Falar de Húlvio Brant Aleixo é desconcertante, considerando-se circunstâncias e contextos. Húlvio começou a se interessar por “discos-voadores” (era assim que se escrevia, com hífen) num dos locais mais conservadores e convencionais que havia, a Belo Horizonte dos anos 50. Mas sua iniciativa em obter espaço na mídia local, em parceria com o doutor Heros Campos Jardim, resultou no programa de rádio Mistérios do Firmamento, dedicado ao assunto.
O começo de seu trabalho foi árduo. Montado numa motocicleta ou de carona, lá ia Húlvio colher seus primeiros depoimentos. Sua persistente busca por notícias sobre UFOs em jornais da época alimentava o pequeno grupo de entusiastas do tema, que virariam seus discípulos, como eu. Deste esforço emergia um Húlvio um tanto rígido e politicamente conservador, um homem que detestava regimes autoritários, mas que tinha seu quê centralizador. Todos gostavam dele e levavam seu temperamento na esportiva.
Nada disto obscurecia seu destemor em assumir publicamente que era entusiasta e se dedicava ao assunto, nem mesmo quando isto o prejudicava. Quando aprovado em primeiro lugar para o cargo de professor de psicologia do antigo Instituto Municipal de Administração e Ciências Contábeis, depois absorvido pela Universidade Católica de Minas Gerais, alguém da banca tentou desqualificá-lo com um “ah não, lá vem aquele cara do disco voador”. Húlvio foi salvo por uma boa alma da banca, por sinal meu ex-professor de física, José Wightman, que passou uma descompostura em regra no grupo. E Húlvio foi contratado.
“Audácia” — Também como aluno de psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais, o ufólogo teve a “audácia” de apresentar, dentro de um centro de excelência, um trabalho de pesquisa de campo examinando a relação entre opinião pública e os discos voadores. Seu professor, o hoje levitantemente holístico Pierre Weil, resistiu, mas Húlvio ga-nhou a parada.
Com seu jeito discreto, viu sua casa se tornar quase um local de peregrinação e referência ufológica, freqüentado por gente da Aeronáutica nos tempos do Sistema de Investigação de Objetos Aéreos Não Identificados (Sioani) e da Operação Prato. Foi lá que vi um monte de pequenas fotos dos objetos registrados na selva. J. Allen Hynek, John G. Fuller e muitos outros compareciam à sua residência. Húlvio também ajudou Lynn Catoe, da Biblioteca do Congresso Norte-Americano, a organizar a primeira bibliografia da casa sobre UFOs. Por isso, figura como o segundo da lista de agradecimentos.
Devemos a Húlvio Brant Aleixo a valorização da cultura popular na gênese do conhecimento científico, graças aos depoimentos dos caipiras do Vale do Rio das Velhas, gente tão “ignorante” e que, no entanto, sabe mais de vida extraterrestre do que todos os pesquisadores do SETI juntos. É curioso que um cara tão anticomunista como Húlvio estivesse, no fundo, de acordo com o marxista Gramsci, que pregava que um dia não haveria divisão entre cultura popular e erudita, simplesmente porque as duas se interpenetrariam e interagiriam. Honra ao mérito a mais um que não foi profeta em sua terra.