Por todo o planeta há locais que têm uma condição especial, uma emanação que, por caminhos ainda desconhecidos da ciência, influem no comportamento e no sentimento das pessoas. Isso não é nenhuma novidade, os xamãs há milênios já sabem disso e até hoje existem espaços proibidos em reservas indígenas ou florestais ao redor do mundo, onde apenas escolhidos podem ir e permanecer. E, tivéssemos nós, humanos modernos, uma concepção menos separatista em relação à natureza, todos perceberíamos a influência que tais regiões têm sobre nós. Para sermos totalmente justos, é bem provável que boa parte do magnetismo emanado nos lugares ditos sagrados venha da composição do subsolo e do tipo de minério que contém, mas isso não significa que assim eles sejam menos especiais. Ao contrário, isso os torna ainda mais atraentes. Se pensarmos um pouco sobre como os povos da Antiguidade escolhiam os locais para erigirem seus monumentos — a maioria sobre espaços considerados sagrados —, veremos que nossos ancestrais conheciam os segredos do planeta muito melhor do que nós.
Como é de conhecimento geral, montanhas e cavernas se destacam entre todos os povos como sendo locais propícios para meditações, curas e rituais de elevação espiritual. Há, claro, um forte traço antropológico em tudo isso, mas é muito reducionismo imaginar que tais locais não tenham algo de diferente ou que guardem segredos que desconhecemos. Uma dessas montanhas especiais é o Uritorco, que se situa próximo de Córdoba, em uma região conhecida como Valle de Punilla, a 100 km da capital argentina.
Supermercado místico
Base de UFOs, entrada da cidade intraterrena de Erks — uma suposta cidade que existiria embaixo do Monte Uritorco —, paraíso de duendes e elfos, chacra energético do planeta Terra, portal para outras dimensões e destino recorrente de um crescente turismo místico, a região onde está o Uritorco é recheada de mistérios e segredos. A montanha, que no passado foi considerada sagrada pela etnia Henia Kamiare, se ergue, magnífica, a 1.960 m sobre o nível do mar, junto ao que já foi uma empoeirada aldeia serrana e hoje é uma próspera cidade, Capilla del Monte.
A área foi, durantes anos, apenas um silencioso destino turístico para recém-casados, aposentados e empregados que aproveitavam as tarifas econômicas de suas colônias de férias. Isso tudo mudou em janeiro de 1986, quando surgiu uma enorme marca que seria proveniente da aterrissagem de um UFO em um morro a poucos quilômetros do Uritorco. O fato de as autoridades locais terem abraçado a teoria ufológica do sinal colocou Capilla del Monte e o Uritorco em primeiro plano nos meios de comunicação, primeiramente nacionais e, com o tempo, internacionais. Mas a notícia sobre o suposto pouso fez mais do que colocar a região no mapa: ela levou dezenas de milhares de caçadores de discos voadores à Capilla, para tentarem estabelecer contatos de fim de semana, inclusive este que vos escreve. Nos anos 90, explodiu a especulação imobiliária, quando grupos crescentes de cidadãos optaram por abandonar suas cidades e se radicarem ali, na bela paisagem serrana.
Durante as várias dezenas de vezes que visitei a região ao longo das últimas décadas, tornou-se evidente ainda que o Uritorco seja palco de fenômenos que fogem à compreensão mundana das coisas, muito do que lhe atribuem não passa de especulação, vontade de acreditar em alguma coisa e exploração financeira. Já falamos que muita gente se mudou para a região alegando querer fugir da pressão e consumismo das grandes cidades, mas o leitor há de convir que não importa onde more alguém, a pessoa ainda precisa ganhar a vida. Lá, quando nada acontece que ajude a atrair turistas, é preciso que se invente algo.
