Em seus quase 70 anos de existência, a Ufologia, que começou como uma febre temporária com traços de histerismo social sobre discos voadores, se transformou em um assunto sério e que envolve mais camadas e sutilezas do que se pode perceber à primeira vista. Por outro lado, se o público em geral, principalmente o norte-americano, embarcou na tal febre dos discos voadores e a utilizou para de alguma forma se abstrair dos horrores da Segunda Guerra e do medo da Guerra Fria, os militares de todo o mundo levaram o assunto muito a sério.
O perigo atômico, a polarização do planeta e a caça aos nazistas que se espalharam pelo mundo formaram um caldo de pânico e preocupação surdos, que deixaram as forças militares da Terra de prontidão permanente. E, como se tudo isso não fosse o suficiente, ainda havia os misteriosos UFOs e OSNIs que não davam sossego aos tais militares, desafiando suas capacidades de monitoramento e perseguição. Muitas pessoas acreditam que apenas os países do Hemisfério Norte viviam esse clima de pânico generalizado, mas isso não é verdade.
Embora a América do Sul tenha sentido menos os horrores da época e não tivesse, ao menos aparentemente, grande influência na Guerra Fria, não podemos esquecer que dois dos submarinos alemães U-Boat escolheram as costas argentinas para se renderem e que muitos nazistas escolheram o sul do Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai para se esconderem. Da mesma forma, embora nenhum país de nosso continente tivesse poder atômico ou estivesse diretamente envolvido no cabo de guerra do poder mundial, todos sofreram as consequências políticas dele.
Currículo invejável
Esse panorama tenso e recheado de histórias fantásticas é um terreno muito conhecido de nosso entrevistado desta edição. No momento em que tem seu livro UFOs na Antártida lançado no Brasil pela Biblioteca UFO (Código LIV-038 da coleção Biblioteca UFO. Confira na seção Shopping UFO e em anúncio nesta edição), o psicólogo social e pesquisador Rubén Morales revela seus segredos neste diálogo. Ele é um dos mais famosos ufólogos da Argentina e o grande especialista a ser consultado quando o assunto é a presença de UFOs no Continente Branco. Com uma abordagem firme e metódica, Morales dá à Ufologia o respeito que ela merece — analisa-a sob um prisma muito mais aberto do que o usado pela maioria dos pesquisadores.
Nascido em Buenos Aires, em 1958, nosso entrevistado é também professor de comunicação política na Universidad Del Salvador (USAL), de Buenos Aires, onde cursou seu mestrado em marketing político e tem grande experiência profissional em publicidade política e campanhas eleitorais. Na década de 70, Morales pertenceu à Comisión de Investigaciones Ufológicas (CIU), um grupo civil de orientação científica que editava a revista Ufopress. Em 2010 criou, e coordena até hoje, as reuniões mensais do Café Ufológico RIO54, em Buenos Aires, com seu colega Mario Lupo. A atividade deu origem à realização de encontros similares em outras cidades que integram a Rede Argentina de Cafés Ufológicos, onde se realizam debates e exposições informais sobre o Fenômeno UFO. Ele também faz parte de dois grupos internacionais, um norte-americano e outro francês.
O pesquisador escreveu diversas notas sobre temas antárticos, sendo merecedor, em duas oportunidades, do prêmio Almirante Irizar, que se atribui aos melhores artigos sobre os casos no Continente Branco publicados no histórico Boletín del Centro Naval de Buenos Aires. O autor também publicou artigos no Boletín de la Associación Polar Pingüinera, no site da Fundación Marambio e na revista do British Antarctic Survey Club. Morales escreveu o prólogo do livro Fenómeno OVNI: Reflexiones, Investigaciones y Estudios (Fenômeno UFO: Reflexões, Investigações e Estudos, Instituto de Publicações Navais, 2008), do tenente de fragata Daniel Perissé, o oficial da Marinha Argentina que foi testemunha e investigador principal das observações de UFOs na Ilha Decepción, durante o ano de 1965.
Seu livro brasileiro, UFOs na Antártida, lançado durante o VIII Fórum Mundial de Ufologia, em Foz do Iguaçu, constitui a maior compilação de informes e relatos de avistamentos de objetos voadores inexplicáveis no Continente Branco, com múltiplos testemunhos de expedicionários antárticos militares e civis de diversos países. A obra reúne um grande conjunto de arquivos oficiais, documentos e material já desclassificado sobre as controversas manifestações de UFOs no extremo sul — uma investigação jamais realizada, que exigiu do autor mais de 10 anos de trabalho e que vem à luz pela primeira vez em sua publicação.
Polêmico e verdadeiro
Bem formado e com opiniões sensatas e firmes que englobam todos os aspectos e possibilidades do fenômeno ufológico, Rubén Morales acredita que ufólogos e céticos limitam o debate porque “ficam girando em torno dos UFOs, sem expandirem as possibilidades do debate. Uns para defender o assunto, outros para negá-lo”. Da mesma forma, é crítico da falta de preparo e educação formal dos investigadores. “A maioria deles tem apenas o ensino médio. Falta universidade à Ufologia”, declara de maneira lúcida.
Suas afirmações sobre o lado místico do assunto também são interessantes e, embora possam inflamar os ânimos de alguns, também deixam margens a outros tipos de questionamento. O autor diz que há anos grupos místicos afirmam que mantêm contatos com extraterrestres. “Estariam todos mentindo? E há tanto tempo?”, pergunta. Por outro lado, nosso entrevistado afirma que muitos integrantes da chamada Ufologia Mística trocaram o divino pelos alienígenas — e isso fica evidente na afirmação de que “os anjos de ontem são os extraterrestres de hoje”.
