
A questão de a humanidade ser ou não a única forma de inteligência tecnologicamente avançada o suficiente para explorar o universo é um dos maiores mistérios da história e uma das questões filosóficas mais profundas já elaboradas pela mente humana. Estamos sós? Essa questão é possivelmente tão antiga quanto a própria humanidade, muito antes de nos reconhecermos como uma espécie capaz de explorar o cosmos. A eventual descoberta de vida extraterrestre em algum ponto desta ou de outras galáxias seria potencialmente a maior descoberta da espécie humana. E se essa forma de vida for inteligente, então provavelmente teremos um ponto de mutação em nossa civilização, com implicações profundas e provavelmente irreversíveis para a nossa compreensão de mundo, nossa espiritualidade e a percepção de nossa própria natureza coletiva e individual.
Há milhares de indivíduos pelo planeta que afirmam publicamente, com convicção, terem conhecimento da existência de formas de vida alienígenas visitando a Terra em discos voadores, inclusive vida inteligente e tecnologicamente avançada, que estaria vindo até aqui e interagindo com humanos. Apesar da apaixonada alegação de veracidade em seus depoimentos, sua certeza ainda não é compartilhada por boa parte da humanidade, especialmente pela maioria dos envolvidos profissionalmente com a ciência. Sou um desses cientistas, que busca assumir uma postura racional, lógica e pragmática para trilhar o caminho do autoconhecimento e a compreensão do universo. Uma trilha que quase certamente restará incompleta ao final da uma vida efêmera.
A ciência é a forma mais eficiente, precisa e acurada de construção do conhecimento já criada pela humanidade — é o conjunto de técnicas mais confiável para compreender o mundo em que vivemos. A tecnologia é a materialização do sucesso da ciência e cada avanço tecnológico é resultado de uma melhor compreensão do mundo pela humanidade. Mas, paradoxalmente, a maior qualidade da ciência, o seu rigor, é exatamente sua maior limitação. Em razão de o método científico de investigação da realidade exigir avaliação crítica do trabalho por outros especialistas, necessidade de documentar e replicar os eventos e fenômenos estudados e ter a obrigatoriedade de reunir provas materiais e conceituais robustas, ele acaba não sendo apto a muitos temas que fogem a essas regras.
Inspirando as ciências
A Ufologia é uma área de estudo que não se enquadra formalmente na investigação científica — mas não ser uma ciência não quer dizer que ela seja inválida. A história mostra exemplos de como pseudociências, como a alquimia e a astrologia, inspiraram o surgimento de ciências, como a química e a astronomia. Estando os ufólogos convictos de sua hipótese de que outras formas de inteligência têm visitado a Terra, então devem mesmo se organizar em grupos de pesquisa, adotar as melhores práticas da ciência sempre que possível e tentar reunir provas as mais concretas para apresentar à sociedade. Mas os milhares de fotos, vídeos e depoimentos não são evidências suficientes para a ciência. E nem devem ser. A ciência tem a responsabilidade e obrigatoriedade de agir como o filtro mais rigoroso e refinado do conhecimento humano.
Mas então a ciência não está preocupada em procurar por seres extraterrestres, confirmar se eles existem ou não? Sim, está. E investe muitos milhões de dólares anuais nesta pesquisa. A ciência chamada de astrobiologia é a que formalmente estuda a possibilidade real de haver vida fora da Terra e da vida terrestre vir a colonizar outros mundos. Do ponto de vista científico, é mais provável que haja vida além da Terra do que o contrário. Pelo que entendemos ser vida, ela depende de haver água líquida — portanto, um ambiente nem tão quente ou frio — e certos elementos químicos, como carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio, fósforo e enxofre, e uma fonte de energia para as reações químicas e metabólicas. Outros requisitos são o calor de uma estrela próxima, a atividade geotérmica pelo decaimento de elementos radioativos e/ou maré gravitacional, a energia gerada pelo campo gravitacional de grandes astros, como Júpiter, Saturno e suas muitas grandes luas etc.
