As comunidades ufológica e espiritualista brasileiras, nos últimos meses, comentaram muito a entrevista concedida por Jan Val Ellam, pseudônimo literário de Rogério de Almeida Freitas, à Revista UFO, publicada em sua edição 126, de outubro. Em tal entrevista, que recebeu destaque na capa da publicação, duas profecias foram veiculadas por Ellam. A primeira alude à possibilidade de eclosão de bombas nucleares, químicas ou biológicas na Palestina, entre 03 e 05 de outubro. A segunda diz respeito a um contato oficial e definitivo com seres extraterrestres, visto pelo entrevistado como a volta de Jesus, que estaria programada para ocorrer entre a segunda quinzena de novembro e abril de 2007.
Como já se sabe, a primeira profecia, mais plausível aos olhos da cultura humana do início do século XXI, não ocorreu. A bomba não explodiu. Na mais ampla e pluralista análise espiritualista possível para explicar a falha na previsão, três hipóteses vêm à tona. A primeira é a de que o perigo pode ter sido real e assim foi evitado por força do livre-arbítrio humano, com o apoio da espiritualidade e de seres extraterrestres. Segundo, que Ellam se equivocou, interpretando mal o recado transmitido por seus orientadores espirituais e alienígenas, como ele mesmo os apresenta. E, terceiro, que o entrevistado apenas inventou um factóide para promover seus livros e palestras. Esta hipótese é a mais condenada, visto ser implausível que Ellam tenha anunciado uma falsa previsão com fins promocionais. Tendo em conta sua trajetória nas comunidades espiritualista e ufológica, e notadamente a sua costumeira elegância moral, não há indícios mínimos de que tenha tido um comportamento direcionado a propósitos lucrativos, nem de postura tendente ao sensacionalismo. Sequer há evidências de contumazes atitudes intempestivas.
Integridade moral e psíquica — Já há cerca de dois anos, em suas palestras, Jan Val Ellam vem alertando para o risco de um incidente nuclear no Oriente Médio, que ele supôs ocorrer no biênio 2005-2006. Por isso, se sua entrevista à Revista UFO constitui golpe publicitário, tratou-se de uma infeliz estratégia de marketing, pois, do ponto de vista estritamente promocional, mais recomendável seria antever hecatombes para daqui a 10 anos ou mais, propiciando-se tempo suficiente para Ellam aumentar a vendagem de seus livros – e da própria UFO –, sem correr o risco de pulverizar credibilidade e diminuir seu público leitor. De qualquer forma, a profecia relacionada ao Oriente Médio foi veiculada na entrevista com datas precisas, e não se concretizou. Felizmente! Existe, de fato, a possibilidade de a catástrofe ter sido desengatilhada graças ao eficaz esforço conjunto de consciências extrafísicas e extraterrestres. Por outro lado, também há a possibilidade de Ellam ter incorrido em grave erro de interpretação, dada a falibilidade humana, inclusive mediúnica. O que quer que tenha ocorrido para que a vaticinada explosão não acontecesse, são desaconselháveis os juízos de valor extremados. Chega a ser temerário concluir que Ellam não tenha errado e que o pior foi evitado pela intervenção da boa vontade de muitos. Também não é coerente duvidar da integridade moral e psíquica de Ellam, em nome do discernimento consciencial.
Na mais ampla e pluralista análise espiritualista possível para explicar a falha na primeira previsão, três hipóteses vêm à tona. A primeira é a de que o perigo pode ter sido real e assim foi evitado por força do livre-arbítrio humano, com o apoio da espiritualidade e de seres extraterrestres
Não precisamos maltratar sua imagem e honra para demonstrarmos a legitimidade e consistência de nossos argumentos. E se houver implosão moral, não precisamos denunciá-la, já que ela será, cedo ou tarde, evidente. Devemos manter saudável nível de questionamento sobre opiniões, teses e idéias, próprias e alheias. Como precisamos também nos acostumar a manter o proveitoso hábito de discordar e criticar sem a dependência à retórica agressiva e à gratuidade do escárnio. Um novo conceito que se aplica a este caso é o da cosmoética, que implica na defesa da liberdade de consciência e de expressão, na adaptabilidade a contextos novos e reciclagem de paradigmas, assim como na abstinência a ofensas desnecessárias à sensibilidade do interlocutor e de terceiros. Em mundo como o terrestre, de provas e expiações, onde o passado multimilenar da maioria dos espíritos autoconscientes se revela nebuloso, em meio a episódios reiterados de desagregação social e desatinos comportamentais, pouquíssimos seres humanos possuem autoridade moral para se deliciarem com as fragilidades e falhas de seus colegas desta “escola evolutiva planetária”. Aqueles que a possuem preocupam-se com a exemplaridade da própria conduta.
Muita Ufologia ou Espiritualidade — Em tempo, no programa de rádio Projeto Orbum, apresentado Rede Boa Nova de Rádio [www.radioboanova.com.br], em sua edição de 08 de outubro, Jan Val Ellam referiu-se à sua primeira previsão publicada na referida entrevista. Ele explicou que o incidente previsto para ocorrer no Oriente Médio, entre 03 e 05 de outubro foi postergado, mas, infelizmente, ocorrerá de modo inexorável em data futura, segundo teriam lhe informado seus “amparadores” extraterrestres, supostamente baseados em tecnologia que desconhecemos. Afirmou ainda que a data do contato oficial e definitivo, que o entrevistado interpreta como a volta de Jesus, mantém-se inalterada. Os apoiadores de Ellam, por natural afinidade com o espiritualista potiguar, compreenderam e aceitaram suas explicações. Já seus críticos, que evitam conhecer em profundidade suas obras, alegando serem muito ufológicas para um espiritualista ou muito espiritualistas para um ufólogo, optam por vislumbrar em suas novas declarações apenas um novo capítulo da morte anunciada da respeitabilidade do médium.
De qualquer forma, a polêmica em torno da entrevista de Jan Val Ellam à Revista UFO reflete a dificuldade do gênero humano de conduzir debates fraternos e moderados em torno de questões controversas. Espelha também a facilidade de nossa espécie em alvejar a dignidade alheia, quando determinado indivíduo se encontra em estado de vulnerabilidade perante os instrumentos de censura social de sua época.