Indo além dos casos de abdução alienígena já conhecidos e dissecados pela Ufologia Mundial, e de experiências em que pessoas se limitaram a manter diálogos com tripulantes dos misteriosos UFOs, estão aquelas experiências de quem declara ter visitado outros planetas, desse e de outros sistemas estelares — alguns praticamente desconhecidos pela astronomia. O paulistano Antonio Rossi é um deles. Ele escreveu, em 1957, o livro Num Disco Voador Visitei Outro Planeta, prefaciado pelo general do Exército Levino Cornélio Wischral, que se referiu ao autor como “metalúrgico, homem simples, trabalhador, prestativo, de caráter virtuoso, exemplificado tanto no lar como na rua”.
Rossi, que após décadas de ostracismo relançou o livro e reapareceu em uma entrevista recheada de humor no programa Jô Soares Onze e Meia, na época transmitido pela rede SBT e levado ao ar em maio de 1996, contou que em uma tarde de primavera — ele não especifica a data — estava pescando no Rio Paraibuna, que atravessa a cidade do mesmo nome no norte do estado de São Paulo, quando notou duas estranhas criaturas aproximando-se a passos lentos. Aterrorizou-se com a súbita aparição, porque ambas encontravam-se absolutamente nuas. Ele foi então convidado a entrar no disco voador dos estranhos, e teria visitado seu mundo de origem — cujo nome ou localização não lhe foram revelados. O livro de Rossi foi durante algum tempo considerado um dos mais importantes da Ufologia, mas sua história nunca foi efetivamente pesquisada.
Um aval de respeito
Uma década depois de Rossi ter dito que visitou outro planeta, o gaúcho Artur Berlet, falecido em 1994, despontaria com uma história muito semelhante — com a diferença de que essa foi investigada por eminentes estudiosos, entre eles o médico e ufólogo Walter Karl Bühler, fundador da Sociedade Brasileira de Estudos de Discos Voadores (SBEDV). Seu livro Os Discos Voadores: Da Utopia à Realidade fez sucesso em todo o mundo, mas não lhe rendeu dividendos. Bühler prefaciou e Jorge Ernesto Macedo Geisel — nada menos do que oficial da Reserva da Aeronáutica, irmão do general e ex-presidente Ernesto Geisel — elaborou a introdução da obra.
Geisel traçou o seguinte perfil de Berlet: “Um homem perfeitamente normal, que goza de excepcional saúdefísica e nunca demonstrou qualquer sinal de debilidade mental. Só possui instrução primária, mas, inteligente e observador, soube assimilar com grande proveito para si e para toda a coletividade os profundos ensinamentos que sua viagem a outro planeta a bordo de um disco voador lhe trouxe”. Esse é um aval de respeito para a alegada história de Artur Berlet, que residiu quase toda sua vida na cidade de Sarandi (RS). Mas uma terrível tragédia o abateu e o marcou até o fim de seus dias: uma explosão ocorrida na pedreira onde trabalhava o forçou a ter uma das pernas amputadas, ficando impossibilitado de continuar exercendo sua profissão de tratorista.
Sua experiência ocorreu quando viajava pelo interior do Rio Grande do Sul, em maio de 1958, já vitimado pela explosão. No dia 14, por volta das 19h00, passava pela fazenda de propriedade de Dionísio Peretti, perto de Passo Fundo, quando teve a atenção despertada por uma luz que brilhava a cerca de 200 m dali. Inicialmente pensou que fosse a Mãe do Ouro, entidade folclórica que indica tesouros enterrados e é interpretada como um UFO pelos ufólogos. Berlet atravessou a cerca de arame farpado e, a 30 m da luz, viu que se tratava de um objeto na forma de duas bandejas sobrepostas, com cerca de 30 m de diâmetro — por ser daltônico, não pôde distinguir as cores. Aproximando-se ainda mais, deparou-se com dois vultos que projetaram um fortíssimo jato de luz em sua direção, e imediatamente perdeu os sentidos.
