Todos nós sentimos algo quando, ao estarmos em um lugar aberto, olhamos para cima e nos deparamos com uma linda noite estrelada. Porém, por mais que nos maravilhe o céu noturno, tudo o que conseguimos ver, mesmo em um ambiente livre de luzes artificiais e com a atmosfera limpa, são 2.500 estrelas, o que é praticamente nada quando pensamos que existem bilhões delas em nossa galáxia. Alguns de nós, diante do espetáculo do cosmos, nos atemos ao tradicional, maravilhados pela beleza épica ou fascinados pela escala insana de seu tamanho. Pessoalmente, acabo passando pela antiga experiência de humildade. Mas todos sentem alguma coisa e ninguém passa incólume diante das estrelas. O físico Enrico Fermi também sentiu algo e se perguntou: “Onde está todo mundo?” Ele estava se referindo aos nossos supostos vizinhos cósmicos.
Quando nos confrontamos com o número de estrelas e galáxias existente no universo, uma questão que ocorre à maioria de nós é se há vida inteligente lá fora. Coloquemos alguns números nisso. As muitas estrelas que existem em nossa galáxia, algo entre 100 e 400 bilhões, correspondem mais ou menos ao mesmo número de galáxias existente no universo observável. Assim, para cada estrela em nossa colossal Via Láctea há uma galáxia lá fora. No universo todo, calculamos que o total de estrelas esteja entre 1022 e 1024, número extraordinário que significa que, para cada grão de areia da Terra, existem 10 mil estrelas lá fora. Mas não há um acordo dentro do mundo científico sobre quantas dessas estrelas são como nosso Sol, ou seja, similares em tamanho, temperatura e luminosidade — as estimativas geralmente variam entre 5% e 20%. Sendo bem conservadores, vamos trabalhar com a estimativa de 5% e com o menor número de estrelas, 1022. Fazendo as contas, chegamos a 500 quintilhões ou 500 bilhões de bilhões de estrelas como o Sol.
Bilhões de estrelas e planetas
Há um debate científico ocorrendo hoje sobre quantas das estrelas similares ao nosso Sol podem ser orbitadas por planetas como a Terra, ou seja, planetas com condições similares de temperatura, que tenham água líquida e suporte potencial para vida. Alguns dizem que chegam a 50%, mas vamos trabalhar com o conservador número de 22%, que saiu em um recente estudo do Proceedings of the National Academy of Science of the United States [Procedimentos da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, PNAS]. O estudo sugere que há um potencial de planetas do tipo da Terra orbitando pelo menos 1% do total de estrelas do universo, ou seja, seriam 100 bilhões de bilhões de planetas similares ao nosso.
Então, haveria 100 planetas similares à Terra para cada grão de areia do nosso mundo. Pense nisso da próxima vez em que estiver na praia. Para seguirmos em frente neste raciocínio, e não temos escolha, vamos precisar ser completamente especulativos. Imaginemos então que, depois de bilhões de anos em existência, 1% desses planetas possam ter desenvolvido vida. Isso sendo verdade, cada grão de areia iria representar um planeta com vida. Agora, imaginemos que em 1% desses planetas a vida alcançou um grau de inteligência similar ao nosso. Isso significaria que há 10 quatrilhões ou 10 milhões de bilhões de civilizações inteligentes no universo observável. Pensando somente em nossa galáxia, e usando sempre os números mais conservadores — 100 bilhões de estrelas na Via Láctea — estimamos que exista um bilhão de planetas similares ao nosso e 100 mil civilizações inteligentes perto de nós.
