Durante anos, nas entrevistas exclusivas da Revista UFO, ufólogos de várias partes do mundo exprimiram seus pensamentos, suas filosofias de estudos e métodos de trabalho, apresentando também aqui casos ufológicos dos mais diversos tipos e graus ocorridos em suas nações e com os quais tiveram envolvimento. Também discutiram a vasta fenomenologia ufológica, a participação que atribuem aos pesquisadores e às testemunhas nesse contexto, sejam elas civis ou militares, e como veem o futuro da pesquisa ufológica.
De Portugal, terra natal do nosso convidado desse mês, também já tivemos a oportunidade de conhecer as ideias de ilustres ufólogos, como o doutor Joaquim Fernandes e o ex-professor de física e atual tarólogo Paulo Cosmelli, que nos deram informações valiosas sobre os rumos que está tomando a Ufologia Lusitana. Fernandes, ufólogo decano e correspondente internacional da Revista UFO, é especialista em aparições marianas — como a de Fátima, de 1917 — e sua relação direta com os extraterrestres [Veja UFO 157, agora disponível na íntegra em ufo.com.br]. E Cosmelli, consultor da publicação, é também membro da Ordem dos Cavaleiros Templários e estudioso da presença alienígena na Terra em diversos aspectos envolvendo sociedades iniciáticas secretas [Veja UFO 164, idem].
Imparcialidade e rigor científico
Dessa vez apresentamos aos leitores outro ufólogo da primeira linha da Ufologia do país irmão — mas que, ao contrário dos anteriores, representa a nova geração que surge em Portugal, voltada à questão ufológica. Apesar de ter apenas 29 anos, Nuno Montez da Silveira já se destaca em toda a Europa por seu brilhante trabalho e é respeitado por seus pares devido principalmente à imparcialidade e à metodologia rigorosamente científica que adota em seus trabalhos. Natural de Lisboa, advogado e pós-graduado em ciências políticas, Montez da Silveira teve a oportunidade de cursar um semestre do curso de direito em Curitiba, onde pôde conviver com diversos colegas da Comunidade Ufológica Brasileira e participar de eventos como o I UFO Minas e do 30º Congresso Brasileiro de Ufologia Científica, ambos em 2004.
Creio que a Ufologia devia ser praticada única e exclusivamente por vias científicas e por profissionais de várias áreas, como as ciências matemáticas e as sociais, por exemplo (…) Está na hora de a Ufologia se profissionalizar, de ser criada uma disciplina para lidar com o assunto nas faculdades ou, pelo menos, em institutos reconhecidos.
De volta a Portugal, em 2005 fundou a Sociedade Portuguesa de Ovnilogia (SPO), da qual é presidente até hoje. Nuno Montez da Silveira é autor de diversos artigos na área, publicados em revistas de todo o mundo, e realiza palestras regularmente em seu país e outros. Participou incontáveis vezes de programas de rádio, televisão e de internet em rede nacional em Portugal, sendo cotidianamente requisitado para eles por seu senso crítico apurado e seriedade com que aborda o tema. Para Montez da Silveira, não importa que se afirme a procedência extraterrestre dos UFOs — o ufólogo quer se manter imparcial, separar as certezas e opiniões pessoais da pesquisa analítica e sustentável. Desde 2008, quando escreveu extenso artigo a respeito da casuística portuguesa aos nossos leitores [Veja edição UFO 142, idem], o ufólogo faz parte do Conselho Editorial da publicação, atuando como consultor em seu país e por toda Europa. Agora, nos brinda com essa interessante entrevista.
Imprensa, ciências e paraciências
Em muitos textos lusitanos sobre Ufologia vemos os UFOs serem tratados como fenômenos aéreos não identificados (FANI), algo semelhante a objetos voadores não identificados (OVNIs). Por que o termo foi adotado pelos ufólogos portugueses? FANI nada mais é do que a tradução da sigla UAP, que vem do termo em inglês unidentified aerial phenomena, utilizado pela National Aviation Reporting Center on Anomalous Phenomena [Centro Aeronáutico Nacional de Registros de Fenômenos Anômalos, Narcap], dirigido pelo doutor Richard Haines. Embora seja um termo mais apropriado para definir o fenômeno, ele não é utilizado em grande escala pela Ufologia Portuguesa — que, em geral, por motivos históricos e tradicionais, continua usando naturalmente a sigla OVNI ou UFO. E digo que FANI seria o mais correto porque não pressupõe a existência de um objeto material, de algo sólido. Na realidade, em muitas observações ufológicas são vistas meras luzes, que podem ou não ser objetos físicos.
Você acha que revisar a sigla ajudaria os ufólogos na hora de classificar os casos? Creio que o problema vai mais além e que a Ufologia necessita de uma revisão geral, da unificação e padronização de termos e metodologias, como forma de dar uma resposta mais completa às grandes exigências requeridas na investigação desse importantíssimo fenômeno.
De modo geral, o que pensa a imprensa portuguesa com relação ao Fenômeno UFO? Ele é muito aceito em seu país? Vejo que a postura da mídia portuguesa quanto ao tema tem mudado ultimamente. Se antes ela podia ser um pouco preconceituosa com o assunto, nos últimos anos nossa imprensa tem tido uma abordagem cada vez mais imparcial e objetiva em relação ao mesmo. Penso que essa atitude é resultado, em grande parte, dos esforços da Sociedade Portuguesa de Ovnilogia (SPO) em honrar a seriedade do assunto. Quando conversamos com um jornalista e lhe apresentamos nosso trabalho e como foi realizado, e lhe transmitimos apenas fatos ao invés de hipóteses — muitas delas sem qualquer cabimento ou correspondência com a verdade —, o profissional percebe que o Fenômeno UFO é coisa séria e isso transparece na reportagem que faz.
