Talvez o Fenômeno UFO seja intrinsecamente noturno”, dizia em 1972 o astrofísico norte-americano Joseph Allen Hynek em seu clássico e importante livro The UFO Experience: A Scientific Study, traduzido no Brasil com o título Ufologia: Uma Pesquisa Científica [Editora Nórdica, 1981]. Será que existe alguma relação entre o Fenômeno UFO e a noite? Muitas questões podem ser formuladas e algumas respostas prováveis e possíveis podem ser sugeridas. A noite encerra algo misterioso? Para começar, basta indagar ufólogos ou simpatizantes do tema sobre qual o período do dia em que os UFOs são mais avistados. Intuitivamente, muitos responderão que a noite é quando as cortinas se abrem e abundam as visões que intrigam tantos observadores. Não é à toa que ufófilos e ufólogos de todo o mundo seguem esta intuição, este saber, pois uma das bases da pesquisa ufológica – a vigília – é maciçamente realizada no período do ocaso do Sol, varando-se a madrugada no alto de morros ou locais que tenham uma visão esparsa do horizonte, longe das luzes dos centros urbanos.
Hynek criou um sistema de classificação para tentar tabular uma imensa quantidade de relatos e uma variedade colossal de aparições acumuladas ao longo do tempo. Tal sistema pioneiro tinha como uma de suas características, justamente, classificar o período do dia em que o fenômeno se manifestava, separando os casos entre discos diurnos (DD) e luzes noturnas (LN). Sua classificação completa ainda incorporava o grupo de episódios conhecidos como radar-visual (RV), quando UFOs são simultaneamente vistos por pessoas e detectados por radar, e os famosos contatos imediatos de primeiro, segundo e terceiro graus, os CI 1, CI 2 e CI 3 [Close Encounters, em inglês]. As categorias DD, LN e RV estão hoje ultrapassadas, devido à sua imprecisão e também porque alguns casos não se encaixam nelas. Também há o agravante de determinados relatos misturarem mais de uma categoria, simultaneamente. Apenas os CIs sobreviveram ao tempo e ainda são usados, apesar de já terem sido adicionados à classificação de Hynek outros graus de contatos imediatos – alguns estudiosos se referem até a CI 7. O astrofísico afirmava que a maioria dos relatos para que foi convocado a explicar, a partir de 1948 e posteriormente, como consultor do Projeto Blue Book da Força Aérea Norte-Americana (USAF), era justamente de luzes noturnas (LN).
Então, a manifestação noturna dos UFOs teria caráter mais acentuado que a incidência diurna? Seriam os seres extraterrestres notívagos em essência, mas também capacitados a manifestar-se no período diurno quando desejam? Se assim for, talvez algo inerente à sua fenomenologia indicaria uma manifestação acentuada em ambiente noturno, mas não necessariamente uma ligação inseparável, podendo ocorrer em qualquer período – o que, aliás, vem sendo registrado ao longo das décadas, pois o avistamento de objetos voadores não identificados se dá em qualquer uma das 24 horas do dia. Uma possibilidade antagônica disto seria a de que não haveria conexão alguma entre os UFOs e a noite. Os que defendem esta tese alegam que haveria somente uma relação aparente, uma variável indeterminada ou mesmo conhecida, mas não bem esclarecida, que estaria causando uma interpretação errônea dos dados.
Acontecimentos Ordinários — Hynek, como astrofísico, tinha a tarefa de verificar se essa marcante presença noturna não poderia ser explicada como acontecimentos ordinários ou fenômenos naturais. Mas verificou que, mesmo depois da filtragem de dados, as LNs ainda permaneciam em quantidade considerável nas estatísticas. Suas características – como trajetória inusitada e comportamento cinético – não poderiam ser determinados como algo conhecido. Hynek confessou que “as observações são mais freqüentes à noite do que de dia. Mesmo quando limitamo-nos unicamente aos casos desconcertantes e bem investigados – de verdadeiros UFOs –, ainda encontramos uma maior quantidade de casos noturnos”. Apesar disto, o arquivo pessoal do astrofísico não apresentava uma diferença marcante entre as ocorrências de LNs e DDs, o que ele explicava como um procedimento de cautela, ao considerar válidos os registros em seu banco de dados de casos de manifestação noturna. A outra importante categoria criada pelo minucioso cientista – a RV – também estava atrelada a aparições com ambiente desprovido de luz solar, fazendo-o declarar, em 1972, “que praticamente todos os casos de RV ocorrem à noite”.
