Como todos sabemos, o Caso Kenneth Arnold inaugurou a Ufologia Moderna em 1947. O episódio, ocorrido em 24 de junho daquele ano no estado de Washington, Estados Unidos, é considerado como a primeira vez em que se utilizou o termo disco voador — ou, mais precisamente, pires voador, do inglês flying saucer. O piloto e empresário Arnold descreveu os artefatos que viu naquela manhã, quando voava próximo das Montanhas Cascade, como “objetos que se moviam como pires saltando sobre a superfície da água de um lago”. Curiosamente, a partir daquele momento, diversas testemunhas de todo o país, que guardavam para si suas experiências, passaram a relatar avistamentos de coisas semelhantes. Em pouco tempo os discos voadores já eram descritos também por observadores de inúmeras outras nações, levando logo à conclusão de que se tratava de um fenômeno global.
Mas ainda há muito desconhecimento sobre milhares de ocorrências anteriores à de Kenneth Arnold, em anos e décadas bem antes de 1947. De fato, durante toda a história temos relatos de milhares de pessoas, dos mais variados cantos do mundo, dando conta de situações igualmente inusitadas, em que ora se viam artefatos discoides no céu, ora cilindros, esferas e toda sorte de objetos voadores não identificados. Uma rápida passada pela literatura ufológica nos mostra casos interessantíssimos nas décadas de 10, 20 e 30 do século passado. E com a Espanha não foi exceção. Uma década antes do Caso Kenneth Arnold, diversos avistamentos foram registrados durante a guerra civil que assolou o país. Claro que não é preciso dizer que a geração que foi obrigada a viver durante os anos do conflito não era dada pensar em UFOs, pois havia outras preocupações mais emergentes. Porém, mesmo assim, arquivos de muitos ufólogos contêm vários episódios em que uma quantidade considerável de pessoas testemunharam manifestações inexplicáveis. Vejamos algumas delas.
Um sombrero
O Sol já havia nascido e os soldados que defendiam a posição Peñón de la Mata, ao norte da província de Granada, em 05 de fevereiro de 1938, suportavam o frio intenso da melhor maneira que podiam. Eles guardavam cuidadosamente sua localização sob um céu sem nuvens quando um dos homens, combatente do Exército Espanhol, percebeu a presença de algo anormal na atmosfera — era um artefato parecido com um chapéu mexicano a uma distância considerável e à altitude de 200 m. Com os raios do Sol refletindo em sua superfície, o militar percebeu que o aparelho era metálico e voava lentamente enquanto se aproximava. Foi então que pôde observar detalhadamente o UFO: “Visto de baixo, sua forma era exatamente a de uma estrela. No seu centro, de onde surgiam os raios, ele tinha o que parecia ser uma lente de câmera fotográfica”. Quando o objeto se aproximou ainda mais, passando quase diretamente por cima de sua cabeça, o soldado distinguiu algumas janelas redondas e negras que apareceram no lado do disco.
Em entrevista ao jornal ABC Andalucía, o homem afirmou ainda que o artefato soltou uma espécie de vapor de suas laterais. Ele não sabia afirmar exatamente de onde o aparelho estava vindo, mas, quando se foi, formou uma pequena cauda atrás de si. O objeto deu um pequeno salto quando se afastou e o combatente parou de observar a estranha ocorrência, pois na situação em que se encontrava não poderia se distrair. Por isso, não foi capaz de ver como o disco desapareceu. A princípio imaginou estar diante de um pneu de caminhão que tivesse explodido, mas, conforme suas palavras, “a coisa parecia ter vida própria e se manteve em voo, sem cair”. Seu diâmetro deveria ser de aproximadamente três metros e voou de norte a sul.