Os grupos ufológicos estão sujeitos à liderança de um único indivíduo, e essas lideranças costumam ser autoritárias, uma vez que não contemplam a renovação democrática. Além disso, os grupos seguem a linha de pensamento do líder. Para o pesquisador, essa substituição tem origens antropológicas antigas e se solidificou quando os rituais de êxtase foram substituídos por outros mais calmos e comportados, nos quais os fiéis são apenas espectadores passivos. “A divindade deixou de fazer parte do cotidiano e se instalou no infinito, deixando as pessoas com um sentimento de orfandade religiosa”, explica. E essa orfandade, de alguma forma, foi preenchida pelos extraterrestres.
A entrevista deste mês é profunda e fundamental para que possamos olhar a Ufologia com a seriedade e o compromisso que o assunto demanda, sem perder de vista a ponderação nas paixões. Pois, como disse o pesquisador, “se o assunto lhe causa incômodo, talvez seja hora de afastar-se dele para amadurecer seus conceitos”. A seguir vamos conferir o que nosso entrevistado tem a dizer sobre este e muitos outros assuntos.
Como começou seu interesse pela fenomenologia ufológica?
Existem muitas respostas possíveis para esta pergunta, e uma delas talvez seja o fato de que, aos seis anos de idade, vi passar uma estrela vermelha veloz no céu de Buenos Aires e escrevi meu primeiro relatório ufológico, obviamente com o vocabulário próprio de um menino daquela idade. Guardei cuidadosamente a folha de papel. Seis anos mais tarde, ou seja, aos 12 anos, achei aquele primeiro relatório e os dados que ele continha foram suficientes para eu deduzir que havia se tratado de um meteoro. Ou seja, aos 6 anos eu tive um avistamento e fiz meu primeiro relatório escrito e, aos 12 anos, minha primeira interpretação racional de um fenômeno.
Com que idade teve seu primeiro contato com os estudos ufológicos?
Com certeza foi na adolescência. Era a época do apogeu do Projeto Apollo, das viagens à Lua, das sondas enviadas aos planetas longínquos do Sistema Solar, e naquela época parecia que a conquista do espaço estava a dois passos de nós — ao menos era isso que indicava a propaganda norte-americana. Em 1973, eu me associei a um grupo juvenil denominado Associação Astromodelista Argentina — Divisão Investigativa de Óvnis (AAA), onde, além de pesquisar UFOs, também lançávamos pequenos foguetes com motores de combustíveis sólidos, de várias etapas, e fazíamos sua recuperação com paraquedas. Em 1976, ingressei na Comisión de Investigaciones Ufológicas (CIU), um grupo de entusiastas que procurava abordar o assunto UFO sob uma perspectiva científica e publicava a lembrada revista Ufopress, dirigida por Guilherme Roncoroni, um dos poucos especialistas em computação que havia nos anos 70. No grupo, todos colaboramos com ele para a realização da primeira pesquisa estatística argentina de casos UFO, feita ineditamente por computação.
Atualmente o senhor participa de algum grupo de pesquisas ufológicas em seu país?
Sim. Coordeno, junto com o pesquisador Mario Lupo, o Café Ufológico RIO54, de Buenos Aires, que não é um grupo, mas um espaço aberto para reunião e conversa, para o qual confluem integrantes dos mais diversos grupos ufológicos — inclusive daqueles que estão em desacordo entre si. No ambiente do café ufológico participamos em um clima de respeito mútuo e eu adoro dialogar com todos, mas prefiro estar livre a pertencer a grupos.
Por que pensa assim?
Os grupos ufológicos habitualmente estão sujeitos à liderança de um único indivíduo, e essas lideranças costumam ser autoritárias, uma vez que não contemplam a renovação democrática. Além disso, os grupos seguem a linha de pensamento do líder, e eu valorizo a liberdade de pensamento, a liberdade de ter amigos e amigas pertencentes aos mais diversos grupos e que respondem a diferentes tendências e enfoques. No âmbito internacional, pertenço à direção nacional argentina da Mutual UFO Network (MUFON), dos Estados Unidos, representada pelo doutor Andrés Salvador, e faço parte do conselho consultivo da Academie d’Ufologie, da França, sem que isso signifique compartilhar monoliticamente de seus pontos de vista. Acredito que a Ufologia tem que se dar permissão para o debate, para se desfazer de velhos modelos e perder o medo de que se questione tudo novamente.
Quais seriam esses velhos modelos que deveriam ser mudados?
Eu me refiro a divisão de pensamento que coloca de um lado o culto aos UFOs e, de outro, o ceticismo, e ambos ficam às voltas ao redor do mito extraterrestre. O primeiro em atitude de defesa e, o segundo, de negação simples, ao invés de ter uma atitude de dúvida. Por não conseguirem atravessar esse sistema fechado e dualista do tipo preto ou branco, perdem a oportunidade de ver um prisma de cores fora dessa casca. Eles obstruem a multiplicidade de abordagens que transcende esse esquema bipolar, maniqueísta e paranoide, onde “nós somos os donos da verdade”. Ao escrever meu livro, redescobri — e esse é um assunto discutido em vários capítulos da obra — que nos anos 60 esse sistema de pensamento não estava tão viciado e que os pesquisadores da Marinha Argentina, por exemplo, podiam se dar a permissão de analisar cada caso ufológico com amplidão de critérios. Eles faziam um esforço metódico para periciar cada evidência detalhadamente, sem fanatismos, e com a prudência de não dar opiniões apressadas a favor ou contra — todas essas virtudes intelectuais hoje em dia caíram em desuso.