Fim das guerras e do dinheiro
Quando voltou a si, viu-se no interior de uma sala retangular, amarrado a uma cama tipo leito de hospital. Minutos depois, dois seres o soltaram e o transferiram para um compartimento anexo àquela sala, onde o obrigaram a vestir uma capa de mangas compridas. Levado a outro recinto, começou a passar mal. Sentia como se seu peso — de 90 kg — tivesse se reduzido à metade e seus membros aumentado de volume. Avaliou que sua fraqueza era devido ao fato de estar há muito tempo sem se alimentar. Os mesmos seres que o escoltaram voltaram acompanhados de uma mulher trazendo uma bandeja de alimentos. Com o único talher disponível, que funcionava tanto como garfo ou colher, comeu algo parecido com carne e um farináceo escuro, da consistência do pão-de-ló. O gosto não era dos melhores. Bebeu uma água mais leve do que o normal e que escorria incessantemente da torneira da pia.
Colocado diante de quatro ou cinco seres, tentou inutilmente iniciar conversação em português, espanhol e italiano, idiomas que dominava — e recorreu ainda ao alemão, língua que lhe foi ensinada antes mesmo do português. Nesse momento, um dos seres, de nome Acorc, levantou-se com uma expressão de júbilo e perguntou-lhe: “Deutsche?” Berlet respondeu afirmativamente. Assim viria a saber que estavam no planeta Acart, a 60 milhões de km da Terra, distância correspondente a Marte. Soube também que os países de Acart haviam se unificado fazia um século, e a abolição das fronteiras traduzia o fim das guerras e do uso de dinheiro naquele mundo. Disseram-lhe que em Acart o governante supremo era escolhido a cada três anos pelo voto popular. No Palácio Central, o “Filho do Sol”, como era chamado, reunia-se com os membros do Conselho, decidindo conjuntamente os assuntos.
Artur Berlet passou quase 10 dias — de 14 a 23 de maio — passeando, comendo, bebendo e dormindo naquela perfeita democracia planetária. Nesse ínterim, precisou de uma única ida ao banheiro — ainda assim, só para tomar banho, logo que lá chegou, depois que fora levado do quarto onde era mantido cativo para outro mais espaçoso. “Já que havia um banheiro, me dispus a tomar um banho. Mas nova decepção me aguardava, pois a água me parecia gás, de tão leve que era. Eu tinha a impressão de que, se fosse jogar um balde daquela água contra uma garrafa vazia de pé, não a derrubaria”, disse o gaúcho em seu livro.
O céu de Acart era salpicado de velozes veículos aéreos, que contrastavam com a multidão que se movimentava lentamente nas ruas. Os prédios residenciais acartianos tinham nove andares e cada pavimento tinha quatro janelas frontais, à frente das quais se estendia uma marquise para o pouso de peque
nas aeronaves — discos voadores diminutos. Os ETs fizeram Berlet visitar zonas agrícolas e de piscicultura, uma cidade serrana, uma indústria de aço e um ginásio de esportes — ele chegou a assistir a uma singular partida de futebol disputada por duas equipes compostas de 13 atletas cada. Também esteve em uma “fábrica” de discos voadores. Em certo momento, Acorc alertou o gaúcho sobre a iminência de uma guerra atômica na Terra, após a qual interviriam em nosso planeta. “Nós temos um aparelho que neutraliza os efeitos maléficos da poeira radioativa, transformando-a em fertilizante para o solo. Em seguida à guerra entraremos em ação, porque se custarmos a agir, a vegetação morrerá nas zonas mais conflagradas”, disse o alienígena.