Excelente. No entanto, os jornalistas em geral se mostram leigos e desinteressados quanto ao assunto, ou parece que preferem matérias sensacionalistas, que lhe darão mais audiência. O que acha disso? Bem, nas dezenas de entrevistas e reportagens em rádios, televisão ou imprensa escrita de que participei, as situações em que o nosso trabalho foi deturpado foram poucas — e na maioria delas por incapacidade do profissional, por ser leigo e achar que em poucas horas pode perceber e assimilar um tema tão complexo como o Fenômeno UFO. Acho que, quando vão aos meios de comunicação, os pesquisadores têm o dever de exigir uma cobertura séria e de usarem o direito de resposta quando virem seu trabalho ser desvirtuado e o assunto transformado em alvo de escárnio.
Mudança de conceitos
E a população? De que forma a sociedade portuguesa tem assimilado a realidade dos discos voadores? Percebo que as pessoas aceitam com facilidade a existência dos UFOs, mas, tal como a imprensa, consideram que a sigla é sinônimo automático de nave espacial, o que em minha opinião é um erro.
Como a SPO auxilia na compreensão do tema e esclarece essas dúvidas? Um dos grandes objetivos de nossa entidade, através das suas participações em diversos programas, é incentivar a discussão sadia, o pensamento crítico e a mudança de conceitos sobre o tema, que parece cada vez mais fundamental na nossa área. Não é aceitável que em 64 anos de Ufologia continuemos presos às mesmas ideias e paradigmas de décadas atrás.
Poderia apresentar aos leitores da Revista UFO os integrantes de seu grupo? Nesse momento, a diretoria da SPO é composta por três membros, além de mim. Entre eles está Carlos Teixeira, cientista licenciado em biologia e mestre em biologia da conservação, Filipe Gomes, que tem conhecimento enciclopédico da casuística ufológica portuguesa, e Pedro Faria, estudante de matemática em uma das instituições de ensino mais prestigiadas de Portugal. Teixeira possui profundo conhecimento da vida em nosso planeta, tendo participado de uma iniciativa europeia que teve por objetivo planejar uma missão de pesquisa de vida extraterrestre no Sistema Solar. Gomes tem uma capacidade extraordinária para investigar e identificar a origem de grande maioria dos relatos que nos chegam. E Faria tem uma curiosidade e uma seriedade que fazem dele um ótimo investigador, sendo muito úteis seus conhecimentos em estatística quando necessitamos de dados objetivos sobre o Fenômeno UFO em terras lusas.
A entidade tem ainda um quadro filiativo aberto? É claro que, além da diretoria, a entidade conta com pessoas de experiências valiosas trabalhando conosco pontualmente, trazendo seus conhecimentos e talentos específicos na investigação dos casos que nos chegam. Essencialmente, temos uma equipe pequena, mas sólida e coesa, com enorme capacidade de trabalho e um desejo genuíno de pesquisar, contribuindo na medida do possível para uma investigação séria e não dogmática dos UFOs. Sobretudo, priorizamos na SPO o método científico.
Os meios acadêmicos e instituições científicas portuguesas têm dado atenção devida à questão ufológica? Acho que em Portugal, como, aliás, no resto do mundo, a comunidade científica parece não prestar muita atenção ao fenômeno, porque provavelmente existam para ela tantas outras áreas de investigação que considera mais importantes, como a busca pela cura de doenças, preservação das espécies, questões como energias e sustentabilidade, meio ambiente etc. São infindáveis outros setores bem mais respeitados e considerados para as profissões, carreiras e autossustento de profissionais dos meios científicos.
São os próprios ufólogos que afastam os cientistas eventualmente interessados pelo Fenômeno UFO. Um dos erros históricos da Ufologia foi o de ter sido praticada e divulgada não por cientistas, mas por pessoas sem formação acadêmica, como autores e jornalistas. E essas pessoas, sem os conhecimentos científicos e metodológicos necessários, formularam teorias e hipóteses que, em sua maioria, se mostram completamente defasadas da realidade dos fatos.
De fato, parece não haver incentivo algum para que nossa área de pesquisa cresça, além da obstinação dos próprios pesquisadores dos UFOs. Sim, mas ao mesmo tempo, são os próprios pesquisadores da fenomenologia ufológica que afastam os cientistas eventualmente interessados pelo Fenômeno UFO. Um dos erros históricos da Ufologia foi o de ter sido praticada e divulgada não por cientistas, mas por pessoas sem formação acadêmica, por autores e jornalistas. E essas pessoas, sem os conhecimentos científicos e metodológicos necessários, formularam teorias e hipóteses que, em sua maioria, se mostram completamente defasadas da realidade dos fatos. Elas revelam muito mais os desejos e crenças pessoais dos seus próprios criadores, do que a natureza do fenômeno. E por sua vez, com o tempo, essas teorias ganharam vida própria e condicionaram toda a investigação subsequente. Na sociedade está muito solidificada a ideia de que ufólogo é quem investiga os UFOs e acredita que são de origem extraterrestre, e isso é um erro!
Como assim, um erro? Em sua opinião, qual seria o papel do ufólogo diante das novas situações oferecidas pela casuística ufológica? O ufólogo deve se dedicar a investigar o fenômeno com seriedade, independente de acreditar que tenha origem extraterrestre ou qualquer outra — e isso inclui chegar à conclusão de que a própria fenomenologia em si talvez não exista, desde que tais conclusões sejam baseadas em apuração séria e sólida. A ideia de cientistas analisarem o trabalho feito pelos ufólogos, apontar suas falhas e colocar em debate teorias consideradas como verdades absolutas por eles assusta quem está no meio e cria animosidade. Por outro lado, devido à falta de metodologias científicas específicas, a Ufologia não é bem vista pela comunidade científica, o que também afasta os cientistas. Creio que o futuro será uma reconciliação entre ufólogos e cientistas, de forma que um dia se possa dizer que um é sinônimo do outro.
