidos a esmo, consumindo esforço inútil, ainda que nenhum resultado válido se obtenha do ponto de vista científico. Eu mesmo devo admitir que, antes de me engajar pessoalmente nessa empreitada, aceitava resignadamente a versão consagrada, sem maiores objeções. Para sair desse círculo vicioso, de nada adiantaria combater o caso, negando-o pura e simplesmente, como os céticos procederiam, apontando falácias e incongruências. Assim, resolvi tomar outra direção e contornar as discussões estéreis, retomar do ponto onde Martins, Fontes e Bühler pararam. Ou seja, explorar rotas que eles deixaram de investigar no Caso Villas Boas e experimentar olhar o acontecimento com uma ótica mais eficaz e dotada de maior força explicativa.
Pelo que se sabe, pouquíssimos ufólogos, até então, haviam se aventurado nessa direção. E dentre os que o fizeram, todos, seja por compromisso de classe ou obediência residual, acabaram voltando à repetição da versão consagrada. Isso quando não acrescentaram elementos díspares ou bastante redutíveis. Um deles foi o parapsicólogo de inclinação espírita Álvaro Fernandes, estudioso de fenômenos paranormais desde 1950 e fundador e presidente do Instituto de Estudos e Aplicação Parapsicológica de São José do Rio Preto (SP), que, cabe reconhecer, teve a sorte e o mérito de ter sido o primeiro pesquisador a visitar a fazenda de Villas Boas em São Francisco de Sales – isso em 28 de outubro de 1957, apenas 12 dias depois do incidente.
Trauma psicológico pós-abdução — Em seu opúsculo Contatos Sexuais com Ufonautas [Edição do autor, 1988], escrito em parceria com a também parapsicóloga Sônia Trigo Alves, Fernandes narra que a oportunidade surgiu bem no dia de seu aniversário, quando se encontrava em companhia de alguns amigos em um rancho de pesca em Fronteira, às margens do Rio Grande. Entre tantos “causos” contados por pescadores, um deles chamou particularmente sua atenção, pois se referia a um rapaz que estava arando a terra à noite e fora forçado a manter relações sexuais com uma mulher de outro planeta. Fernandes, que deveria retornar a São José do Rio Preto naquela noite, resolveu ir com seus companheiros até a fazenda de Villas Boas. Recebidos por sua mãe e parentes, foram informados de que o rapaz estava muito abalado e passava todo o tempo trancado em seu quarto, preferindo se isolar e não tocar no assunto.
Em seguida, foram até o vilarejo e procuraram o farmacêutico que atendeu Villas Boas. Era um senhor respeitável, educado e experiente, que disse que o agricultor temia ter contraído doença venérea, já que a relação com a tal mulher o deixara com os órgãos sexuais doloridos e o corpo todo coberto de manchas. O farmacêutico lhe garantiu que não era doença venérea, mas, de qualquer forma, o aconselhou a procurar um médico ou alguém que pudesse orientá-lo melhor.
A segunda visita de Fernandes a São Francisco de Sales se deu em 27 de agosto de 1977, ou seja, quase 20 anos depois. Desta vez estava acompanhado do professor e ufólogo Guilherme Willi Wirz, de Izildinha, repórter do jornal Diário da Região, também de São José do Rio Preto, e do doutor Ernesto Zeferino Dias. Também nesta ocasião Fernandes não logrou encontrar pessoalmente Villas Boas, uma vez que ele se encontrava em Formosa (GO), concluindo o último ano do curso de Direito. Em compensação, o grupo conversou com seu sobrinho, o proprietário rural João Batista de Queiroz [Vulgo João Neto], que os levou até a fazenda onde o agricultor havia morado, a cerca de seis quilômetros de São Francisco de Sales, próximo ao Rio Grande, e lhes mostrou o local onde pousara o disco voador. Naquela época a área estava abandonada, coberta de taboa, uma vegetação típica de brejos. Segundo Fernandes, “no local da descida do disco não mais cresceu vegetação, ficando uma marca escura no solo. Depois de um ano de nossa visita, tudo ficou inundado pela formação do lago de Água Vermelha, inclusive a casa onde morava Antonio ficou coberta pelas águas”.