Maldizendo os abdutores
Manifestando saudades de casa, Acorc acabou trazendo Berlet de volta à Terra no mesmo disco voador que o levara, deixando-o a poucos metros de uma rodovia e a cerca de 5 km de Sarandi, em plena madrugada. Cansado da viagem, transpôs com dificuldade uma cerca e acabou se estatelando no chão — pensou que não resistiria à queda. Arrastando-se, atingiu o barranco da estrada e se deitou na relva encharcada. Ali, imerso em reflexões, chegou a maldizer os ETs por não o terem deixado mais perto da cidade. Com muita cautela e apoiando as mãos no barranco, colocou-se de pé. Improvisando uma bengala, andou cambaleante até a estrada. A caminho da cidade, viu um jipe se aproximando, mas, como se recordou das recomendações de Acorc para que não entrasse em contato com ninguém até que chegasse a casa, não pediu carona. Naquelas condições, levou três horas para cumprir o trajeto, normalmente percorrido em no máximo uma hora.
Psicologicamente abalado, não saiu de casa por vários dias. Contornando limitações literárias, encheu 14 cadernos com escritos que nove anos depois se transformariam em seu livro, graças ao apoio de amigos, entre eles o gerente do Banco do Brasil Carlos de Oliveira Gomes — que descobriu e recomendou o caso —, o bacharel Rui Schmidt, o ufólogo Bühler e o militar Geisel. De sua experiência em Acart, chamam particular atenção o talher com que se serviu e os prédios residenciais de nove andares, itens sobre os quais trataremos a seguir, comparando-os com fatos de nossa própria humanidade.
O único talher disponível naquele planeta, na descrição de Artur Berlet, funcionava tanto como garfo quanto colher. Pelo esboço que desenhou, qualquer entendido em artes imediatamente identifica o utensílio não como algo oriundo de outro planeta, mas sim muito parecido com o que vem da corrente dadaísta, vanguarda europeia surgida em 1916 por iniciativa de um grupo de jovens poetas, pintores e intelectuais de várias nacionalidades exilados na Suíça — que, recusando-se a prestar serviço militar e descrentes de uma sociedade a quem culpavam pelos estragos da Primeira Guerra Mundial, decidiram romper deliberadamente com todos os valores e princípios estabelecidos por ela anteriormente, aplicando a negação mais radical das tradições artísticas do Ocidente em todos os tempos. Teria Berlet recebido influência dessa corrente para descrever o curioso talher?
Aquela nova corrente de pensamento se difundiu a partir do ambiente boêmio de Zurique, e a própria palavra “dada” não tem outro sentido senão a própria falta de sentido — perdido pelas artes ante a irracionalidade da guerra —, enunciando a essência desse movimento rebelde, provocativo, bizarro, iconoclasta e anarquista. Assim como o nome nada significava, os próprios artistas diriam que sua obra seria sem sentido, ao menos perceptível, mas hoje se reconhece que sua arte era realmente revolucionária e inovadora, tanto do ponto de vista formal quanto de conteúdo. Mais uma atitude do que um estilo, o dadaísmo considera o processo de criação mais importante do que o produto artístico final. Objetos do cotidiano são retirados de seu contexto e elevados à categoria de arte com pouca ou nenhuma modificação. Mas o que tem tudo isso com a história de Artur Berlet? Logo veremos.
Ufólogos desavisados
Pode-se afirmar que Duchamp é o pai da arte conceitual. Ele criou uma obra sem obras, na qual não há mais telas, mas bizarros e curiosos mecanismos óticos e objetos, tais como o talher alienígena. Em época semelhante apareceram também, como na pintura, os primeiros antimecanismos — máquinas construídas com os elementos mais estapafúrdios e com o único objetivo de serem expostas para desconcertar e provocar o público. Os críticos não foram muito condescendentes com tais obras, pois não conseguiam compreendê-las nem classificá-las, e elas seriam facilmente tomadas, por um ufólogo desavisado, como autêntica tecnologia de uma desconhecida ciência extraterrestre.