Houve uma época em que a Força Aérea e a Marinha Argentinas tinham equipes técnicas que incluíam homens que pesquisavam os UFOs com método e paixão. E não o faziam para desqualificar o assunto e as testemunhas envolvidas.
O senhor é um dos ufólogos mais experientes em Antártida. Como interpreta o Fenômeno UFO?
Bem, não é coincidência que eu tenha observado aquele meteoro em 1965, precisamente quando havia muita difusão midiática sobre os avistamentos que ocorreram na Ilha Decepción e na Ilha Laurie, ambas na Antártida Argentina. Depois, os caminhos da vida me levaram a conhecer o capitão Daniel Perissé, uma testemunha privilegiada dos acontecimentos que havia pesquisado os casos, já que era ele o comandante do Destacamento Naval Decepción, braço da Marinha, em 1965. Nos seus últimos anos, o capitão foi um amigo e me relatou várias vezes, em primeira pessoa, os acontecimentos da época. Ele também me deu os nomes dos outros integrantes das unidades antárticas que participaram dos avistamentos, que registro em meu livro UFOs na Antártida. Quando consegui contatar vários de seus subordinados, eles visitaram Perissé e se reencontraram uns com os outros, após muitas décadas sem contato. Foi realmente emocionante.
E então o que houve?
Então eles começaram a me dar os seus testemunhos, alguns a favor, outros contra. Esses novos dados me abriram as portas para a localização de mais informações documentais sobre a ocorrência ufológica na Antártida, após o que acabei acumulando um volume muito grande de material sobre o assunto, em sua maioria desconhecido até então. Depois de um tempo, finalmente consegui organizar, analisar e escrever meu livro. Eu acredito que haver reunido boa parte dos integrantes do Destacamento Naval Decepción de 1965 é um trunfo muito superior à publicação da obra, mas se soma a ela.
Eu gostaria de explorar mais esse encontro entre Perissé e seus comandados. O senhor poderia nos falar sobre isso?
Perissé é sinônimo de Ufologia Oficial na Argentina. Tudo começou quando ele estava internado em uma clínica e me falava a respeito dos outros homens do Destacamento Naval Decepción. A partir disso, consegui localizá-los e eles se reencontraram com seu antigo comandante e começaram a propor reuniões entre si. Imediatamente descobriram que a parceria nascida na Antártida permanecia intacta, mesmo após se passarem mais de quatro décadas. Há que se reconhecer que Perissé tinha uma grande capacidade de liderança, o que permitiu criar fortes laços de amizade no grupo sob seu comando. Em 08 de dezembro de 2007, realizamos a primeira reunião do destacamento de 1965, e a partir de então multiplicaram-se os novos encontros em diferentes locais do país — fui convidado para todos eles com grande alegria. Aqueles homens recuperaram parte de sua história, de seus ideais de juventude, de suas alegrias compartilhadas. Recuperaram a “amizade antártica” que sempre esteve latente em seus corações. Essa foi a grande conquista. Meu livro mostra isso.
Poderia nos falar mais um pouco a respeito da ação de Perissé em relação aos UFOs?
Claro. Muitos não sabem, mas houve uma época em que a Força Aérea e a Marinha Argentinas tinham equipes técnicas que incluíam homens que pesquisavam os UFOs com método e paixão. Diferentemente de certas comissões atuais, não o faziam para desqualificar o assunto e as testemunhas com explicações simplistas, mas procuravam saber algo a mais. O então capitão Daniel Alberto Perissé, falecido em 2008, foi talvez o último expoente dessa camada de militares comprometidos com a Ufologia. Perissé recebeu sólida formação como infante da Marinha, mas também era um grande ginasta e tinha ampla cultura geral. Amava a música clássica e a ciência, e sempre fazia cursos de aperfeiçoamento em assuntos navais. Ele interessou-se pela Ufologia e pela parapsicologia, considerando-as como os novos desafios da ciência. Dentre os muitos cargos hierárquicos que ocupou, em 1965 — quando tinha o grau de tenente de fragata — foi comandante do Destacamento Naval Decepción, localizado na ilha do mesmo nome, um dos cenários antárticos onde aconteceram os famosos avistamentos de UFOs daquele ano. A partir de então, foi o principal pesquisador e difusor desses casos, assim como continuou pesquisando outros ao longo do tempo.
De que forma ele o influenciou como ufólogo?
Lembro-me que nos anos 70, quando eu participava na edição da revista Ufopress, Perissé enviava artigos pelo correio com as iniciais “C. D. P.” para resguardar a sua identidade. Ao se reformar [Aposentar] da Marinha, em 1985, intensificou seu relacionamento com os ufólogos civis, multiplicou suas atividades no assunto, participou de congressos sobre UFOs, deu conferências, concedeu entrevistas, escreveu artigos em revistas e chegou a publicar seu livro Fenómeno OVNI: Reflexiones, Investigaciones y Estudios (Fenômeno UFO: Reflexões, Investigações e Estudos, Instituto de Publicações Navais, 2008). Em seus últimos anos, me disse uma frase que é um farol de luz para nós, que pesquisamos o assunto: “Sempre que se fala em mistério, é porque há ocultamento de informação”.