Por tudo isso o lugar, que começou como ponto de observação de UFOs, transformou-se em uma confusão de crenças esotéricas, místicas e holísticas que chegam a enlouquecer os turistas menos avisados. E como esse tipo de “oferta esotérica” depende muito da procura, conforme novas modas foram surgindo, elas foram incorporadas ao “supermercado místico” da região. Hoje em dia é possível encontrar-se até mesmo quem faça “massagens atlantes” lá. E ainda que elas funcionem — como qualquer massagem bem-feita funciona —, é de se questionar como conhecemos as tais massagens atlantes se ainda sequer sabemos onde ficava a Atlântida…
Uritorco, o começo
Voltando ao começo da história — o aparecimento da marca supostamente feita por um UFO —, cabe detalhar como tudo aconteceu para que o leitor possa entender nossa argumentação e compreender como, muitas vezes, é difícil separar os fatos dentro da Ufologia. Tudo começou em 09 de janeiro de 1986, quando atrás do monte considerado sagrado, em uma área montanhosa conhecida como El Pajarillo, uma estranha marca apareceu sobre a vegetação local: uma queimada de quase 30 m de comprimento por 20 m de largura. Casualmente, naqueles dias havia na região um grupo de contatistas, que foram os primeiros a chegar ao local, tirando fotografias, atribuindo o fato à manifestação de um UFO e divulgando-o por meio da imprensa. No entanto, é necessário explicar as coisas. Sim, houve uma manifestação, mas não lá e nem produziu a famosa marca.
No mesmo dia 09 de janeiro, mas às 22h00 e a 10 km dali, perto de um pequeno arroio que corre na base do Monte Áspero, se encontrava dona Esperanza Pelliza de Gómez, uma senhora de 80 anos. Naquela noite, dona Esperanza estava no pátio de sua casa jogando cartas com seu neto Gabriel Eduardo Gómez, de 11 anos, e com sua filha Sara Gómez, que haviam chegado de Buenos Aires para visitá-la. Era uma noite quente e um convite para ficar fora de casa. No entanto, após algum tempo, o ruído do motor de um automóvel que parecia aproximar-se da afastada residência lhes fez pensar que seria prudente entrar novamente na casa.
A área foi apenas um destino turístico para quem aproveitava as tarifas econômicas de suas colônias de férias. Isso tudo mudou em janeiro de 1986, quando surgiu uma enorme marca que seria a aterrissagem de um UFO a poucos quilômetros do Uritorco
Depois de fecharem as portas, os familiares disseram que uma luz avermelhada começou a se filtrar através da janela do quarto de dona Esperanza. A origem da luminosidade era um i
ntenso foco de luz vermelha que permanecia aparentemente estático em um dos lados do Monte Áspero — o local, que é um pouco mais baixo do que o que está por detrás dele, é perfeitamente visível da casa da família e se localiza do lado leste, a aproximadamente 90º da posição das serras de El Pajarillo. Este dado deve ser destacado e merece atenção, pois, ao contrário do que foi informado pela imprensa, não existe nenhuma relação visual direta entre o fenômeno observado pelos Goméz e o surgimento da marca oval sobre El Pajarillo. E as inconsistências não param por aí.
Não é apenas uma questão de localização, mas também de datas. O grupo de contatistas, que então se chamava Instituto de Planejamento de Encontros Próximos (IPEC), afirmou haver encontrado a marca em 09 de janeiro, durante o dia. Mas como, se foi apenas às 22h00 horas que os Gómez protagonizaram seu episódio? Se a datação do grupo de contatistas for correta, não pode ter sido o mesmo UFO que apareceu à noite quem deixou a marca.
UFO ou incêndio?
É certo que todas as pessoas que tiveram a paciência de subir a serra para chegar ao local onde ocorreu a mancha — como ficou conhecida a área chamuscada — coincidentemente descartaram a possibilidade de aquilo ter sido feito por um incêndio natural, argumentando que a vegetação estava queimada de cima para baixo. Também disseram que os contornos da marca eram perfeitamente elipsoidais e que eram demasiadamente bem delimitados. Conclusão: um UFO provocou a mancha enquanto flutuava sobre a serra. A pesquisa que fizemos in loco, entretanto, mostrou outra coisa.
O primeiro fato a se destacar é que, dependendo da direção da qual estamos observando a mancha, a nitidez dos contornos muda. Se nos aproximarmos vindos de cima, vemos que não se trata de uma elipse perfeita, mas sim de uma área oval de forma irregular, principalmente sobre a parte sul da marca, que vai se diluindo em direção ao norte da mesma. Outro fato que merece destaque diz respeito às fotografias que foram veiculadas. As imagens mostram que dentro da marca há outra marca, em forma de V, na base da marca principal, local onde parece que o fogo começou. Por suas grandes dimensões, não foi possível vê-la no nível do solo.
