Os discos voadores e seus tripulantes sempre fizeram parte da história humana, ainda que fossem chamados por outros nomes e interpretados de acordo com a cultura de cada época. Todos já lemos ou ouvimos falar de anjos, mensageiros, deuses, escudos flamejantes, carruagens de fogo, navios dos céus e mais incontáveis epítetos usados para designar o que hoje chamamos de naves alienígenas e seres extraterrestres.
Sinais e pessoas vindas do céu são símbolos tão fortes que atravessaram gerações e culturas e desembocaram na literatura como nós a concebemos hoje. Embora já houvesse algo parecido no século XVIII, a ficção científica envolvendo veículos e seres de outros planetas ganhou corpo no século XIX e explodiu no século XX.
O assunto é usado regularmente como fonte de inspiração para grandes sucessos de Hollywood desde a década de 50, embora a maior parte das vezes os ETs sejam retratados sob uma luz depreciativa. Os UFOs e seus tripulantes também estão nas propagandas de produtos e de lojas e dos romances de ficção científica continuam constando histórias de visitas e de encontros com seres de outros mundos. Portanto, não causa surpresa que o tema tenha chegado ao universo musical, uma das mais expressivas formas de registro cultural que conhecemos.
1947. Apenas coincidência?
Muitas pessoas não imaginam como é o vasto número de músicas e de bandas que trataram, e tratam, de Ufologia. Quando se pede para que se citem faixas sobre UFOs ou alienígenas, muitos listarão clássicos como Starman [Homem das Estrelas], de David Bowie, baladas mais modernas como Out of Space [Espaço Sideral], da banda The Prodigy, ou trilhas sonoras como as dos filmes da série Homens de Preto [1997], estrelados pelos atores Will Smith e Tommy Lee Jones. Mas existem literalmente centenas e centenas de músicas com temática ufológica, e elas retrocedem aos anos 40. Algumas vezes — os artistas que as escreveram foram inspirados por experiências reais e não apenas por seu interesse no assunto.
A história da música com temática ufológica pode ser traçada até 1947, quando a banda de country rock The Buchanan Brothers lançou uma canção intitulada When You See Those Flying Saucers [Quando Você Vir Aqueles Discos Voadores]. O grupo formado pelos irmãos Chester e Lester Buchanan já era bem conhecido do público, mas a música tornou-se extremamente popular na época e ficou na história como uma das mais famosas da banda. Ela foi, até onde sabemos, a primeira faixa de temática ufológica a ser gravada e lançada por um selo fonográfico. A canção tinha inclinações religiosas e advertia que os UFOs tinham sido enviados por Deus para cuidar dos pecadores, o que é enfatizado pelos dois versos iniciais da letra:
“You’d better pray to the Lord when you see those flying saucers / It may be the coming of the Judgment Day / It´s a sign there´s no doubt of the trouble that´s about / So I say my friends you’d better start to pray / They’re a terrifying sight as they fly on day and night / It’s a warning that we’d better mend our ways / You’d better pray to the Lord when you see those flying saucers / It may be the coming of the Judgment Day”. Tradução: “É melhor você rezar ao Senhor quando você vir aqueles discos voadores / Pode ser a chegada do Juízo Final / São sem dúvida um sinal de problemas / Assim, eu digo: meus amigos, é melhor começarem a rezar / Pois é uma visão aterrorizante ao voarem dia e noite / Uma advertência de que retifiquemos nossas vidas / Seria melhor rezar ao Senhor ao ver aqueles discos voadores / Pode ser a chegada do Juízo Final”.
Mas o interessante a respeito dessa música é o ano em que ela foi lançada. A faixa foi colocada à venda oficialmente em 16 de julho de 1947, ano em que, como é de amplo conhecimento público, ocorreram dois dos eventos mais importantes da Ufologia: o avistamento de Kenneth Arnold e o Caso Roswell. O primeiro, a observação de nove discos voadores pelo piloto comercial Arnold sobre o Monte Rainier, no estado de Washington, ocorreu em 24 de junho. Durante o fato, ele assistiu os objetos realizarem manobras erráticas, porém controladas, as quais depois descreveria aos jornais como sendo parecidas com “um pires deslizando sobre a água”.
O outro evento envolveu a queda de um UFO no começo de julho daquele ano próximo da cidade de Roswell, no estado do Novo México. O acontecimento foi oficialmente anunciado ao público no dia 08 por meio de um agora famoso artigo de jornal intitulado Força Aérea Captura Disco Voador em um Rancho na Região de Roswell. Embora a manchete tenha sido publicada em um jornal local, a notícia se espalhou pelo mundo, obviamente.
Mesmo os dois incidentes acontecendo poucas semanas antes do lançamento da música, é provável que os irmãos Buchanan tenham baseado seu titulo e a letra em um deles, ou quem sabe nos dois. Mesmo assim, precisamos lembrar que o período de tempo entre os fatos em Roswell e o lançamento da canção foi muito curto para que os irmãos escrevessem e lançassem a canção.