Existem padrões de manifestação do Fenômeno UFO? Esta pergunta tão antiga começou a ser formulada assim que teve início o acúmulo de relatos de observações, o que permitiu um estudo estatístico das aparições. Inúmeras análises foram feitas por diversos centros particulares de pesquisas ufológicas, conseguindo coligir modelos de manifestação do fenômeno. Particularmente de interesse para esse trabalho são as estatísticas para o período do dia em que os UFOs são vistos. Hynek, alguns anos depois do Projeto Blue Book, em 1969, revisou inúmeros casos relatados à USAF durante seus 22 anos de atividade na área. Dos 640 casos classificados por ele como não identificados, 42% eram DDs e 38% eram LNs – o restante preenchia outras categorias. O astrofísico se surpreendeu com o fato de as luzes noturnas não estarem encabeçando a lista, visto que os estudos de quase todos os outros centros civis de pesquisa, até então, apontavam neste sentido.
Entretanto, as estatísticas gerais não estavam mentindo: os UFOs ainda eram mais vistos à noite que de dia. Mas a classificação de Hynek tinha sérios problemas neste sentido. Por exemplo, muitos casos de discos voadores vistos à luz do dia, que também foram detectados por radar, ou mesmo casos de contatos próximos com humanóides também radarizados, podiam se alocar em duas categorias ao mesmo tempo. Conseqüentemente, uma das duas iria sofrer um desfalque e uma amputação de registros. Essa falha na arquitetura da classificação podia ser responsável por camuflar os dados estatísticos e oferecer um resultado equivocado.
Onda Ufológica — Antes do trabalho de Hynek, outro sistema de classificação de observações de UFOs já havia sido criado pelo também astrofísico e cientista da computação francês Jacques Vallée, junto dos ufólogos de mesma nacionalidade Aimé Michel e Pierre Guerin, nos anos de 1961 e 62. O método dos três visava sistematizar o amontoado de relatos originados na famosa onda ufológica francesa de 1954. As categorias criadas pelos estudiosos eram quatro, denominadas simplesmente de Tipo 1 até Tipo 4. Posteriormente, em 1966, Vallée aplicou seu sistema para casos franceses e norte-americanos, na tentativa de encontrar um padrão comum na
distribuição da duração e do horário das aparições… E encontrou! Dentro de uma amostragem de centenas de casos, o cientista descobriu muitas peculiaridades. Ele publicou em seu livro Challenge to Science: The UFO Enigma [Desafio à Ciência, Editorial Milênio, 1978] alguns dos mais significativos resultados. “As observações de aterrissagens de UFOs [Tipo 1] ocorrem durante o dia somente raramente, entre 06h00 e 18h00. Ao pôr do Sol há um súbito aumento no número de observações desses casos, sendo que o ápice é atingido quase que imediatamente”.
Essas visões de pousos de UFOs, segundo Vallée, decaem no correr da noite, mas apresentavam um segundo pico de ocorrências pela madrugada, chegando a zero por volta das 06h00. As observações que respondiam pela categoria Tipo 3, criada pelo trio francês e empregada pelo astrofísico, ocorriam em sua grande maioria no período compreendido entre as 18h00 e 24h00. São os casos de UFOs vistos no céu, executando movimentos irregulares ou somente parados. Os picos de atividade destacategoria estavam centrados entre 20h00 e 21h00, diminuindo também com o avanço da noite. Durante o dia existe pouca manifestação ufológica de objetos voadores não identificados que se encaixem nesta classificação. Por outro lado, os avistamentos do Tipo 3 – UFOs no céu em movimento contínuo – ocorriam com maior freqüência durante o dia, alcançando o auge ao se aproximar o pôr do Sol. Em uma amostra de 600 casos dessa categoria, 60% foram de avistamentos entre o período das 17h00 às 23h00. Já os casos do Tipo 2 – UFOs em formato cilíndrico – não entraram neste estudo por apresentarem um número elevado de “ruído” [Informações confusas contidas nos relatos, que acabam por invalidá-los].
