Há mais de uma década, quando tomei a decisão de me afastar da Ufologia, não foram poucos os amigos e colegas que, surpresos, questionaram o porque de tão repentina decisão. Em primeiro lugar, ela não foi tão repentina assim, já que os rumos que minha pesquisa estavam tomando relegavam a Ufologia a segundo plano, posto que meus interesses recaíam prioritariamente no ser humano e, em última análise, no elo de ligação entre o investigador e o fenômeno propriamente dito. Assim, como dizia Charles Chaplin, “não posso compreender o universo sem antes compreender o homem”, inferi que o depoimento testemunhal deveria ser o centro das minhas atenções. Se o testemunho não era (e não é) 100% confiável, como avaliar os eventos ufológicos em toda a sua extensão?
Em segundo lugar, meu afastamento se deu por razões externas e alheias à Ufologia, sem qualquer relação direta. Assim, meus horizontes quanto ao tema ampliaram-se significativamente, tal como a perspectiva dos acontecimentos. A melhor analogia que encontrei para ilustrar essa situação foi a de como assistir a uma partida de futebol na posição privilegiada de observador neutro. De um lado os indecifráveis UFOs e suas táticas mirabolantes, “jogadas de efeito” e uma estratégia de defesa perfeita. De outro lado, os ufólogos, perplexos e impotentes, sem saber como, quando, de que forma e por onde será o próximo “ataque”. Diante desse quadro nada animador, a partir do momento em que escrevi para esta mesma revista, em março de 2000 [Edição 70], a polêmica matéria Para Onde Caminha e Qual o Futuro da Ufologia Brasileira, tenho sido reiteradamente questionado por alguns pesquisadores e leitores sobre dois aspectos que parecem ser o cerne da discussão: a propalada estagnação da Ufologia e, em sua decorrência, qual ou quais seriam os caminhos que se poderia propor como renovação.
Um dos primeiros a se manifestar nesse sentido, e o fez imediatamente após a publicação da matéria, foi o autor do excelente O Caso Varginha [LV-08], Ubirajara Franco Rodrigues. Através de uma longa correspondência, Ubirajara demonstrou total concordância com a argumentação apresentada para, ao final da mesma, perguntar textualmente: “Que nova abordagem você sugere? Sob a ótica da física quântica? Terá você sugerido a espera de ‘irmãos cósmicos’ sob preparo espiritualista? Que forma de se compreender o fenômeno há, que não seja pela razão e pela ciência?” Depois dele, outros tantos se seguiram com as mesmas indagações, e até os dias de hoje a questão permanece em aberto.
Estagnação da Ufologia — Permaneci em silêncio nestes últimos três anos, e errou quem pensou que assim fiquei por comodismo ou por não ter mais nada com a Ufologia. Durante esse período refleti profundamente sobre a questão, li muito, ouvi muito, estudei muito. No início deste ano aceitei o convite feito pelo editor da Revista Ufo para assumir o cargo de ombudsman, e o fiz por razões bastante prosaicas: atender ao pedido de um velho amigo, ter a oportunidade de tecer comentários sobre o tema com alguma isenção e ainda dar minha modesta contribuição para o aprimoramento de todos os envolvidos (pelo menos neste último quesito, quem mais está se aprimorando sou eu). Mas ao me expor novamente num veículo de circulação nacional, voltei a ser alvo daqueles mesmos questionamentos. Portanto, creio que é chegada a hora de uma manifestação. Primeiro, com relação à estagnação da Ufologia, pois parece estar havendo um equívoco de interpretação, ou estão subvertendo o verdadeiro sentido da colocação original.