De volta a São Francisco de Sales — Desde então, por incrível que pareça, numa mostra do quanto a Ufologia carece em matéria de pesquisas, nenhum outro pesquisador retornou a São Francisco de Sales. E, assim, o Caso Villas Boas permaneceu praticamente esquecido, até que em 2002 resolvi voltar a percorrer os velhos caminhos, embora de maneira independente e sem contar com qualquer tipo de apoio, subsídios e recursos. No início daquele ano, logrei localizar o paradeiro da irmã de Antonio, Odércia Villas Boas, com quem conversei primeiro por telefone e, no final do ano, pessoalmente. Nesta última ocasião estava acompanhado do jornalista Pablo Villarrubia Mauso, também consultor da Revista UFO, e encontramos Odércia em sua humilde residência, em São Francisco de Sales. Morava sozinha e sobrevivia com uma modesta aposentadoria. Ela, que nunca havia sido entrevistada por quem quer que seja, aos poucos foi deixando o receio e a desconfiança de lado e, do alto de seus 70 anos, demonstrando uma lucidez e uma disposição invejáveis, se dispôs a contar tudo o que sabia acerca do caso.
Numa prévia promissora do que me aguardava no quesito novas revelações, Odércia foi logo me garantindo que ela, e não sua mãe, é quem teria sido a primeira pessoa para quem seu irmão confidenciara o sucedido naquela fatídica madrugada de 16 de outubro de 1957. “Eu morava pertinho da sede da fazenda, na margem do Rio Grande e a uns dois quilômetros do local onde a nave pousou. Naquela época, estava gr&
aacute;vida de minha filha caçula. Era de manhã bem cedinho, por volta das 05h30, e eu já havia levantado porque a essa hora tinha de fazer café e despachar os homens para o trabalho na roça”, relatou a senhora. Disse que seu marido ainda estava dormindo porque se recuperava de uma cirurgia que havia feito no pescoço. “O Antonio chegou do varjão em que trabalhava e logo notei que estava tremendo e com o rosto pálido, amarelado, com manchas roxas na fronte e no queixo. Perguntei o que tinha acontecido e, em vez de responder, pediu que lhe preparasse um café bem forte e mandasse meu marido tirar leite para que tomasse, pois estava se sentindo muito mal”.
Dona Odércia descreveu o estado de Villas Boas naquele instante. “Ele estava meio zonzo e deitou-se num banco grande de madeira que havia na varanda, estirando as pernas. Vendo o estado em que se encontrava, insisti para que entrasse e deitasse na cama, mas ele teimou que queria ficar ali mesmo”. Seu marido foi até o curral tirar o leite que Villas Boas pedira, que bebeu misturado com café bem forte. “Mas logo em seguida ele vomitou uma ‘cola amarelinha’. E aí tomou café de novo, esperou de novo e foi parando de tremer, passando a se sentindo um pouco melhor. Então me contou toda aquela história”, declarou a senhora.
O irmão de Antonio Villas Boas, José Villas Boas, nascido em 1938 e quatro anos mais novo, também tinha medo de ser levado pelas luzes que rondavam a fazenda desde antes da abdução. Ele trocou São Francisco de Sales por Fernandópolis (SP), onde reside até hoje, e é próspero criador de gado. Em entrevista a mim concedida, também a primeira em sua vida, revelou que cerca de duas horas antes de seu irmão ser seqüestrado, observou, na companhia dele, uma luz no formato de dois pratos fundos e emborcados, que parecia observá-los acintosamente e se esquivava agilmente de suas tentativas de perscrutação com os faróis do trator. Temendo que qualquer coisa de ruim lhe ocorresse, José Villas Boas tratou de fugir dali, ao passo que seu irmão insistiu em permanecer trabalhando e terminou por ser alvo de insólitas manipulações. Ele nunca havia comentado este detalhe nem nada sobre o caso, e sempre fizera questão de resguardar-se da imprensa e dos ufólogos. Mas cabe observar, todavia, que ele provavelmente se enganou quanto a data, pois o mais certo é que se encontrava em companhia de Antonio não poucas horas antes do seqüestro, e sim em 14 de outubro, na noite anterior, por ocasião do segundo incidente.
Revisão histórica — Narrado e perpetuado de maneira incompleta, lacunar e distorcida pelo trio de pesquisadores – Martins, Fontes e Bühler – que monopolizaram e ocultaram o caso durante mais de uma década, todos os que vieram em seguida continuaram endossando-o e reproduzindo-o fielmente, sem discordar de nenhum detalhe. Muitos aproveitaram para inserir nesses intervalos suas opiniões pessoais ou grupais que, por malícia e convicção própria, desejavam conferir ao Caso Villas Boas. Isso desvirtuou ainda mais o que já se ia distanciado da fonte original, entre tantos hiatos e subentendidos. E acabou por tornar quase impossível ao leitor leigo e comum – e mesmo ao pesquisador experiente – averiguar a veracidade ou falsidade das afirmações, porque, para tanto, seria preciso elidir todos os pontos cerzidos, o que requer o domínio de técnicas bastante complexas e sofisticadas.