Todos esses requisitos, ou ingredientes, não são raros no universo e, pelo seu gigantesco tamanho, podem estar reunidos em um número enorme de mundos, como planetas, luas, planetas-anões, meteoros, cometas e até em planetas errantes, ou seja, aqueles que não estão presos a um campo gravitacional estelar. Portanto, é provável que a vida tenha se desenvolvido em muitos lugares. Se considerarmos que ela pode existir sem um ou mais desses ingredientes, então deve ser ainda mais comum.
Acumulam-se evidências científicas de que é possível que algumas formas de vida, especialmente microrganismos, sejam catapultados de seus mundos de origem pelo impacto de meteoritos ou cometas — eles poderiam sobreviver dentro de fragmentos de rocha dos seus mundos, lançados ao espaço na forma de meteoros, que finalmente colidem com outros orbes, podendo sobreviver e colonizá-lo. Assim, teoricamente, a vida poderia se espalhar pelo universo sem precisar ser inteligente o suficiente para construir naves. Essa é a teoria da panspermia e, se ela for verdadeira, a vida pode ser ainda mais abundante no cosmos, pois não precisaria surgir em vários mundos, mas surgindo em apenas um já poderia colonizar muitos outros.
Como detectar aliens?
Se considerarmos que a vida pode ser um fenômeno comum no espaço, como encontrá-la? Bem, a astrobiologia se baseia no que sabemos da vida terrena para procurar por vida alienígena. Sendo assim, para tentarmos detectar seres extraterrestres inteligentes, analisamos que tipos de sinais nossa espécie já emite para as estrelas. Nesse caso, sinais de rádio são uma excelente aposta. Pelo menos desde os anos de 40 a humanidade emite, sem querer, sinais de televisão, rádio e radar para o cosmos na forma de radiação eletromagnética na faixa das ondas de rádio. Se alguma civilização alienígena próxima apontar um radiotelescópio para nossa direção, poderá detectá-los. Por isso, em 1959, Philip Morrison e Giuseppe Cocconi publicaram um artigo clássico na conceituada revista Nature teorizando como poderíamos vasc
ulhar estrelas no céu em busca de ondas de rádio com um padrão matemático que indicasse haver uma inteligência por trás do tal sinal eletromagnético.
E assim fez também o astrônomo Frank Drake, em 1960, através do Projeto Ozma. Ele usou o Radiotelescópio de Green Bank, nos Estados Unidos, investigou os sistemas estelares de Tau Ceti e Épsilon Eridani. Esta é oficialmente a primeira inciativa cientificamente embasada para buscar inteligências extraterrestres, o protótipo do que viria a ser o SETI, o programa de busca por vida extraterrestre inteligente, que, em 1984, resultou na criação do famoso Instituto SETI, inicialmente financiado pela Agência Espacial Norte-Americana (NASA), mas atualmente uma organização sem fins lucrativos e independente. Os leitores mais interessados podem ajudar no processamento desse enorme banco de dados por meio da iniciativa SETI@home, que usa o tempo livre dos computadores conectados à internet que forem cadastrados, criando um supercomputador virtual.
A ciência é a forma mais eficiente, precisa e acurada de construção do conhecimento já criada pela humanidade — é o conjunto de técnicas mais confiável para compreender o mundo em que vivemos. E a tecnologia é a materialização do sucesso da ciência
Desde então, o SETI já operou por décadas sem detectar um único sinal possivelmente inteligente que pudesse ser repetido ou confirmado independentemente. Apenas em 1977 ocorreu o interessante, o excitante Sinal Wow! — equivalente à expressão “uau” no Brasil —, que foi assim nomeado pelo pesquisador Jerry Ehman, que o detectou e assim escreveu nos dados impressos. O sinal levantou suspeitas de ser inteligente, mas nunca mais pôde ser confirmado, apesar das muitas tentativas. Embora possa parecer muito tempo de busca por ETs, ainda investigamos apenas o equivalente a uma gota no oceano. Ondas de rádio têm a vantagem de serem de envio menos custoso, não requererem apontamento preciso de um alvo e viajarem longas distâncias no espaço sem considerável interferência. A fim de aprofundar essa busca, a possibilidade de sinais de rádio inteligentes foi expandida para a possibilidade de também haver feixes de laser, maser, ópticos ou neutrinos cruzando a galáxia para comunicação e/ou sinalização.