O Projeto SETI, o programa de busca por vida extraterrestre inteligente, é uma organização dedicada a buscar por sinais de civilizações avançadas no espaço. Caso estejamos certos e realmente existam 100 mil ou mais delas em nossa galáxia, e considerando que apenas uma fração esteja enviando sinais por ondas de rádio, raios laser ou outros modos de contato, o conjunto de radiotelescópios do SETI já não os teria detectado? Mas não detectaram nenhum. Nunca. Então, novamente recorrendo a Fermi: “Onde está todo mundo?” E a situação fica mais estranha ainda quando pensamos que o nosso Sol é relativamente jovem em comparação com o tempo de vida do universo — há estrelas muito mais antigas e provavelmente muito mais planetas similares à Terra orbitando-as, o que, em teoria, significaria civilizações muito mais avançadas do que a nossa. Como exemplo, comparemos nosso planeta, que tem 4,54 bilhões de anos, com um mundo hipotético que chamaremos de planeta X, com 8 bilhões de anos, portanto 3,46 bilhões a mais do que a Terra.
Escala de Kardashev
Apenas para facilitar o raciocínio, tenha em mente que a tecnologia e conhecimento de uma civilização que estivesse há meros mil anos à nossa frente poderia ser tão chocante para nós como seria nosso próprio mundo para uma pessoa da Idade Média. Uma civilização um milhão de anos mais adiantada seria tão incompreensível para nós, humanos, quanto a nossa deve ser para as baratas. Agora, se o planeta X está 3,46 bilhões de anos à nossa frente, imagine o que deve haver por lá. Para entender isso, há a chamada Escala Kardashev, que agrupa civilizações inteligentes em três amplas categorias, com base na quantidade de energia que usam [Veja artigo sobre isso em UFO 214, agora disponível na íntegra em ufo.com.br]. Segundo a escala, uma civilização do Tipo 1 teria a habilidade de usar toda a energia de seu planeta. Nós ainda não somos uma civilização desta categoria, mas estamos próximos — Carl Sagan criou uma fórmula para essa escala que nos coloca como Tipo 0,7. Já uma civilização do Tipo 2 poderia manipular a energia de sua estrela hospedeira. Mas nosso fraco cérebro mal consegue imaginar como se faria isso, embora possamos visualizar o processo como uma Esfera Dyson.
O conceito do que ficou conhecido como Esfera de Dyson foi proposto em 1960 pelo físico e matemático Freeman Dyson, daí seu nome. A esfera, ou cinturão, seria uma megaestrutura feita de painéis solares montada em torno de uma estrela, de modo a captar o máximo de energia possível direto da fonte. Por mais mirabolante que possa parecer tal estrutura, há astrônomos procurando por elas desde novembro de 2012, em estrelas da Via Láctea e de outras galáxias. Voltando à Escala de Kardashev, uma civilização do Tipo 3 varreria as outras duas para longe, acessando poderes comparáveis à própria galáxia Via Láctea. Esse nível
de avanço soa difícil de acreditar, mas lembremo-nos de que o planeta X está 3,46 bilhões de anos à nossa frente em desenvolvimento. Caso uma civilização em tal mundo fosse similar à nossa, e conseguisse sobreviver até chegar ao topo da Escala de Kardashev, seria natural pensar que ela provavelmente dominasse as viagens interestelares, o que lhes possibilitaria colonizar toda a galáxia.
O Paradoxo de Fermi
Uma hipótese sobre como a colonização galáctica seria feita poderia ser a de se criar algum tipo de mecanismo que pudesse viajar a outros planetas, passar aproximadamente 500 anos se autorreplicando, utilizando para isso os materiais locais e, então, enviando réplicas suas para outros lugares para fazerem a mesma coisa. Mesmo sem precisar viajar para qualquer lugar à velocidade da luz, esse processo iria colonizar toda a galáxia em 3,75 milhões de anos — um piscar de olhos em relação à escala de bilhões de anos do universo.