Você acredita que muitos ufólogos temem perder seu status se seus trabalhos forem submetidos a um crivo científico — que poderia apontar, por exemplo, que seus casos foram investigados superficial ou equivocadamente? Sim, essa é a questão. E é nela que reside um interessante meio de a própria Ufologia se regenerar, na medida em que os bons ufólogos possam aceitar críticas construtivas da comunidade científica e aproveitar a oportunidade para se aperfeiçoarem e aos seus métodos. Os novos investigadores iriam, sem dúvida, se beneficiar dessas melhorias, aprendendo com técnicas e resultados mais adequados. Quanto aos maus ufólogos — e claro que existem —, esses seriam definitivamente afastados do meio a partir do momento em que uma ampliação no processo de avaliação de seus casos fosse realizada, fazendo com que os trabalhos fracos sejam bem mais facilmente denunciados e repudiados.
Investigação multidisciplinar
Você acredita que deveria haver maior interesse da comunidade acadêmica para a questão? E de que forma nós poderíamos ajudar isso a acontecer? Creio sinceramente que a Ufologia devia ser praticada única e exclusivamente por vias científicas e por profissionais de várias áreas, como as ciências matemáticas e as sociais, por exemplo. Sim, porque somente uma investigação multidisciplinar dos UFOs poderá, talvez, tentar fornecer uma resposta ao fenômeno. Passados 64 anos desde a observação de Kenneth Arnold, que deu origem à Era Moderna dos Discos Voadores, continuamos tão distantes de uma resposta efetiva para a natureza dos UFOs quanto antes — provavelmente até mais afastados dela do que no começo da pesquisa, dada à confusão criada por pesquisadores amadores ou sem competência para tal. Está na hora de a Ufologia se profissionalizar, de ser criada uma disciplina para lidar com o assunto nas faculdades ou, pelo menos, em institutos reconhecidos pelos ministérios de Educação de diversos países, onde se possam formar pessoas com capacidade para literalmente fazerem esse trabalho investigativo nas diversas searas do próprio tema. E, sobretudo, é necessário criar senso crítico, inquisitivo e desapaixonado para tratar do assunto — que é o que sempre faltou na grande maioria da atividade ufológica.
Maioria dos casos é explicável
Perfeito. Qual hipótese é adotada pela Sociedade Portuguesa de Ovnilogia (SPO) quanto à origem dos UFOs? A SPO ainda não tem uma opinião formada sobre a origem do fenômeno. Sabemos que a grande maioria dos casos ufológicos é explicável — e aqueles que ainda não têm esclarecimento possível ficam arquivados à espera de novos conhecimentos que possam levar à sua compreensão, ou pelo menos apontar caminhos. O mais metodologicamente correto e ético é assumir, para os casos inexplicáveis, que ainda não é possível encontrar conclusão para eles, e apenas dizer: “Não sabemos”.
Mas essa não seria uma forma de minimizar demasiadamente a importância da fenomenologia ufológica? Uma linha de pensamento que exclui os avanços a que se chegou com tanta pesquisa? Não penso assim. Como já disse, não creio que tenha havido dentro da Ufologia uma investigação suficientemente criteriosa para que se possa defender qualquer uma das teorias vigentes para a origem do Fenômeno UFO — como a hipótese extraterrestre (HET). Não estou dizendo que não existiram ou não existam bons pesquisadores, mas mesmo esses muitas vezes não têm os meios técnicos e financeiros necessários para realizar um trabalho verdadeiramente exaustivo para se chegar a uma conclusão definitiva. A maioria das hipóteses são meras ideias, até o momento sem qualquer tipo de comprovação objetiva. A realidade é que o fenômeno é tão misterioso como era há 60 anos, e continuamos com as mesmas perguntas — mas com a diferença de que hoje estamos convencidos que já sabemos as respostas e queremos comprová-las. Essa postura me parece incorreta. A posição na Ufologia deve ser a de investigar o tema sem qualquer tipo de preconceito, adaptando teorias aos fatos, e não o contrário. Mas uma coisa parece ser correta e indubitável: o fenômeno existe.
Então você assume a realidade dos UFOs, mas não se arrisca a dar uma opinião sobre sua procedência? Sim, é suficientemente óbvio que existam objetos voadores desconhecidos trafegando em nossos céus, com morfologias e características de voo completamente diferentes das convencionais. Esses artefatos são observados, fotografados, filmados, registrados em radar etc — e não só no planeta Terra, mas também no espaço. Esses UFOs merecem ser investigados, até porque não seria apenas por motivos científicos, mas também práticos, como questões de segurança aeronáutica e de soberania nacional.
E sobre os contatos diretos com os tripulantes desses aparelhos, o que pensa? As milhares de histórias de contatos com ocupantes desses objetos — e até mesmo as abduções alienígenas — podem e devem ser investigadas, porque é difícil imaginar que não exista uma causa real por trás desses acontecimentos. Contudo, à medida que vamos descobrindo mais sobre a psiquê humana, bem como sobre o funcionamento do cérebro, nossas pesquisas de tais situações têm necessariamente que avançar, pois precisam estar antenadas e atualizadas com esses novos conhecimentos.
Como advogado, supondo que tivesse que defender uma das teorias vigentes sobre a origem dos UFOs e pudesse escolher sua predileta e com maior chance de ganhar uma causa, qual delas seria? Defenderia apenas a alta probabilidade de os UFOs existirem enquanto fenômeno. A minha posição pessoal sobre o tema é de que aparentemente existe uma inteligência não humana por trás de algumas manifestações ufológicas. Porém, essa é apenas uma opinião, algo que pode se alterar com o tempo e sem qualquer tipo de certeza absoluta associada — e assim, pouco ou nada vale em termos práticos.