O Fenômeno UFO nãose encaixa num único modelo. Na verdade, nãose encaixa em nenhum.Ele é algo totalmente novoe a explicação espacialnão pode ser a única. Ela é a menos explicável.Pode e deve haver outros caminhos, e é por eles que eu tento caminhar
— Jacques Vallée
Quando afirmei que a Ufologia está num marasmo sufocante, obviamente não estava falando da casuística, dos avistamentos, dos contatos, fotos, abduções e de toda sorte de acontecimentos, que estão aí se multiplicando, se avolumando e se acumulando, sem entrar no mérito de sua autenticidade. Tampouco estava me dirigindo aos veículos de comunicação específicos da área, pois a Ufo é um modelo vivo de heróica resistência, prestes a completar duas décadas de existência, contrariando todas as expectativas passadas e atuais. Além disso, a cada dia surgem novos sites na internet sobre o tema e grupos de pesquisa pontuam por todo o país. Tudo isto faz com que a Ufologia esteja cada vez mais presente no cotidiano do cidadão comum e seja vista com muito mais naturalidade que em tempos idos. Crer ou não é uma questão pessoal. Ainda assim, ao longo destes mais de 50 anos, a Ufologia só fez juntar uma quantidade imensa de informações, dados estatísticos, levantamentos, exames, laudos médicos, enfim, toda uma parafernália de documentação que, a rigor, não gera conhecimento. E é importante ficar claro que informação não é conhecimento! Tudo o que temos é um extraordinário acervo, um banco de dados incrivelmente variado. Só que não sabemos o que fazer com ele! Estamos enchendo nosso álbum de figurinhas sem ter a menor idéia de para o que servirá!
Na matéria Para Onde Caminha a Ufologia, sugeria aos colegas que buscassem novas formas de ver o fenômeno, reavaliassem suas posturas, fossem exigentes consigo mesmos, a exemplo do que eu mesmo fizera anos antes, insatisfeito por não poder proporcionar ao público uma renovação nas informações. Eu não estava me renovando porque o tema não apresentava (ou eu não enxergava) outras opções de pesquisa. Naquela ocasião, recomendei também à própria Revista Ufo que tratasse de reciclar seu conteúdo, buscasse a renovação das fontes e estimulasse o surgimento de novos autores, ou cairia num círculo vicioso entrópico. Ponto para ela, que fez corretamente sua lição de casa e seguiu prontamente minha sugestão, com sobras. Os leitores estão aí e não me deixam mentir. E a esses mesmos leitores eu pedia também que ampliassem sua visão acerca do assunto. Entretanto, pelas cartas que tenho recebido e pelas que têm sido publicadas, tenho dúvidas sobre isso.
Ufólogos Obtusos — Tomo como exemplo um leitor que me escreveu recentemente, para quem a Ufologia só poderá evoluir quando os ETs se fizerem mais presentes e participativos, e que o surgimento dos círculos ingleses é uma evolução da Ufologia! Já outra leitora se manifestou aqui mesmo na Revista Ufo chamando de “ufólogos obtusos” e “espíritas carolas” aqueles que não vêem ligaç
;ão entre Ufologia e espiritismo. Ainda outro crê que Dino Kraspedon recebe visitas freqüentes de um amigo interplanetário, comandante de uma nave-mãe estacionada próxima da Terra. Defendendo até a morte o direito inalienável de cada um expressar-se à vontade sobre qualquer tema de sua crença, discordo totalmente de todos eles. Democraticamente, no entanto, procurei nas 10 últimas edições da Ufo um único leitor que expusesse com inteligência, visão ampla e descondicionada um tema para debate, mas lamentavelmente não encontrei alguém com essas características. Não tenho dúvidas de que existam leitores assim, só espero que não demorem a escrever. Todos defendem seus pontos de vista de um modo particular, achando que a solução para os mistérios da Ufologia está no espiritismo, que nossos “irmãos cósmicos” aguardam nossa evolução para que possam se fazer compreender, ou ainda que a Ufologia não evolui porque os cientistas não colaboram, porque os governos vivem acobertando tudo, porque o presidente norte-americano não obedece a Lei de Liberdade de Informação, porque o Echelon fica bisbilhotando nossos e-mails, ou porque o dólar não pára de subir, porque o Fome Zero não sai do papel, porque o Gilberto Gil virou ministro da Cultura…
E quanto aos colegas ufólogos? É bem verdade que tenho lido e comentado, na medida do possível, algumas matérias muito interessantes. Mas vejo com reservas se haverá uma transposição da teoria para a prática. Para ilustrar, recorro à matéria assinada pelo ufólogo Carlos Alberto Machado, Novas Formas de Encarar a Presença Alienígena na Terra [Edição 81], na qual ele apresenta uma série de proposições sobre uma nova abordagem para o fenômeno. Refaço aqui a pergunta feita em uma das minhas últimas colunas: Machado, consultor de Ufo, aceitaria trocar todos os seus anos de pesquisa e investimentos no fenômeno Chupacabras, que o fez publicar um livro e o tornou uma autoridade no assunto, por uma radical mudança de valores e percepções, como ele mesmo sugere no seu artigo? E o colega e co-editor Marco Petit, outro veterano pesquisador, toparia abandonar suas longas vigílias na Serra da Beleza (RJ) e começar do zero a partir de um novo enfoque? Ou ainda nosso também co-editor Claudeir Covo, que passou os últimos 20 anos desmistificando filmes e fotografias de supostos UFOs, partiria para uma ousada e inédita empreitada de pesquisas?