Continuando este processo especulativo, imaginemos que 1% da vida inteligente sobreviva tempo suficiente para tornar-se uma civilização do Tipo 3, colonizadora de galáxias. Nossos cálculos acima sugerem que há pelo menos mil civilizações desta categoria em nossa galáxia e, se pensarmos no poder que teriam, sua presença seria provavelmente visível. Mas, mesmo assim, não vemos nada, não ouvimos nada e não fomos visitados — pelo menos não oficialmente — por ninguém. Então, mais uma vez, onde está todo mundo? Esse questionamento é justamente o que se chama de Paradoxo de Fermi. Não temos resposta para ele e só o que podemos fazer é dar explicações possíveis. E se alguém perguntar a dez cientistas diferentes quais são seus palpites sobre a explicação a correta, terá dez respostas diferentes. Isso faz lembrar os homens do passado, que debatiam se a Terra girava em torno do Sol ou que pensavam que os raios aconteciam por causa de Zeus. É exatamente nesse ponto que estamos em relação ao assunto.
A colonização galáctica seria feita criando-se um mecanismo que pudesse viajar a outros planetas, passar aproximadamente 500 anos se autorreplicando, utilizando para isso os materiais locais e, então, enviando réplicas suas para outros lugares
Para conhecermos algumas das possíveis explicações mais discutidas entre os cientistas sobre o Paradoxo de Fermi, vamos dividi-las em duas grandes categorias: aquelas que presumem que não há sinal de civilizações dos Tipos 2 e 3 simplesmente porque não existem, e este seria o Grupo 1; e aquelas que presumem que tais civilizações existam e que há razões para não as vermos ou ouvirmos, que chamaremos de Grupo 2. Os adeptos do primeiro grupo apontam para algo chamado de “problema da não exclusividade”, que rebate as teorias que dizem que há civilizações mais avançadas, mas nenhuma delas fez qualquer tipo de contato conosco porque são todas justamente muito avançadas para nós. Se olharmos os números que apontam que deveria haver milhares ou milhões de civilizações avançadas, como estas, é bem possível que alguma delas fugisse à regra e nos contatasse.
Mesmo que essa teoria fosse correta para 99,99% das civilizações avançadas, as outras 0,01% teriam que se comportar de maneira diferente e aí nós ficaríamos cientes de sua existência. Portanto, diz o Grupo 1, não há civilizações superavançadas. E sendo que a matemática sugere que há, sim, milhares delas em nossa própria galáxia, então outra coisa está acontecendo para que não tenhamos sido contatados — isso se chama Grande Filtro em astronomia. A teoria do Grande Filtro diz que, em algum ponto entre a pré-vida e um estágio civilizatório do Tipo 3, há um obstáculo que todos, ou quase todos, os tipos de vida encontram. Há algum estágio no longo processo evolucionário que é extremamente difícil ou impossível para a vida ultrapassar. Esse estágio é o tal Grande Filtro.
Somos raros?
Se essa teoria for correta, a grande pergunta é: onde, na linha do tempo, esse Grande Filtro acontece? Com relação ao destino da humanidade, esta questão é muito importante. Dependendo de em que ponto da evolução da vida o Grande Filtro ocorre, temos três possíveis realidades: somos raros, somos os primeiros, ou estamos perdidos. Se formos uma espécie rara, então uma esperança que temos é a de que o Grande Filtro já tenha passado e que nós tenhamos conseguido superá-lo, o que significa que é extremamente incomum para vida chegar ao nosso nível de inteligência — esse cenário explicaria porque não há civilizações Tipo 3 e também significaria que nós podemos ser uma das poucas exceções atuais que conseguiram chegar até este ponto.
Mas também significaria que temos esperança. Isso pode soar um pouco como pessoas de 500 anos atrás sugerindo a Terra como centro do universo, o que implicaria que somos especiais. No entanto, algo que os cientistas chamam de “efeito seletivo de observação” sugere que qualquer um que pondere sobre sua própria raridade é intrinsicamente parte de uma história de sucesso em relação à vida inteligente. E sejam realmente raros ou comuns, os pensamentos que ponderam e as conclusões que alcançarão serão idênticos. Isso nos força a admitir que sermos especiais é, no mínimo, uma possibilidade.