Também há uma discussão sobre ideias de comunicação interestelar mais exóticas, como a modulação de luz estelar e, o uso de ondas gravitacionais, além de transmissões contínuas ou em pulsos em qualquer uma das outras faixas do espectro eletromagnético. É claro que se ETs muito mais avançados do que nós quisessem esconder suas transmissões, especialmente telecomunicações interestelares, eles poderiam criptografar ou disfarçar os sinais, tornando-os imperceptíveis para nós em meio ao mar de sinais astronômicos comuns pelos quais somos bombardeados — além de poderem usar alguma forma de tecnologia de comunicação e/ou sinalização que ainda sequer especulamos existir e que permaneça indetectável para nós.
Tuitando com o universo
Em 2012, o maior radiotelescópio do mundo, localizado em Arecibo, Porto Rico, comemorou 35 anos do Sinal Wow! enviando uma coleção de 10 mil mensagens do aplicativo Twitter à provável origem do sinal, o aglomerado estelar M55, na Constelação de Sagitário. Esse tipo de iniciativa de enviar mensagens ativamente, em vez de apenas escutar passivamente, é chamada de SETI Ativo ou METI e ocorre desde 1974. O maior destes programas ocorreu em 1974, quando o Radiotelescópio de Arecibo tornou momentaneamente o Sol muito chamativo — de longe a mais brilhante estrela da nossa galáxia, a Via Láctea, em certa frequência. Conforme essa tecnologia se torna mais econômica, mais organizações e grupos comerciais demonstram interesse em enviar suas próprias mensagens ao espaço. Apesar disso, seria mais prudente e precavido apenas ouvirmos e aprendermos enquanto ainda não conhecemos nosso ambiente cósmico bem o suficiente.
Já alardeamos nossa presença cósmica o bastante emanando inadvertidamente nossos sinais de rádio e televisão — o que felizmente tem sido reduzido com as novas tecnologias —, além de potentes radares militares e radiotelescópios científicos. Mas não parece confortável pensar que nosso “primeiro embaixador interestelar” pode ser o Programa do Chacrinha ou mensagens aleatórias de tuiteiros em busca de diversão. Um contato interestelar entre inteligências exige uma resposta bem ponderada que não mostre fraqueza e nem hostilidade. Aliás, pesquisadores já publicaram artigos diversos sobre como deveria ser feito o anúncio ao público de um eventual contato com outras inteligências cósmicas e qual deveria ser o protocolo de resposta, ou da decisão de não responder.
Outras formas de comunicação ativas foram enviadas a bordo de espaçonaves destinadas a viajar enormes distâncias no Sistema Solar, conforme idealizado por Robert Goddard, pioneiro em foguetes. Talvez os mais famosos sejam os discos fonográficos de ouro a bordo das sondas espaciais Voyager 1 e 2, que devem durar por centenas de milhões ou bilhões de anos. Neles, há saudações humanas em 55 idiomas, sons e imagens comuns da Terra, de pessoas de diversas etnias e animais, além de algumas músicas. O conteúdo foi criteriosamente selecionado por um comitê liderado pelo falecido astrônomo Carl Sagan. A Voyager 1 é oficialmente a primeira máquina terrestre a deixar o Sistema Solar e já está a mais de 20 bilhões de quilômetros de distância de nós. Os astrônomos usam a analogia de garrafas lançadas ao oceano com mensagens dentro e, na prática, elas também funcionam como cápsulas do tempo, armazenando um fragmento congelado da história humana e da Terra.