Se o Caso Villas Boas, que é tido como um dos mais completos e bem pesquisados de todos os tempos, apresenta tantas incongruências, o que dizer dos outros? Esta é uma situação alarmante, sem dúvida, e é inequivocamente a situação da Ufologia Mundial, principalmente da Brasileira, que padece de recursos, de profissionalismo e de pesquisadores gabaritados. Poderíamos buscar as causas remotas desse estado de coisas na progressiva deterioração de nossa educação, cultura e idioma, e mesmo na dilapidação de nossos valores éticos e morais. Mas, deixando para outra hora essas críticas e denúncias, limito-me a observar que as confusões desnorteantes e nebulosidades dissolventes, inerentes aos casos ufológicos, não podem jamais ser tomadas e aceitas em seu estado puro. Antes, devem ser checadas cada terminologia empregada e cada conjunto de esquemas expositivos mais ou menos estereotipados e padronizados.
Cabe observar, logo de saída, que Antonio Villas Boas foi estereotipado na figura de um lavrador simplório, rude, pobre, analfabeto e ignorante, talvez porque dessa maneira ganharia um sentido uniformemente apreensível e proporcionaria uma intimidade e uma identificação imediata e pessoal com o público. Os ufólogos foram induzidos a imaginarem um homem que jamais poderia ter inventado uma história como essa, já que não possuiria cabedal, capacidade, nem tampouco referências suficientes para tanto. Ora, o verdadeiro Antonio Villas Boas era diferente do imaginado. Se, por um lado, não era rico e nem tampouco moderno e urbano, por outro também não era assim tão pobre e rude quanto nos quiseram fazer crer. Filho dos fazendeiros Jerônimo Pedro Villas Boas (1887-1963) e Enésia Cândida de Oliveira (1897-1963), pertencia a uma família tradicional e influente em sua região, tanto que seu irmão Delpides Villas Boas (1914-1991) entrou para a história local por ter participado ativamente do processo de emancipação do distrito de São Francisco de Sales, concluído em dezembro de 1962.
E se, por um lado, Villas Boas não era letrado, por outro também não era analfabeto, embora seus estudos estivessem muito atrasados – por isso fazia um curso tipo supletivo por correspondência para concluir o primeiro grau. Odércia disse que ele preferia ler e estudar a trabalhar na lavoura, tanto que possuía uma pequena coleção de livros. Enfim, inúmeros são os detalhes a serem corrigidos e acrescentados à história, mas vamos deixar que os próprios entrevistados, em viva voz, façam isso [Ver a íntegra das entrevistas no livro Contatos Sexuais com Extraterrestres, a ser lançado em breve pela coleção Biblioteca UFO]. Um dos principais refere-se à mulher que manteve intercurso sexual com Villas Boas. Ao contrário do que até hoje se propala, ela não era propriamente uma beldade. Longe disso, era bastante feia e até repulsiva, conforme retificaram todos os familiares do abduzido que entrevistei, tanto por telefone como pessoalmente, em 2002.
Levado a uma base secreta — Eles confirmaram, ainda, terem vist
o as marcas de pouso deixadas pela nave alienígena no solo da fazenda. Estive na propriedade e constatei que parte dela e o local exato da aterrissagem estavam inundados pelo menos desde a visita de Álvaro Fernandes, 25 anos antes. Os familiares confirmaram também o fato, amplamente difundido na Ufologia Mundial, de que Villas Boas teria sido levado pela NASA [Criada em 1958, ou seja, alguns meses depois do caso] ou alguma agência de espionagem a uma base secreta nos Estados Unidos, um local repleto de UFOs acidentados ou construídos pelos cientistas terrenos aproveitando tecnologia alienígena.