Por fim, para descartar a declaração de que alegava que “o calor veio de cima”, há o fato de que toda a vegetação que cresce ao redor da marca se encontra calcinada, como seria o caso se uma corrente de fogo avançasse de baixo para cima naquela subida. Esse fato é visível, pois se percebe com clareza que o cânhamo que cresce na direção sul está chamuscado, enquanto o canto posterior dos mesmos não foi tão afetado pelo calor. Os partidários da teoria ufológica para a marca omitiram este dado e se apoiaram na forma como a parte superior, e mais seca, da vegetação estava queimada. Com efeito, ao pôr fogo em uma mata qualquer — e nós experimentamos e reproduzimos isso —, a porção mais afetada é sua parte central e superior, onde se concentra a palha seca, o que dá a falsa ideia de que o calor veio de cima.
Se pesarmos que por sua geografia especial as correntes de vento que incidem sobre a montanha muitas vezes rodopiam sobre si mesmas e que a variação climática ali é única, não é difícil imaginar que um incêndio natural ou provocado pelo homem possa ter ocorrido e que tenha se extinguido por causas naturais, ou ainda que tenha sido extinto por aqueles que o provocaram. Também precisamos pensar que o fato de a marca ter sido encontrada em 09 de janeiro não significa que tenha sido feita naquele dia. Aliás, muito provavelmente, ela surgiu alguns dias antes.
Quando eles estavam a poucos metros do que parecia ser uma curiosa pessoa vestida de negro usando um tipo de capa e um chapéu de aba larga, a criatura os viu e começou a correr, fugindo em direção ao promontório que havia perto de um arroio
Mas, então, o que houve foi apenas uma interpretação errônea dos fatos? Talvez. Ou, quem sabe, o incêndio tenha sido provocado artificialmente, com possíveis fins publicitários, pelo grupo que talvez não tão casualmente passeava pela área tentando contatos com extraterrestres. Mas e quanto ao avistamento da família Goméz? Bem, o leitor deve se lembrar de que ela se recolheu porque ouviu o motor de um carro se aproximando. E é bem provável que a luminosidade vermelha que viram tenha vindo dos faróis traseiros do automóvel, que, na escuridão da noite, tiveram seu brilho e intensidades aumentados. É certo que a região toda é abundante em avistamentos de UFOs, mas isso não significa que tudo o que acontece por lá tenha uma origem misteriosa. Há muitos que se aproveitam da fama do local para fins pessoais.
Casuística da região
Pessoalmente acredito, após tantos anos visitando e pesquisando a região, conhecendo seus mistérios, testemunhando eventos e entrevistando testemunhas, que o local reúne as condições do que se costuma chamar de “portal”, ou seja, um local geográfico onde o véu entre os mundos se levanta ou é mais frágil. Uritorco é um portal para conexão com realidades paralelas ou com aspectos de uma realidade que é muito mais ampla do que aquela que percebemos pela estreita janela sensorial de nossas três dimensões físicas. Isso explicaria porque o fenômeno dominante na região, que antes eram os UFOs, tenha sofrido uma espécie de mutação para outros tipos de entidades, como duendes, elementais, supostos guias espirituais etc. Isso não se deve apenas à mudança de crença das pessoas que frequentam o local ou ao delírio alheio, embora ele exista, é claro. Não. Isso se deve principalmente à natureza mutante daquilo que se manifesta, ao longo do tempo, através daquela janela.
Fazer uma lista dos eventos ufológicos, parapsicológicos e criptozoológicos de Capilla del Monte é uma tarefa imensa, já que praticamente todo visitante tem algo para contar — e isso é especialmente significativo no caso daqueles que permanecem mais de três ou quatro dias na região e a percorrem de forma solitária, dos que fazem as vigílias ufológicas à noite e dos que sobem as colinas para meditar ou simplesmente para vigiar os céus. As fotografias são inúmeras. Há, inclusive, câmeras permanentes voltadas para a serra e conectadas à internet, que têm acumulado tantas evidências que chamam a atenção por sua prodigalidade [O leitor pode conferir as imagens ao vivo em www.camuritorco.com.
ar].
Há muitas evidências sugestivas que pude testemunhar. Como uma imagem diurna, feita em uma área conhecida como El Zapato, onde um estranho objeto oval luminoso se materializou diante da câmera. Ou um pequeno humanoide, de não mais de 30 cm de altura, que apareceu ao revisarmos algumas fotografias noturnas tiradas no jardim de um conhecido hotel de Capilla. Ou ainda a nuvem azulada onde alguns veem um rosto com imensos olhos e, outros, um busto de mulher flutuando sobre um de nossos colegas durante uma noite de vigília. Todas essas imagens não têm explicação convencional e todas foram exaustivamente analisadas.