Como você vê a atual fase da Ufologia Mundial? Progredimos nas últimas décadas ou estamos estagnados? Talvez ainda seja discutível que haja uma Ufologia Mundial, pois na verdade existem diversas “Ufologias”, cada qual com suas características, objetivos, preconceitos, crenças próprias etc. Creio que, no geral, a Ufologia não está progredindo e explico a razão. Se pegarmos livros recentes e os compararmos com as obras dos primórdios da Era Moderna dos Discos Voadores — como, por exemplo, o livro Flying Saucers from Outer Space [Discos Voadores do Espaço Exterior, Henry Holt and Company, 1953], do saudoso pioneiro major Donald Keyhoe, entre outros —, a temática é a mesma. E qual é ela? É a que segue o roteiro básico já conhecido: os UFOs são naves interplanetárias, aparecem a algumas pessoas, os governos sabem mais do que dizem, alguns caíram e foram capturados, incluindo os seus tripulantes etc. Os livros de hoje, na sua maioria, apenas se limitam a copiar e repetir casos antigos e a adicionar alguns recentes, mas na sua essência são apenas repositórios de histórias e boatos.
Acho que, quando vão aos meios de comunicação social, os pesquisadores do Fenômeno UFO têm o dever de exigir uma cobertura séria e de usarem o direito de resposta quando virem seu trabalho ser desvirtuado e o assunto transformado em alvo de escárnio (…) Não é aceitável que em 64 anos de Ufologia continuemos presos às mesmas ideias e paradigmas de décadas atrás.
Em que tipo de literatura sobre o tema você sugere que os ufólogos devam investir ou que você sente mais falta em sua biblioteca? Fazem falta livros sobre o pensamento ufológico de grandes estudiosos, manuais de investigação e obras que levantem e escrutinem hipóteses teóricas para a explicação do Fenômeno UFO. Mas, sobretudo, faltam obras com um olhar mais sério por parte da própria Comunidade Ufológica Mundial. Outro ponto muito importante que eu destaco é o de que, mais do que congressos e palestras de ufólogos para o público, fazem falta conferências e debates entre pesquisadores. Acredito que só assim a área evoluirá. Felizmente, alguns autores, como Jacques Vallée [Veja edição UFO 139, agora disponível na íntegra em ufo.com.br] e os falecidos Mac Tonnies e John Keel, testaram novas hipóteses em suas obras, sem dúvida com falhas, mas já vislumbrando algo além da corrente principal da presença alienígena na Terra, e isso é positivo. A Ufologia precisa se refundar se quiser evoluir.
Ufologia não é política
Vamos falar agora de abertura ufológica. Você considera a brasileira um bom exemplo para outros países? Creio que foi e é um ótimo exemplo para muitos países, e não apenas os sul-americanos, porque através dela ficou demonstrado que é possível fazer pressão civil a um governo, no sentido de sensibilizar seus agentes para divulgarem informações que mantenham ocultas sobre o assunto. Contudo, creio que os contornos que essa iniciativa tomou nos Estados Unidos são negativos, sobretudo com o movimento conhecido Exopolítica [Veja edição UFO 166, idem].
Como assim? Por que você cita aqui especificamente a Exopolítica? Primeiramente porque seus praticantes pretendem ser uma espécie de lobistas políticos perante os governos, e Ufologia não é política. Em segundo lugar porque partem de duas premissas de que discordo: a de que o Fenômeno UFO é com certeza de origem extraterrestre e a de que os governos têm provas disso, que se recusam a liberar para a sociedade. Eu até concordo que os governos em geral tenham mais informações sobre o tema do que divulgam, e disso não tenho dúvidas, mas também creio sinceramente que estão tão no escuro sobre a verdadeira natureza da fenomenologia ufológica quanto os pesquisadores.
Há algum tipo de movimento ou tentativa para pressionar o governo português a liberar informação ufológica? Não, em Portugal não existe nenhum tipo de movimentação nesse sentido, apesar de a Exopolítica ter criado um grupo aqui e de ele ter promovido um congresso na cidade do Porto, em maio desse ano — durante o qual tive a sorte de assistir várias palestras e de conhecer muitos dos oradores. Porém, até onde eu saiba, não há nenhuma ação para solicitar expressamente que o governo português ou suas Forças Armadas divulguem informações sigilosas sobre o tema que eventualmente possam ter. Em julho de 2008, o editor da UFO, A. J. Gevaerd, quando fez sua palestra no I Encontro Internacional de Ovnilogia, em Lisboa, nos desafiou a seguirmos os mesmos passos dados no Brasil.
O que os impediu de levar adiante o desafio de Gevaerd? Sem dúvida, era uma ideia interessante e tentadora, e que considero bastante. Mas penso que ela apenas deveria ser implementada após terem sido esgotadas as solicitações ao governo para que revele tal documentação através dos trâmites normais. E como não tivemos oportunidade de fazer isso até agora, creio que seria prematuro realizar aqui um movimento como o UFOs: Liberdade de Informação Já. Porém, se através dos meios tradicionais as instituições governamentais não cooperarem, acho que se poderá considerar a possibilidade de fazer alguma pressão através de uma iniciativa como a adotada no Brasil — que, aliás, saliento que foi uma excelente atitude e saúdo.