Enfim, o movimento dadaísta é o que mais lançou manifestos depois do futurismo, escritos de 1916 a 1920 por poetas e intelectuais, que viriam influenciar muita gente nas décadas seguintes. Estaria Berlet nesse rol? Mas, pelo seu próprio caráter autonegador e autodestrutivo, o dadaísmo, como movimento de grupo, terminou precocemente em 1921 — e, tal como ele, a Ufologia também surgiu logo depois de uma mudança na forma como a humanidade via a si mesma. Enfim, os pontos em comum entre ambas as coisas não param por aí e são tantos que nos levam a afiançar que a Ufologia seria um produto dadaísta — senão ela mesma uma vertente ou ramo autônomo do movimento, com suas motivações, peculiaridades e contingências perpassadas por bases semiológicas comuns. A Ufologia acumulou ao longo das últimas décadas tal repertório de obras que, tomadas pelo seu grau de irracionalismo, absurdo e falta de lógica — seguindo as características do Fenômeno UFO em si —, ultrapassa o dadaísmo e o supera, se não em originalidade, ao menos em quantidade.
Conluio com militares e governos
Os artistas dadaístas culpavam as forças supostamente racionais do desenvolvimento científico e tecnol&
oacute;gico pela destruição da civilização europeia e a negavam com uma arte que era justamente o oposto do racionalismo: intuitiva, emocional, confusa, disfuncional e eivada de absurdos. Da mesma forma, a Ufologia nasceu negando e culpando, e praticamente sempre negou e culpou a ciência oficial pelos mesmos motivos: esconder a “verdade” do povo e conspirar em conluio com militares e governos para acobertar o segredo em torno dos UFOs. E como os artistas dadaístas, contatados e ufólogos responderam com tudo que fosse contrário à ciência dita oficial, afastando-se ao máximo dela e abraçando as mais díspares e absurdas disciplinas paracientíficas e pseudocientíficas — bem como as mais esdrúxulas doutrinas e correntes alternativas. Isso vem impedindo que o Fenômeno UFO seja reconhecido e incorporado pelo mundo acadêmico, apesar dos esforços de vários abnegados que insistem em fazer com que assuma uma postura eminentemente científica.
Os artistas dadaístas eram mais cidadãos provocadores do que propriamente artistas de ateliê, produtores de objetos. O mesmo se pode dizer de muitos ufólogos que deixam em segundo plano a preocupação com os estudos, a pesquisa e a análise, e se voltam prioritariamente para a divulgação via meios de comunicação, desafiando autoridades e governos a revelarem a verdade sobre a presença alienígena na Terra e impressionando o público com informações fantásticas, porém duvidosas e não comprovadas. Muitos são protagonistas de autênticas performances em programas de debates ou em programas televisivos, recebendo seguidos convites para repetirem suas atuações, que costumam agradar a maioria leiga e ingênua que compartilha as mesmas crenças e expectativas — ou seja, de que em breve os discos voadores aterrissarão em massa, pondo fim aos tormentos e às angústias da humanidade.
O lado incompreensível e agressivo do dadaísmo não raro enfurecia os espectadores, assim como esse lado na Ufologia não raro enfurece os céticos e afasta aqueles que antes eram interessados no assunto, reforçando o seu caráter underground e transgressivo. Ainda que a crítica à sociedade fosse um traço comum da arte moderna, os dadaístas eram mais radicais e violentos do que os demais na sua rejeição à moral e aos valores burgueses. Já a Ufologia não os rejeita, muito pelo contrário, e só esparsamente os critica — em compensação, não faz questão de defendê-los. O que a Ufologia faz com a mesma contundência do dadaísmo é negar a validade de todas as tradições culturais anteriores, acusadas de repousarem em bases falsas, e desprezar tudo que não leve em conta a presença de extraterrestres em nosso planeta, pugnando pela demolição das verdades oficiais e o completo redirecionamento das ciências para o estabelecimento definitivo do contato imediato e do intercâmbio com outras civilizações em prol do progresso da humanidade.
