Relegada ao panteão dos contatados que surgiram no início da década de 50 no bojo do perigo nuclear, da paranoia da Guerra Fria e das primeiras incursões do homem pelo espaço, a pintora portuguesa e colunista de ciência de um jornal carioca Alex Madruga, merece hoje ser reconduzida ao seu verdadeiro lugar na história. Isso porque, apesar de não ter escapado à influência de outros contatados, como George Adamski e Dino Kraspedon, e de filmes de ficção científica, principalmente O Dia em Que a Terra Parou, já antecipava o que hoje conhecemos como “visitas ou sequestros de dormitório”, modalidade que só bem mais tarde viria a caracterizar, como o próprio termo denota, uma das modalidades de abduções. Além disso, foi uma das primeiras pessoas a alegar ter sido colocada deitada sobre uma espécie de mesa de operações a bordo de um UFO — o que virou rotina em relatos de abduzidos de anos seguintes — e toscamente anestesiada por um aparelho que desceu do teto da nave.
Apenas para lembrar aos leitores, a era das abduções só se iniciou oficialmente com o rapto do casal inter-racial norte-americano Barney e Betty Hill, em 19 de setembro de 1961. Até então, o panorama foi quase inteiramente dominado pelos contatos de cunhos religiosos e messiânicos, aqueles dos altos, loiros e benevolentes “irmãos do espaço”. Mas a partir do sequestro dos Hill o cenário começaria a ceder lugar à violência e ao sadismo dos baixinhos e sombrios alfa-cinzentos, os grays, culminando com a febre de abduções que acometeria o mundo nas décadas de 80 e 90. Alex — que tem nome de homem, mas era uma linda mulher — se situa a meio caminho entre Adamski e os Hill. Se de um lado os seres descritos ainda são do tipo angelical e pacifista, do outro o comportamento dissimulado e invasivo e a presença de um monstruoso robô com “face de tamanduá e corpo parecido com uma rã apoiada nas patas traseiras”, como foi descrito pela abduzida, prenuncia uma dramática e iminente transição.
A maneira como reagiu após ter retornado da viagem de algumas horas que acreditava ter feito até o nosso vizinho planeta Vênus, também mais aproxima Alex Madruga dos abduzidos do que dos contatados propriamente ditos. Longe de sair propalando mensagens de advertência e de salvação à humanidade com vistas a fundar uma seita mística, e antes de qualquer coisa, duvidou de sua própria sanidade a ponto de procurar psiquiatras para que a examinassem — andou de consultório em consultório por não achar verossímil a aventura que empreendera. Os médicos, porém, foram unânimes: poderia ter sido uma alucinação, mas Alex não apresentava nenhum traço de desequilíbrio ou loucura, nada que indicasse padecer de males psíquicos.
Um ser misterioso e soturno
A partir da longa entrevista concedida ao jornalista Roberto Botelho da Costa — que em uma noite chuvosa de novembro de 1963 viria a testemunhar a aparição de um UFO de cerca de 15 m de diâmetro do topo de um pequeno morro em uma vasta área despovoada do bairro de Guaianazes, extremo leste da cidade de São Paulo —, seu companheiro de profissão, o jornalista, professor universitário, astrônomo amador e ufólogo A. S. August, produziu uma sensacional matéria, da qual nos valemos [O texto foi intitulado Vê Disco em Guaianazes e saiu no suplemento especial O Estranho Mundo dos Discos Voadores, do Diário Popular, em setembro de 1967]. O caso de Alex Madruga é fascinante e procuramos reproduzi-lo aqui em sua forma original. Interromperemos somente naqueles pontos em que comentários e observações se façam necessários.
Era fevereiro de 1958 e em uma casa de uma rua central de Angra dos Reis, cidade a 150 km da capital do Rio de Janeiro, aos 30 minutos do dia 22, todos dormiam e apenas Alex ainda não havia se recolhido ao leito. Ela ouviu passos no terraço que lhe pareceram estranhos porque não podia haver ninguém acordado àquela hora. Teve medo de ser um ladrão, quem sabe até mesmo um assassino, mas o intruso aproximou-se misterioso, soturno, alheio ao terror que a invadiu. Em frente à janela, de costume aberta devido ao calor daquela época do ano, o ser parou e fez-se um silêncio mais aterrador ainda para Alex.
