Um anúncio divulgado como se fosse uma notícia de suposta colisão entre um asteróide e a Terra confundiu os internautas brasileiros. A peça publicitária, parte da estratégia de lançamento de um carro da marca francesa Citroën, foi divulgada entre domingo à noite e a manhã desta segunda-feira em diferentes portais de Internet.
A notícia é falsa e, por causar confusão, o UOL optou por retirá-la do ar por volta das 10h, antes do prazo determinado pelo contrato.
O anúncio, em formato de texto jornalístico, esteve nas primeiras páginas de portais. Pequenos ícones avisavam tratar-se de publicidade, mas muitos leitores não perceberam e se assustaram. Ao clicar no link, o usuário tinha acesso a uma página com o título “Asteróide Pallas poderá se chocar com a Terra em 2007”.
A página tinha um logotipo de um suposto Observatório de Asteróides, identificado como associado a um hipotético International Astronomy Centre.
O texto tenta dar credibilidade à falsa notícia e afirma, em seu primeiro parágrafo, que “astrônomos amadores descobriram que o asteróide 2-Pallas teve sua órbita alterada e segundo os últimos cálculos está em rota de colisão com a Terra”. A peça afirma que a colisão deve acontecer na segunda quinzena de julho (na verdade, é o período de lançamento do novo carro).
A única identificação de que se trata de anúncio está no fim da tela, com a menção de “informe publicitário”.
Em nenhum momento, o texto cita o carro ou a Citroën. O modelo de veículo que será lançado é o C4 Pallas.
Criadores
A campanha foi idealizada pela agência de marketing promocional Banco de Eventos.
Segundo o diretor de Criação da Banco de Eventos, Fábio Brandão, o material estava identificado como anúncio. “O que fizemos foi aproveitar a coincidência de nome de nosso novo produto com o asteróide, para produzir uma peça publicitária que chamasse a atenção das pessoas, sem deixar de mostrar que se tratava de publicidade”.
Ele afirma que a proposta era atrair o leitor. “O que pretendíamos era aguçar a curiosidade das pessoas, para que, apesar de estarem cientes de se tratar de uma forma de publicidade, entrassem no site em busca de informações sobre essa misteriosa ação promocional. Assim funciona o \’buzz marketing”.
De acordo com ele, essa peça faz parte da primeira fase da campanha do C4 Pallas. “Ainda nesta semana, entrará no ar a segunda fase, na qual a verdade será revelada e surgirá um personagem que fará parte do lançamento do carro”.
A assessoria de comunicação H2M, indicada pela Citroën para falar sobre o assunto, disse que “o maior objetivo da ação foi despertar a curiosidade dos consumidores. A iniciativa foi bem-sucedida”. A Citroën não comentou os aspectos éticos da divulgação da falsa notícia.
Regulamentação publicitária
A assessoria de imprensa do Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária) disse que o órgão não pode comentar o caso porque não há um processo aberto ainda, mas ressaltou três artigos do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária que podem ser usados como argumento contra anúncios divulgados em forma de notícia.
O principal é o artigo 27, segundo o qual, “o anúncio não deverá conter informação de texto ou apresentação visual que direta ou indiretamente, por implicação, omissão, exagero ou ambigüidade, leve o consumidor a engano”.
Segundo outro artigo, o 23, os “anúncios devem ser realizados de forma a não abusar da confiança do consumidor, não explorar sua falta de experiência ou de conhecimento e não se beneficiar de sua credulidade”.
Por fim, o artigo 28 determina que “o anúncio deve ser claramente distinguido como tal, seja qual for a sua forma ou meio de veiculação”.
Enor Paiano, diretor de Publicidade do UOL, diz que os anúncios não saem mais. “O UOL cancelou a campanha, pois repudia publicidade que imita conteúdo jornalístico e confunde o público, mesmo que o espaço utilizado esteja informado como \’Publicidade”.
Segundo Paiano, “os controles internos da empresa estão sendo revistos de forma a evitar que episódios como este se repitam”.
Luciana Lima, gerente de Comunicação do portal Terra, que também divulgou a falsa notícia, disse que a identificação de anúncio estava visível. “O anúncio estava claramente identificado como publicidade, ocupando um espaço publicitário, e não de conteúdo. Ele saiu do ar não por decisão do Terra, e sim por um pedido da agência de propaganda”.
Segundo ela, a área editorial do portal recebeu seis reclamações diretas por e-mail de internautas, “mas o serviço de atendimento do Terra não registrou nenhuma ocorrência ligada a esse anúncio”.
Noticiário
A falsa notícia chegou a ser divulgada como verdadeira em veículos de comunicação nacionais, como a rádio Band News FM. A assessoria de imprensa do Grupo Bandeirantes confirmou o equívoco.
“Realmente o âncora Ricardo Boechat registrou a notícia de um asteróide que atingiria a Terra durante tranmissão da BandNewsFM na manhã desta segunda-feira, conforme notícia que havia visto veiculada na Internet. Porém, alguns minutos depois, a produção do programa informou a Boechat que se tratava de uma campanha publicitária, informação essa que ele veiculou no ar, como correção do informe anterior”.
O asteróide 2-Pallas existe mesmo, segundo o site do Instituto de Física da UFRJ, e tem diâmetro entre 400 km e 525 km.
O caso lembra a transmissão de rádio feita pelo ator e diretor de cinema norte-americano Orson Welles nos anos 30 nos EUA, que simulava uma invasão da Terra por marcianos. Era uma apresentação teatral pelo rádio, e isso foi avisado, mas somente no começo do programa. Depois, parecia material noticioso normal. Causou pânico e muita discussão sobre ética.