O termo exoteologia, ainda pouco conhecido pela Comunidade Ufológica Mundial, deriva da expressão teologia extraterrestre, cunhada para definir parâmetros que permitam um entendimento religioso das conseqüências de futuros contatos com seres de outros planetas. Conceitualmente, a exoteologia é o exame das conseqüências teológicas advindas do contato com inteligências alienígenas, e teria aplicação também numa tentativa de compreensão de como seriam as possíveis crenças dos ETs que viéssemos a encontrar. Por fim, a exoteologia forneceria uma estimativa de como nossa própria teologia seria afetada face à prova incontes-
tável de vida alienígena.
A nova disciplina parte de conceitos primeiramente falados na Conferência dos Bispos da Itália (CBI), por volta de 1996, pelo padre jesuíta George Coyne, na época diretor do Observatório Astronômico do Vaticano. Mas chamou mesmo a atenção quando, em 18 de janeiro de 1997, a revista oficial da CBI publicou uma entrevista com padre Piero Coda, um dos mais importantes teólogos do Vaticano, que afirmou: “Criados por Deus e tendo suas falhas, eles [Os extraterrestres] precisam de redenção através da palavra salvadora de Jesus Cristo”. Meses antes dessa entrevista, outros teólogos do Vaticano declararam ao respeitado jornal Corriere della Sera que os ETs também devem ser considerados filhos de Deus. No mesmo ano, o Vaticano iniciou a construção de um dos mais poderosos observatórios da Terra, para ajudar na pesquisa de sistemas estelares que possam ter planetas capazes de abrigar vida.
O papa João Paulo II pediu a um grupo de astrônomos de alto nível para procederem à busca pelo que foi chamado de “a impressão digital de Deus”. Esta foi a denominação que a Igreja Católica encontrou para os fenômenos celestes, que, por sua complexidade e sutileza, reforçariam a onipotência de Deus. Para tanto, os pesquisadores montaram no Monte Graham, no Arizona, um rá-diobservatório astronômico composto de dois telescópios para pesquisa de nuvens de poeira cósmica e gás, que podem formar sistemas planetários. O instrumento é capaz de identificar estrelas e planetas em que haja condições favoráveis ao desenvolvimento de vida. As pesquisas no observatório envolvem um pequeno grupo de cientistas, mas poderá dobrar em pouco tempo, de acordo com a entrada em operação dos equipamentos. Os jesuítas da Igreja convenceram o papa a ajudar no financiamento do projeto, defendendo que o observatório papal – estabelecido no último século – caiu em desuso por causa da poluição atmosférica. Esta guinada científica da Santa Sé não é por acaso.
Com um estudo astronômico apurado e poderoso, o Vaticano vê no projeto a possibilidade de evitar erros, como os que levaram os estudiosos a confrontos históricos entre as posições religiosas e científicas. As batalhas do passado culminaram com a perseguição a astrônomos famosos, como Nicolau Copérnico e Galileu Galilei, que defenderam teorias contrárias à tese de que a Terra era o centro do universo, como pregava a Igreja. Para justificar a iniciativa e delinear as tendências teológicas da empreitada, o padre Coyne, então diretor do Observatório do Vaticano, disse que “a encarnação de Cristo se aplica a toda atividade humana, incluindo a astronomia”.
O projeto já começa a prever até mesmo reações possíveis diante de temas delicados para a Igreja Católica, como a descoberta de formas de vida extraterrestres, sobretudo no caso de serem inteligentes. Haveria problemas para decidir se a crucificação de Jesus Cristo significaria também a remissão dos pecados para os alienígenas. O padre Christopher Corbally, jesuíta inglês vice-diretor no Observatório, diz que “se as civilizações fossem descobertas em outros planetas, e se for possível nos comunicarmos, então nós iríamos querer enviar missionários para salvá-los, da mesma maneira como fizemos no passado quando novas terras foram descobertas”. A busca de uma sintonia maior do cristianismo com a ciência parte de um estudo teórico dos astrônomos do papa, que deu origem à teologia especulativa, que permite à Igreja ter grande flexibilidade na maneira como responde a novas descobertas. Há uma grande preocupação com teorias recentes de que o universo não tem fim nem começo, o que eliminaria a necessidade de um deus criador de tudo. Sob a ótica da teologia especulativa, fenômenos recém-descobertos são como “impressões digitais de Deus”, que em sua complexidade e sutileza reforçam sua onipotência e não enfraquecem a fé numa força maior.