O que exatamente aquele soldado viu? Seria um protótipo militar secreto? Mas na Espanha dos anos 30? No livro de J. J. Benítez La Punta Del Iceberg [Editorial Planeta, 1989], que trata da aviação militar espanhola durante a Guerra Civil, o autor diz: “Em 1936, a Força Aérea era pequena e antiquada. O principal avião de combate foi o hemiplano Newport 52. A aeronave com o maior número de unidades operacionais foi a Breguet, um bimotor biplano de reconhecimento e operações de bombardeio. Os primeiros auxílios da Alemanha tomaram a forma de 20 aviões Junkers. Pouco depois, outros veículos italianos, alemães, russos, franceses, norte-americanos, holandeses e britânicos chegariam em ajuda à Espanha”. Simplesmente, nenhum desses aviões reunia as características descritas pela testemunha, como uma superfície circular. Embora seja verdade que os alemães projetaram e construíram um número considerável de aeronaves de asa circular, esses veículos não existiam até a Segunda Guerra Mundial e não poderiam sobrevoar o céu espanhol em 1938. O soldado, que preferiu manter o anonimato, acabou perdendo uma perna três dias após o avistamento — muitos anos mais tarde ele se tornou pintor e assinaria uma declaração atestando que o que descreveu fora completamente verdadeiro.
Duas figuras humanoides
Apenas cinco meses após o episódio em Granada, outros militares seriam testemunhas, dessa vez na cidade de Guadalajara, de um acontecimento não menos interessante. Eram 23h30 de 25 de julho de 1938 quando um tenente e seu assessor estavam descendo um barranco localizado na cidade de La Alcarria e, de repente, viram uma poderosa luz branca no céu. Pouco tempo depois ela se apagou e um artefato em forma de disco, com cerca de 10 m de diâmetro e 5 m de altura, apareceu diante de seus olhos — o aparelho estava a aproximadamente 60 m de distância deles e parecia estar suspenso a pouquíssima altura do solo. Os homens o descreveram como “dois pratos unidos por seus lados convexos e separados por uma linha ou seção de uma cor mais escura”. Além disso, sua parte inferior tinha uma espécie de coluna que desceu muito lentamente e parecia conter duas figuras humanoides. Em seguida o artefato começou a projetar um círculo de luz azulada no chão e, quando a circunferência atingiu os militares, eles sentiram uma sensação de frio. Pouco depois a luz se apagou e a coluna se levantou em completo silêncio.
Na época as testemunhas acreditaram ter visto as duas metades do aparelho girarem em direções opostas uma da outra. O disco novamente projetou um forte brilho branco e rosa no ar e desapareceu no céu a grande velocidade. Como no caso de Granada, não há uma explicação aparente para a observação. Apesar de os militares acreditarem ter testemunhado um protótipo alemão secreto ou algo pertencente
aos russos — uma ameaça que despontava na Europa —, isso seria impossível, conforme já analisado. O tenente rejeitou qualquer publicação sobre o assunto e insistiu ao ufólogo Manuel Carballal, que tentou entrevistá-lo, que iria permanecer anônimo. Tendo eliminado a possibilidade de fraude, o que resta para explicar o avistamento? Só podemos aceitar que uma manifestação do Fenômeno UFO esteve na Espanha de 1938.
Aterrissagem em Ávila
Foi o notório escritor Benítez quem trouxe o presente caso à tona em seu citado livro La Punta Del Iceberg. A testemunha deste episódio foi Mariano Melgar, um menino de sete anos na época que tinha sido enviado pelos pais para a cidade de Muñizo para ser resguardado dos horrores e perigos da guerra. Era o verão de 1938 e, em uma manhã, enquanto o garoto manejava o gado, um incrível evento aconteceu. “Eu cuidava de algumas das vacas de meus parentes naquela manhã quente de verão quando, em torno de 12h00, saí em direção a uma área rural a cerca de dois ou três quilômetros de Muñizo. Cheguei à pequena floresta e me sentei entre as árvores, enquanto os animais pastavam em um campo próximo”. Foi então que ele ouviu um zumbido que quase perfurou seus tímpanos: “Olhei para o céu e vi um clarão. De repente percebi que era um aparelho circular que disparava flashes prateados. Ele desceu não muito longe da beira do bosque e tocou o solo. Abriguei-me atrás de uma das árvores e vi seus movimentos”.