Também vêm ocorrendo, nas proximidades do Uritorco, manifestações paranormais com matizes francamente aterrorizantes. Um desses eventos ficou conhecido como Caso do Vampiro do Uritorco e está detalhadamente relatado no livro de Mario Gustavo Guevara, Hechos y Relatos Fantásticos de Capilla del Monte [Atos e Relatos Fantásticos de Capilla del Monte, Del Prete Editor, 2004]. Tudo começou em setembro de 1989, quando um feroz incêndio iniciado na região de Cruz del Eje entrou na jurisdição de Capilla del Monte. A faixa de fogo, de aproximadamente 6 km de comprimento, avançava no sentido norte-sul empurrada por ventos do setor norte e ameaçando uma estância local onde ocorreriam os fatos que vamos relatar em seguida. Imediatamente, duas viaturas da Central dos Bombeiros da cidade se dirigiram ao local do incêndio e, após constatarem a gravidade da situação, solicitaram apoio imediato, razão pela qual se convocou pessoal de outras localidades. O Exército Argentino forneceu dois helicópteros Bel 212 H1H e vários Unimog para o transporte
do pessoal dos Bombeiros.
Indivíduo alto vestido de negro
Uma vez montada a base operacional na estância, começaram as tarefas de extinção do incêndio de forma coordenada, alcançando-se rapidamente o objetivo. Pelo meio da manhã, depois de sufocada uma parte do fogo, novos focos começaram a surgir na área onde ele já havia sido extinto, atrasando o trabalho dos combatentes e obrigando-os a se separarem em grupos. Foi justamente um desses grupos que viu um indivíduo alto e totalmente vestido de negro, provocando o reinício dos focos de forma intencional. O chefe da equipe, então, destacou três homens para localizar e deter o incendiário, enquanto o resto do pessoal continuava combatendo o fogo. Quando estavam a 200 m do grupo principal, três bombeiros avistaram o incendiário a 50 m de sua posição. Aqueles homens, os mais fortes do grupo, sem equipamento de combate e armados com machadinhas de montanha, se dirigiram até o indivíduo, dispostos a cumprir a ordem que haviam recebido.
Chupacabras ou algo pior?
Quando estavam a poucos metros do que, à primeira vista, parecia ser uma pessoa vestida de negro usando um tipo de capa e um chapéu de aba larga, a criatura os viu e começou a correr através do monte, fugindo em direção ao promontório que havia perto de um arroio. Os três homens que o perseguiam foram superados em velocidade e em agilidade pelo desconhecido que, nas palavras dos bombeiros, “não eram normais”. A perseguição continuou até o promontório, de onde a figura de negro deu um prodigioso salto no vazio e se perdeu da vista de seus perseguidores. Ao chegarem ao local, os bombeiros deram com uma queda vertical de 80 m e divisaram a silhueta do indivíduo correndo a toda velocidade pelo arroio, até desaparecer no interior de uma caverna existente em uma das margens.
Atônitos pela demonstração de agilidade e sem entender como o sujeito havia sobrevivido à queda, o pequeno grupo regressou para informar seus superiores sobre o ocorrido. Os chefes dos bombeiros, então, entraram em contato com a base de comando na estância e solicitaram a presença de pessoal militar para garantir a segurança dos combatentes. As tarefas de extinção continuaram normalmente e não se voltou a ver a estranha figura incendiária pelo resto do dia. Com as primeiras sombras da noite, as tarefas foram abandonadas e o pessoal se reagrupou na base operacional para jantar e descansar para o dia seguinte. Claro que o assunto mais comentado foi o incendiário e por esse motivo os superiores deram a cada grupo uma escolta armada.