Alex se arma de coragem, olha o estranho atentamente fixando-o por aquele ponto distante e retangular por onde penetra o escuro da noite, no qual se destacou um vulto alto, esguio, de rosto oval e olhos dotados de um brilho diferente. Semiparalisada, ouve, então, sua voz dizer: “Não precisas ter medo!” Mas Alex queria saber de onde vinha aquilo: “Quem é você?”. A pergunta, porém, perde-se no vácuo como se ele não tivesse ouvido. Ele a olha firmemente e estende-lhe o braço com a mão espalmada, da qual deflui algo esquisito que a penetra contra sua vontade, roubando os movimentos de Alex e fazendo seu corpo perder peso. Ato contínuo, ela vê o estranho transpor a janela e caminhar em sua direção, cada vez mais a impossibilitando de reagir. Já bem perto, Alex sente seu corpo levitar sob a mão direita do ser, que a conduz janela afora em direção do terraço.
Anulação da gravidade
Entretanto, sua consciência ou lucidez persiste, e ao chegar adiante sofre novo golpe, pois distingue próximo dali um objeto esférico circundado por uma plataforma, imitando a aba larga de um chapéu. Paralisada, já então quase também em sua consciência, observa o homem ao seu lado, a quem não interroga e não sabe bem por que sente que lhe invade uma sensação de confiança — ele representa uma figura juvenil, de idade indefinida, olhos claros, nariz reto, lábios finos e bem talhados. Veste uma malha cuja tonalidade e corte se confundem com as linhas do corpo. De súbito ele bate com um pé de encontro ao outro. Alex ouve um ruído semelhante ao do cristal em choque, acompanhado da ideia de que a gravidade fora anulada e ambos flutuam.
É no mínimo interessante verificar aqui que no clássico livro infantil O Mágico de Oz, do norte-americano Lyman Frank Baum, publicado em 1900, bem como no filme homônimo que Victor Fleming dirigiu em 1939, a sonhadora garotinha Dorothy Gale, para retornar da fantástica Terra de Oz à sua casa no Kansas, também bate um contra o outro seus pés calçados com sapatinhos de rubi, presenteados por uma fada, ao que é imediatamente teletransportada. A sensação de deslocamento experimentada por Dorothy ao ser arrebatada do Kansas e levada para a Terra de Oz se parece com as
sensações experimentadas por pessoas raptadas por UFOs. A Estrada de Tijolos Amarelos, o Campos de Papoulas Mortíferas e a Cidade Esmeralda, bem poderiam ser paisagens de um outro planeta ou dimensão.
O chamado ‘Efeito Oz’ é uma sensação de ausência de tempo e de isolamento em que a testemunha sente ter sido sugada pelo UFO para uma espécie de vácuo onde apenas coexistem ela e o fenômeno, uma situação rotineira
A ufóloga britânica Jenny Randles afirmou em seus estudos que as vítimas de abdução sentem o que ela chama de “Efeito Oz”, uma sensação de ausência de tempo e de isolamento sensorial em que a testemunha sente ter sido sugada pelo UFO para uma espécie de vácuo onde apenas coexistem ela e o fenômeno. Isso provavelmente ocorre quando uma pessoa em estado de vigília confere a uma situação natural uma interpretação sobrenatural, manipulando subjetivamente a realidade objetiva. O detalhe dos pés que batem um contra o outro acionando magicamente algum tipo de mecanismo que conduz a uma nova realidade ou situação revela o quanto as fábulas e os contos de fada influenciaram poderosamente e passaram a integrar e estruturar o repertório cultural do Fenômeno UFO. Mas voltemos ao caso de Alex Madruga.
Um autômato no disco
A anulação da gravidade permite que ela se erga sozinha e de forma a deslizar em direção a um ponto de atração que se situa no objeto voador não identificado, de portas escancaradas e parado a uns cinco metros de distância. Mal chega ao seu interior e a porta se fecha rapidamente. Ela então vê que sobre o centro do piso há duas cadeiras unidas pelo espaldar, senta-se em uma delas meio automaticamente, ao mesmo tempo em que verifica que na outra há alguém que não é o ser que a trouxe para ali, mas um autômato com vestimenta própria às longas viagens aéreas. Percebe também que essa figura é mais assustadora do que tudo que até ali lhe fora dado presenciar: cabeça, braços, pernas, tudo recoberto por uma espécie de escamas sobrepostas. Sua face é muito parecida com a de um tamanduá, inclusive com tromba, o que sugere a Alex Madruga ser um depósito de oxigênio solidificado.