Comunicação eficiente com ETs
Todas essas ideias visam à detecção de inteligências capazes de se comunicar conosco. Mas talvez elas não sejam tecnologica ou biologicamente aptas a fazê-lo. Bem, nós também ainda não somos aptos a nos comunicarmos eficientemente com outras inteligências da Terra, como chimpanzés, elefantes, golfinhos, corvos e polvos. Neste caso, o procedimento deve ser o mesmo adotado para procurar vida não inteligente. Mas aí fica ainda mais complicado, pois ainda não definimos exatamente quais são os sinais que a Terra vista do espaço dá de que é habitada. Consideramos que a composição gasosa da atmosfera é um desses sinais.
Reações puramente físicas e químicas são mais previsíveis e levam a um equilíbrio gasoso na atmosfera, com alguns gases sendo perdidos para o espaço exterior. A biologia é capaz de alterar esse equilíbrio gasoso, continuamente produzindo e consumindo gases específicos. Em nosso planeta, a fotossíntese das microalgas
e plantas, consome dióxido de carbono da atmosfera para produzir seu próprio alimento, os açúcares, e libera oxigênio como resíduo. Portanto, a fotossíntese é responsável pelo excesso de oxigênio na atmosfera da Terra, que poderia ser detectado por eventuais telescópios posicionados em muitos outros sistemas estelares.
A porcentagem de quase 65% de água líquida em relação à quantidade de terra firme da nossa superfície também poderia ser detectada por telescópios potentes e/ou próximos. Se um suposto sistema extraterrestre de observação da Terra for possante o suficiente para observar detalhes ainda maiores que as massas continentais e oceânicas, poderia identificar manchas esverdeadas ao longo da linha do equador e nas zonas costeiras — essas manchas esverdeadas são nossas microalgas fotossintéticas, uma clara evidência de vida. Por isso, astrobiólogos já teorizam outras tonalidades que poderiam predominar em microalgas e plantas em outros sistemas estelares. A evolução prioriza a seleção dos pigmentos fotossintéticos que absorvem a energia eletromagnética nas frequências mais abundantes naquele ambiente. Nossa vegetação predominantemente verde tem a ver com a clorofila, o pigmento fotossintético mais comum da Terra, adaptado ao tipo de estrela que é o nosso Sol, sua idade e distância da Terra, além da interferência da radiação eletromagnética com a atmosfera do planeta.
Sendo a frequência da luz na faixa do verde menos absorvida pela clorofila, essa cor é refletida para os nossos olhos. Em outros mundos, podem predominar organismos fotossintéticos de outras cores, como vermelhos, amarelos ou pretos. Uma eventual observação telescópica alienígena de uma faixa da Terra no período noturno revelaria uma evidência ainda mais interessante. A iluminação urbana pode ser identificada do espaço e, na Terra, as regiões mais desenvolvidas ou ricas têm maior densidade de pontos luminosos. Para um observador alienígena, essa iluminação noturna seria um provável sinal de vida — ou talvez um enorme aglomerado de algum tipo de organismo bioluminescente, como são os vaga-lumes, porém bem mais intenso — e potencialmente de vida inteligente e tecnologicamente avançada, com domínio do básico do que conhecemos por engenharia elétrica.