Espero que os colegas citados não se aborreçam com a menção de seus nomes, pois não há aqui nenhuma conotação de crítica, já que foram tomados emprestados apenas e tão somente como exemplos para reflexão. Mas a questão está lançada para ver quem toma a iniciativa. A Ufologia está em permanente estado de torpor porque há uma acomodação generalizada, porque se acha que evolução é desmistificar a Tiazinha, é tomar depoimentos de celebridades como evidência da presença de ETs na Terra, é entupir a mídia com dúzias de casos de luzinhas no céu e UFOs fotografados na praia, é acreditar que a onda de implantes é documento incontestável da tecnologia extraterrestre, é discutir se Jesus foi ou não um alien, é aceitar que um guru indiano seja um escolhido dos extraplanetários ou que os círculos ingleses são sinais criptografados de mensagens interestelares. Tudo isso é o que chamei, linhas atrás, de colecionar figurinhas. São um reflexo da imaturidade e ingenuidade com que está sendo vista uma realidade que bate na nossa cara com luvas de pelica. É preciso pensar!
Seriedade e Compromisso — Disse e repito com todas as letras: a Revista Ufo vem publicando boas matérias, mas enquanto estiverem restritas ao papel e não saírem para uma ação prática mais efetiva, não podemos prosseguir discutindo sobre evolução da Ufologia. Que atire a primeira pedra quem achar que estou errado, mas que o faça com convicção e não erre o alvo! E antes que isso aconteça, vou exercer meu direito de defesa. Quando expus com tanta veemência meu ponto de vista sobre a inércia ufológica, não o fiz gratuitamente, porque não estou sozinho nessa linha de raciocínio. Mas também não vou ficar na omissão de apontar alguns caminhos. Nas últimas edições da revista [87 e 88], mencionei, ainda que de passagem, um importante pesquisador nome da Ufologia mundial, que desde a década de 70 defende uma reputação de absoluta seriedade e compromisso. Estou falando de Jacques Vallée, francês radicado há anos nos Estados Unidos, colega do falecido J. A. Hynek, um dos maiores nomes da Ufologia.
O leitor mais antigo certamente já ouviu falar e muito de Vallée, mas a nova geração talvez não. Quem é Vallée e o que o diferencia dos demais ufólogos? Ele pensa, o que faz muita diferença, e sua visão do fenômeno tem levado à reflexão os mais sérios e competentes investigadores em todo o mundo. Não há aqui nenhuma idolatria, apenas reconhecimento por sua postura ousada, equilibrada, consistente e sensata. Não foi uma tarefa fácil para este autor inteirar-se com profundidade da essência dos pensamentos e da visão de Vallée, principalmente por não haver material para consulta que exponha com clareza e atualidade sua linha de raciocínio. Constato com frustração que raramente uma obra sua é traduzida para o nosso idioma. Mas, afinal, que linha de pensamento é essa que faz esse pesquisador se destacar tanto? Com formação em ciências exatas, sendo matemático, astrofísico e Ph.D. em computação, desde cedo Vallée teve sua atenção despertada para uma realidade totalmente nova que se apresentava, até por força da profissão, que o deixava intrigado. Naturalmente, como astrônomo, sua primeira inclinação seria a de interpretar os avistamentos de UFOs como sendo de origem extraterrestre, puramente espacial. Mas ele intuiu logo que não seria uma explicação convincente. Tendo essa percepção e sentindo que não deveria se condicionar apenas à teoria espacial, a flexibilidade para ir em busca de outras possibilidades permitiu que, com rapidez, começasse a construir seu próprio caminho de pesquisa. Até porque ficava profundamente aborrecido com seus colegas que evitavam discutir o assunto.