Contudo, é importante aqui analisarmos a chamada antiarte, os objetos dadaístas que foram precursores do surrealismo, outra corrente que se conlui sobremaneira com a Ufologia. Ora, na iconografia ufológica encontramos um sem número de desenhos, pinturas e esculturas produzidas por contatados que não deixam de ser, a seu modo, autênticas obras de arte — e que apresentam as mesmas características dos conceitos dos dadaístas. A única diferença é que não surgiram dentro dessa proposta nem foram revestidos com essa aura, e sim aspirando à condição de representações fiéis e verdadeiras de objetos extraterrestres. Basta, no entanto, uma simples verificação para constatarmos que tais esboços, plantas, croquis, projetos, maquetes e protótipos de discos voadores, painéis de controle, computadores, armas de raios, máquinas de diversos tipos, tamanhos e finalidades etc, possuem tanta chance de funcionar se construídos como indicados quanto os dos dadaístas, que não aspiravam essa pretensão e assim faziam propositadamente para reforçar o caráter absurdo e nonsense das coisas.
Os discos voadores de George Adamski, por exemplo, não passavam de meras chocadeiras, saleiros ou tampas de máquinas de café de seu tempo que o contatado apenas teve o trabalho de retirar de seus contextos usuais e rearranjar em cenários preparados de modo que se parecessem com reluzentes naves venusianas e adquirissem um status inteiramente diferente do original, ou seja, vemos aí a aplicação das mesmas atitudes dadaístas, mormente do citado Duchamp. Na esteira de Adamski, a Ufologia recebeu uma quantidade de fotografias seguindo os princípios do “pronto para uso” e ostentando constrangedoras tampas de panelas, pratos, pires, tigelas, calotas de automóveis, chapéus, cinzeiros, enfim, todo tipo de utensílios domésticos que não precisaram sofrer praticamente nenhuma interferência ou transformação para que sugerissem a presença de misteriosos engenhos nos céus terrenos.
Ao procurar suprimir as relações lógicas ordinárias entre o conceito e sua expressão verbal, rompendo com todas as formas e medidas e preconizando uma absoluta liberdade de pensamento para questionar e destruir fórmulas — científicas, religiosas, literárias, artísticas ou filosóficas —, a Ufologia se faz uma legítima herdeira do dadaísmo e sua mais prolixa vertente, dando continuidade, à sua maneira, ao projeto de negação total, sobretudo negação de todo e qualquer sistema oficial. A arte até a última metade do século XX não pode ser entendida sem que se faça referências ao dadaísmo, como, da mesma maneira, a mentalidade do mundo da segunda metade do século XX não pode ser entendida plenamente sem que se faça referências à Ufologia.
Casa Estatal de Construção
O gaúcho e suposto abduzido Artur Berlet também alegou ter visto prédios residenciais de nove andares em Acart, que teriam em cada pavimento quatro janelas frontais, à frente das quais se estendia uma marquise para o pouso de pequenas aeronaves. De onde o contatado tirou esse modelo? De outro planeta? Na verdade, ele talvez nem precisasse ir tão longe, mas apenas dar um pulo até a terra de seus antepassados, a Alemanha. As linhas retas simples, a ausência de ornamentação e a funcionalidade que Berlet descreve se enquadram no estilo preconizado pela Escola de Bauhaus, que revelou importantes criadores de vanguarda e fixou diretrizes estéticas no campo das artes, que iriam prevalecer em todo o mundo no século XX.