Projetos de astroengenharia
Consciências alienígenas também poderiam estar, ou ter um dia estado, empenhadas em projetos de astroengenharia. A identificação de alguma estrutura do tipo potencialmente nos traria mais informações sobre outras espécies cósmicas do que um sinal eletromagnético. O programa Busca por Artefatos Extraterrestres (SETA), do inglês Search por Extraterrestrial Artifacts, tem sido discutida cientificamente como uma iniciativa igualmente válida ao SETI. Obras tecnológicas sofisticadas em operação no universo devem seguir as leis da termodinâmica e, portanto, não devem possuir eficiência perfeita, perdendo parte de sua energia devido à entropia na forma de calor, detectável na faixa do infravermelho. Umas dessas formas teóricas de astroengenharia mais populares é a Esfera de Dyson: um tipo de estrutura esférica construída ao redor de uma estrela para utilizar a enorme quantidade de energia por ela produzida. A emissão de radiação eletromagnética por tal astro com uma Esfera de Dyson chamaria atenção por sua anormalidade com um provável pico na faixa do infravermelho. Outra obra de astroengenharia cogitada é o propulsor baseado na aniquilação mútua entre matéria e antimatéria, que poderia produzir emissões anômalas de raios gama como resíduo.
Assim como a humanidade está lançando há décadas diversos tipos de sondas espaciais, civilizações alienígenas podem ter lançado as suas próprias há muitos milhões de anos. Algumas delas podem até já estar extintas e terem suas sondas ainda operando no espaço, alimentadas por reatores nucleares ou outras formas de energia. Naves espaciais, tripuladas ou não, poderiam ser capazes de pousar em outros astros e construir, por controle remoto ou inteligência artificial, outras naves, como uma forma de autorreplicação, até mesmo com inovações adaptativas e, portanto, sujeitas à evolução. Essa possibilidade torna mais provável toparmos antes com as obras de alguma inteligência extraterrestre do que com ela própria. Especula-se que algumas dessas sondas poderiam estar já bem próximas de nós, disfarçadas de meteoros, cometas ou de outros corpos astronômicos dentro do Sistema Solar — ou elas poderiam ser demasiadamente miniaturizadas, dificultando sua detecção.
Nossa forma corporal depende da interação com toda a biologia e com os processos químicos e físicos comuns ao nosso planeta. Como, então, não vemos relatos de seres de conformação não humanoide? Teríamos nós e eles uma ligação?
E é claro que uma civilização capaz de voo interestelar provavelmente disporia de outras tecnologias furtivas, que evitariam sua detecção, caso assim desejassem. Portanto, a astrobiologia trabalha sim com a possibilidade teórica de estarmos sendo vigiados por inteligências alienígenas, inclusive por meio de naves interestelares. Mas enquanto não surge alguma evidência mais concreta disto, não é um tema de destaque a ser pesquisado cientificamente. Como disse Sagan, “alegações extraordinárias requerem evidências extraordinárias”.
Dentro do ímpeto do SETA, alguns pesquisadores já sugeriram iniciativas de astroarqueologia ao buscarem por infraestruturas extraterrestres, ativas ou não, no planeta Terra, em Marte, na Lua ou em outros corpos do Sistema Solar. Na prática, essa inciativa em nosso planeta parece não demandar nada que as ciências da arqueologia e a paleontologia já não façam corriqueiramente. Talvez esse termo astroarqueologia seja mais adequado para o esforço de se detectar sinais civilizatórios fora da Terra, ao menos enquanto não tivermos confirmação acadêmica de algum artefato arqueológico extraterrestre encontrado na Terra. A humanidade deixou certos artefatos na Lua que devem permanecer intactos por milhões de anos. Já em outras locais, como Marte e a lua Titã, processos de intemperismo e erosão podem degradar e soterrar tais vestígios. Um dos artefatos humanos deixados na Lua, por exemplo, é uma das mai
ores provas de que a humanidade realmente pousou lá em 1969, durante a missão Apollo 11. Trata-se do Lunar Laser Ranging Experiment, um pequeno retrorrefletor usado por alguns dos principais cursos de física do mundo, que projetam um feixe de laser para calcular a distância Terra-Lua com base no tempo de ida e volta da luz do feixe.
Como são os ETs?