Em 2001, o então diretor do Observatório Vaticano, George Coyne, disse estar convencido da existência de vida extraterrestre e garantiu que é “uma loucura” pensar que o homem possa estar só no cosmos. “O universo é tão grande que seria insano pensar que nós somos uma exceção”, afirmou Coyne em recente entrevista ao jornal milanês Corrieri della Sera. Ele destacou que “a cada dia são acumulados novos dados que fazem pensar na possibilidade de formas de vida diferentes das existentes na Terra”. Coyne acrescentou que, “quanto mais estudamos os astros, mais conscientes ficamos de nossa ignorância”. O jesuíta, ex-responsável desde 1978 por um observatório com mais de um século de história, e que depende diretamente da Santa Sé, afirmou que a ciência não destrói a fé, mas a estimula.
Repensando dogmas
Embora admita que hoje em dia não exista evidência científica que prove a existência de vida fora da Terra, Coyne é consciente que esta eventualidade abre para os que acreditam nisso “uma inquietante série de incógnitas e um grande desafio”, mas que isso não deve ser considerado um fato dramático. Ne
sse sentido, o astrônomo declarou que alguns setores da Igreja consideram negativo debater ou estudar questões que podem fazer a doutrina católica “tremer um pouco”. No entanto, insistiu em que não existe obrigatoriamente uma contraposição das versões sobre a origem do cosmos que a Bíblia oferece com as mais atuais defendidas pela ciência, como a Teoria do Big Bang. Segundo Coyne, nem as sagradas escrituras nem a teologia se aprofundam em como Deus criou o universo, mas compete aos cientistas e à sua insaciável curiosidade responder às muitas incógnitas que ainda não foram resolvidas, entre elas a possibilidade de formas de vida extraterrestre.
Monsenhor Corrado Balducci, que já foi considerado exorcista oficial da Santa Sé e era pessoa do círculo de intimidade do papa João Paulo II, admitiu em um simpósio de Ufologia em San Marino que é “real a possibilidade de que outras criaturas inteligentes vivam no espaço [Veja Revista UFO 067], causando grande agitação no meio ufológico e na ala mais conservadora da Igreja. Segundo o monsenhor, a existência de discos voadores seria um sinal inequívoco da graça de Deus. E acrescentou: “a Bíblia não se refere diretamente aos extraterrestres, mas também não os exclui. A realidade dos UFOs é muito provável no infinito mistério da criação”. Balducci escancarou um tema que sempre foi mantido a sete chaves por governantes e pelo próprio Vaticano.
Ele vai mais longe quando afirma que “a Bíblia não exclui a possibilidade de existência de outros planetas com seres inteligentes e voluntariosos de corpo e alma. Uma posição de ceticismo integral está fora de jogo. A religião cristã também se baseia em testemunhos”. Para ele, a existência de outros seres vivos é possível e natural também do ponto de vista teológico definido como Bonun Est Diffusium Suis. Trata-se de um conceito largamente repetido na Bíblia, de que a criação é a glória divina. “E criaturas dotadas de inteligência e vontade, ainda que alienígenas, podem contribuir difundindo isso”.