Após o jantar, o pessoal se reuniu com o encarregado da estância, um senhor de idade avançada, mas dotado de uma vitalidade invejável, que os recebeu amavelmente. Depois de um pouco de conversa, surgiu o assunto sobre o ser de negro e o encarregado lhes disse em tom bastante sério: “É preciso ter cuidado com certas coisas”. Os homens se interessaram e lhe perguntaram o que ele sabia a respeito daquele homem. O senhor, então, lhes contou que dois ou três anos antes, o gado começara a aparecer morto nos campos, sem sangue no corpo e com um pequeno corte no pescoço. Um dia, enquanto andava pelo terreno procurando pelos animais, ele viu uma marca que levava até o outro lado do barranco e decidiu segui-la. Porém, depois de determinado ponto, o cavalo que montava refugou e os cães que o acompanhavam começaram a ganir e a retroceder. “Desci do cavalo, peguei a escopeta de dois canos e subi pelo caminho. Do outro lado dei com um quadro inimaginável: uma vaca estava caída no chão, esperneando e, em cima dela, havia um tipo vestido de preto grudado no pescoço do animal”, contou o homem.
Segundo a testemunha, a criatura tinha cor escura, olhos amarelos brilhantes e dentes afiados, com uma expressão horrível. O ser avançou em sua direção e ele atirou. “Um tiro teria sido suficiente para derrubar um touro, mas apenas fez o tipo vacilar, e então atirei de novo. Aí sim ele caiu no chão, de costas e sem nenhum gemido. Uma vez que me recompus, comecei a pensar no que ia fazer com o corpo. Levá-lo para a cidade não podia, pois o cavalo se recusava a carregá-lo, e deixá-lo lá no chão e ir avisar a polícia também não, pois tinha medo que algum animal selvagem o levasse e as pessoas pensassem que eu estava louco”. Ele, o homem decidiu amarrar a criatura e arrastá-la até uma caverna perto do riacho. Lá, ele enterrou o corpo e, após fazê-lo, fechou a entrada da caverna com pedras e esqueceu o assunto. O encarregado da estância revelou ainda aos bombeiros que, alguns meses antes do incêndio, ele voltara a encontrar uma rês morta nas mesmas condiç&otild
e;es das anteriores. Ele, então, foi até a caverna, que estava aberta e com a cova vazia.
Criatura com passos rápidos
No dia seguinte, os grupos se armaram para terminar o incêndio e partiram todos, com certo nervosismo, acompanhados pelas escoltas militares, que também pareciam inquietas. Os helicópteros sobrevoavam a área transportando o pessoal aos pontos mais distantes e realizando uma vigilância aérea para informar qualquer novidade. No dia anterior, no meio da manhã, o estranho personagem fez sua aparição, com a diferença de que daquela vez todos os grupos estavam em contato e que os helicópteros podiam vê-lo. Do ar, não podiam segui-lo, pois o caminho arborizado o ocultava, mas os grupos em terra passaram por momentos de grande apreensão, já que, enquanto alguns conseguiam vê-lo a distância, outros eram surpreendidos com a criatura passando entre eles, com passos rápidos e a grande velocidade, sempre desaparecendo em direção ao riacho.
Os bombeiros que podiam vê-lo de perto estavam tão nervosos que muitos não suportaram a pressão e precisaram ser retirados de seus postos e evacuados da área. Outros simularam acidentes, desidratação e outras desculpas para serem dispensados. Os contatos continuavam acontecendo sem interrupção, mas em nenhum momento o pessoal sofreu qualquer agressão por parte do estranho indivíduo. Não havia, e nem há, explicação sobre as manifestações simultâneas e em diferentes pontos, com grande distância entre si. Pelo meio da tarde, e apesar de todos os inconvenientes, o incêndio se extinguiu, realizando-se uma rápida vistoria nas cinzas, sem verificar a presença do indivíduo e nem de novos focos de fogo. Quando entardeceu, todo o pessoal se retirou da área e, enquanto as filas de carros se afastavam da sede da estância, a figura de negro pôde ser vista em cima de uma colina, recortada contra o pôr do Sol, observando enquanto saíam de seus domínios.
É inevitável vincular aquela aparição ao ilustre Springheel Jack, o Jack Saltador da literatura, uma entidade da década de 1890 que assolou as noites londrinas, saltando de um telhado a outro sob o olhar atônito dos policiais britânicos, que nada podiam fazer para interromper sua ação — ele parecia estar interessado apenas em saltar nos telhados e nunca atacou nenhum viajante ou entrou em qualquer casa. Sua descrição é mais ou menos unânime: muito alto e magro, vestido totalmente de preto, com um chapéu de aba extremamente larga, uma capa e — aqui está a única diferença com seu sósia argentino — uma potente luz branca no centro do peito, que podia cegar momentaneamente aqueles que se aproximassem. No caso do Uritorco, somam-se à estranha presença duas constantes conhecidas dos investigadores do paranormal: o gado morto em estranhas circunstâncias — normalmente creditado à ação do chupacabras — e os incêndios inexplicáveis.