Foi então que Melgar observou o artefato de perto, que tinha cerca de 15 a 20 m de diâmetro e que apresentava uma espécie de cúpula sobre a sua metade superior. Várias pernas podiam ser vistas em sua parte inferior e dezenas de luzes coloridas acendiam e apagavam na fuselagem. Uma porta se abriu na estrutura e, depois de descerem uma rampa, surgiram três criaturas em formato humanoide. “Alguns segundos se passaram quando eu vi um ‘homem’ aparecer pela porta. Ele foi seguido por um segundo e depois por um terceiro. Mas enquanto os dois primeiros caminhavam ao longo da rampa e se moviam a cerca de cinco ou 10 m de distância da nave, o terceiro, que era ligeiramente menor do que os outros, permaneceu no objeto”. Os dois primeiros quase alcançavam o topo da porta, que deveria ter dois metros de altura por dois de largura, segundo Melgar. Eles começaram a coletar alguma coisa no chão, que a testemunha não soube dizer se eram plantas ou solo. “Um deles se ajoelhou e todos tinham algo em suas mãos, talvez um saco. Tentei me aproximar, mas não havia caminhado mais do que cinco metros quando o ser que estava na porta disparou um flash que quase me fez cair de costas. Isso me assustou e então eu voltei para as árvores”.
Quando o objeto se aproximou, passando quase diretamente por cima de sua cabeça, o soldado distinguiu algumas janelas redondas e negras que apareceram no lado do disco. ‘A coisa parecia ter vida própria e se manteve em voo sem cair’, disse a testemunha
Após Mariano Melgar ter feito uma segunda tentativa de aproximação — e de ter recebido um desencorajamento semelhante —, os seres, que pareciam estar se movendo em câmera lenta, voltaram para o veículo. Um deles levantou a mão como se estivesse acenando. “Eu pude ver o aparelho decolando. Primeiro a rampa se recolheu e em seguida a porta se fechou. Então, dentro de segundos, o artefato subiu cerca de 50 a 100 m no ar, girando sobre seu próprio eixo. Muitas luzes coloridas podiam ser vistas. Em seguida, partiu em direção a Barco de Ávila”. O jovem permaneceu em silêncio sobre sua experiência durante 40 anos, até a entrevista concedida a Benítez. Como nos casos anteriores, ele identificou os tripulantes e sua nave como “um dos aviões do general Franco”. No entanto, ele próprio reconheceu o equívoco anos mais tarde. “Hoje eu sei que a coisa não poderia ter nada a ver com a nossa guerra”, disse a testemunha.
Epílogo de uma guerra
A Guerra Civil Espanhola chegou ao fim em março de 1939, quando as tropas nacionalistas chegaram à Madri. Entretanto, as manifestações ufológicas continuaram. Em maio de 1939, por exemplo, alguns moradores de Horcajada foram surpreendidos pela chegada inesperada de uma entidade com forma humana e pernas de metal, que foi vista em várias ocasiões. Uma das testemunhas, Adelaida Rubio, afirmou que a criatura, cujas manifestações sempre eram precedidas por um poderoso flash, tinha o aspecto de um “soldado estranho se movendo desajeitadamente a passos largos”.
Dois meses depois, em 01 de julho de 1939, várias crianças que cuidavam do gado em Zahara de los Atunes avistaram um disco voador de uns 18 m de diâmetro — quando o artefato voou sobre suas cabeças à baixa altitude eles sentiram uma sensação de extremo calor. O aparelho aterrissou com um som sibilante a cerca de 30 m, levantando uma tempestade de poeira. Uma porta surgiu na lateral e dois seres desceram de dentro do aparelho, um deles alto e o outro pequeno e atarracado, ambos levando uma espécie de lanterna que era capaz de iluminar o ambiente, apesar da intensa luz do dia. Depois de andar uns 20 passos de distância da nave, as entidades se viraram e entraram novamente nela, tendo o estranho encontro durado 15 minutos.
Enquanto a Espanha tentava se reconstruir após os horrores da guerra, os avistamentos e aterrissagens de discos voadores continuavam a acontecer em todo o país. Jamais saberemos quantos episódios ocorreram e nunca foram divulgados, permanecendo para sempre na memória de seus protagonistas. Mas, de uma forma ou de outra, as ocorrências que antecedem o Caso Kenneth Arnold mostram que os UFOs já cruzavam os céus de todo o mundo antes mesmo que a expressão disco voador tivesse sido criada.