Para maior susto da abduzida, o estranho ser lhe chama a atenção por meio de sinais, comunicando que ia ser feita a ligação entre a esfera e a plataforma que a rodeia. Esta última, a seguir, passa a girar em grande velocidade, enquanto a esfera permanece imóvel. Não há painéis de comando, apenas, em uma linha horizontal nas paredes da esfera, uns buracos semelhantes a janelas. Abaixo, projetam-se em uma tela, como se vindas do exterior, imagens de pequenas cidades. Em um instante, assombrada, ela percebe que o UFO voa sobre um lugar que em nada se parece com os que conhece na Terra — em cada uma das ditas cidades há casas de formatos circulares e quase rentes ao solo, com uma cobertura de leve forma cônica que brilha com o reflexo da Lua cheia. Não há janelas nem portas nelas, apenas umas aberturas em linha oblíqua indo para o subsolo. Em dado momento Alex divisou uma porção de criaturas em uma cidade edificada sobre uma encosta sem vegetação, que reluz como prata polida. Dão a impressão de formigas saindo e entrando em formigueiros.
Daí por diante não teve dúvidas em admitir que já estava em outro mundo. Vêm à sua mente, então, a lembrança dos seus parentes e amigos, e a ela se alarma com aquilo — quer sair dali e voltar à Terra, e por isso grita e se debate, mas ninguém a ouve nem a atende. Seu pânico cresce e com ele Alex vê que uma campânula desce do teto e a envolve. Logo depois sente um torpor que a invade, como se fosse um anestésico. Ao despertar, verifica estar deitada e torna a gritar: “Onde estou? Que lugar é este? Que faço aqui?” Na verdade, estava no interior de uma sala e acompanhada apenas daquele homem que, em posição estática, a observa detidamente. Alex o interroga infrutiferamente, fala de modo imperioso para que responda. O mutismo dele, porém, tem outro sentido, pois logo expele pelos olhos uma coisa igual à fumaça e que a pouco a pouco começa a modelar palavras e depois frases. Ela lê no ar: “Não precisas te preocupar em saber onde te encontras”.
Robô com forma de rã
Seguiu-se um novo diálogo com um ser parecido com um robô, que em certo momento disse à Alex Madruga: “Pensa-se emitindo ondas, da mesma forma que uma estação de rádio ou de televisão. Essas ondas, ao caminharem pelo espaço, são por nós captadas”. “Mas qual é a finalidade disso? Posso saber por que fazem essas pesquisas?”, interroga Alex. “Não há nenhum segredo. Agimos na organização de um plano. Assim, sabemos tudo que queremos sobre a maioria das pessoas importantes que vivem na Terra ou em qualquer outro planeta”. Essa foi a última lição que Alex recebeu do estranho robô, que era parecido com uma rã estranhamente apoiado nas patas traseiras. Depois, quando deu por si, estava outra vez no salão em que fora introduzida inicialmente.
Levada pela curiosidade, dirigiu-se a um dos seres que ali estavam e perguntou: “Podem me explicar por que se preocupam, por que não deixam o povo da Terra se destruir a seu modo, se é isso que parece que tanto queremos?” O ser lhe respondeu que fazem isso por diversas razões — e uma delas, a mais importante, diz respeito ao desequilíbrio de nosso planeta. “A sua possível desintegração iria fatalmente atingir todo um sistema”. Alex retrucou: “Nesse caso, por que, em vez de me preocuparem, não procuram os cientistas ou os governos das nações?” O curioso ser extraterrestre respondeu de forma inusitada: “Gostaríamos de fazê-lo, mas não vemos meio de nos entendermos com aqueles que não são capazes de entenderem uns aos outros. Assim como não podemos impor a força ou a violência, também não podemos dar vantagens a uma nação sobre outra e nem podemos servir a interesses partidários ou egoísticos”.
ga sido levada?
Essa última fala, bem como o design do disco, o robô, o propósito de advertência da missão etc, remetem ao clássico já citado O Dia em Que a Terra Parou. Mas não estava acabada a experiência de Alex Madruga. Na sequência, o instrutor fez uma breve pausa e disparou: “Também não vemos nenhuma razão prática para procurar seus cientistas. Para que o faríamos? Para ensinar-lhes os nossos segredos? Para armá-los mais fortes contra nós?” A uma série de indagações de Alex, todas envolvendo questões ligadas às viagens interplanetárias, o ser que ela presumia venusiano retrucou com veemência, sendo esta a sua expressão mais contundente:
“Lamentamos não te poder dar mais explicações sobre o assunto, pois sabemos que é bastante esperta. E enquanto vocês não atingirem um grau de comportamento bastante diferente do atual, precisaremos manter-nos protegidos contra o avanço da sua irresponsabilidade. No entanto, diz àqueles que a procurarem pedindo explicações que as aves nos serviram orientação para realizarmos a ambição de nos erguermos atravessando o espaço. A dificuldade está em um ponto bastante distante. Por sua natureza, a Terra, assim como todos os outros planetas, é uma nave percorrendo o espaço. Ela é o molde a ser copiado, naturalmente com as modificações necessárias aos diversos interesses”.