Fenômeno Global — Vallée atesta que essa distribuição horária é a mesma em todos os países em que pôde verificar a casuística ufológica. Como forma de comprovar a afirmação do eminente astrofísico, este autor resolveu computar em dados estatísticos uma grande onda ufológica brasileira, a ocorrida no Amazonas e Pará, no ano de 1977. Essa onda regional ficou conhecida pelo nome dado pelos populares às luzes misteriosas que eram vistas nas vilas ribeirinhas: Fenômeno Chupa-Chupa. Os casos foram estudados in loco pela Força Aérea Brasileira (FAB), que montou um projeto específico de investigação, chamado Operação Prato, sob comando do então capitão Uyrangê Hollanda, que funcionou entre setembro e dezembro daquele ano [Veja edições 54 e 55]. A operação expediu um relatório final de mais de 1.000 páginas, registrando centenas das manifestações aéreas. É deste relatório – pelo menos da parte conhecida da Comunidade Ufológica Brasileira, cerca de 500 páginas – que retirei uma amostra de 500 observações de UFOs relatadas pela própria equipe de Hollanda e também por populares.
Os resultados confirmam a conclusão de Jacques Vallée, apresentando uma distribuição horária similar à que ele descobriu, com maior manifestação ufológica no período noturno. Nessa amostragem não foi adotada nenhuma categoria de classificação usada por Vallée ou Hynek. Simplesmente, foi considerado qualquer avistamento de UFOs como uma categoria única. Como resultado, foi praticamente nulo o avistamento de objetos voadores não identificados entre o período de 07h00 às 17h00 [Veja gráfico]. A maior concentração de atividade ufológica desta onda situou-se entre as 18h00 e 24h00 horas: 315 relatos ou 63% do total. Encontramos o grande ápice das ocorrências entre as 19h00 e 20h00: 42 relatos ou 28,4% dos casos somente dentro desta única hora. No decorrer da madrugada, os relatos são menos intensos e só voltam a apresentar outro pico de 05h00 às 06h00, sendo que a partir desse horário decaem bruscamente. Deve-se salientar que todas as avaliações da distribuição horária da manifestação ufológica nos diferentes países em que foram feitas levaram em consideração o horário local, a estação do ano e o momento do crepúsculo do Sol, particular para cada região examinada.
Mas por que as pessoas narram que observaram mais UFOs à noite? Será que estes objetos realmente se apresentam mais em nossa atmosfera neste período do dia ou são os humanos que estão mais propícios para observações nesses horários? Antes de se buscar qualquer explicação extraordinária para justificar a estatística, deve-se tentar examinar respostas prosaicas. Precisamente, muito da intensa presença de luzes no céu noturno poderia, a priori, ser o resultado da observação de meteoros, balões iluminados, faróis de automóveis, estrelas, planetas, luzes de aeronaves, satélites, bando de aves iluminadas pelas luzes de uma cidade etc. O escuro pode dificultar a visão humana, provocando diversos erros de interpretação. Contudo, Hynek, como astrofísico, excluiu todos os relatos que indicavam essas possibilidades e os números continuaram sinalizando uma elevada casuística noturna.
Com base nisso, algumas hipóteses podem ser lançadas. Primeiramente, talvez as pessoas tenham sua atenção despertada para essas visões noturnas devido à iluminação dos UFOs, em contraste com o fundo negro da abóbada celeste. Um ponto luminoso no escuro, em local com ausência de iluminação urbana, atrai significativamente a atenção humana. Em vez disso, contra o azul do céu diurno a iluminação de um UFO de iguais proporções quase passa despercebida, ofuscada pela luz solar. É algo relativo, mas comumente é mais fácil ver um objeto luminoso em céu noturno do que em céu claro. Muitos relatos de populares, colhidos no decorrer da Operação Prato, descreviam que as testemunhas estavam em suas residências quando tiveram suas atenções desviadas para uma forte iluminação externa ou que adentrava suas casas.
Corpos Luminosos — Os horários em que acontecem picos de observações de UFOs durante a noite também poderiam ter como causa as atividades humanas, e não necessariamente a atividade ufológica. Vallée informa que “o número de relatos de Tipo 1
[Aterrissagens de UFOs] diminui gradativamente com o progresso da noite, em proporção direta ao número de observadores em potencial”. Ou seja, na medida em que as pessoas voltam para casa, depois do trabalho, temos mais casos do que quando elas estão dormindo. O segundo pico de atividade, no fim da madrugada, poderia ser causado quando as pessoas acordam cedo para irem ao trabalho, deixando suas casas. Tendo os UFOs uma manifestação maciçamente expressiva em ambiente aberto, as testemunhas estariam sujeitas a estas observações, pela manhã, quando o céu ainda não está tão claro.