Em 1976, um satélite na órbita de Marte captou uma imagem que para muitos parecia uma face humana voltada para o céu — alegações de uma obra extraterrestre cresceram rapidamente entre o público leigo e infelizmente ainda persistem entre alguns. Outras imagens de 1972 mostravam possíveis pirâmides. Sob pressão popular, a NASA programou um orbitador, o Mars Global Surveyor, para focalizar melhor e repetidamente essas áreas da superfície marciana e, em 1998, provou que essas supostas obras de engenharia nada mais eram que feições geológicas em um jogo de luzes e sombras em ângulos convenientes que foram interpretadas pela mente humana como outras imagens, um fenômeno psicológico bem conhecido e chamado de pareidolia. Hoje existem muitas imagens disponíveis dessas áreas, que nada mostram além de montanhas, cordilheiras e rochas.
Diante de tudo isso, o que a astrobiologia tem a dizer sobre a provável aparência, comportamento e intenções dos seres extraterrestres? Obviamente não há resposta pronta, por não termos confirmação científica de haver qualquer vida fora da Terra. Mas há sim pensamentos bem construídos e lógicos a respeito, além de algumas controvérsias acadêmicas. Em geral, a astrobiologia é bem crítica quanto ao fato de os estudos ufológicos quase sempre reportarem apenas inteligências extraterrestres em corpos humanoides ou antropomorfizados. Mesmo quando são relatadas manifestações de supostos robôs alienígenas, eles possuem um tronco com dois braços e uma cabeça acima dele com um par de olhos, ou um visor semelhante a óculos. Essa tendência dominante não parece ter respaldo no processo evolutivo ao qual a vida está sujeita. Principalmente no caso de formas de vida evoluindo enquanto se adaptam a condições ambientais bem diferentes da Terra, como pressão, temperatura, composição atmosférica, duração do dia e do noite, cooperação simbiótica e competição ecológica com outros seres vivos etc.
O corpo de qualquer animal complexo, inclusive de humanos, é ele mesmo uma intrincada associação com milhares de outras formas de vida. Uma estimativa aponta que 90% das células do nosso corpo pertencem a outros organismos que nele vivem constantemente, especialmente bactérias, mas também fungos, vírus, ácaros e outros, além de eventuais piolhos, carrapatos, lombrigas etc. Aproximadamente 8% do genoma humano pode ser composto por fragmentos de DNA de vírus que já infectaram a humanidade. Também percebemos nosso corpo como um organismo singular, mas somos verdadeiramente um ecossistema de espécies e processos interdependentes.
Enfim, nossa forma corporal depende da interação com toda essa biologia e com os processos químicos e fatores físicos comuns ao nosso planeta. É bastante implausível que mudando quase todos os fatores de condição ambiental, como provavelmente seria o caso em outro mundo, ainda seja dominante a convergência evolutiva das inteligências extraterrestres para corpos humanoides. Muitos dos caminhos evolutivos que levaram ao surgimento de detalhes da biologia humana foram tomados devido ao acúmulo de eventos catastróficos imprevisíveis e cuja replicação em outro mundo é altamente improvável. Por que quase ninguém relata encontros com ETs gelatinosos, semelhantes a polvos ou máquinas que não lembrem em nada animais terráqueos ou obras humanas?
Humanização dos aliens
Para muitos cientistas, essa antropomorfização dos alienígenas diz mais sobre a psicologia humana do que sobre a biologia extraterrestre. Ao longo da história, a humanidade criou inúmeras entidades mitológicas à sua própria imagem e semelhança. Ao descobrirmos novas espécies na Terra, frequentemente os especialistas ficam abismados com a capacidade da natureza em ser diversa, encontrar soluções distintas para problemas conhecidos e assumir formas antes impensadas. Muito nos surpreende que inteligências interestelares venham sempre à Ufologia na monótona forma humanoide. Fria e tecnicamente, isso soa mais como criação imaginativa do que memória testemunhal. Entretanto, quase como um lema astrobiológico, é preciso ressaltar que improvável não quer dizer impossível. Neste caso da aparência física dos ETs, prefere-se as posições expressas por Paul Davies, físico da NASA: “Não há limite para a estranheza. A mais provável forma de um ET será algo que nunca imaginamos”. Ou ainda as de Michael Michaud: “Alienígenas inteligentes podem não ser apenas mais estranhos do que imaginamos. Eles podem ser mais estranhos do que podemos imaginar. Nossas culturas limitam nossa visão”.