Mas, se somos especiais, como exatamente nos tornamos especiais? Ou melhor dizendo, o que conseguimos superar que outras espécies não conseguiram para que chegássemos até aqui? Uma possibilidade é a de o Grande Filtro ocorrer bem no início de nossa evolução e talvez que seja incrivelmente incomum que a vida comece. Isso é possível, uma vez que a Terra já existia há bilhões de anos quando a vida finalmente surgiu, e também porque já tentamos extensivamente replicar os eventos que geraram a vida em laboratório e nunca fomos capazes de fazê-lo. Se esse for o Grande Filtro, isso então significa não só que não há vida inteligente lá fora, mas que pode não haver nenhuma outra forma de vida.
Por que somos raros?
Outra possibilidade é a de que o Grande Filtro possa ser o salto de uma simples cé
lula procarionte para uma complexa célula eucarionte. Depois que os procariontes vieram a existir, continuaram dessa forma por quase dois bilhões de anos antes do salto evolucionário que os tornaram complexos e com vários núcleos, como uma célula eucarionte. Se esse for o Grande Filtro, significa que o universo borbulha com células procariontes simples e mais nada. Mas há outro grande número de possibilidades. Alguns pensam que o salto mais recente que fizemos em nossa inteligência atual é um grande candidato a ser o Grande Filtro. Enquanto isso, o salto de vida semi-inteligente, como os chimpanzés, para vida inteligente, dos humanos, não parece ser algo ao acaso.
O psicólogo, linguista e escritor de divulgação científica Steven Pinker rejeita a ideia de um inevitável salto na evolução. “Como a evolução não busca uma meta, mas simplesmente acontece, ela usa a adaptação que seja mais útil para determinado nicho ecológico e o fato de que, na Terra, isso levou à inteligência tecnológica somente uma vez até agora, o que pode sugerir que esse resultado de seleção natural é raro e, portanto, não é de forma alguma um desenvolvimento da evolução da árvore da vida”, afirmou Pinker.
Com sua energia, civilizações avançadas seriam capazes de criar um ambiente perfeito para sua espécie e satisfazer suas necessidades. E como viveriam muito bem, não teriam interesse em explorar o universo frio, vazio e pouco desenvolvido
A maioria dos saltos evolutivos não está qualificada para ser candidato a Grande Filtro — qualquer possível Grande Filtro deve ser algo do tipo um em um bilhão, onde uma ou mais ocorrências acidentais precisam acontecer para produzir uma exceção inusitada. Por essa razão, algo como o pulo das células singulares para multicelulares está fora, porque ocorreu umas 46 vezes em acidentes isolados somente em nosso planeta. Por essa mesma razão, se encontrássemos um eucarionte fossilizado em Marte, isso iria remover a possibilidade de células simples virarem complexas como salto evolutivo e como possível Grande Filtro porque, se isso acontece tanto na Terra quanto em Marte, está definitivamente fora da probabilidade de ser o acidente do tipo um em um bilhão.
Caso sejamos mesmo especiais, seria devido a alguma casualidade biológica. Mas nossa raridade também poderia ser atribuída ao que chamamos de Hipótese da Terra Rara, que sugere que, mesmo que existam outros planetas iguais à Terra, as condições particulares de nosso planeta, relacionadas às especificidades do nosso Sistemas Solar, ao tamanho da Lua ou a algo sobre nosso mundo em si, são excepcionalmente amigáveis à vida.
Somos os primeiros
Dentro das explicações do Grupo 1, que reúne aqueles que dizem não haver civilizações mais avançadas do que a nossa, alguns teorizam que, se o Grande Filtro não está atrás de nós, talvez só agora, desde o Big Bang, o universo tenha chegado ao ponto de reunir condições que permitiriam que vida inteligente se desenvolvesse pela primeira vez. Nesse caso, nós e várias outras espécies também podemos estar no caminho de nos tornarmos superinteligentes, e que isso simplesmente ainda não aconteceu. Um exemplo de um fenômeno que pode tornar isso uma realidade é a existência de explosões de raios gama, tão massivas que são observadas em galáxias distantes. Da mesma forma que demorou algumas centenas de milhões de anos para que asteroides e vulcões se acalmassem e vida fosse possível na Terra, pode ser que a primeira fase de existência do universo estivesse tão cheia de eventos cataclísmicos que explosões de raios gama iriam incinerar quase tudo de tempos em tempos. Agora, talvez, estejamos no meio de uma fase de transição astrobiológica e possivelmente esta seja a primeira vez que qualquer vida foi capaz de evoluir por tanto tempo, sem interrupção.