Partindo do pressuposto de que entre vida extraterrestre e visitas alienígenas ha
via uma distância – desculpem o trocadilho – astronômica, e tendo bem vivas na memória as palavras de seu amigo Hynek, de que a possibilidade de haver vida inteligente no universo era real, mas que nossa visão dessa inteligência era muito provinciana, Vallée acreditava que o absurdo dessas aparições deveria ter uma explicação. Ele entendia por absurdo não um acontecimento que fosse ilógico ou irreal, apenas que escapava à nossa compreensão. Ele exemplifica essa maneira de pensar citando os koans do zen-budismo, em que seu aparente absurdo tem na verdade o objetivo de romper com as formas condicionantes de pensamento, introduzindo um novo referencial mental. Ou seja, em sua natureza primordial, os UFOs exercem esse mesmo papel, como um colossal koan.
Minha decisão de deixar o cenário ufológico se dá porque o trabalho sério e construtivo é impossível nas circunstâncias atuais. A Ufologia desperdiça milhões de dólares em trabalhos absurdos e não científicos
— Jacques Vallée
Nas palavras de Juan Atienza, escritor e historiador espanhol, profundo estudioso do ocultismo, tudo isto é um “absurdo programado”. Em um de seus tratados sobre o tema, Mística y OVNIs – Signos para un Apocalipsis, ele esgota a idéia comparativa entre os UFOs e as filosofias orientais, citando os pensamentos sufis: “O aparente é a ponte que leva ao real” ou “existem outros mundos, mas estão todos aqui!”
Para Vallée, se você avista um UFO cruzando os céus, seu primeiro impulso é acreditar que ele vem do espaço, e essa passa a ser a sua única forma de pensar. “Isso é errado. É preciso entender que vir do espaço pode ser apenas um meio, não um fim. O Fenômeno UFO não se encaixa num único modelo. Na verdade, não se encaixa em nenhum conhecido. Ele é algo totalmente novo e essa explicação espacial não pode ser a única”, escreveu o pensador. “No meu entender, ela é a menos explicável. Pode e deve haver outros caminhos, e é por eles que eu tento caminhar”. Vallée parte também do princípio de que o Fenômeno UFO não é um sistema, porque, se fosse, haveria uma forma de entendê-lo. Sua manifestação é tão diversificada, singular, imprevisível e impalpável que não se pode ancorar numa explicação simplista. E, mesmo que fosse um sistema, qualquer que seja, por qual inteligência ele seria controlado? Terrestre? Divina? Cósmica? Nem Vallée, nem ninguém tem a resposta.
De novo, ele tenta ilustrar: “É como assistir a um filme. Você vai ao cinema e interage com os atores, com as situações, se emociona, ri, chora, sofre, vibra, depois fica feliz com o que viu. E o que você viu, efetivamente? Você viu a projeção de uma outra realidade. Ao contrário de você, eu quero olhar para trás, quero saber de onde vem a luz que projetou o filme, quero ir atrás de sua origem”. Esse é um ponto que também questiono há muito tempo. Estamos sempre indo atrás dos efeitos do fenômeno, depois que ele aconteceu, e não às suas causas. “O problema é que eu não sei de onde é feita essa projeção”, insiste. Esse comportamento contraria a norma básica da investigação em qualquer campo. Quando a medicina encontra uma nova forma de vírus, mutante e letal, assim que toma ciência de seus sintomas e efeitos, parte rapidamente em busca das causas e vai à raiz do problema, na sua origem, na fonte. Com a Ufologia, não.
Multidimensionais — Em Revelations, um de seus livros, ainda não traduzido, Vallée declara que o Fenômeno UFO é genuíno, real e físico, associado a uma forma de consciência não humana, uma inteligência capaz de manipular o espaço-tempo de um jeito que não compreendemos. Essa é a questão. Se essa forma de vida opera as propriedades do espaço-tempo, ela não deve ser, necessariamente, extraterrestre. Ela pode ser proveniente de qualquer lugar ou tempo, e até mesmo do nosso ambiente. Pode coexistir conosco e não percebermos. As entidades podem ser multidimensionais, além do próprio espaço-tempo, aquilo que é conhecido também como universos paralelos. Com base nisso, ele concentrou seus estudos e pesquisas, sem negligenciar a parte prática das investigações, chegando a vir ao Brasil para tentar compreender uma outra faceta do fenômeno, aquela que colocava frente a frente uma inteligência desconhecida e outra desprovida dos conceitos fundamentais acerca da existência humana.