Obrigado! Você conhece algum movimento para se criar um organismo oficial de pesquisa ufológica na Europa? Há algo em andamento? Creio que um grande passo na investigação e na dignificação da atividade ufológica seria a criação de um observatório astronômico continental, conforme proposto por um eurodeputado italiano na década de 90, no Parlamento Europeu. Uma instituição desse calibre e com financiamento apropriado poderia, sem dúvida, dar uma grande contribuição ao conhecimento sério da temática ufológica. Mas, até lá, compete aos bons pesquisadores e às boas organizações de pesquisa realizar esse serviço, que considero de interesse público.
A maioria das hipóteses são meras ideias, até o momento sem qualquer tipo de comprovação objetiva. O Fenômeno UFO é tão misterioso como era há 60 anos, e continuamos com as mesmas perguntas.
Na América do Sul temos diversos órgãos oficiais de investigação ufológica, no Uruguai, Chile, Peru e Argentina, criados dentro da Aeronáutica desses países. Alguns de seus dirigentes já revelaram à Revista UFO que o fenômeno tem origem extraterrestre, por não terem encontrado respostas convencionais para muitos casos. Como vê essa atitude? Se essas opiniões forem alicerçadas nas próprias investigações desses órgãos e as mesmas tiverem sido realizadas com os mais elevados padrões, considero muito positiva. Agora, se apenas refletem opiniões pessoais das testemunhas ou dos militares, creio que poderá ser um passo perigoso. No entanto, à medida que os estudos dessas entidades oficiais forem disponibilizados, deverão ser analisados e debatidos com o maior dos rigores, pois poderão trazer elementos importantíssimos para a resolução do enigma ufológico.
Em sua opinião, termos militares da Aeronáutica de um país como os citados assumindo tal postura, de forma aberta, é um bom sinal para a Ufologia? Sem dúvida! Creio que essa atitude deveria ser transposta para os demais organismos estatais.
Esses órgãos de pesquisa são constituídos tanto por militares quanto por civis de diversas áreas, profissionais de várias disciplinas. Esse seria o caminho a ser tomado no resto da Ufologia? Sim, acredito que a pesquisa do Fenômeno UFO tem que ser feita exatamente dessa forma: multidisciplinarmente. E tem que contar com a atuação de cientistas, técnicos e especialistas das mais variadas áreas do conhecimento humano. Considero também que, em médio prazo, as pesquisas precisarão ser realizadas por grupos certificados e não por amadores ou pesquisadores solitários. E deverão estar inseridas em uma estrutura que ateste a forma de investigação e os métodos empregados, além da qualidade dos resultados atingidos. Se tais órgãos militares fornecerem esses requisitos, então considero que é uma oportunidade imperdível. De todo modo, o correto é que esses grupos sejam civis e não estejam submetidos a uma hierarquia militar. O ideal seria existirem departamentos nas universidades que fizessem esse tipo de trabalho, como acontece nos demais ramos da ciência.
“Selo de qualidade”
A partir desse ponto de vista, você acha possível ser regulamentada a profissão de ufólogo? Acho perfeitamente viável. Creio que deviam ser criados cursos nas universidades que possibilitassem a formação de pesquisadores legítimos do Fenômeno UFO. Também não me chocaria se visse que tais estudos fossem efetuados em institutos privados, desde que obedecendo a critérios de qualidade. Até lá, seria interessante a criação de órgãos nacionais ligados a um internacional, compostos pelos melhores investigadores, um mecanismo que servisse como um “selo de qualidade”, pronunciando-se sobre as informações que são publicadas e divulgadas em conferências, palestras, artigos e na imprensa. Um instrumento que certificasse a qualidade do investigador e de seu trabalho, que realizasse o que os norte-americanos chamam de peer review [Revisão do trabalho de colegas por seus pares da mesma área], tão necessária aos artigos publicados. Indo mais adiante, tal mecanismo promoveria, se fosse o caso, ações junto aos tribunais ou aos órgãos jurisdicionais dessa entidade internacional, criados com o objetivo de denunciar falsos ufólogos e aqueles que usem o tema para se promover, burlar ou enganar quem genuinamente quer saber mais sobre o fenômeno.
Há uma recente onda de ceticismo mundial, em especial no Brasil, que extrapola o bom senso e que já não se guia mais pelo objetivo de tratar o assunto UFO com seriedade, contrapondo-se às excentricidades que abundam nesse meio, mas que pretende desmoralizar o tema atacando os principais casos bem documentados. O que diz a respeito? Considero que qualquer ceticismo que extrapola o bom senso não é verdadeiramente ceticismo. Já o ceticismo sadio — especialmente o científico — é um instrumento útil na investigação e na reinvestigação de casos. É sempre legítimo alguém questionar a veracidade de uma alegação e procurar prová-la ou rejeitá-la utilizando o método científico. Não acho que deva haver “vacas sagradas” na Ufologia e considero que qualquer caso, por mais conhecido e divulgado que seja, possa sempre ser alvo de novas investigações e questionamentos. Até porque, se o trabalho a seu respeito estiver bem feito, ele irá resistir a todas as críticas. E se for descoberto que foi mal feito, a Ufologia idônea só terá a ganhar com seu afastamento da casuística ufológica legítima. Assim, a denúncia dos falsos casos ou das falsas afirmações é necessária. A Ufologia não pode cair no erro de assentar em dogmas qualquer que seja o caso ufológico. Como atividade intelectual que busca o conhecimento do Fenômeno UFO, ela tem que ter uma capacidade crítica e especialmente autocrítica, pois só assim melhorará e suas evidências se tornarão ainda mais persuasivas.