Sucessos nos anos 50 e 60
Os anos 50 trouxeram consigo o nascimento de uma nova subclasse de rock and roll, com foco na ficção científica e no espaço. Inevitavelmente, muitas das músicas do gênero continham menções à invasão alienígena ou à comunicação com seres do espaço exterior, e não se pode desconsiderar a influência do cinema e do início da corrida espacial como fonte inspiradora dos compositores. Uma das canções mais conhecidas desse tipo é Flying Saucers Rock & Roll [Rock and Roll do Disco Voador] do músico rockabilly Billy Lee Riley.
Riley era um cantor e compositor do estado do Arkansas, mas suas músicas foram gravadas inicialmente em Memphis, no Tennessee, em 1955. Contudo, seu maior sucesso, pode-se dizer, foi essa canção falando sobre discos voadores, lançada em fevereiro de 1957 — a capa do compacto apresentava várias naves douradas flutuando sobre a terra. A letra da música descreve um UFO e seus pequenos ocupantes verdes vindos de Marte, os quais, após pousarem, formam uma banda e começam a tocar.
Outro grande exemplo dos anos 50, e uma grande novidade à época, é o disco The Flying Saucer [O Disco Voador], de Bill Buchanan e Dickie Goodman. Mais do que conter faixas inteiramente musicais, o disco era um mix de palavras faladas e clipes de muitas músicas populares da época. Hoje, isso é comumente descrito como um mash up e The Flying Saucer foi, talvez, o primeiro exemplo disso. Ele contava a histó
;ria de uma invasão alienígena vinda de Marte, utilizando-se de reportagens e relevantes excertos musicais.
Com a corrida espacial plenamente estabelecida em meados dos anos 60, a música da época seguiu o assunto. Os temas de ficção científica da década anterior tomaram uma faceta mais psicodélica, mas continuaram a focar em tópicos similares. Um grande exemplo do início dos anos 60 foi o álbum conceitual largamente instrumental I Hear a New World: An Outer Space Music Fantasy [Eu Ouço um Novo Mundo: Uma Fantasia Musical do Espaço Sideral], por Joe Meek & The Blue Men.
Ainda que não falasse especificamente sobre UFOs, o tema do disco estava centrado em torno da ideia de viagem espacial e de encontros com espécies extraterrestres. Meek era fascinado pelas viagens da Agência Espacial Norte-Americana (NASA) ao espaço e também um crente na ideia de vida em algum lugar no nosso Sistema Solar. Em uma entrevista sobre o álbum, o artista declarou: “No primeiro momento, eu ia gravá-lo com músicas que eram completamente fora deste mundo, mas me dei conta de que isso seria muito pouco divertido e assim mantive a construção da música com um pé na Terra”. Contudo, o álbum ainda continha muitos efeitos sonoros não usuais e amostras vocais de alta frequência para criar uma atmosfera de outros mundos.
Outro artista conhecido por ter interesse especial no assunto UFO foi Reg Presley, o líder vocal da banda inglesa de rock The Troggs, que se formou em Hampshire, em 1964. Embora as músicas do grupo não fossem focadas no assunto ufológico, Presley nunca escondeu sua grande fascinação pelo tema — o cantor se interessava particularmente pelo fenômeno dos agroglifos e acreditava que as figuras eram mensagens de visitantes extraterrestres.
Em meados dos anos 90, enquanto ainda excursionava com a banda, Presley tornou-se anfitrião de sua própria série de TV, chamada de The Reg Presley UFO Show, na qual investigou vários avistamentos e participou de acampamentos noturnos para observação do céu. Embora o interesse do artista pelos discos voadores fosse mantido bem afastado de seu trabalho com a banda, a capa do álbum com os maiores sucessos do grupo mostrava os músicos parados no meio de uma plantação, enquanto um UFO flutuava sobre eles.
Nos anos 70
Em se tratando de temática ufológica, o primeiro nome que nos vem à mente é o da banda UFO. É verdade que a maioria das músicas do grupo não são realmente focadas no assunto, mas existem várias conexões entre o grupo e a Ufologia. Muitos dos álbuns lançados por eles ou mostram UFOs ou têm nomes relacionados ao tema. Na capa de UFO2: Flying [UFO2: Voando], lançado em 1971, há um humanoide sem cabelo voando pelas nuvens, acompanhado de dois artefatos em forma de disco. Phenomenon [Fenômeno], de 1974, mostra um UFO voando sobre os subúrbios e um homem no chão olhando para o objeto. Alguns títulos de álbuns posteriores incluem Visitors In The Night [Visitantes Na Noite], Making Contact [Fazendo Contato] e The Visitor [O Visitante].