É real a possibilidade de que outras criaturas inteligentes vivam no espaço. A Bíblia não se refere diretamente aos extraterrestres, mas também não os exclui. A realidade dos UFOs é muito provável no infinito mistério da criação
Caminho espiritual
O religioso defende também que é difícil pensar que a criação pela vontade de Deus tenha se limitado à Terra. Por isso, garante que a habitabilidade de outros planetas pode ser também um fato. “Em um futuro remoto, poderiam também servir de ajuda em nosso caminho espiritual. Queriam que não houvesse outras criaturas que amam o Senhor? Certamente Ele não teria restringido sua glória a este planeta”, disse. Ainda segundo o monsenhor, há quatro questões que precisam ser entendidas sobre seres extraterrestres. Primeiro, não se tratam de demônios. Segundo, os casos relacionados a UFOs não são apenas situações psicológicas corriqueiras. Terceiro, os tripulantes destes veículos não estão ligados a casos de possessões. E para finalizar, argumenta que os contatos entre ufonautas e aqueles que os relatam devem ser estudados cuidadosamente. Outra polêmica causada por Balducci é sua incursão pelo mundo do exorcismo, uma vez que era considerado uma espécie de exorcista oficial da Santa Sé.
ETs: IRMÃOS NA CRIAÇÃO
Outro personagem que pode ser citado no contexto é o padre José Gabriel Funes, jesuíta argentino formado em astrofísica, além de teologia, e atual diretor do Observatório Astronômico do Vaticano, no Arizona. Funes acaba de causar grande furor na mídia mundial ao admitir que Deus pode ter criado seres inteligentes em outros planetas, do mesmo jeito como criou o universo e os homens. “Como existem diversas criaturas na Terra, poderiam existir também outros seres inteligentes, criados por Deus”, disse o atual diretor. Funes não se limitou a meras divagações sobre o tema. Para ele, acreditar em vida extraterrestre não contradiz a fé cristã, “porque não se pode colocar limites à liberdade criadora de Deus”, disse em entrevista ao jornal L’Osservatore Romano, órgão oficial de imprensa da Santa Sé.
As afirmações do teólogo e cientista foram reproduzidas por jornais de todo o mundo, sendo interpretadas como uma espécie de sinal para que todos os religiosos do Vaticano se alinhem em seus pensamentos e idéias quanto ao assunto. Mas Funes já vem causando polêmica há anos. Ao Corriere della Sera, disse que, “em uma típica galáxia com um amontoado de centenas de bilhões de estrelas, poderia haver uma enorme quantidade de planetas como a Terra, com seres vivos como nós”. Como religioso ousado, ele vai ainda além em suas considerações. “Acredito que eles [Os extraterrestres] podem ser considerados irmãos da criação. Penso que nos outros planetas do Sistema Solar existem somente formas muito primitivas, como bactérias ou vírus. As civilizações evoluídas estão distantes, por ora invisíveis e inalcançáveis, como os anjos, também irmãos da criação”.
Este assunto também interessa a outros religiosos, como demonstrou uma pesquisa publicada no jornal inglês The Sunday Times, em 1998, quando se constatou que 95% dos bispos anglicanos britânicos [De 45 ouvidos] acreditam na possibilidade de vida em outros mundos e 74% afirmam crer que tais formas de vida possam ser inteligentes. A maioria dos bispos, segundo o Sunday Times, concorda que a descoberta de vida alienígena irá exigir um novo estudo das doutrinas mais tradicionais.
Além desses resultados significativos, a pesquisa revelou opiniões muito interessantes de alguns bispos a respeito do assunto. Henry Richmond, bispo de Repton, por exemplo, diz que “formas de vida alienígena podem realmente existir. Eu gostaria de acreditar que os ETs são semelhantes aos humanos, mas precisamos adaptar nossas idéias e reconhecer que os pequenos homens verdes são outra forma de vida inteligente e que não a devemos temer”. Michael Turnbull, bispo de Durham, considera a descoberta de vida em outros mundos uma “força positiva”, embora coloque em discussão o dogma de que o homem é único no cosmos. “Deus criou toda a vida. Se for possível entrar em contato com vida em outros planetas, isso abriria nossas próprias perspectivas para as grandes maravilhas da criação de Deus”.