Porém, se não somos nem raros nem adiantados no tempo, os pensadores do Grupo 1 concluem que o Grande Filtro deve estar em nosso futuro — isso sugere que vida evolui regularmente até chegar ao ponto em que chegamos, mas que, na maioria dos casos, algo a impede de ir adiante e alcançar uma inteligência mais elevada. E nós não somos exceção. Uma possibilidade de Grande Filtro futuro é a ocorrência de um evento natural cataclísmico como as explosões de raios gama mencionadas anteriormente, que ainda ocorrem no universo e é só uma questão de tempo até que a vida na Terra seja destruída por elas. Outro candidato é a possível inevitabilidade de que quase todas as civilizações inteligentes acabem destruindo a si mesmas quando alcançam certo grau tecnológico.
Por essa razão, o filósofo da Universidade de Oxford Nick Bostrom diz que “nenhuma novidade é boa”. A descoberta de vida em Marte, mesmo que simples, seria devastadora porque iria cortar drasticamente o número de possíveis Grandes Filtros passados. E se encontrarmos vida complexa fossilizada em Marte, Bostrom diz que “seriam as piores notícias já produzidas para a ciência”, porque significaria que o Grande Filtro está à nossa frente e, seja o que for, irá destruir todas as espécies. Bostrom acredita que, com relação ao Paradoxo de Fermi, “o silêncio na noite estrelada é um tesouro”. Ou seja, melhor que não exista mesmo ninguém lá fora.
Silêncio devastador
Vamos agora falar do Grupo 2, que pensa que há razões lógicas para não ter havido qualquer contato de outras inteligências cósmicas conosco. As explicações dos integrantes desta categoria se desapegam de qualquer noção de que haja algo especial ou raro em nós ou em qualquer coisa. Ao contrário, eles acreditam no Princípio da Mediocridade, que primeiramente aponta que não há nada de incomum ou raro sobre nossa galáxia, nosso sistema estelar, nosso planeta ou nível de inteligência, até que alguma evidência aponte o contrário. Eles também são bem mais cautelosos quando presumem que a falta de evidências de seres com inteligência superior seja evidência que não existam, enfatizando o fato de que nossa busca por sinais via SETI se estende no máximo por aproximadamente 100 anos-luz de distância de nós, ou seja, apenas 0,1% da galáxia, e sugerem algumas explicações possíveis, como veremos a seguir.
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Formas de vida superinteligente podem ter visitado a Terra antes de estarmos aqui. Humanos capazes de pensar só estão no planeta há 50 mil anos, uma fração de segundo se comparado à idade do universo. Então, se o contato com outras avançadas espécies cósmicas aconteceu antes disso, pode não ter surtido efeito algum. Mais ainda, o registro histórico da humanidade tem apenas 5.500 anos. Então, é possível que um grupo de antigos humanos possa ter tido algum tipo de contato, mas eles não tinham a menor ideia de como registrar o fato para o futuro.
* A galáxia foi colonizada, mas nós vivemos na sua periferia. Os norte-americanos foram colonizados pelos europeus muito antes que qualquer índio da tribo Inuit, do norte do Canadá, soubesse disso. Por esta analogia, queremos demonstrar que pode haver um componente urbanizador nos agrupamentos interestelares de espécies mais avançadas, no qual todos os sistemas estelares em sua vizinhança sejam colonizados e se mantenham em comunicação. Isso tornaria impraticável e sem propósito para qualquer um viajar para uma parte tão aleatória da galáxia em que vivemos.