Os casos antárticos descritos em meu livro são observações singulares, com detalhes intrigantes e sugestivos. Notei que certos incidentes parecem se repetir e que há cenas muito similares ocorridas em diferentes anos e em bases de diferentes países.
Quais são os casos ufológicos ocorridos na Antártida que considera os mais importantes? O senhor pesquisou algum deles pessoalmente?
Em princípio, não pesquisei nenhum caso in situ [No local], porque a Antártida fica longe demais. Mas não descarto um dia realizar essa viagem. Eu adoraria, seria emocionante. Mas, sim, tive acesso a muitos depoimentos diretos de invernantes antárticos, em sua maioria argentinos, como também obtive informação decisiva de antárticos chilenos e britânicos. No meu livro, a recopilação testemunhal está cruzada com fontes documentais e jornalísticas, selecionadas com critérios que priorizam a qualidade — e há nele, ainda, casos ufológicos reportados em bases austrais de diversos países, como Estados Unidos, União Soviética, África do Sul, Nova Zelândia etc. Os avistamentos de UFOs de 1965, que correspondem ao Chile, Reino Unido e Argentina, mereceram um tratamento mais extenso e intenso, não por serem mais importantes, mas porque encontrei maior quantidade de dados sobre eles para analisar. No conjunto, os casos antárticos descritos na obra não parecem se moldar ao estereótipo da Ufologia clássica. Eles são observações singulares, com detalhes intrigantes, sugestivos. E notei que certos incidentes parecem se repetir e que há cenas muito similares ocorridas em diferentes anos e em bases de diferentes países, mas sempre na Antártida, esse continente tão pouco conhecido e tão misterioso, ainda em nosso século.
Seu livro foi traduzido para o português e já está disponível em nosso país. Poderia nos adiantar alguns detalhes dos casos que diz estarem fora da Ufologia clássica? Por que são tão singulares?
Existem dois aspectos que os diferenciam e ambos são fornecidos pelo meio antártico. O primeiro é a geografia, pois tratam-se de cenários despojados, paisagens e céus limpos, praticamente livres de intervenção humana — lá não há a saturação tecnológica que contamina as cidades e que pode dar lugar a toda espécie de estímulo ótico. Isso faz com que os avistamentos sejam casos registrados em um entorno ideal para a pesquisa. O segundo aspecto é o fator humano. Na Antártida há uma altíssima concentração de cientistas e militares, ao contrário do resto do mundo. São pessoas treinadas na observação técnica e científica e na elaboração de documentos, o que nos obriga a revisitar seus relatórios de casos ufológicos com o máximo de cuidado, até os mínimos detalhes. Afinal, que outra coisa podemos fazer quando uma das testemunhas é o reconhecido cientista neozelandês Claude Taylor, ou o experimentado meteorologista Rubens Junqueira Villela, o primeiro brasileiro a chegar ao Polo Sul?
Há mais alguma coisa relevante que os diferencie?
Sim, há algo mais. Eu gostaria de definir de forma mais exata, mas não sei se é possível. Veja, há certas correlações muito finas, certos detalhes entre os diferentes casos ufológicos antárticos que descobri conforme ia reunindo o material para UFOs na Antártida, que parecem indicar um denominador comum entre diferentes acontecimentos, e é uma constatação tão sutil que não percebi enquanto analisava os casos individualmente. É muito provável, inclusive, que os leitores do livro cheguem a outras deduções que escaparam a este autor.
Em termos mundiais, quais casos ufológicos o senhor acredita serem os mais importantes? Por quê?
Eu resisto a acreditar que haja algum caso que seja mais importante do que outro, porque talvez a chave para decifrar o enigma surja de eventos que, a princípio, parecem pequenos e irrelevantes. Por exemplo, o grande caso mundial é Roswell, e ninguém duvida disso. Correram rios de tinta sobre esse assunto, se escreveram livros, há filmes e documentários às dúzias e, ao final, temos somente um monte de dados contraditórios envolvidos em ocultamentos, versões dos serviços de inteligência, desinformações e falsas autópsias. Que ensinamento verdadeiro, que conclusão positiva nos deixou o Caso Roswell? Por enquanto, nada. Talvez tenha deixado um ensinamento quanto à manipulação de informação, quanto ao comportamento da opinião pública, sobre fenômenos psicossociais e pesquisas de crenças contemporâneas. Há muitos outros casos comoventes, como a Operação Prato, de 1977, na ilha de Colares, por exemplo. E os estranhos fenômenos na Vila de Trancas, na Argentina, em 1963. Outro episódio jamais esclarecido foi o pouso de um aparelho com humanoides em Valensole, na França, e esse aconteceu exatamente quando estavam ocorrendo os avistamentos antárticos de 1965.
No Brasil, graças à campanha UFOs: Liberdade de Informação Já!, que a Revista UFO conduziu junto da Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU), foram alcançados resultados significativos na liberação de documentos ufológicos oficiais, até então classificados como secretos. Existe alguma campanha similar em andamento na Argentina?
Sim, vi notícias a respeito da liberação de documentos ufológicos brasileiros que, claro, merecem o meu maior respeito, porque tudo que seja para liberar informação ao público é muito bom. Vi também alguns desses arquivos, mas não posso opinar a respeito de seu conteúdo porque não achei documentos relacionados com a Antártida, que foi o assunto ao qual me dediquei nos últimos anos. Incluindo o avistamento do meteorologista brasileiro Rubens Junqueira Villela [Consultor da Revista UFO], ocorrido na Baía de Alrantazgo, que resgatei em uma excelente publicação francesa. Em compensação encontrei — e estão publicados no livro — documentos oficiais e semioficiais norte-americanos, britânicos, chilenos, australianos, neozelandeses e argentinos que se referem a observações realizadas na Antártida. Um interessante exercício foi comparar esses arquivos entre si e confrontá-los com fontes civis confiáveis, o que me levou a desmascarar algumas estratégias de comunicação política que tinham como objetivo a manipulação de informação para gerar climas de opinião.