A Cidade de Erks
Embora a história da estranha criatura incendiária possa parecer assustadora para a maioria das pessoas, há coisas ainda mais obscuras e perversas se desenrolando na região, ligadas ao uso negativo das energias do local. Em Capilla del Monte, o fenômeno tem um lado muito sombrio vinculado a grupos neonazistas que se aproveitam das lendas, e da egrégora que elas criam no inconsciente coletivo, para seus próprios fins. Esses grupos, caso alguém queira rastreá-los na Argentina, serão mais facilmente encontrados em Capilla do que em Buenos Aires, por exemplo. Este autor está convencido de que alguns grupos que ali se instalaram o fizeram com o expresso e inconfesso propósito de aproveitar a energia do lugar para fins nada santos. E, deixando de lado os inevitáveis comerciantes e alucinados do lugar, aqueles que visitarem a área com vontade de investigar constatarão, de forma sutil, a aura que flutua sobre certas pessoas.
O lado sombrio da região também inclui outro grupo, que por sinal é muito conhecido dos ufólogos: os illuminati. Obviamente, sendo o local poderoso como é, eles haviam de estar presentes por lá. Sua ação tem a ver com a morte de um homem de nome Ángel Cristo Acoglanis, autoproclamado “guardião das portas de Erks”. Sem dúvida, um dos mais fortes atrativos para tanta procura espiritualista na região são as lendas sobre a existência de uma suposta cidade subterrânea conhecida pelo nome de Erks. Alegadamente extraterrestre, com os anos a cidade deixou de ser encarada como sendo uma base de UFOs física e tridimensional para transformar-se em algo astral e etéreo, seguramente por que nunca se conseguiu localizá-la, apesar das inúmeras tentativas feitas. O leitor sabe como são as coisas: se não se consegue provar que algo existe neste mundo, joga-se sua existência para o outro e se continua faturando em cima.
Sobre seu nome esotérico, pouco ou nada se havia dito, até que Dante Franch, um comerciante portenho radicado no local e mentor de um próspero grupo messiânico, explicou que Erks são as iniciais de Encontro de Remanescentes Cósmicos e Siderais, sendo a palavra cósmicos grafada com k, ou kósmicos. Isso chega a ser divertido, pois parece que o idioma espanhol atravessou o universo e até os extraterrestres o usam para nomear suas cidades. Os habitantes locais admitem claramente que têm interesse na visita de pessoas crédulas à Capilla del Monte para levá-los, em noites fechadas, até um local sobre uma estrada vicinal um pouco além da cidade de Ongamira [Ver box], chamado Puertas del Cielo.
Lá chegando, dizem aos turistas para entoarem certos mantras, em um suposto idioma cósmico chamado “Iridrin”, para que a cidade de Erks apareça. E os turistas, desavisados e ingênuos, gelados de frio em pleno inverno, obedecem — começam a cantar no tal idioma cósmico e, de repente, a distância, passam a ver luzes alinhadas, algumas móveis, outras formando grupos, que os guias locais dizem aos turistas ser Erks. Na verdade, o que veem são as luzes dos automóveis que se movimentam ao longe, por localidades como La Caroya e Deán Funes. No escuro, não dá para distinguir entre o céu e a terra, e o turista, claro, não vai voltar no outro dia — quando está claro — para comparar com um mapa nas mãos suas visões da noite anterior com a geografia local. Melhor acreditar que sim, Erks apareceu de verdade, para espanto de todos.
Duas mortes estranhas
Quem começou a rotina de reunir grupos à noite, cantar mantras e falar-lhes sobre a mitologia de Erks foi justamente Ángel Cristo Acoglanis. Embora para muitos Erks seja ap
enas uma invencionice, algumas pessoas que conheceram Acoglanis dizem que o homem sabia que na região, sob certas circunstâncias, se abria um portal e que a história de Erks era apenas um relato que permitia aos mortais comuns um conhecimento que devia ser oferecido progressivamente. Outros afirmam que não foi Acoglanis, mas sim seus subordinados quem sustentavam a história de Erks, e que Acoglanis apenas mantinha contato com entidades não humanas naquele local. Creio que a história de Erks e os passeios turísticos para contatá-la são a banalização de um conhecimento hermético muito mais profundo de contato com outras realidades. Também acredito que Acoglanis talvez pensasse em revelar o conhecimento que tinha e que isso tenha irritado a alguns poderosos que vivem nas sombras.