* Todo o conceito de colonização física é ridiculamente atrasado para espécies mais avançadas. Isso nos remete à imagem da civilização Tipo 2 com a Esfera de Dyson em volta de sua estrela. Com toda essa energia, tais seres seriam capazes de criar um ambiente perfeito para sua espécie e satisfazer todas as suas necessidades. E como eles viveriam muito bem, não teriam interesse em deixar sua feliz existência para explorar o universo frio, vazio e pouco desenvolvido. Isso sem dizer que civilizações mais avançadas podem enxergar todo o mundo físico como um local horrivelmente primitivo, tendo há muito tempo dominado sua própria biologia e colocado o conteúdo de seus cérebros em alguma realidade virtual, ou paraíso de vida eterna. Viver em um mundo físico, dependente da biologia, da mortalidade, dos desejos e necessidades, pode parecer a eles o mesmo que nos parece a vida primitiva das espécies que vivem no findo escuro e frio dos oceanos.
* Há civilizações predatórias lá fora e qualquer forma de vida inteligente sabe que não deve transmitir sinais que apontem sua localização. Esse é um conceito pouco agradável, mas que pode explicar a falta de sinais recebidos pelos radiotelescópios do SETI. Também significaria que somos novatos ingênuos e que estamos correndo sérios riscos ao transmitirmos sinais para fora do planeta. Sobre isso, Stephen Hawking diz que, “se os alienígenas nos visitarem, o resultado será muito parecido com aquilo que ocorreu quando Colombo chegou às Américas”. Até Sagan, que acreditava que civilizações avançadas o suficiente para realizarem viagens interestelares fossem altruístas e não hostis, chamou o envio de sinais para fora da Terra de “profundamente imatura e nada sábia”. E recomendou que “as novas espécies em um cosmos estranho e incerto deveriam ouvir silenciosamente por um bom tempo, pacientemente aprendendo sobre o universo antes de gritar para uma selva desconhecida e que não entendemos”. É assustador.
Outras explicações possíveis
Além das razões que listamos acima, há outras que poderiam explicar porque, havendo formas de vida muito mais inteligentes e tecnologicamente avançadas do que a nossa, elas ainda não nos visitaram ou contataram de forma aberta e generalizada. Uma delas poderia ser o fato de que há somente uma civilização superinteligente e que ela exterminaria todas as outras que encontrasse pelo caminho. Isso explicaria porque não conseguimos encontrar sinais de vida avançada até agora — ela não existiria porque foi destruída. E este seria mais um motivo para ficarmos calados, sem transmitir nada para fora da Terra.
Outra possibilidade diz que há muita atividade e comunicação no cosmos, mas que nós não temos aparelhagem sofisticada o suficiente para ouvir o que está acontecendo. Isso seria mais ou menos como entrar em um edifício supermoderno e tentar se comunicar via código Morse. Obviamente não ouviríamos nada, pois todos estariam se comunicando por celular, SMS, Whatsapp etc. E como não ouvimos nada, achamos que o edifício está vazio. Ou talvez, como o citado Sagan também apontou, pode ser que nossas mentes trabalhem exponencialmente mais rápido ou mais devagar do que outras formas de inteligência. E existe ainda, claro, a possibilidade de que elas realmente estejam se comunicando conosco e os governos estejam escondendo este fato da população mundial — mas isso não seria tão fácil de fazer como alguns parecem pensar. De qualquer forma, esta é uma teoria muito discutida e vale a pena pensar nela.
Podermos também elencar outras razões que poderiam explicar o silêncio cósmico, como, por exemplo, o fato de que as superinteligências existem e nos veem como material de estudo e observação, apenas. Seríamos mera curiosidade, tal como veríamos as formigas ao montarem seu formigueiro de maneira excepcionalmente organizada. Não iríamos notar seres muito mais avançados que quiserem nos observar porque eles saberiam como fazê-lo sem serem percebidos. Talvez até tenham uma regra similar à diretiva principal da série Jornada nas Estrelas [1966], que proíbe seres muito inteligentes de fazerem contato aberto com seres menos inteligentes, até que esta espécie alcance um certo nível de desenvolvimento que a permita enfrentar o contato sem degenerarem suas condições.