Mas, e quanto à liberação de documentos ufológicos na Argentina?
Em meu país existe uma lei de liberdade de informações que até o momento não foi aplicada ao assunto UFO, e os poucos documentos oficiais que conhecemos sobre pesquisas realizadas pela Força Aérea, Marinha e pela Polícia de Fronteira provêm de colaborações espontâneas que não respondem a um programa geral de liberação. Realmente, existe uma comissão oficial dedicada aos UFOs dentro da Força Aérea Argentina (FAA), mas que desde 2011 até hoje trocou de comandante diversas vezes, sem que nenhum deles se dedicasse à árdua tarefa que significa um processo sério de liberação — processo esse, devo dizer, que deveria ser realizado com grande responsabilidade e de forma peremptória. No meu blog Rio 54 [Endereço: www.rio54ovni.blogspot.com] publiquei, junto com o perito Mario Lupo, diversos artigos sobre as idas, vindas e contradições dessa comissão. Seria desejável que se criassem outros comitês oficiais em meu país, por exemplo na Marinha, com objetivos e métodos mais exatos, concentrando-se em estabelecer uma comunicação transparente com os pesquisadores civis e com a população em geral.
Em meu país existe uma lei de liberdade de informações, mas que até o momento não foi aplicada ao assunto UFO. Os poucos documentos oficiais que conhecemos provêm de colaborações espontâneas que não respondem a um programa geral de liberação.
A Ufologia moderna pretende ser reconhecida pela ciência. Em sua opinião, qual seria o caminho a ser seguido para se alcançar esse reconhecimento por parte da comunidade científica?
Esse é um assunto medular para o necessário debate sobre o qual falamos. Muitos ufólogos reclamam que suas atividades são ignoradas pela ciência ortodoxa, mas quando começamos a estudar seus currículos percebemos seu baixo nível de formação acadêmica — alguns nem ao menos acabaram o colegial, e sem ter completado trabalhos científicos ou acadêmicos sobre quaisquer outros assuntos, por que a ciência os levaria a sério? Não somos formados em ciência alguma. Outros ufólogos percorrem os sets de TV passando mensagens sensacionalistas e mostrando vídeos suspeitos para elevar a audiência dos canais. Por que a ciência vai nos ter em conta, se nenhum cientista faria parte dessas intervenções midiáticas da imprensa ruim? Há ufólogos que se refugiam todo dia no assunto dos UFOs, mas, no entanto, são permanentes desocupados ou ganham a vida lendo tarô, fazendo regressão a vidas passadas, terapias com florais e outras práticas que estão nas antípodas do pensamento científico. Por que a ciência se interessaria por nós se fazemos exatamente o contrário? Se estamos sempre bebendo cerveja, não podemos esperar sermos aceitos no clube dos especialistas em vinho. Mas as possibilidades de abrir portas científicas são excelentes hoje em dia, e já há teses universitárias a respeito do assunto, trabalhos publicados com critérios acadêmicos etc. Realizar esse tipo de serviço é uma forma inteligente e silenciosa de se inserir no mundo científico.
O senhor fala sobre isso em seu livro?
Sim. Inclusive, um dos capítulos, chamado O Dia em que a Argentina Reconheceu os UFOs, foi originalmente meu trabalho final na disciplina opinião pública, quando eu estava finalizando um mestrado em marketing político, no ano 2010. E mereceu nove pontos. Além disso, a comunidade científica atual tem critérios mais amplos do que em décadas passadas. Por exemplo, no capítulo citado se recolhem opiniões de diferentes personalidades a respeito da onda que assolou a Argentina em 1965, entre elas a do engenheiro Conrado Estol, secretário da Comissão Nacional de Pesquisas Espaciais. Ele dizia, de forma arrogante: “O que vamos pesquisar? O testemunho de um caminhoneiro do interior?” Há meio século havia lugar para esse exagerado autoritarismo científico, mas se alguém dissesse alguma coisa assim hoje em dia seria imediatamente denunciado pelos organismos contra a discriminação e repudiado pelo sindicato dos caminhoneiros.
Quando apresentou sua tese de mestrado, o senhor sofreu algum tipo de discriminação? Como foi a repercussão no meio acadêmico?
Bem, já disse que esse trabalho final mereceu nove pontos em uma escala que vai até 10, portanto, uma nota excelente, de modo que não houve discriminação ao assunto em si. Além do mais, a Universidade Del Salvador, onde defendi a tese, foi fundada pela Congregação dos Jesuítas, que se caracteriza pela amplidão de critérios em todos os campos do conhecimento. A instituição pertenceu ao padre Benito Segundo Reyna, a quem tive o prazer de conhecer pessoalmente. O padre Reyna era um ativo pesquisador de UFOs nos anos 60 e 70, no Observatório Adhara, em Buenos Aires. A universidade realizava experimentações parapsicológicas com plantas, assim como fazia o padre Oscar Gonzalez Quevedo, no Brasil, com quem estavam em contato.
O senhor imagina que, se a política da universidade fosse outra, seu trabalho também seria bem aceito? Ou que outra universidade o aceitaria?