É difícil dar os nomes e sobrenomes dos illuminati operantes em Capilla del Monte ou em qualquer outro lugar. Mas não é tão difícil fazê-lo com seus gerentes operativos. Um deles é Munzer Al Kassar. Nos últimos anos, os illuminati têm operado também sob a cobertura do fundamentalismo islâmico para gerar um clima tanto material como espiritual propenso às suas atividades — os benefícios materiais são o dinheiro e o poder geopolítico. Já os espirituais são o medo, a angústia e o desespero de milhões, que alimentam as forças das sombras. Al Kassar, na Argentina, administrava a compra de armas brasileiras e sua revenda ao Irã, enquanto seu irmão Gazzan, com aceitadíssimas relações com Saddam Hussein, fazia o mesmo com o Iraque.
Quando, em 1987, a investigação da revista Tiempo e as denúncias do ex-legislador Ramón Tamanes obrigaram o Governo Espanhol a expulsá-lo, Al Kassar dispunha de um passaporte argentino e dois luxuosos apartamentos nos bairros portenhos de Belgrano e Palermo. Alguns anos antes, em plena Guerra das Malvinas, a Agência Central de Inteligência (CIA) detectou e desativou meia dúzia de operações ilegais de compra e venda de armas que tinham como destino final a Argentina.
“Não faça isso, não faça isso!”
Angel Cristo Acoglanis, que era osteopata, havia montado seu consultório de Buenos Aires na Rua Callao, número 1.541, no bairro da Recoleta. Ele tinha 63 anos quando os irmãos Rubén e Antonio Suarez chegaram ao consultório, em 19 de abril de 1986, às 10h30 da manhã. A secretária do médico declarou em juízo que deixou Antonio entrar, pois sabia do vínculo pessoal que mantinha com Acoglanis. De repente, ela escutou os gritos de súplica do médico: “Não faça isso, não faça isso!” A secretária pôde ver Antonio segurando o revólver e disparar repetidamente contra o médico, até que o matou, em meio a uma enorme poça de sangue. Quase imediatamente Antonio se dirigiu à 17ª delegacia, entregou a arma homicida e disse ao oficial: “Acabo de matar um bruxo e me sinto muito aliviado”. Em razão do homicídio, instaurou-se um inquérito. Com uma rapidez incrível, o juizado reuniu uma junta psiquiátrica que determinou que Antonio era insano.
O filho de Acoglanis, que era jornalista na cidade de Rosário, intrigado com o enigmático assassinato de seu pai, pediu a alguns colegas portenhos que tentassem averiguar os motivos do crime. O que se sabe é que em uma tarde, os irmãos Rubén e Antonio se reuniram em um edifício em um bairro de Buenos Aires. Nada se sabe sobre os detalhes daquele encontro, mas Antonio contou posteriormente a seus familiares que havia ficado angustiado com as palavras de seu irmão. Instantes depois da reunião, Rubén se suicidou, atirando-se do terraço do edifício. O jornalista que se encontrou várias vezes com Antonio para tentar descobrir os motivos do enigmático assassinato, sempre recebeu uma negativa definitiva do empresário em referir-se a esse assunto. Respondia sempre educadamente: “Por favor, não me faça falar disso…”
Enquanto isso, pelas ruas de Capilla del Monte, corria outra versão. Para os moradores da cidade, o que aconteceu foi que Jorge Antonio era encarregado de cobrar pela proteção dada aos nazistas refugiados na Argentina e Acoglanis descobrira seu segredo. Seu assassinato teria sido a mando de Antonio, que induziu seu irmão a fazê-lo. O que contamos aqui é, talvez, uma pequena introdução ao outro lado de Uritorco e a seus eternos mistérios que, esperamos, continuarão perdurando além das obscuridades da alma humana. O certo é que o lugar mais misterioso e emblemático para místicos, espiritualistas e ufólogos na Argentina é também o local por onde se cruzam histórias que reúnem illuminati, neonazistas, refugiados de guerra e aspirantes a terroristas. Só o que não se sabe é como, em um local assim, haja tamanha incidência ufológica.