Que interesses acha que motivam esse movimento cético e que danos avalia que pode causar à Ufologia Mundial? Se for simplesmente o chamado debunking, como é denominada a negação sistemática ou resistência irracional ao tema, ele é tão equivocado quanto o fanatismo ufológico. Nenhuma dessas opções é atividade legítima de investigação. Nesse sentido, os interesses por trás desse movimento são pura e simplesmente o de impedir a divulgação de informação que contrarie os seus enraizados preconceitos. O problema dessas ações céticas é que a imprensa, por ver nelas um caminho mais fácil para tratar o assunto, costuma usar seus argumentos para afirmar que determinado caso está explicado ou resolvido — muitas vezes quando nada pode estar mais longe da verdade. Nesse sentido, os danos causados por esse movimento podem ser significativos.
Como reagir a essas investidas céticas? Os ufólogos sérios e competentes têm que usar todos os meios à sua disposição para contrapor os falsos argumentos apresentados pelos céticos. Esse é um desafio às vezes até com armas desiguais, mas um combate que tem que ser feito. Porém, repito, apenas contra o ceticismo irracional e a negação cega, pois o ceticismo imparcial é um aliado da Ufologia e não um inimigo. Virar-lhe as costas é desprezar o verdadeiro conhecimento humano e, consequentemente, mais prejudicial à Ufologia do que qualquer ataque de um cético irracional.
Não acho que deva haver ‘vacas sagradas’ na Ufologia e considero que qualquer caso, por mais conhecido e divulgado que seja, possa sempre ser alvo de novas investigações e questionamentos. Até porque, se o trabalho a seu respeito estiver bem feito, ele irá resistir a todas as críticas. E se for descoberto que foi mal feito, a Ufologia idônea só terá a ganhar com seu afastamento da casuística ufológica legítima.
Como você acha que o verdadeiro ceticismo, aquele sadio e voltado à separação do joio do trigo, deva ser praticado? Creio que a melhor maneira seria através da publicação de textos, estudos, livros e artigos nos quais se explica a metodologia utilizada na investigação de cada caso ufológico, com apresentação dos dados apurados e as conclusões atingidas. Esses textos deveriam ser preferencialmente revistos pelos pesquisadores mais reconhecidos do meio, que também tivessem participado das pesquisas apresentadas. E posteriormente deveriam ser realizados debates e conferências públicas, onde ambas as partes — ufólogos e céticos — exporiam seus argumentos, contra-argumentos e conclusões, em igualdade de condições.
Aprimorando a investigação
Você não acha que isso poderia levar a uma polarização severa da Ufologia? Creio que o principal problema, que não é exclusivo da Ufologia, é confundir as críticas ao trabalho do investigador com um ataque pessoal. Muitas vezes os campos se extremam entre os “amigos” e os “inimigos” do investigador cujo trabalho está em debate, e isso é um equívoco. Qualquer pessoa, por melhor que seja, está sempre sujeita a cometer erros, e a identificação e correção desses erros não é demérito nenhum — pelo contrário, serve para aprimorar a investigação previamente feita. Pode até acontecer de um pesquisador, com o passar do tempo, mudar de ideia sobre algum trabalho que tenha feito — e é saudável que isso aconteça, desde que existam motivos válidos para essa reavaliação.
Você já teve casos assim, ou seja, de reavaliar investigações realizadas? Sim, essa situação já ocorreu comigo quando escrevi textos ou exprimi opiniões sobre o Fenômeno UFO com as quais não concordo atualmente. Todas as pessoas evoluem e é positivo que isso aconteça. A Ufologia precisa encontrar uma maneira de ser mais permeável às críticas e aproveitá-las para evoluir e melhorar. Nesse aspecto, creio que a Revista UFO pode ter um importante papel na veiculação imparcial de ideias contraditórias e na apreciação isenta das mesmas, sendo um significativo fórum de discussão e divulgação. Com essa mentalidade, a Ufologia não se estagna e somente se renova.
Perfeito. Agora, mudando um pouco de assunto, diga-nos como anda a casuística ufológica em seu país? Há muitas novas ocorrências em Portugal? Sim, e a Sociedade Portuguesa de Ovnilogia (SPO) recebe todos os meses inúmeros relatos. A grande maioria deles se refere a luzes vistas no céu e quase a totalidade das fotografias que nos são enviadas são apenas efeitos óticos nas lentes das câmeras, além de insetos, pássaros ou corpos celestes registrados em condições especiais. Existem alguns casos recentes interessantes, mas, como ainda estão sob investigação, qualquer opinião a seu respeito nesse momento seria prematuro. De qualquer forma, convido aos leitores da Revista UFO a visitarem o site de nossa entidade [Endereço: www.spo-ovnilogia.com] para se inteirarem um pouco mais sobre a casuística portuguesa e os casos que temos sob análise. Na verdade, creio que ainda não temos na Ufologia de meu país aquele episódio derradeiro, definitivo, um fato com que não deixasse dúvidas quanto à origem dos UFOs.
O problema das ações céticas é que a imprensa, por ver nelas um caminho mais fácil para tratar o assunto, costuma usar seus argumentos para afirmar que determinado caso está explicado ou resolvido.
Em sua opinião, a aparição mariana de Fátima, no início do século passado, foi um caso ufológico ou não? Sinceramente, não sou especialista nesse acontecimento e nem o investiguei pessoalmente para emitir opinião, ainda que conheça alguns de seus contornos. Mesmo assim, não sei o que realmente aconteceu em Fátima e até que ponto seria um fato religioso ou ufológico. Porém, uma vez que o incidente está tão ligado à Igreja Católica e à crença de milhões de pessoas, sem que se tenham provas concretas é prejudicial para a Ufologia tentar sistematicamente apresentar o ocorrido como uma intervenção extraterrestre. Isso tem o risco de atrair sobre si a desconfiança e talvez ressentimentos de multidões, sem qualquer vantagem para a pesquisa ufológica. Admito que existam pontos de contato entre os fenômenos religiosos e ufológicos, e até que possa existir uma entidade — ou várias, por que não? — que mascare ocorrências de ambos os gêneros, mas não se encaixando em nenhum dos dois. Porém, sem mais elementos à disposição, não posso afirmar a natureza do fenômeno que ocorreu em Fátima [Veja edição UFO 157, agora disponível na íntegra em ufo.com.br]. Como português, no entanto, lamento que muitos turistas venham ao meu país apenas para ver o Santuário de Fátima, quando Portugal tem muitos outros locais maravilhosos para oferecer.