Minha experiência me indica que dentro de todos os órgãos oficiais e privados há pessoas, em todos os níveis de comando, que expressam boa receptividade e até interesse real pelo assunto dos UFOs. Nós só temos que saber como nos aproximar delas com o respeito e a paciência que suas hierarquias merecem. Muitos ufólogos acreditam que se fazer notar perante os organismos oficiais é entrar chutando a porta, exigindo e reclamando, e não percebem que essa atitude prepotente conduz diretamente à rejeição. Depois reclamam quando são efetivamente rejeitados.
O senhor acredita que em algum momento haverá um contato definitivo entre as civilizações extraterrestres e os humanos? Como imagina que isso acontecerá?
Esse tipo de especulação baseia-se em um mecanismo psicológico projetivo, ou seja, como a única civilização que conhecemos é a terrestre, projetamos que a outra cultura deva ter condutas similares às nossas, pela falta que temos de referências externas. O contato pode acontecer de muitas e imprevistas formas, mas — seguindo com o critério projetivo — sempre que em nosso planeta houve o encontro entre uma cultura superior e outra inferior, a superior impôs as regras do jogo e repetitivamente acabou submetendo a inferior. Isso não é um bom prognóstico.
Realmente não é…
Exato. Na mesma linha, o pioneiro ufólogo francês Aimée Michel dizia que, se houvesse um abismo intelectual entre eles e nós, certamente os extraterrestres realizariam suas atividades aqui, mas não haveria comunicação possível e nós não perceberíamos nada, da mesma forma que um entomólogo não tenta se comunicar com o inseto que analisa. E essa metáfora abre as portas para as teorias conspiratórias. Veja que já no século XIX o brilhante Charles Fort sugeria que nosso mundo pode ser propriedade de alguém — alguém que está fora dele. Outra possibilidade, dadas às gigantescas distâncias interestelares, pode ser que sejamos visitados apenas por máquinas ou entidades híbridas, projetadas para intercambiar rapidamente pacotes enormes de informação e dados. Também podemos imaginar que exista uma consciência ou inteligência sem um corpo físico associado, assim como hoje pode existir uma revista virtual sem ser publicada no papel.
Minha experiência me indica que dentro de todos os órgãos oficiais e privados há pessoas, em todos os níveis de comando, que expressam boa receptividade e até interesse real pelo assunto UFO. Temos que saber como nos aproximar delas com respeito e paciência.
O que falta para a humanidade fazer o grande contato?
Não sabemos. Além do mais, esse contato pode ou não ser bom. Também é possível que nossos visitantes já tenham feito contatos secretos, mas que permaneçam ocultos. Por outro lado, há numerosos grupos místicos que se adjudicam alguma forma de contato. Todos estão errados? Ou seja, deixando de lado os fanatismos, há alguma coisa que possa ser resgatada dessas supostas comunicações cósmicas?
Nos últimos anos surgiram inúmeras fraudes na internet, devido à facilidade de acesso a novas tecnologias. Em que medida isso afeta a Ufologia séria?
Acredito que não exista uma “Ufologia séria”, ou seja, um grupo colegiado de ufólogos que tenha um consenso com determinados princípios operacionais mínimos. Nesse ramo sobram a individualidade e o autodidatismo. De minha parte, prefiro uma “Ufologia prazerosa”, uma atividade que realizamos por puro prazer intelectual. Às vezes, quando aparecem obstáculos a esse prazer, é melhor suspender a atividade por um tempo até podermos começar de outro ângulo. É verdade que a internet cumpre com a Lei de Sturgeon, segundo a qual 90% de qualquer coisa é lixo. Está em nós perder tempo revirando o lixo à procura da informação útil que também está lá. Muito mais escondida, mas está. Hoje nós temos acesso a recursos tecnológicos que há 30 anos não existiam ou eram muito caros. Se soubermos utilizar essas ferramentas, e se soubermos trabalhar na rede, construiremos algo muito bom, jamais alcançado até agora.
Qual é sua opinião sobre a chamada Ufologia Mística?
Conheço o assunto e também muitos de seus protagonistas na Argentina. A busca espiritual, seja ela orientada aos extraterrestres ou a outro tipo de entidade superior, está enraizada nas origens da humanidade, quando as tribos faziam rituais grupais, nos quais cada integrante podia vivenciar a revelação mística, a presença divina entre os homens. Essas cerimônias primárias de êxtase místico coletivo logo foram eliminadas pelas grandes religiões e substituídas por rituais rotineiros, nos quais os fiéis só fazem o papel de devotos passivos. Desde então, a recuperação do contato místico com o além permanece reprimida em nós, e é uma aspiração naturalmente legítima. Certamente, quem envereda por esse caminho pode sofrer uma dissociação psicológica com a realidade mundana, que é causa de dor e conflito. Também deve ser dito que às vezes as pessoas sensíveis são um alvo fácil para certos indivíduos manipuladores, que têm personalidade psicopata e se apresentam como iluminados líderes espirituais, quando na verdade só procuram o poder e o dinheiro às custas de outros.
Voltando à casuística, no inverno de 1965 houve uma importante onda de avistamentos ufológicos naBase Naval Decepción,na Antártica. Em sua opinião, os alienígenas estavam interessados nos militares ou nos estudos que faziam na região?