O diálogo de Alex Madruga com o ser extraterrestre se torna cada vez mais interessante, segundo ela se recorda e registra para depois narrar ao citado jornalista. Mais adiante, o ET diz que em volta de suas naves, ocultando-as, muitas vezes é visto um amplo clarão vermelho, e que estudando a reação que à atmosfera dá essa cor é que eles podem ter um ponto de partida. “O verde, também visto, é outra cor provocada por tais reações. E não pense ser o vermelho, a auréola das nossas naves, incitado por altas temperaturas. Pelo contrário, é um dos efeitos produzidos ao anularmos o atrito. O nosso combustível são as leis da natureza, que usamos sem alterar”. Alex também teve seu momento no diálogo: “O mistério de vocês e das suas naves, o poder de desenvolverem velocidades tão absurdas e atravessarem distâncias tão grandes, é para nós algo fantástico”.
Aparelho circulatório espacial
O suposto venusiano responde que o mistério se dá por falta de conhecimento de nossa parte, pois suas naves não desenvolvem velocidade, apenas anulam os opostos e pela contração deles é que se deslocam no espaço, atraindo de maneira quase instantânea pontos remotos ou, então, usando os caminhos magnéticos. “Desculpe a minha ignorância, mas o espaço não é todo igual?”, perguntou Alex. “Não, no espaço há enormes desigualdades, principalmente na área adjacente aos planetas, onde existem faixas de força, túneis, canais etc. É um complexo aparelho circulatório que vocês precisarão conhecer”. Ele então se cala, dirige os olhos para longe e depois se volta para Alex dizendo: “Está na hora. Você não pode demorar mais, me acompanhe”. E seguem pelo que lhe pareceu ser o mesmo caminho do bosque, tendo sempre ele ao lado. De repente Alex ouve um som estranho e surge um cone de luz no ar, quando ela sente um estado de fuga tal como se fora lhe abandonar a consciência.
Gostaríamos de procurar seus governantes, mas temos como nos entender com aqueles que não são capazes de entenderem uns aos outros. Assim como não podemos impor a força, também não podemos dar vantagens a uma nação sobre outra
Diante da estranha sensação, ela pergunta onde está e o que está ocorrendo. “Não vejo nada. Estou cega!” E o ser, que ainda está perto dela, lhe responde: “Você está em Angra dos Reis, mas não está cega. Esta é apenas uma reação momentânea sem maiores consequências. Não precisa se preocupar, pois passa logo”. Ela então se deu conta de que já estava de volta à Terra e à sua cidade. “Oh, não! Quer dizer que já estou de volta?” “Sim, se demorássemos mais onde estávamos as pessoas dariam pela tua falta, e daqui a poucos minutos você deve descer, pois já tem alguém se levantando e indo para a cozinha da tua casa”. E despediu-se.
Disco acinzentado
O extinto jornal paulista Diário da Noite, que cobriu a conferência proferida por Alex Madruga no auditório do Ministério da Educação, em São Paulo, no final de maio de 1959, considerou a história tremendamente semelhante ao “argumento de um filme em série norte- americano”, conforme foi publicado. Entre os detalhes acrescentados, o que nos soa mais revelador é o fato de ela ter admitido que, pouco antes de viajar para Angra, havia acabado de ler o livro Contato Com os Discos Voadores, de Dino Kraspedon [Veja artefato nesta edição], e que por isso desejara mentalmente o auxílio oferecido pelos seres do espaço. Sobre o estranho animal que lhe surgira repentinamente, disse que era “vermelho, semelhante a um polvo com cinco tentáculos de mais ou menos um metro e meio, ou talvez mais, com o rosto liso, sem boca nem nariz e com olhos azuis que, todavia, apresentavam expressão humana”.
Sem que ainda tivesse se refeito do susto que a experiência lhe proporcionou, disse que “o animal passou a sofrer radical transformação — aos poucos, foi tomando forma humana até transformar-se totalmente em um homem”. Explicou que o aparelho que a conduziu apresentava a forma de um disco, era acinzentado e quase transparente, e que as casas no planeta que visitou eram todas de pedra negra, cercadas de árvores e de grama de um verde bem forte. Por fim, Alex Madruga procurou corrigir a origem dos seres, uma vez que, se tivesse sido levada pelo espaço, na atmosfera terrestre a luz seria dirigida, mas lá onde esteve a claridade era difusa, de alta luminosidade. “Tenho a impressão de que estive, em verdade, no interior da Terra”. Isto nunca poderemos confirmar.