A tese defendida por tantos pesquisadores portugueses, como Joaquim Fernandes, Fina d’Armada e Paulo Cosmelli, entre outros, é a de que as aparições de Fátima teriam sido manifestações extraterrestres, e que tais fatos teriam sido ocultados da Igreja. Você crê que a sociedade lusitana estaria hoje preparada para tais revelações? Acho que hoje em dia o professor Fernandes já não defende essa teoria. Mas, de qualquer modo, creio que no fenômeno de Fátima existem elementos semelhantes aos observados em casos de observação e contatos ufológicos. É possível defender que ambos tenham a mesma natureza, mas falar que algo é semelhante é diferente de falar que é igual. Quero dizer com isso que podem ter aspectos parecidos, mas com origens distintas. Julgo ser sempre perigoso e prematuro tentar identificar aparições religiosas com extraterrestres, e, como disse anteriormente, é algo que a Ufologia não deveria fazer — pelo menos não sem provas incontroversas, o que não é o caso. Porém, não tendo me debruçado e nem investigado as aparições de Fátima, prefiro não fazer comentários, deixando-os para quem, melhor do que eu, as conheça.
Ainda assim, na hipótese de que a teoria extraterrestre em torno das aparições marianas seja confirmada, que consequências você acredita que ela traria à população e à Igreja? Aí está uma questão muito interessante e que renderia uma entrevista completa. Mas, resumindo, partindo do pressuposto de que por trás do fenômeno das aparições em Fátima — e, quem sabe, de outras aparições religiosas — estava uma presença extraterrestre, até que ponto tal revelação não iria destruir a fé humana em uma entidade divina ou, pelo menos, nos dogmas, mitologias e tradições das diversas igrejas? Por outro lado, até que ponto poderíamos criticar e, consequentemente, desacreditar qualquer coisa que essas entidades nos digam, uma vez que manipularam a humanidade através de suas crenças religiosas mais enraizadas?
Boas colocações. Como você as responde? Com cautela. Teríamos então em Fátima uma entidade extraterrestre identificando-se como personagem religiosa e solicitando inclusive que se fizessem rezas de uma determinada religião, nesse caso, a católica? E mais, esses casos influenciaram comportamentos de papas, como aconteceu com João Paulo II, que atribuiu sua sobrevivência a uma intervenção de Nossa Senhora de Fátima? E quantas pessoas não fazem peregrinações e sofrem com longas e penosas caminhadas, na tentativa de expiarem seus pecados ou pedirem favores divinos, a algo que na realidade não tem relação alguma com Deus, mas foi apenas um ardil de outras entidades? Essas são perguntas que merecem reflexão. De essencial, creio que haveria uma quebra significativa da fé nas religiões, caso a teoria extraterrestre em torno das aparições marianas fosse confirmada, mas também uma enorme frustração e animosidade para com os seres que estivessem por trás da tal manifestação — algo que poderia prejudicar irremediavelmente as relações entre ambas as civilizações. Para o nosso bem, se existirem, que essas civilizações obedeçam à Primeira Diretriz de Star Trek, da saga Jornada nas Estrelas: que apresentem uma forma de conduta baseada em ética e princípios morais universais.
Você acredita que o Vaticano esteja em processo de reconhecimento da questão extraterrestre, como tem sido aludido por muitos pesquisadores? Como é do conhecimento de todos, o Vaticano tem um dos mais importantes observatórios astronômicos do planeta, e muitos de seus padres também são cientistas, com vasto conhecimento sobre astronomia e astrobiologia. Creio que a recente posição da Igreja Católica [Veja edição UFO 174, agora disponível na íntegra em ufo.com.br] vem na esteira das novas descobertas científicas, principalmente dos exoplanetas e da constatação de que existem boas probabilidades de existência de vida inteligente no universo. Acho que o Vaticano está se preparando inteligentemente para o inevitável, ou seja, para o anúncio da descoberta de vida fora da Terra. Ele precisa acompanhar e, de certa maneira, antecipar o rumo dos acontecimentos, evitando qualquer choque dessa nova realidade com sua doutrina e, consequentemente, uma crise de identidade que certamente afetaria as religiões e igrejas mais dogmáticas e rígidas.
Como você analisa as correntes místicas que lidam com o Fenômeno UFO, que crescem incomparavelmente mais rápido do que os grupos de postura científica? Com muito receio. É lamentável que, em plena segunda década do século XXI, quando já tiramos proveito do conhecimento e do método científico acumulado, cada vez mais pessoas se virem para o esoterismo, para o obscurantismo e o misticismo. Creio que as descobertas e possibilidades científicas, ao descortinarem tantas coisas novas, causaram nas pessoas a sensação de que o mistério foi tirado do universo, das nossas vidas, e por isso elas buscam se prender a algo transcendental, tentando dar um sentimento metafísico às suas existências, algo que consideram superior. Mas não há nada mais equivocado! O que a ciência tem descortinado é que o universo é algo magnífico, com muitos enigmas para resolver — e, no entanto, é ela que os descobre e será ela mesma que os resolverá.