A respeito desse assunto, quero ser muito exato. Não houve uma onda ufológica na Antártida, mas um conjunto de testemunhas e documentos que falam de fenômenos vistos em diversas bases, incluindo ao menos três unidades argentinas isoladas entre si — Decepción, Orcadas e Esperanza. E em meu livro não se fala em alienígenas, palavra que não era de uso habitual no jargão ufológico de 1965. É muito importante valorizar a posição da Marinha Argentina à época, cujos nomes tiveram verdadeiro empenho em pesquisar cada avistamento até os mínimos detalhes, com rigor metodológico, mente aberta e fluida relação com os pesquisadores civis.
No evento de 1965, a Marinha Argentina emitiu uma nota oficial interessante, fornecendo todos os detalhes da observação de um UFO feita tanto pelos militares como pelos civis, inclusive sobre as incríveis manobras do objeto. O senhor acredita que, hoje, o governo ou as forças militares da Argentina se colocariam da mesma maneira sobre a questão?
Acredito que hoje em dia não saberiam o que fazer. De fato, as declarações dadas pela Força Aérea Argentina (FAA) a respeito do assunto nos últimos dois anos apresentam numerosos contrassensos. Já a Marinha — que tinha feito um excelente trabalho de pesquisa nos anos 60 e 70 — está em total silêncio há décadas, e seria bom que começasse a se manifestar novamente. Quando aconteceram aqueles episódios, em 1965, houve dois comunicados públicos da Marinha Argentina e mais dois da Força Aérea Chilena (FACH), todos afirmando e ratificando a presença de objetos não convencionais nos céus antárticos. Em meu livro estão compilados outros documentos, como cartas informativas enviadas por militares das bases antárticas. Há todo um acúmulo de informação que demonstra a seriedade com que o tema era oficialmente abordado à época.
Hoje a psicologia social, em especial a de Erich Fromm, que temimportância nos estudos dassociedadescontemporâneas, está esquecida ou adormecida. Qual sua opinião sobre uma parceria entre a psicologia social e a Ufologia, pensando-se na dimensão que esta última alcançou em nossos dias?
Como psicólogo social, considero essa especialidade muito útil para a abordagem da temática. Não para impulsionar uma explicação psicossocial de cada caso, mas para facilitar a compreensão dos processos psicossociais que intervêm e para dar contenção emocional às testemunhas de observações de UFOs. A percepção de um UFO nunca é um fato individual, mas está inserida em um imaginário social coletivo, com estereótipos precisos e mitos ativos, que abrangem as culturas do mundo todo. Tanto os crentes como os negadores.
Existe no cenário da Ufologia um território de crença em um alienígena salvador, que nos coloca como inferiores e dissemina o conceito de que eles estão aqui para ajudar em nossa evolução. Como o senhor, sendoufólogoe psicólogo, vê essa crença?
Eu escrevi um artigo, intitulado O Papel dos Extraterrestres em Nossa Cultura, que abordava exatamente esses aspectos. Os antigos livros sagrados falam de deuses que intervinham, muito mais do que fazem agora, nos assuntos humanos. Certamente os povos neolíticos vivenciaram isso nos tempos dos rituais grupais. Depois, as religiões foram substituindo esses rituais, estereotipando as cerimônias para torná-las mais controláveis. E chegou um dia em que a deidade se transformou em um “deus otiosus”, um deus que já realizou sua obra e a contempla, ocioso, do longínquo cosmos, como bem explicava o mitólogo, filósofo e romancista romeno Mircea Eliade.
O senhor está dizendo que as pessoas estão substituindo Deus pelos extraterrestres?
De certa forma, sim. Veja, no momento em que o deus se afasta e deixa de intervir na vida cotidiana para contemplá-la do infinito, surge na cultura a nostalgia do sagrado, uma ansiedade que procura se satisfazer para recuperar aquelas experiências de êxtase que foram ocluídas, negadas, silenciadas. E é nesse cenário, em que Deus está afastado, que aparecem os extraterrestres como mediadores perfeitos entre o sagrado e o profano, entre o céu e a terra. Eles possuem os atributos espirituais da divindade ao mesmo tempo em que demonstram os maiores prodígios de tecnologia, são um tipo de Messias atualizado. E é assim que os grupos de contato místicos os veem, quando dizem que “os anjos de ontem são os extraterrestres de hoje”.
Como o senhor acredita que encaixa, se é que se encaixa de alguma forma, a hipótese psicossocial no Fenômeno UFO?
A chamada hipótese psicossocial foi proposta no final dos anos 70 por Michel Monnerie em seu livro Et si Les OVNIs N’Existaient Pas? (E se os UFOs Não Existirem?, Les Humanoides Associés, 1977), um título que ocasionou fortes debates na Ufologia Francesa. Monnerie propôs-se a reexaminar casos publicados na revista Lumières Dans la Nuit [Luzes na Noite] para tentar esclarecê-los. Ao final, ele concluiu que a maioria dos casos era explicada como sendo o planeta Vênus, a Lua e outros fenômenos comuns. O autor, então, especulou que os observadores costumavam adicionar detalhes fantásticos a uma observação originalmente banal, em um processo de elaboração psicológica que ele denominou de “sonhar acordado”. Mas havia um problema. Monnerie era ufólogo e não psicólogo, e em seu empenho para diagramar teorias e definições psicológicas, não levou em conta que já havia uma grande bibliografia sobre esses assuntos que ele tinha ignorado. Aliás, isso é um vício muito próprio da Ufologia: inventar definições e teorias que já existem com outro nome. Ou seja, voltar a inventar a pólvora. Hoje em dia acredito que ninguém mais adira à hipótese psicossocial pura e simples, mas às vezes ela é mencionada como uma explicação possível, dentro da argumentação dos refutadores de lendas.