Além disso, acrescentaram uma série de informações ao Caso Villas Boas. Como o surgimento de fenômenos parapsicológicos, fantasmagóricos e luminosos na fazenda antes e depois do episódio, bem como detalharam as seqüelas sofridas pelo abduzido nas semanas seguintes ao rapto. Entre elas estavam náuseas, vômitos, perda de apetite, dores de cabeça na região das têmporas, ardência nos olhos, insônia e depois sonolência excessiva. Villas Boas também sofreu de nervosismo, depressão, feridas nos antebraços e nas pernas, manchas amareladas no rosto etc. Muitos destes sintomas nunca foram mencionados pelos ufólogos que trataram do caso, que se limitaram a reproduzir o que ouviam de outros.
Ainda que tenha se casado, concebido filhos e se formado em Direito, exercendo por muitos anos a profissão de advogado, a verdade é que Antonio Villas Boas jamais readquiriu o mesmo vigor de antes. Tampouco se livrou dos traumas advindos do contato com aqueles seres extraterrestres, tanto que faleceu relativamente jovem, em 17 de janeiro de 1991, com apenas 56 anos. O atestado de óbito emitido pelo Cartório de Registro Civil de Uberaba (MG), cidade onde vivia, aponta como causa mortis “hemorragia subaracnóidea, aneurisma da artéria basilar e hipertensão arterial”. Na mesma cidade, localizei o túmulo de Villas Boas no Cemitério Municipal São Judas Tadeu, próximo do mausoléu do célebre médium espírita Chico Xavier (1910-2002). Como não há nenhuma placa indicativa, os desavisados que passam por ali nem sequer desconfiam que ali jaz o primeiro abduzido da Era Moderna dos Discos Voadores. Eis uma tremenda negligência e um triste anonimato para alguém que teria sido vítima de estranhas manipulações genéticas por parte de seres de outro planeta.
Silenciosamente, de pé diante daquele túmulo despido de qualquer ornamentação, epígrafes ou epitáfios a invocar a memória de tão ilustre figura, não pude deixar de perguntar: quantos outros Villas Boas, quantas outras histórias tão fantásticas – e verídicas – ainda estariam ocultas e esquecidas por trás da cortina de silêncio que foi estendida, por vários interesses de diferentes ordens, sobre o fascinante enigma dos UFOs? Quantos Antonios Villas Boas já não estariam enterrados e a essa altura, todos completamente esquecidos, até mesmo por seus familiares?
Se nas últimas décadas o Caso Villas Boas tem desafiado e resistido a todos os exames críticos, deixando os céticos perplexos e abalando até suas sistemáticas incredulidades e inamovíveis renitências, é porque, para assombro de todos, além das seqüelas em seu corpo, Villas Boas apresentava sintomas típicos de alguém que tivesse sido exposto a uma radiação moderada – suficiente para alterar-lhe o equilíbrio orgânico por algum tempo, conforme consta de sua ficha clínica. Ainda que fosse um mentiroso extremamente hábil, um mistificador dotado de uma imaginação admirável, uma memória superdotada – já que manteve a história inalterada nos menores detalhes – e de uma inteligência rara, a testemunha teria que se expor a radiações em doses suficientes para causarem sintomas convincentes.
Sem frustração sexual — Segundo a alegação de alguns céticos, será que algum complexo de inferioridade ou quaisquer frustrações sexuais teriam movido Antonio Villas Boas a inventar toda aquela história? Tal possibilidade não se sustenta, em vista do resultado do exame psicológico feito por Olavo Fontes. Ele era um rapaz tímido e reservado, mas isento de complexos e psicoses produzidas por frustrações. Durante toda sua vida ele continuou afirmando que o incidente se deu conforme foi por ele descrito. Além disso, não queria saber de mais nada a respeito do tema Ufologia.
Se Villas Boas foi de fato usado para fins de procriação, caberia perguntar se aquela mulher seria um exemplar feminino pertencente à mesma raça dos tais estranhos seres, cuja procedência ignoramos? Ou seria uma mulher daqui da Terra mesmo, modificada ou não, igualmente abduzida e induzida ao ato sexual? No primeiro caso, haveria a geração de um híbrido. No segundo, de uma criança terrestre. Em ambas as situações, os seres teriam a oportunidade de verificar e monitorar como os humanos se relacionam sexualmente, e de usar a criança daí resultante – híbrida ou terrestre – como cobaia para novos experimentos e manipulações. Por sobrarem dúvidas e faltarem respostas é que só podemos conjeturar. Villas Boas não viu nenhum dos outros seres sem os escafandros que os cobriam quase que totalmente, e dessa maneira ficou impossível saber se eram semelhantes àquela mulher.