Se analisarmos o rápido desenvolvimento e convergência dos campos das ciências cognitivas, neurobiologia, genética, robótica, computação, engenharia de materiais e nanotecnologia, podemos deduzir que a própria forma corporal humana atual pode não ser aquela que irá explorar outros sistemas estelares. A humanidade pode estar a apenas uma ou duas gerações da criação de inteligência artificial — e ela poderia se conectar com a internet, onde estará uma parte ainda maior do conhecimento e cultura humanos. Poderia ainda projetar suas próprias inovações tecnológicas futuras, tanto de sua mente digital quanto de seu corpo robótico, superando muito rapidamente o intelecto e a capacidade física da humanidade. Nossa espécie, Homo sapiens sapiens, poderá eventualmente se fundir a essa inteligência artificial, talvez ainda combinando muitos dos benefícios da biologia orgânica, pela sua própria manipulação genética.
Essa possibilidade fantástica, advinda da pesquisa em inteligência artificial, é bastante real, caso a replicação da complexidade do cérebro humano seja possível e que ela efetivamente leve ao surgimento de uma mente autônoma, autoconsciente e inteligente. Como nossa exploração espacial indica, parece ser muito mais propício explorar o universo com radiação eletromagnética ou máquinas do que com nossos corpos orgânicos. Segundo esse raciocínio, outras inteligências cósmicas que puderam evoluir por muitos mi
lhares ou milhões de anos antes da humanidade, interessadas na exploração do universo, poderiam já ter assumido formas mais exóticas e complexas de inteligência, como máquinas conscientes ou até na forma paradoxal de onda e/ou partícula da radiação eletromagnética.
Comportamento extraterrestre
Quando se pergunta como são os ETs, pensamos logo em sua aparência, o que apresentei brevemente acima, segundo a perspectiva astrobiológica. Porém, como eles são comportamentalmente parece ser uma pergunta muito mais importante. Algo que pode rapidamente se tornar a principal questão em jogo assim que o contato entre civilizações for estabelecido. Suas intenções para com a humanidade serão benevolentes ou belicosas? É óbvio que uma civilização muito mais avançada pode ser indiferente à humanidade, especialmente se a inteligência como a nossa for um fenômeno comum para eles. Mesmo essa indiferença pode nos ser prejudicial, como quando somos indiferentes a tantas outras espécies no nosso processo de urbanização do planeta. Quanto mais avançada for uma espécie, mais difícil para nós poderá ser decifrar seu comportamento e intenções. Parece bastante óbvio que nenhuma civilização interestelar precisaria travar uma guerra por recursos como água, minérios ou energia, uma vez que esses recursos são abundantes em muitos objetos astronômicos desabitados.
A astrobiologia é crítica quanto ao fato de a Ufologia quase sempre reportar inteligências extraterrestres em corpos antropomorfizados. Mesmo quando são relatados robôs alienígenas, eles possuem um tronco com dois braços e uma cabeça
A vida pode ser o único recurso da Terra escasso no universo, o que teoricamente poderia atrair o interesse de uma inteligência extraterrestre. Ou talvez, mais precisamente, a inteligência seja esse recurso escasso, se não no universo, mas no raio de ação de uma civilização extraterrestre. Para a pergunta quanto às intenções extraterrestres, considero o pensamento do estrategista militar chinês Sun Tzu, em A Arte da Guerra, uma obra do século V, a melhor racionalização que dispomos como resposta: “As considerações da inteligência sempre incluem ambos benefícios e perigos”. Considerando o histórico e presente padrão comportamental da humanidade, nós é que podemos ser considerados uma espécie hostil, causando extinções de espécies animais e extermínio de pessoas em massa, frequentemente motivados pelo egoísmo e ambição desenfreados.