Como um dos pesquisadores mais experientes sobre UFOs na Antártida, o que o senhor pode nos dizer sobre a incidência de casos no Continente Branco?
Acredito que a Antártida não é um continente particularmente privilegiado quanto à observação de UFOs. De acordo com os dados que temos, em sua enorme superfície foram relatados apenas 50 casos, pelo menos foi isso o que já foi liberado até agora. Esse número tem a ver, também, com o fato de que a Antártida ser um continente pouco povoado e com uma população flutuante, alojada em bases científico-militares distantes umas das outras. Sem cidades, sem grupos humanos estáveis capazes de sustentar uma história e uma cultura que seja transmitida de geração para geração, é difícil se saber exatamente como se dá a incidência de casos por lá.
Não há tradições, é isso?
Veja, quando falamos de santuários extraterrestres do mundo, nos referimos a locais onde há observações recorrentes que já fazem parte do folclore local. Elas configuram um corpo de histórias fantásticas que lhes dão identidade e tornam aquele local um centro de peregrinação obrigatório para os ufólogos, contatados e turistas. Em outras palavras, para que aconteçam fatos ordinários ou extraordinários, tem que haver uma testemunha humana. Para que alguém observe a árvore, é mais importante a existência do observador do que a árvore em si.
O senhor escreveu o prefácio do livro do capitão Daniel Perissé. O que pode nos falar sobre a obra?
Em seu livro Fenómeno OVNI: Reflexiones, Investigaciones y Estudios, o capitão Perissé reuniu diversos de seus principais trabalhos ufológicos, entre eles um resumo das observações antárticas das quais foi testemunha e pesquisador. Ele definia de forma contundente seu ponto de vista: “Minha opinião é a de que os UFOs configuram um fenômeno objetivo e aparentemente inteligente, de características anômalas para nosso âmbito cultural, cuja ação impune, predominantemente aérea, mas que também manifestada em terra e mar, resulta não previsível e fora de qualquer controle”. Semelhantes conceitos parecem muito ousados para um oficial da Marinha Argentina, mas certamente falava com conhecimento de causa. Lembremo-nos de que o capitão foi um dos poucos que teve perante seus olhos os volumosos arquivos secretos da Marinha, documentos que nunca foram liberados. Além disso, o livro de Perissé levou o selo editorial do Instituto de Publicações Navais, órgão do Centro Naval de Buenos Aires. Essa obra hoje já é uma raridade, um objeto de culto para os aficionados aos UFOs.
Atualmente o senhor está escrevendo algum novo livro?
Tenho material para continuar a escrever, mas ainda estou desfrutando do livro que foi publicado. UFOs na Antártida é uma obra forte, tanto pelo viés conceitual quanto pelo informativo. Fazê-la significou reunir uma grande quantidade de dados, o que me deu muito trabalho. Penso que, se tivesse que escrever um novo livro, seria muito mais fácil, seria como pilotar um navio de transporte atrás de um navio quebra-gelo que já abriu o caminho mais difícil.
Para finalizarmos, o senhor gostaria de deixar alguma mensagem para nossos leitores, aficionados pelo Fenômeno UFO?
É difícil aconselhar um ufólogo, já que nós não gostamos de conselhos e preferimos fazer tudo por nós mesmos, mas posso assinalar alguns atalhos para que a busca pessoal não atole em caminhos sem saída. Em princípio, recomendo às pessoas a pensarem quais são os assuntos da Ufologia de seu maior interesse e se focarem neles, sem dispersões e sem pretender abraçar tudo de uma vez. Depois, aconselho a tomarem nota de cada um dos diferentes enfoques que a matéria mereceu. E, muito importante, por favor, não se concentrem em um único autor ou linha de pensamento, principalmente se ele ou ela depreciarem outras. Ninguém tem a verdade absoluta, mas todos temos uma parte dela. O segredo é examinar tudo e reter o que é bom.
São ótimos conselhos. Há mais alguma coisa que queira dizer?
Sim. É preciso entender que o computador é uma ferramenta imprescindível hoje em dia, mas um ufólogo deve ir além de assistir vídeos no Youtube ou debater em redes sociais. Passar o dia todo sentado à frente do computador é cômodo, mas física e mentalmente prejudicial. Aprendemos muito ao ler biografias, e quanto mais diversificadas, melhor. É também muito importante se reunir e conversar com outros interessados pessoalmente, treinar a observação do céu e seus fenômenos, treinar a realização de entrevistas com testemunhas que permitam desempenhar seu trabalho, mas também que também favoreçam o campo da Ufologia. Há alguns ufólogos que passam o dia todo frente ao computador, e além de não estudarem nem trabalharem, ainda reclamam por não serem valorizados e reconhecidos como eles gostariam de ser. Precisamos de mais ufólogos com formação universitária e de menos “profetas quânticos”. Posso acrescentar algo mais?
Por favor, fique à vontade. Nossos leitores agradecem.
É fundamental ter sempre presente que a Ufologia não é uma obrigação — ela é uma escolha voluntária, um passatempo e, portanto, deve prover prazer. Se em algum momento o que você leu, o que lhe disseram ou as pessoas que o cercam lhe causam desconforto, é o momento de se retirar, de tomar distância. Quase com certeza, você voltará a
entrar na Ufologia mais adiante, mas por uma porta mais ampla, com uma compreensão diferente e superior, que lhe permitirá avançar no conhecimento e integrá-lo a seu ser e a seu projeto de realização pessoal.
<!–[if gte mso 9]>