De qualquer forma, a fêmea se expressava por meio dos mesmos grunhidos ou rosnados incompreensíveis com que se comunicavam os outros tripulantes entre si. Ela respirava o mesmo ar que Villas Boas respirava. Isso eliminaria a necessidade dos escafandros para os outros tripulantes, se eles fossem da mesma origem. Então, das duas uma: ou não tinham a mesma procedência, ou usavam os escafandros para se protegerem e não se contaminarem – nossos cientistas e técnicos em recintos e laboratórios esterilizados fazem o mesmo. Há outra opção: usavam aquelas vestimentas simplesmente para não serem vistos tais como eram. Cabe observar, todavia, que no compartimento em que a fêmea permaneceu sem escafandro, o ar estava misturado com aquele gás mal-cheiroso mencionado por Villas Boas, e que lhe provocara náuseas e vômito. Nesse caso, seria um gás descontaminante ou um componente que permitiria à mulher respirar sem escafandro, sendo ela da mesma origem dos outros seres?
A estranha mulher não era muito diferente de uma terrestre, nem mesmo por seu tamanho um tanto pequeno, uma vez que mulheres miúdas e de baixa estatura não constituem propriamente uma anormalidade. As maçãs do rosto muito sobressalentes, os olhos grandes e excessivamente puxados, o queixo pontudo e o cabelo liso, bem como outras de suas características, que a tornavam “feia” para Villas Boas, podem ser encontradas em algumas das raças de nosso planeta. A pele da
mulher era muito branca e tinha muitas sardas nos braços, o que também não representa nada de extraordinário. Não exalava nenhum cheiro especial nem usava qualquer espécie de maquiagem. Suas atitudes também não apresentavam anomalias, a não ser que não falava em linguagem corrente discernível e parecia desconhecer o beijo.
Ainda que bem detalhados, esses dados não permitem inferir qualquer conclusão definitiva sobre sua origem. Exceto que aqueles seres levaram a contento um seqüestro bem planejado e, ao colocarem Villas Boas a sós naquele compartimento com a mulher, conseguiram o que aparentemente desejavam, ou seja, uma experiência de procriação entre um homem da Terra e uma cobaia – terrestre, extraterrestre ou híbrida. O Caso Villas Boas, a despeito de suas incongruências, apresenta vários elementos que, se não levam à uma afirmação categórica de sua veracidade, pelo menos levam à consideração dela. Não só por ter sido aquele que inaugurou a modalidade dos seqüestros ou abduções alienígenas em tempos modernos, mas principalmente pela riqueza de detalhes que contém, ainda que um tanto exagerados. Ele nos permite identificar várias estruturas comuns subjacentes aos casos do gênero, bem como certos conteúdos latentes.
“Zona quente de aparições” — Entre estas estruturas está a geografia física e política de São Francisco de Sales, que na época não passava de um distrito e se afigurava como um acanhado lugarejo perdido nos confins de Minas Gerais, margeado pelo Rio Grande, que inundaria parcialmente a fazenda onde se deu o seqüestro. Como também a organização social, familiar e econômica de Villas Boas, além de seus elementos culturais. Nada disso destoa do que se encontraria nos casos subseqüentes, a não ser em termos pontuais e estritamente regionais e particulares, pois, em geral, os ufonautas pareceram sempre preferir ou escolher para suas experiências de manipulação indivíduos que atendam a essas exigências ou estejam inseridos em contextos similares.
Observe o leitor que três dos principais casos de abdução alienígena seguida de relação sexual – o do próprio Villas Boas, o de Onilson Pátero e o de Antônio Carlos Ferreira –, ocorreram na mesma região compreendida entre a fronteira sul-sudoeste de Minas Gerais e norte-noroeste de São Paulo. Essa região cortada pelo Rio Grande é, aliás, uma das mais ricas do Brasil em manifestações ufológicas, constituindo-se no que os ufólogos chamam de “zona quente de aparições”. É patente que a proximidade de um rio tão caudaloso tem muito a ver com essa profusão, pois ou os UFOs se ocultariam em suas águas, ou por algum motivo que desconhecemos prefeririam se deslocar e concentrar suas ações às suas margens. Os antigos já haviam notado isso. Basta observar que, na literatura grega, toda área limitada ou circundada por mares ou rios evoca o perigo da “interferência do divino”. Lugar natural da violência inesperada, constitui o palco privilegiado do rapto, tanto por parte dos homens como parte dos deuses e das criaturas sobrenaturais.