Vallée está convencido – e nós também – de que estamos diante de uma oportunidade excepcional para se aprender algo de fundamental sobre o universo, porque o Fenômeno UFO não domina apenas os conceitos do espaço-tempo, mas está interferindo diretamente na ambientação psíquica do ser humano. Quando escreveu Le College Invisible, mais um não traduzido, ele sabia que a comunidade ufológica mundial não estava madura para aceitar suas idéias, que não eram em absoluto fantasias delirantes ou especulação visionária. Ao contrário, estavam fundamentadas em pesquisa de campo, em entrevistas com testemunhas seguras, que sabiam ter presenciado algo totalmente inexplicado, dentro ou fora de suas convicções pessoais. Havia uma interligação inequívoca entre os relatos, por mais diferentes que fossem, e foi por essa via que Vallée concluiu estar o fenômeno atuando em duas frentes, simultaneamente, a física e a psíquica. “Há uma interação entre elas, mas ainda não sabemos como isso acontece”, provoca.
Ao mesmo tempo, ele se mostrava desgostoso e incomodado pela forma como as pesquisas, de um modo geral, estavam se desenvolvendo, estampando sempre um selo sensacionalista e especulativo. Por isso, em 1995, decidiu afastar-se da Ufologia. “Minha decisão de deixar o cenário ufológico é consistente com a observação de que o trabalho sério e construtivo é impossível nas circunstâncias atuais. Nos últimos anos a Ufologia desperdiçou perto de um milhão de dólares em trabalhos absurdos e não científicos, centrados na pesquisa de abduções, no fiasco de Roswell e em várias investigações do tipo Gulf Breeze. Não posso permanecer associado a nada disto, portanto, é o tempo de me retirar silenciosamente”. Mais tarde, noutra oportunidade, voltou a esclarecer as razões de seu afastamento. Disse que as pessoas imaginaram que ele tinha se retirado para subir ao topo de uma montanha e filosofar. A razão pela qual abandonou a Ufologia, n
a verdade, era de que queria trabalhar na investigação dos UFOs e estava cansado de comparecer a congressos e encontros onde só se falava a mesma coisa. “O que acontecia era somente muita falação”, desabafou. Com esse silêncio auto-imposto, Vallée se isolou de tudo e de todos, não responde a correspondências, evita contatos com a imprensa e não participa de congressos. Retirou-se para reflexão, para estudar à sua maneira esse conjunto de manifestações dentro de uma ótica toda particular. Se daí surgir uma revolução no pensamento ufológico mundial, quero estar vivo para presenciar.
Aspecto Sociológico — Exterior ao fenômeno, entretanto, outro aspecto tem tomado forma e, num certo sentido, suplantado a questão maior. É o aspecto sociológico, que tem proporcionado um ruído de fundo, uma distorção capaz de desviar e até inverter o foco central do problema. Vallée se refere a isso citando Comunhão, de Whitley Strieber, um livro de retumbante sucesso nos Estados Unidos e larga vendagem no Brasil, que virou filme. Segundo ele, a obra “…tocou as pessoas, mesmo as que jamais o leram, porque tem uma capa poderosa. O rosto impresso na capa tornou-se o modelo, para nossa sociedade, de como os alienígenas deveriam ser”. Referindo-se a um alien amedrontador, Vallée acha que este modelo atingiu um tal ponto que, quando uma testemunha não descreve algo de semelhante, é rejeitada como farsante. “Há uma espécie de profecia envolvida, o que é muito mágico e enganador”. Nessa mesma vertente, porém num nível mais grave, estão o acobertamento de informações, os falsos contatados, a implantação de uma política de desinformação, o exercício das falsas verdades etc. Tudo isso faria parte de um dissimulado teatro de operações muitas vezes sem qualquer vínculo entre si, mas que, no final das contas, têm o mesmo objetivo. É o marketing da mentira, ponto vital no controle de forças. Se você não tem o segredo, mas dá a entender que tem, o poder está em suas mãos. Se você tem o segredo, mas finge que não, as pessoas nunca saberão se você o tem de fato, e o temerão por isso também. De um jeito ou de outro, o poder acaba em suas mãos.