Cupinzeiro
Ao ser consultado sobre o assunto, o físico, professor e autor de divulgação científica Michio Kaku resumiu a questão da seguinte forma: “Digamos que temos um formigueiro no meio de uma floresta e ao lado dele estejamos construindo uma grande rodovia de dez faixas. A questão é: as formigas compreenderiam o que é uma rodovia de dez faixas? Seriam capazes de entender a tecnologia e as intenções dos seres construindo a estrada ao seu lado? Então, concluímos, não é que não consigamos captar os sinais do planeta X citado no começo deste trabalho usando nossa tecnologia, é que não conseguimos compreender o que os seres do planeta X estão fazendo ou tentando fazer. Esta informação está tão além de nós que mesmo que tais seres quisessem nos iluminar explicando quem são e o que fazem, seria como tentar ensinar um besouro sobre como usar a internet.
Essa também pode ser a resposta para outra per
gunta: se há tantos tipos de civilizações do Tipo 3, por que não nos contataram ainda? Para responder a isso, perguntemos a nós mesmos: quando o conquistador espanhol Pizarro entrou no Peru, ele parou ao lado de um cupinzeiro e tentou se comunicar com seus moradores? Ele foi altruísta e tentou ajudar os cupins, ou se tornou hostil e atrasou sua missão original para destruir o cupinzeiro? Ou será que o cupinzeiro era simplesmente irrelevante a Pizarro? Essa bem pode ser nossa situação — somos tão irrelevantes que não fez sentido tentar contato.
Por fim — e essa é uma possibilidade que a cada dia ganha mais simpatizantes —, nós podemos estar completamente errados sobre nossa realidade, e há muitas formas de estarmos errados sobre tudo. O universo pode parecer uma coisa e ser totalmente outra, como um holograma. Ou talvez sejamos nós os alienígenas e fomos plantados aqui como algum tipo de fertilizante. Há até a chance de sermos parte de uma simulação computadorizada feita por algum pesquisador de outro mundo e que outras formas de vida simplesmente não façam parte da simulação. De qualquer forma, sejam quais forem as explicações, todas nos fazem pensar e concluir que ainda estamos longe de ter as respostas.
Golpe em nossa prepotência
Além de ser um chocante componente de ficção científica, o Paradoxo de Fermi também nos deixa profundamente humildes diante de tudo. Ele traz uma visão mais clara do universo e da pluralidade de vida extraterrestre inteligente. Futuras gerações irão olhar para nós, desta época, da mesma forma que olhamos para os povos antigos que tinham tanta certeza que as estrelas estavam do lado de baixo do domo do céu e que o Sol girava em torno da Terra. Nossos descendentes irão pensar: “Eles não tinham a menor ideia do que estava acontecendo”.
Junto com isso, há um forte golpe na autoestima de nossa espécie que se origina em toda essa conversa sobre civilizações do Tipo 1 e 3. Aqui na Terra, somos os senhores de nosso pequeno mundo, soberanos orgulhosos do grande número de almas que compartilham o planeta conosco. E nessa bolha, sem competição e sem ninguém para nos julgar, é raro que paremos para pensar na possibilidade de sermos dramaticamente inferiores a outras espécies. Mas, depois de gastar um bom tempo imaginando como seriam as civilizações avançadas que podem existir no universo, nosso poder e orgulho parecem ridículos e espetacularmente ignorantes. Dito isso, e porque este autor acredita que a humanidade seja órfã em uma pequena pedra no meio do universo desolado, o simples fato de que provavelmente não sejamos tão inteligentes quanto imaginávamos, junto com a possibilidade de que muito do que temos certeza provavelmente está errado, parece maravilhoso — isso abre a porta para possibilidades ilimitadas e cria a oportunidade para questionarmos o que mais há nessa história.