De qualquer forma, é de se questionar por que, se considerarmos o início e o fim da noite, e a madrugada – momento este em que as pessoas em geral estão dormindo –, existe ainda uma freqüência maior de observações do que no período diurno, quando as pessoas estão acordadas e em atividade. Hipóteses alternativas também poderiam explicar porque foram vistos mais UFOs pela noite no período de quatro meses que durou a Operação Prato. Uma sugestão seria a de que a equipe do capitão Hollanda não mantinha vigília de 24 horas contínuas, mas apenas noturna, e boa parte da manhã e tarde era usada pelos investigadores militares para descanso. Assim, enquanto repousavam durante o dia para uma nova empreitada noturna, a equipe não registrava os UFOs que surgiam nas vilas ribeirinhas comumente atacadas pelo Chupa-Chupa. A propósito, os militares da operação, no relatório oficial que emitiram, chamavam os objetos voadores noturnos de corpos luminosos e, os diurnos, de aeromóveis. Entretanto, o documento inclui também relatos de observações prestados por populares. Unindo-se a quantidade de depoentes civis e militares, pode-se praticamente afirmar que existia uma atividade diária nos locais, assegurando-nos que as estatísticas não estão desviadas por essa variável.
De qualquer modo, para eliminar completamente todo ruído que seja a causa das atividades corriqueiras humanas nesta questão horária, seria ideal uma vigília de 24 horas, realizada com o auxílio de aparelhos eletrônicos de observação e detecção. Necessariamente, uma câmera de vídeo registrando todo o ambiente em volta e monitorando qualquer anomalia aérea. Tal vigília eletrônica já foi realizada no Vale de Hessdalen, na Noruega, onde fluía uma intensa atividade ufológica nos anos 80. Segundo os estudiosos do Projeto Hessdalen, criado para investigar os casos, 85% dos UFOs eram luzes avistadas no céu escuro e o restante eram objetos aéreos vistos em céu claro. O fenômeno, que era monitorado por diversos aparelhos, além das câmeras, ocorria várias vezes por dia, mas sua concentração maior estava logo ao anoitecer ou durante a noite. Era a derradeira conclusão de que, pelo menos naquele lugar, os objetos voadores não identificados realmente aparecem em maior quantidade no período noturno, independentemente das atividades do dia a dia dos humanos.
Parapsicologia e UFOs — Depois de analisarmos todos esses dados, uma pergunta se torna crucial: afinal, será que a manifestação ufológica é inibida em algum grau pela luz solar? Existiria uma semelhança entre a ação dos UFOs e a de animais notívagos, como o morcego ou a coruja? Ou os tripulantes dessas naves teriam uma predileção qualquer pelo ambiente noturno, uma hipótese que associa diretamente uma inteligência artificial ao Fenômeno UFO? É certo que esses objetos vêm sendo registrados em qualquer hora do dia, inclusive alguns casos clássicos ocorreram com o Sol a pino. O famoso ufólogo brasileiro general Alfredo Moacyr de M. Uchôa, em sua obra A Parapsicologia e os Discos Voadores [Horizonte Editora, 1979], já ponderava se não existiria algum denominador comum entre o fenômeno da ectoplasmia em sessões espíritas e as manifestações ufológicas, já que ambos são inibidos pela luz.
Como resumo de sua experiência em vigílias no município de Alexânia (GO), Uchôa resumiu que “jamais vimos os UFOs com qualquer claridade solar. Sempre foi necessário sobrevir à obscuridade, superado o crepúsculo”. O relatório do Projeto Hessdalen [www.hessdalen.org] também menciona que as estranhas luzes noturnas raramente eram vistas no verão daquela região, tendo a maior parte de sua atividade concentrada na estação de inverno.
Uma das razões para isso, lançadas pelos executores do projeto, aventava a idéia de que as noites de verão no Vale Hessdalen são intensamente iluminadas pela luz solar e, portanto, tal claridade poderia ser a causa da menor freqüência de atividade ufológica. O fenômeno naquela localidade norueguesa continua se repetindo até os dias de hoje, e o projeto se mantém em atividade.
Infelizmente, existem mais questionamentos do que respostas para esse enigma – e bem diferentes hipóteses podem ser formuladas a seu respeito. Muitos estudiosos acreditam que a resposta final seria a de que os UFOs são naves de civilizações extraterrestres visitando a Terra, que fazem suas incursões noturnas e se escondem na penumbra para sempre permanecerem ocultos dos humanos. O que não se compreende, em vista desta alternativa, é por que tais seres que desejam tanto tal anonimato precisam surgir com suas naves profusamente iluminadas, nos mesmos céus noturnos em que querem se esconder, despertando a atenção até do mais desatendo mortal?