Vallée, a exemplo deste autor, que já defendia essa idéia anos atrás, espera que o público conclame por mudanças, e só essa iniciativa já é suficiente para que as mudanças de fato aconteçam. Se o leitor se reportar à matéria já citada, Para Onde Caminha a Ufologia, verá que nossa colocação não é muito diferente do que o pesquisador franco-americano acredita a respeito. “Penso que o modo de estudarmos os UFOs nos acarretou problemas, pois misturamos todos os níveis envolvidos no fenômeno, o físico, o psicológico e o mitológico ou social”, diz. No nível físico teríamos uma quantidade gigantesca de efeitos que estão muito bem documentados. Nos níveis psicológico e fisiológico também fizemos muitos avanços com a participação da comunidade médica nas investigações dos casos mais significativos. “Já o nível mitológico ou sociológico é o que me interessa agora. Aí a realidade física é irrelevante. Provar que Jesus Cristo jamais existiu não ocasionará qualquer abalo no sistema de crenças em nossa sociedade. Querer demonstrar se Jesus foi ou não um ET também não mudará nada, porque nada ficará provado. E, se ficar, você deixará de dirigir suas orações a Ele?”
Grosso modo, a espécie humana se divide em dois níveis de consciência, o material e o espiritual, convivendo separados por um muro quase intransponível, que os deixam simultaneamente tão próximos quanto distantes. Do lado material, a corrida em busca de bens, a ampliação do patrimônio, a disputa antropofágica por um pedaço de terra. Desse lado do muro, os UFOs são vistos como naves espaciais, viajantes do tempo, seus tripulantes são angelicais ou demoníacos, com finalidades variadas e usam toda a tecnologia conhecida e desconhecida na exploração do planeta e seus habitantes, e seriam de uma realidade física incontestável. O erro nessa idéia está em entronizar os tripulantes dessas naves como deuses salvadores, numa ingênua e perigosa prática de divinização.
Busca Espiritual — Já do outro lado do muro, a busca é espiritual, a evolução é da consciência, a meta é a iluminação. E os UFOs são compreendidos como um programa para o aprimoramento da consciência cósmica, um modelo de inteligência desenvolvido para aguçar a percepção humana. Entretanto, a desproporção de seres de cada lado do muro é imensurável e tende a aumentar. O ser humano alarga as fronteiras do conhecimento tecnológico e ao mesmo tempo estreita o caminho espiritual.
Diante de tudo isto, quer nos parecer que a linha de raciocínio adotada por Vallée é a que nos oferece um amplo painel para reflexão, muito mais rico e consistente do que simplesmente aceitar o fenômeno como sendo de natureza exclusivamente extraterrestre. É um ponto de partida, um referencial para se começar a fazer alguma coisa, porque, convenhamos, alguma coisa precisa ser feita, até para que possamos no futuro justificar toda essa discussão, tanto investimento e pesquisa. Mas é preciso também, acima de tudo, amadurecer nossa visão diante de uma questão tão relevante quanto a nossa própria existência no planeta, reavaliar, renovar e ampliar nossas expectativas. Isso ou…
Há 17 anos era escrita uma obra sem similar na literatura ufológica brasileira, sempre preocupada em divulgar somente os aspectos físicos do fenômeno: Ufologia – O Despertar de uma Nova Consciência, de Jaime Lauda. E é dela que tomo emprestadas suas palavras finais, sempre atuais, para encerrar também este capítulo de nossa reflexão: “Os UFOs, sejam extraterrestres ou não, possuem uma proposta benéfica e útil para a humanidade. É nessa proposta que, se alguns chegarem a compreender, está alicerçada a mensagem desse grandioso e secular espetáculo! Necessitamos de melhores seres humanos e ansiamos pelo despertar de uma nova mentalidade, pois somente a partir dela renunciaremos de vez à escravidão da inconsciência”.