Conflitos e harmonia
Em sua busca comum por informações sobre vida extraterrestre inteligente, a astrobiologia e a Ufologia efetivamente competem e cooperam entre si. Competem quando a Ufologia alega ser evidente a presença de inteligências extraterrestres presentes ou visitando Terra, enquanto a astrobiologia mantém seu ceticismo e pragmatismo científicos. A astrobiologia coopera com a Ufologia quando revela segredos da natureza e reúne evidências sólidas sobre a possibilidade de vida alienígena, como a descoberta de milhares de planetas fora do Sistema Solar, os exoplanetas, organismos terrestres que sobrevivem a condições ambientais extremas da Terra e do espaço, os extremófilos, e propõe novas racionalizações sobre o assunto baseadas em estudos científicos.
E a Ufologia coopera com a astrobiologia quando não despreza a evidência testemunhal, que é abundante e diversa, e documental, esta mais escassa, de uma possível ação de mentes extraterrestres na Terra no presente e/ou no passado. Por mais improvável que seja para a ciência a hipótese extraterrestre ufológica, ela não pode ser facilmente descartada, e talvez nem deva ser. Esse embate intelectual entre duas visões de mundo e a corrida por evidências cada vez melhores, parece saudável e benéfico para o conhecimento de mundo e autoconhecimento do ser humano. Vamos manter nossas mentes abertas, mas com respeito mútuo, raciocínio lógico e crítico.
Exobiologia, astrobiologia ou bioastronomia?
Todas as três são terminologias técnicas ligeiramente distintas umas das outras. Exobiologia é um termo mais antigo e trataria da busca por evidências científicas da existência de formas de vida fora da Terra. Ela combina essencialmente a biologia com a astronomia, mas acaba incluindo também muitas outras ciências, como astrofísica, química, geologia, sociologia etc. Já o termo astrobiologia surgiu mais tarde e é mais abrangente. A astrobiologia não só busca por vida extraterrestre, mas também pesquisa a possibilidade das formas de vida da Terra colonizarem outros corpos celestes. Assim, astrobiologia é o estudo da origem, evolução, distribuição e o futuro da vida no universo. A exobiologia estuda o mesmo, mas apenas para formas de vida não terrestres, ou seja, extraterrestres. E, finalmente, a bioastronomia é a aplicação da astronomia em assuntos de potencial interesse biológico, como a formação de exoplanetas, a química de compostos orgânicos e a busca por sinais de rádio de inteligências extraterrestres.
Espectro eletromagnético e a luz visível aos humanos
Toda a luz que nossos olhos humanos enxergam corresponde à faixa chamada visível do espectro eletromagnético. Esta faixa que enxergamos é aproximadamente apenas 1% de toda a energia eletromagnética que viaja pelo universo. A radiação eletromagnética é transmitida através do cosmos por fótons que, como toda partícula quântica, apresenta um comportamento dual entre onda e partícula. As distintas faixas do espectro eletromagnético são divididas em intervalos de frequências, ou mais normalmente em comprimentos de onda. Um comprimento de onda é a distância entre duas “cristas”, a parte alta de onda eletromagnética, ou entre duas “cavas”, a parte baixa da onda. Alguns animais são capazes de enxergar parte da faixa do infravermelho e do ultravioleta. As ondas de rádio têm enormes comprimentos de onda, do tamanho de prédios a montanhas, e assim provavelmente são a faixa do espectro mais eficiente para comunicação a distância, como as emissões interestelares. O comprimento de onda da faixa da luz visível está aproximadamente entre 0,00075 e 0,0004 milímetros.