Ocasionalmente, a banda discutia o assunto UFO em sua música. Silver Bird [Pássaro Prateado] retirada de UFO2: Flying é completamente sobre alguém descobrindo uma nave danificada com tripulantes vivos. O primeiro verso da faixa diz: “This morning as I walked, I gazed out across my land / Lying there all still lying there upon the sand / A big silver bird had planted itself into the ground / Big silver bird let me inside your plane / Want to fly so high, fly me high away”. Tradução: “Esta manhã ao caminhar, eu passeei por minhas terras / Parado lá, todo parado lá sobre a areia / Um grande pássaro prateado tinha se fincado sobre o solo / Grande pássaro prateado, deixe-me entrar em seu avião / Quero voar alto, leve-me às alturas”.
Mais uma conhecida banda do começo dos anos 70 que tem ligações com o assunto é a Klaatu. Esse grupo de psycho rock canadense retirou seu nome do robô do clássico filme de ficção científica O Dia em que a terra parou [1951]. Em 1976, o grupo lançou sua famosa Calling Occupants of Interplanetary Craft [Chamando os Ocupantes da Nave Interplanetária].
A canção foi inspirada no Dia do Contato Mundial, um evento real que aconteceu em março de 1953. Uma organização conhecida como International Flying Saucer Bureau enviou um boletim aos seus membros pedindo a eles para, coletivamente, propagarem uma mensagem telepática aos extraterrestres em determinado dia e hora. A mensagem começava com a mesmas palavras do título da canção do Klaatu. A música se tornou tão popular que foi gravada posteriormente por várias bandas, incluindo The Carpenters.
David Bowie
Não há como fazermos um apanhado amplo sobre bandas que trabalharam o tema do contato extraterrestre sem falar do único e absoluto David Bowie, recentemente falecido. Embora o ídolo inglês tenha formado sua primeira banda com 15 anos de idade, em 1962, foi em 1969 que ele atingiu o sucesso comercial com o lançamento da conhecida música Space Oddity [Estranheza Espacial]. A canção apresentava um astronauta ficcional chamado Major Tom e falava sobre o programa espacial — a oportunidade não poderia ser melhor, pois foi apresentada apenas cinco dias antes do lançamento da Apollo 11.
Bowie continuou explorando temas como o espaço e inteligência alienígena, o que o levou a fazer um de seus álbuns mais influentes, Ziggy Stardust and the Spiders from Mars [Ziggy Stardust e as Aranhas de Marte], em 1972. A peça era focada em seu alter ego, um músico de rock chamado Ziggy Stardust, que agia como mensageiro de uma espécie extraterrestre. O trabalho criou controvérsias por cobrir temas como exploração sexual, política e opressão. Além disso, incluía uma das mais conhecidas músicas de temática alienígena, Starman. Outras faixas também falavam sobre o assunto, incluindo Loving the Alien [Amando o Alienígena], Looking for Satellites [Procurando por Satélites], I Took a Trip on a Gemini Spaceship [Eu Viajei em uma Espaçonave Gemini] e She Was Born in a UFO [Ela Nasceu em um UFO].
O interesse de Bowie pelo assunto, porém, foi bem além de sua criação musical — ele era fascinado pela ideia de raças extraterrestres e usou muito de seu tempo livre pesquisando sobre Ufologia. Por vezes interrompia entrevistas para checar, no céu, sinais
de atividade extraterrestre. Ao longo dos anos, Bowie teve numerosos avistamentos que provavelmente o influenciaram em sua composição.
A música que veio para ficar
Para finalizar, queremos falar sobre a cantora Helen Wheels, que tocou com a banda The Helen Wheels Band de 1977 a 1987 e depois juntou-se à Skeleton Crew. Helen também escreveu letras para o grupo Blue Oyster Cult. Paralelamente à sua carreira musical, ela ganhou vários prêmios de fisiculturismo. Quando era jovem, Helen Robbins, seu nome real, e seu irmão Peter foram abduzidos no terraço de sua casa em Rockville, em Long Island, no estado de New York.
Helen trabalhou junto aos pesquisadores de contatos Budd Hopkins e Pete Mazolla, recordando suas experiências. Seu irmão veio a se tornar um respeitado ufólogo, muito famoso por seu trabalho no Caso da Floresta Rendlesham. Assim como outros artistas que também tiveram suas experiências, a música de Helen foi influenciada por sua abdução, levando a numerosas faixas focadas no assunto, incluindo The Saucer Song [A Canção do Disco Voador].
De 1980 em diante, mais e mais bandas tomaram o tema UFO como inspiração. Existem algumas exclusivamente focadas no tema, como a CEIV, cujo nome é uma abreviação para Contatos Imediatos de Quarto Grau em inglês [Close Encounters of the Fourth Kind], além da Element 115 e a Unidentified Funk Object. Há incontáveis canções que ou mencionam diretamente UFOs, as abduções e os visitantes extraterrestres ou cobrem o assunto de forma mais metafórica. Músicas com temática ufológica certamente fazem parte da visão do público sobre o assunto e estamos certos de que isto continuará assim nos anos vindouros. Essas canções vieram para ficar.