Descredibilizando o tema
Você vê o misticismo no tratamento do Fenômeno UFO como algo negativo? O esoterismo na Ufologia apresenta vários problemas. Em primeiro lugar, é pródigo em fazer determinadas afirmações e profecias que só descredibilizam o tema, como, por exemplo, as recentes e intensas manifestações infundadas sobre o cometa Elenin, simplesmente mais algumas entre inúmeras que logo se mostraram totalmente enganosas. O histórico da própria Ufologia demonstra que o misticismo não é confiável e não pode ser levado em consideração — basta nos recordarmos de quantas vezes já foram feitas profecias envolvendo ETs e sua aludida chegada à Terra, que nunca se verificaram. Além de livros psicografados que foram escritos com descrições do planeta Vênus ou de Marte, como aconteceu nas décadas de 50 e 60, e que se comprovaram completamente equivocados com a chegada lá de nossas naves espaciais.
A Ufologia precisa encontrar uma maneira de ser mais permeável às críticas e aproveitá-las para evoluir e melhorar. Nesse aspecto, creio que a Revista UFO pode ter um importante papel na veiculação imparcial de ideias contraditórias e na apreciação isenta das mesmas, sendo um significativo fórum de discussão e divulgação.
Então, como tratar as informações veiculadas na seara da Ufologia Mística? Como se vê, as supostas fontes das informações dos místicos não são comprováveis e não há maneira de testá-las, e nem há como demonstrar sua proveniência. Na maioria das vezes ficamos no dilema de acreditar ou não nelas, mas na Ufologia não pode haver lugar à crença, somente ao conhecimento. É por isso que sempre digo que a frase I want to believe [Eu quero acreditar], da série Arquivo-X, é perniciosa para a Ufologia — ela deveria ser I want to know [Eu quero saber]. O esotérico pretende dar um componente moral, ético e religioso ao Fenômeno UFO, o que é outro grande problema. Não só porque leva à criação de seitas e líderes messiânicos, como pode causar efeitos desastrosos, como ocorreu com a entidade mística Heaven’s Gate, em 1997 [Veja edição UFO 084, agora disponível na íntegra em ufo.com.br].
Como identificar uma entidade mística com tendências sectárias e separá-la de entidades legítimas de pesquisa? Ora, uma organização científica de investigação ufológica nunca deu origem à perda de vidas humanas, como ocorreu na Heaven’s Gate. Nem nunca pleiteou ser integrada ou dirigida por seres humanos superiores aos demais, como muitas vezes pretendem fazer crer alguns “enviados” extraterrestres que fundam seitas ufológicas. É como se fossem mais conhecedores da realidade, como se estivessem em outro patamar e fossem merecedores de serem salvos pelos que chamam de “irmãos cósmicos”. Esse tipo de disparate só vem prejudicar e desacreditar a pesquisa ufológica, levando as pessoas a viverem fantasias. O estudo da fenomenologia ufológica tem que ser científico, racional, com seriedade e metódico. Para mim, esse é o verdadeiro caminho, e qualquer outro é bom apenas para alimentar discussões, criar mitos e até dar uma aura de mistério aos UFOs — e com isso aumentar o interesse no tema, mas não o modo como verdadeiramente aprenderemos o que se passa em nossos céus.
A SPO já tem projetos programados para 2012? Quais seriam eles? Não há ainda nenhum cronograma específico para o ano que vem, pois nossas iniciativas são ditadas pelas pesquisas e casos concretos que nos surgem. São eles que servem de fundamento às palestras, congressos, exposições e outras atividades que realizamos. No entanto, gostaríamos de continuar publicando casos ufológicos portugueses e foi muito positivo ver lançadas, pela primeira vez no mercado nacional, grandes obras da Ufologia Mundial, como uma coleção que teve como primeiro exemplar o histórico livro do capitão Edward J. Ruppelt, Relatório Sobre o Fenômeno OVNI [Editora Antagonista, 2010]. O volume marcou o início da Coleção SPO, que incluirá principalmente obras de caráter científico e estudos históricos. A série é composta por livros de distintos autores, com diferentes opiniões sobre a natureza dos UFOs — alguns deles de caráter oficial, mas raramente disponíveis ou lidos pelo grande público. É muito importante oferecermos aos leitores, em sua língua, os melhores livros sobre o tema, a exemplo da Coleção Biblioteca UFO, no Brasil.
Obrigado! Para finalizarmos a entrevista, há alguma atividade pessoal planejada ou algum livro de Nuno Montez da Silveira em vista? Tenho concluídas pouco mais de 100 páginas de um livro que pretendo organizar, terminar e publicar. Por enquanto não tem título, mas a intenção é que seja uma obra que trate da natureza da Ufologia e do ufólogo, que se debruce sobre conceitos e metodologias, que aprofunde e debata as diversas teorias e, por fim, que possa servir de manual para quem queira adentrar nesse campo. E teria muito orgulho se a Revista UFO o publicasse em sua renomada coleção.
Tenho certeza de que nosso editor, que tanto carinho tem pela Ufologia e pelos ufólogos portugueses, estudará a questão com muita atenção. Agora, gostaria de deixar uma mensagem para os amigos e leitores brasileiros? Sim. Gostaria de lhes lembrar que, ao contrário de muitos países, o Brasil tem uma Ufologia ativa e dinâmica, verdadeiramente exemplar, com excelentes pesquisadores que sistematicamente trazem à luz novos e interessantes casos, organizam eventos e conferências minuciosamente e que são dotados de um enorme conhecimento e força de vontade. Creio que a Ufologia Brasileira é uma das mais avançadas do planeta, e o povo de seu país deve ajudá-la no que puder, pois merece. Os ufólogos brasileiros já deram o exemplo ao resto do mundo com a campanha UFOs: Liberdade de Informação Já, e com auxílio e parceria de todos, podem conquistar muito mais.