A Alemanh
a, obrigada pelo Tratado de Versalhes a pagar altas indenizações aos países vencedores após a derrota na Primeira Guerra Mundial, via-se mergulhada no caos econômico e social. A hiperinflação e as altas de desemprego derrubavam sucessivos governos socialdemocratas. Ante o desafio e a necessidade de produzir em série objetos de consumo baratos para o povo, em 21 de março de 1919, o arquiteto alemão Walter Gropius integrou duas escolas existentes na cidade de Weimar, a Escola de Artes e Ofícios, do belga Henri van de Velde, e a de Belas Artes, do alemão Hermann Muthesius, e fundou uma nova escola de arquitetura e desenho a que deu o nome de Staatliches Bauhaus — Casa Estatal de Construção, onde bau significa construção e haus, casa.
As origens da Bauhaus remontam ao movimento Arts and Crafts, do inglês William Morris, que procurou restabelecer a dignidade medieval do artesanato e do artesão. A Bauhaus propôs o restabelecimento do contato entre a arte e a produção industrial, o que fez repensando a arquitetura e criando um novo conceito de design — calcado na geometria, na razão e na ciência — acessível a todas as camadas sociais alemãs, em contraposição aos ditames burgueses. De um lado combatia a arte pela arte e do outro incentivava a liberdade de criação, mas dentro de convicções filosóficas comuns. Tal modelo teria forte influência sobre as gerações seguintes, assim como de seus descendentes que decidissem migrar para o exterior — como é o caso da família de Berlet, originária da Europa.
Prédios residenciais acartianos
Teria Artur Berlet descrito prédios residenciais acartianos com base no que conhecia de nossa própria civilização? E seria o processo algo natural ou artificial? Uma das suposições é de que Berlet teria de fato viajado a outro mundo, mas, para tentar descrever tudo o que lá vira — como o curioso talher e as construções residenciais —, teria recorrido àquilo que sua mente conhece, fazendo assim uma associação inocente, porém fictícia, do que vira lá com o que conhecia daqui. Outra suposição, mais hostil ao gaúcho, é de que ele nunca foi a lugar algum, apenas criou uma história encantada e recheada de fatos curiosos, dentro dos quais se acomodam o estranho utensílio que usara para comer e os prédios que descreveu. A se aceitar essa idea, o que se vê, na verdade, é que Berlet agira como tantos outros seres humanos, que criam uma história e a substanciam com elementos que estão em seu cotidiano. Ora, teriam os acartianos, uma raça tão avançada, um único talher e uma só arquitetura?
Em Acart, a 60 milhões de km da Terra, os países se unificaram e a abolição das fronteiras traduziu o fim das guerras e do uso de dinheiro. Disseram a Berlet que lá o governante supremo era escolhido a ca-da três anos pelo voto popular
Voltando à Bauhaus, não há quem não tenha incorporado, mesmo que inconscientemente, seu estilo simples e limpo de dar forma às coisas valendo-se apenas de formas geométricas e de cores básicas, geralmente o preto e o branco, para contrastar com a burguesia da época, que costumava utilizar cores fortes. Na maioria das vezes nos passam despercebidos que muitos dos prédios, casas, móveis, objetos etc que nos rodeiam são baseados nessa escola. Apenas para lembrar, foi na Bauhaus que se inventaram as cadeiras de aço tubular e outros equipamentos semelhantes e há muito incorporados ao nosso uso cotidiano — e tão abundantemente descritos por quem alega ter estado no interior de UFOs e sido levado a outros mundos.
Enfim, se ainda hoje a Bauhaus ainda soa moderna e futurista, na época de Berlet deveria impressionar bem mais. Isso não surpreende se levarmos em conta que os projetos não guardavam qualquer referência com o passado — ao contrário de todos os estilos anteriores — e eram inteiramente voltados para o presente e para o futuro, obedecendo aos princípios de racionalidade, simplificação e da unidade entre forma e função. Assim, talvez não tenha sido por acaso, portanto, que Berlet escolheu o estilo da Bauhaus para dar forma aos prédios e móveis do planeta que pretendeu ter visitado. Um marco na história das artes, nenhuma escola teve mais influência no aspecto das cidades modernas do século XX do que ela — inclusive em cidades de outros planetas.