;dito: Arquivo UFO
Em resposta à pergunta se Deus poderia ter visitado pessoalmente outros mundos, Mark Green, bispo assistente de Chichester, respondeu: “Eu não ficaria chocado se isso tiver acontecido. Se Ele tem filhos em diferentes planetas, Ele os deve ter visitado, do mesmo modo que um pai visitaria seus filhos em diferentes partes do país”. Já Lindsay Urwin, de Horsham, afirmou que “a religião nunca olhou simplesmente para a Terra para ensinar a respeito de Deus. A Bíblia diz que o céu proclama a glória de Deus e eu diria que tudo o que existe lá em cima proclama sua glória”. Enquanto isso, o bispo de Knaresborough, Frank Weston, disse estar feliz com um universo em expansão e com a idéia de outros universos além do nosso. “Deus é um criador Todo-Poderoso e nós não podemos limitar sua criatividade. É preciso existir vida sob outras formas. Estou bastante entusiasmado com essa idéia”.
Existem alguns aspectos que podemos considerar relevantes dentro da exoteologia, e que dão margem a uma série de questionamentos. O primeiro diz respeito a Deus. Raças extraterrestres teriam o conceito de Deus? Ou ainda, como levar até eles este conceito? Outro questionamento trataria da suposta superioridade extraterrestre, ou seja a possibilidade de estarmos na iminência de entrar em contato com seres intelectual, cultural, genética, tecnológica e espiritualmente superiores. Como lidar com estas questões e suas implicações nas religiões e no modo de vida na Terra? Há também quem questione se os ETs estariam numa missão espiritual, considerando os contatos. Outro importante desdobramento desta questão diz respeito às visões de extraterrestres luminosos ou não corpóreos, que têm levado alguns homens a considerá-los semideuses. Haveria veneração a estes seres em caso de contato pleno?
Aspectos relevantes
Ainda tratando-se da profunda interação de homens com ETs, perguntamos se estes tiveram alguma interferência no desenvolvimento humano. Nossa evolução, em algum momento do passado remoto, teria tido interferência direta de ETs? Então, como encaixar Deus neste processo? Teriam eles algum conceito sobre o pecado e a existência do mal? Por fim, a salvação de Jesus, que se sacrificou pela humanidade, vale também para todos os demais seres inteligentes no universo? E outros inspiradores de religiões globais, como Muhammad ou Sidharta [Buda], como se encaixariam neste contexto?
Como se vê, são muitas as implicações desta nova área da investigação da vida extraterrestre. A Ufologia seriamente estudada não pode ser considerada contrária ao cristianismo ou a qualquer religião, e isso aos poucos vem sendo compreendido. Sabemos que o futuro contato com outras civilizações trará mudanças profundas em nosso mundo, e como tudo mais, nossos sistemas de valores religiosos serão de alguma forma afetados, mas não invalidados. Assim como nós devemos ser afetados por novos conceitos e conhecimentos, nossos “visitantes” também o serão, e novas formas de entendimento da vida, do universo e conseqüentemente de toda a criação advirão disso.
BIOSFERA
A diversidade da vida no universo engrandece a obra de Deus, e não a diminui. Conceber que somos a única forma de vida no universo, como alguns ainda defendem, é pretensão sem lógica diante das evidências científicas de que já dispomos. E ainda que não haja provas contundentes, isso é apenas questão de tempo e, quem sabe, ainda no tempo de nossas vidas, estas provas surgirão evidenciando que a vida é um processo muito mais amplo do que o contido em nossa pequena biosfera. Somos parte da criação, e quão reconfortante acabará sendo se nos reconhecermos como parte de uma imensa humanidade, representada por variadas formas de vida, em múltiplos mundos habitados pelo universo.