Os chineses têm a sonda orbital Chang\’E 1, com lançamento marcado para setembro desde ano. Os indianos pretendem lançar, no ano que vem, a sua, a Chandrayaan 1. Os americanos estão construindo a Lunar Reconnaissance Orbiter, que voa no fim de 2008 ou começo de 2009. Os alemães já manifestaram interesse em construir uma espaçonave com destino à Lua, e os europeus concluíram no ano passado sua primeira missão lunar, conduzida pela sonda orbital SMART-1. Mas que diabos, todo mundo resolveu ir à Lua?Resolveu.
“Mas por que, alguns diriam, a Lua?”, já perguntava o presidente americano John F. Kennedy em 1961. Naquela época, a resposta era a corrida pela supremacia tecnológica e espacial, parte da resposta americana aos comunistas soviéticos. Ninguém nem sabia, àquela altura, se era possível ir à Lua e caminhar sobre o satélite (não se conhecia a consistência do solo lunar, e havia temores de que uma nave que ali pousasse pudesse simplesmente afundar). Muito menos se sabia sobre o que fazer na Lua. Pesquisa científica básica e exploração eram parte da agenda dos astronautas do Projeto Apollo, mas eles estavam em essência tateando às cegas — seu principal objetivo era fincar a bandeira dos Estados Unidos no solo lunar.
Seis missões de pouso foram realizadas (Apollo 11, 12, 14, 15, 16 e 17) entre 1969 e 1972, 12 astronautas deixaram suas pegadas no solo lunar e cinco das seis bandeiras americanas ainda seguem de pé por lá. (A única a cair, ironicamente, foi a da Apollo 11, que foi fincada muito perto do módulo lunar – na decolagem da superfície, a poeira levantada foi suficiente para derrubar a bandeira). Os astronautas trouxeram de volta muitos quilos de rochas lunares, que fizeram a alegria dos geólogos por décadas a fio. Sabemos hoje muito mais sobre a Lua (e, por tabela, a Terra) do que sabíamos antes dessas incríveis missões. E a aventura inspirou pelo menos algumas centenas de milhões de seres humanos a aspirarem algo mais, a acreditarem no impossível.
Muito bem. Trinta anos e lá vai fumaça depois, ninguém mais pensa que ir à Lua é impossível (salvo os poucos que acreditam que os americanos nunca estiveram lá, a despeito das evidências avassaladoras). Voltar à superfície lunar pode ainda ser inspirador, mas é preciso mais que isso para justificar uma empreitada dessa magnitude. A despeito disso, os americanos estão determinados a levar astronautas para lá. Os russos cogitam a possibilidade de participar do esforço, os chineses têm suas próprias ambições, e outras nações, como a Índia, colocam suas manguinhas de fora. A Europa quer a sua parte. Por quê?
Talvez os motivos não sejam muito diferentes dos das primeiras viagens – razões geopolíticas.Hoje, muitos cientistas acreditam que a Lua pode ser uma excelente plataforma para pesquisas, e alguns acreditam que no solo lunar residem os elementos para solucionar alguns graves problemas na Terra. O aquecimento global está na ordem do dia, não? E o aquecimento global está acontecendo porque os seres humanos estão queimando um monte de petróleo e carvão para alimentar suas necessidades energéticas e soltando um monte de gás carbônico na atmosfera, acirrando o efeito estufa. Qual a solução? Trocar a matriz energética, ou seja, a forma de produzir energia, e buscar maneiras “limpas” de obtê-la, sem “sujar” a atmosfera.
Pois bem. Há quem diga que a melhor maneira de fazer isso é com usinas de fusão nuclear – produzindo energia a partir da “colagem” de átomos pequenos. É a forma como o Sol e outras estrelas produzem energia, mas ninguém ainda sabe se isso pode dar certo numa instalação terrestre. De toda maneira, tem muita gente disposta a apostar: europeus e japoneses estão torrando uma grana num projeto chamado Iter, que consiste num reator experimental de fusão nuclear.Se a fusão der certo, o melhor combustível para alimentar os futuros reatores está na Lua – uma substância chamada hélio-3, que é produzida pelo Sol e viaja em todas as direções do Sistema Solar. Como a Lua não tem atmosfera, os átomos de hélio-3 chegam livres e desimpedidos ao solo, onde se alojam. Sabemos que eles estão lá por conta das amostras coletadas pelo Projeto Apollo.
Ainda que a fusão não dê certo, há quem diga que vale a pena instalar painéis solares gigantes na Lua e enviar a energia coletada para uso na Terra. De novo, como não há atmosfera, o processo de coleta de energia solar é muito mais eficiente na Lua do que na Terra. E os engenheiros dizem que seria possível construir os painéis com matéria-prima disponível no solo lunar. Talvez nada disso aconteça. Mas e se for possível? Alguém vai ganhar muito dinheiro na Lua, e as nações espaciais não estão dispostas a deixar isso nas mãos do concorrente. Por isso está todo mundo correndo para a Lua.Atualmente, ninguém pode explorar a Lua em seu próprio benefício. O chamado Tratado do Espaço, de 1967, impede as nações de se apropriarem de recursos celestes para seu próprio proveito. Mas, se houver pressão para uma mudança, ela deve ocorrer.
É aí que entram as modestas missões planejadas por indianos e chineses. Eles querem ter “um pé” na Lua. Assim, se um dia houver uma repartição lunar (nos moldes da que aconteceu com a Antártida, tempos atrás), esses países poderão exigir a sua parte. Infelizmente, o Brasil é a única nação espacial que parece impermeável a essas sutilezas. Alguns avanços são notados, como a audácia de enfrentar as críticas para colocar o primeiro astronauta brasileiro no espaço (feito que comemorou um ano na quinta-feira última), mas falta uma visão coerente e ampla do que o país deve buscar em suas investidas além da Terra.
Hoje, do programa espacial brasileiro, a única coisa que realmente avança é o programa de observação da Terra, com a série de satélites CBERS, desenvolvida em parceria com a China. Não que isso não seja importante; é talvez o mais importante. Mas o programa não pode se limitar a isso. O país carece de visão e ousadia para empurrá-lo adiante. Fazer pesquisa espacial é caro mesmo, mas o preço de não fazê-la é ser para sempre refém das nações que enxergam mais longe e acreditam no futuro.